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Novas tendências da tripartição dos poderes

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Agenda 23/03/2016 às 08:38

CONCLUSÃO

Frente às colocações supradispostas, é notável que a atual conjuntura política de nosso país está permeada por falhas e lacunas. É também sabido que nenhuma teoria até hoje foi capaz de suprir totalmente a matéria concernente à ciência política. Nada obstante, tem-se por óbvia a necessidade de mudanças na organização dos poderes ou funções do Estado. Não se objetiva criar um substituto à atual organização, tão somente se busca conjecturar possíveis alterações que, ao nosso sentir, se mostram necessárias.

A primeira alteração a se considerar é a quebra do atual entendimento da teoria da tripartição dos poderes, que eminentemente não deve ser tida por esse nome. A teoria da separação das funções estatais não pode ser vista de maneira estática, mas dinâmica, levando em consideração a interpenetração dos órgãos, bem como a posição anômala de alguns deles.

Além disso, a alteração que se propõe é ao atual paradigma político nacional. Cientes do numerus clausus de condições de elegibilidade previstas no § 3º, Art. 14 da CF/88, vê-se que há determinados cargos da administração que exigem uma extensa preparação acadêmica para o exercício, muito além do que se exige atualmente.

A priori, toma-se para análise o cargo de Presidente da República, que cumula as funções de Chefe de Governo e Chefe de Estado. Atualmente exigem-se como condições de elegibilidade para o cargo a nacionalidade brasileira (somente brasileiro nato), o pleno exercício dos direitos políticos, o alistamento eleitoral, o domicílio eleitoral na circunscrição (Brasil), a filiação partidária e a idade mínima de trinta e cinco anos.

Após breve análise dos artigos 84 de nossa Carta Maior, pode-se facilmente deduzir que entre as exigências para o cargo e as atribuições e responsabilidades que lhe são imputadas, há um enorme vácuo. Ainda que a figura dos Ministros de Estado busque suprir essa lacuna, o cargo de Presidente da República exige de seu ocupante notável articulação e conhecimento jurídico, político, diplomático, administrativo, econômico e muitos outros.

A ponderação acerca do tema remete de imediato ao termo cunhado pelo sociólogo Michael Young, a Meritocracia. Apesar do viés pejorativo que adotou o autor em seu livro Rise of meritocracy, bem como o extremismo que guia o grupo britânico The Meritocracy Party, a ideia de mérito é imprescindível ao ideal exercício das funções de um governante.

Bem verdade que a medida desse mérito é um dos pontos mais controvertidos a esse respeito, no entanto, as provas têm se mostrado um tanto quanto eficientes como forma de seleção, tanto que a Constituição de 1988 as adotou como principal forma de ingresso no serviço público.

Nesse sentido, em exercício de abstração, supõe-se que o cargo de presidente da república poderia seguir o que dispõe o artigo 37, II, de nossa Constituição Federal. A exigência de aprovação prévia em concurso público de provas e títulos, acrescido à exigência democrática de uma eleição mediante sufrágio direto, secreto, universal, periódico e de igual valor para todos poderia sanar algumas deficiências político-organizacionais de nosso sistema.

Em tal conjectura se poderia prever que os mais bem colocados em tal concurso público concorreriam democraticamente ao cargo. O povo escolheria dentre os profissionais mais qualificados e do mais alto escalão de nosso país.

De modo a evitar radicalismos, podemos trazer outro posicionamento: no intuito de preservar ao máximo o conceito que se formou em torno da democracia, poderíamos trazer à tona a figura dos Ministros de Estado, cargos de confiança que muitas vezes acabam por ser indicados pelo Presidente indistintamente a Ministérios de que não detêm qualquer conhecimento técnico, como aconteceu com o ministro da Pesca e Aquicultura, Marcelo Crivella.

Nesse sentido, semelhantemente ao que sugerimos com relação ao cargo de presidente, poder-se-ia também realizar concurso público para provimento dos cargos de Ministro de Estado.

Não se pode negar a necessidade política de ter pessoas de confiança em cargos de tamanho relevo, todavia, não se pode também negar a necessidade que tem o país de utilizar suas melhores mentes das diversas áreas do conhecimento para o exercício de funções como a de Ministro do Estado.

Assim, realizar-se-ia concurso público para provimento dos cargos de Ministro de Estado, considerando haver a essa altura quantidade suficiente e ideal de Ministérios, e dentre os mais bem colocados e dotados de maior conhecimento na área específica, o Presidente da República poderia escolher aquele que politicamente mais lhe aprouvesse.

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Não se pode olvidar estarmos em uma forma federativa de Estado (federalismo trino ou até mesmo quaternário) e, por esse motivo, é necessária a observância do princípio da simetria constitucional, aplicando-se, no que couber aos Estados-membros e Municípios da República Federativa do Brasil o mesmo que se propõe à União.


REFERÊNCIAS

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GOMES, Wilson. A democracia digital e o problema da participação civil na decisão política. Revista Fronteiras, 2005.

KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do Estado; tradução Luís Carlos Borges. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

LOCKE, John. Ensaio Acerca do Entendimento Humano; Segundo Tratado Sobre o Governo. 5. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991.

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Sobre o autor
Lucas Menezes de Souza

Procurador da Fazenda Nacional

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Lucas Menezes. Novas tendências da tripartição dos poderes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4648, 23 mar. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/47176. Acesso em: 22 nov. 2024.

Mais informações

O presente trabalho contempla proposta de nova interpretação da teoria da tripartição dos poderes, abordando pontos controversos que têm sido alvo de críticas por parte daqueles que defendem a sua superação.

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