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Responsabilidade civil do Estado por danos decorrentes de erro judicial

Agenda 08/03/2016 às 19:30

O presente estudo tem a finalidade de analisar, através de pesquisa exploratória, bibliográfica, e da utilização do método dedutivo, a Responsabilidade Civil do Estado por danos decorrentes do Erro Judiciário.

RESUMO

O presente estudo tem a finalidade de analisar, através de pesquisa exploratória, bibliográfica, e da utilização do método dedutivo, a Responsabilidade Civil do Estado por danos decorrentes do Erro Judiciário. No atual Estado Democrático de Direito, as ações e omissões praticadas pelos agentes do Estado que, agindo nessa qualidade, gerem danos a particulares atraem a responsabilização objetiva do Estado. Os juízes no desempenhar de sua função podem causar prejuízos ao particular, devendo estes, eventualmente, ser reparados pelo Estado, ou na forma do art. 133, do CPC, pelo agente público. Negar o dever de o Estado se responsabilizar pelos prejuízos decorrentes da atuação jurisdicional é afastar os preceitos do Estado Democrático de Direito assumidos pelo Estado brasileiro, razão pela qual, deve o Estado responder pelos atos administrativos, legislativos e judiciários de seus agentes, sempre que houver nexo de causalidade entre a conduta do agente público e o dano.

Palavras-chave: Responsabilidade civil do Estado, erro judiciário, responsabilidade civil extracontratual.

ABSTRACT

The present study aims to analyze, through exploratory research,literature, and the use of the deductive method, the State Civil Responsibility for damages arising from judicial error. In the currentdemocratic rule of law, the actions and omissions committed byState agents who, acting as such, generate damages to attractprivate accountability aims of the state. The judges in performingtheir function can cause damage to the individual, which musteventually be repaired by the state or in the form of art. 133 of theCPC, the public official. Deny the duty of the State is liable for damages resulting from court action is to remove the precepts of the democratic rule of law made ​​by the Brazilian government, whyshould the state respond by administrative acts, legislative and judiciary of its agents, whenever there causal link between the conduct of public servant and damage.

KEYWORDS: Liability of the State, judicial error, tort.

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. DESENVOLVIMENTO: 2.1. Responsabilidade Civil: Conceitos iniciais; 2.2. Evolução da Responsabilidade civil do Estado no Brasil e no Mundo; 2.3. Responsabilidade Civil do Estado no Direito Brasileiro; 2.4. Responsabilidade Civil do Estado por Atos Judiciais; 2.5. Jurisprudência Pátria. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo o estudo da responsabilidade civil do Estado na hipótese de danos decorrentes do erro judiciário.

Sabe-se que a atividade jurisdicional do Estado é exercida por seus agentes investidos de jurisdição, ou seja, por juízes e desembargadores, os quais possuem o objetivo de exercer a pacificação social e a realização da justiça em nossa sociedade.

Entretanto, hodiernamente nos deparamos com um cenário diverso do pretendido por nossa Lei Maior, em que o próprio judiciário é o lesador de direitos dos cidadãos, pois não raras às vezes tem atuado de forma arbitrária, proferido decisões injustas e eivadas de erros crassos.

Diante desse cenário, mister é o estudo da Responsabilidade civil do Estado nos casos de erro judiciário, principalmente no tocante à prisões efetuadas de forma indevida, o que faremos através das seguintes indagações: Qual a responsabilidade civil do Estado por ato de seus agentes? Quem responde pelo erro judiciário? Quais as consequências práticas de sua ocorrência? De que forma se dá a sua reparação?

Nesse diapasão, o presente estudo busca fundamentar juridicamente respostas para as perguntas supramencionadas, através de levantamento bibliográfico e pelo método de pesquisa exploratória, visando proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a constituir hipóteses.

O método utilizado foi o dedutivo, onde partimos de argumentos gerais para formar argumentos particulares, com vistas a esclarecer pontos obscuros sobre o tema.

O estudo foi dividido em três partes: introdução, desenvolvimento (quatro capítulos) e por fim, a conclusão.

A introdução expõe os motivos que levaram a escolha do tema. O primeiro capítulo traz os conceitos iniciais sobre o instituto da responsabilidade civil. O segundo faz breves comentários acerca da evolução histórica da Responsabilidade Civil do Estado no Brasil e no mundo. Já o terceiro capítulo trata da Responsabilidade Civil do Estado no Direito Brasileiro, fazendo um relato de seus aspectos mais importantes. O quarto capítulo trata do Erro Juciário e a possibilidade de reparação por parte do Estado e de seus responsáveis. Por fim, vem a conclusão do trabalho.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1. RESPONSABILIDADE CIVIL: CONCEITOS INICIAIS.

A noção jurídica de responsabilidade pressupõe que algo ou alguém pratique uma atividade danosa que, atuando a priori ilicitamente, viola uma norma jurídica preexistente, subordinando-se, dessa forma, às consequências do seu ato.

A responsabilidade civil deriva da agressão a um interesse particular, fazendo com que o infrator tenha a obrigação de repor in natura o estado anterior de coisas ou efetue o pagamento de uma compensação pecuniária a vítima. (STOLZE, 2009,p.09)

Toda manifestação humana que provoca prejuízo, ou seja, cause um dano, traz em seu bojo o problema da responsabilidade, o que não é um fenômeno exclusivo da vida jurídica, mas de todos os domínios da vida social. (DINIZ, 2006, p. 04)

A responsabilidade civil vem a ser definida por Savatier apud Rodrigues (2003, p. 06) como a “obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam”.

A responsabilidade civil, por ser repercussão do dano privado, tem por causa geradora o interesse em restabelecer o equilíbrio jurídico alterado desfeito pela lesão, de modo que a vítima poderá pedir reparação do prejuízo causado, trazida na composição do status quo ante ou numa importância em dinheiro. (DINIZ, 2006, p. 23-24)

2.2. EVOLUÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO NO BRASIL E NO MUNDO.

Hodiernamente, numa sociedade onde imperam os valores de um Estado Democrático de Direito, não se admite a irresponsabilidade do Estado por danos causados por seus agentes a terceiros.

Mas nem sempre foi assim. A responsabilidade civil do Estado passou por grande evolução até chegar ao cenário atual.

Por muito tempo vigeu a máxima "The King can do no wrong" (O Rei não pode errar), na época dos Estados Absolutistas, em que o Estado possuia uma autoridade incontestável sobre os seus súditos, de modo que, era inadmissível a sua responsabilização, sob pena de desrespeitar a sua soberania (CUNHA JR, 2011, p. 332)

Em alguns Estados a irresponsabilidade não era absoluta, admitia-se a responsabilização nas hipóteses em que a lei expressamente definisse, ou, ainda, por prejuízos decorrentes da ação estatal na iniciativa privativa, bem como pelos causados pelas coletividades públicas locais. (MARINELA, 2011, p. 935)

A ideia de irresponsabilidade era tão absurda que desde o séc. XIX já haviam manifestações dos postulados da responsabilidade. Entretanto, alguns países ainda resistiam a essa mudança, detre os quais, os Estados Unidos da América e a Inglaterra, que foram os últimos a abandonarem a teoria da irresponsabilidade, por meio do Federal Tort Claim Act, de 1946, e Crown Proceding Act, de 1947, respectivamente. (CUNHA JR, 2011, P. 332)

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O cenário muda e a responsabilidade civil ganha força e, o Estado antes irresponsável, passa a responder pelos atos de seus agentes.

No Brasil, o reconhecimento da responsabilidade civil do Estado ocorreu com o extinto Tribunal de Conflitos, em 1873, entretanto, não era nem geral nem absoluta. Depois, baseada na Teoria Subjetiva, foi tratada no CC de 1917, em seu art. 15. (MARINELA, 2011, p. 935)

A partir do conhecido aresto Blanco, do Tribunal de Conflitos, na França, em fevereiro de 1873, que a responsabilidade do Estado começou a sofrer grande influência de princípios do direito público. Nesse momento, surgem diversas teorias publicitas da responsabilidade do Estado, dentre elas, a Teoria da Culpa Administrativa (ou da culpa do serviço) e a Teoria do Risco (que, para alguns autores, desdobra-se no risco administrativo e no risco integral). (CUNHA JR, 2011, p. 332)

2.3. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO NO DIREITO BRASILEIRO.

No direito brasileiro sempre ouve previsão da Responsabilidade Civil do Estado. Entretanto, a responsabilidade objetiva só veio a ser concebida entre nós a partir das Constituições de 1946 e 1967, bem como pela Emenda Constitucional nº 01/69, e pela atual Constituição, com previsão expressa no art. 37, §6º, in verbis:

 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 

(...)

  § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

O mencionado dispositivo consagra a responsabilidade civil objetiva das pessoas jurídicas de direito público e de direito privado prestadoras de serviço público, integrantes da administração pública direta e indireta. Entretanto, ressalva a possibilidade de o Estado responder subjetivamente pela culpa do serviço em determinados casos. Além de, assegurar ao Estado o direito de regresso contra o responsável pelo dano, em caso de comprovação do dolo ou culpa.

Para o ilustre Dirley Júnior (2011, p. 337) a responsabilidade do Estado ou de seus delegados na prestação de serviços públicos será firmada sempre que houver algum dano causado por seus agentes a terceiros, exigindo-se que o mesmo seja causado em decorrência da atuação do agente público no exercício de função pública ou em razão dela, não cabendo a responsabilidade quando o agente público causador do dano estiver agindo na condição de um simples particular, hipótese em que a responsabilidade é pessoal.

Ainda segundo o autor (2011, p. 338), o art. 37, §6º, da CF, cria duas relações de responsabilidade: a do Estado e de seus delegados na prestação de serviços públicos perante a vítima do dano, de natureza objetiva (em regra), baseada no nexo causal, ou de natureza subjetiva (nos casos de omissão), calcada na culpa administrativa; e a do agente público ou delegado na prestação de serviço público de caráter exclusivamente subjetivo, com base no dolo ou culpa.

Considerando que as duas responsabilidades convivem no ordenamento jurídico, surge a necessidade de definirmos o momento que incidirá a responsabilidade objetiva ou subjetiva do Estado.

Celso Antonio Bandeira de Mello (2011, p. 1018-1028), traceja a responsabilidade civil do Estado sob três aspectos: a) responsabilidade civil por ação do Estado; b) responsabilidade civil por omissão do Estado; e c) responsabilidade civil em razão de atuação positiva do Estado causadora de risco de dano.

Se o dano foi causado em decorrência de um comportamento positivo do Estado (lícito ou ilícito) ele responde objetivamente, sendo suficiente apenas a comprovação do dano e o nexo de causalidade entre ambos.

O Estado também responderá objetivamente quando tinha o dever jurídico de agir para impedir o evento danoso e manteve-se inerte. Assim, se houver obrigação de agir, o Estado responderá por sua omissão objetivamente. Entretanto, a responsabilidade será subjetiva, na hipótese de culpa anônima, caracterizada pela “faute du service”. Portanto, a responsabilidade do Estado por suas omissões é de natureza subjetiva, calcada na culpa administrativa.

Tratando-se de atuação positiva do Estado propiciadora de risco de dano, o Estado também responde objetivamente, uma vez que, embora não seja o causador direto do dano, fez surgir a situação propiciadora do ato lesivo.

Consoante foi dito anteriormente, a responsabilidade objetiva do Estado está calcada na existência do nexo de causalidade entre a conduta do Estado e o dano. Ausente quaisquer desses elementos, estaremos diante de uma excludente de responsabilidade do Estado.

A doutrina costuma enumerar como causas excludentes de responsabilidade civil do Estado a culpa exclusiva da vítima, o caso fortuito e a força maior, na medida em que impedem o nexo causal entre o comportamento estatal e o dano.

Acrescente-se, por oportuno, que quando houver culpa concorrente entre a vítima e o Estado, não haverá exclusão da responsabilidade, apenas existirá uma atenuação do quantum da indenização. (CUNHA JR, 2011, p. 344-345)

2.4. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATOS JUDICIAIS.

O Poder Judiciário possui como função típica a jurisdicional, ou seja, julgar aplicando a lei ao caso concreto, solucionando conflitos que lhes são postos.

Algumas garantias são essenciais ao cumprimento de sua função jurisdicional. A absoluta independência em relação aos demais poderes garante q será a vontade da Lei que decidirá o conflito, e não a dos demais poderes. Essa independência também é traduzida na introdução de garantias, tais como a vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios.

A independência funcional dos magistrados traduz na verdade uma garantia necessária ao povo, uma garantia de que juízes imparciais decidirão de forma justa e livre de influências. Ocorre que, nem sempre os conflitos são solucionados como devido, e por vezes o Judiciário é falho, uma vez que, os atos judiciais são passíveis de erros, tendo em vista que seus executores são seres humanos.

O erro judiciário é aquele oriundo do Poder Judiciário, no curso de um processo, visto que na consecução da atividade jurisdicional ao praticarem qualquer ato ou pronunciamento, os juízes estão sujeitos a cometerem erros de fato ou de direito, pois são seres humanos, e nessa condição são falíveis.

Os vícios na manifestação da atividade jurisdicional podem ser acidentais, provocados ou intencionais, podendo acontecer tanto esfera civil, como na penal, mas o tratamento legal em cada uma dessas situações é diferenciado.

Na esfera penal, o erro judiciário encontra responsabilização no art. 5º, LXXV, da Constituição Federal de 1988, a qual admite expressamente a responsabilidade do Estado de indenizar o particular por erro judiciário, segundo a qual “o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”, bem como nos termos do art. 630 do Código de Processo Penal, vejamos:

Art. 630. O tribunal, se o interessado o requerer, poderá reconhecer o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos.

§ 1º. Por essa indenização, que será liquidada no juízo cível, responderá a União, se a condenação tiver sido proferida pela justiça do Distrito Federal ou de Território, ou o Estado, se tiver sido pela respectiva justiça.

§ 2º. A indenização não será devida:

a) se o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova em seu poder;

b) se a acusação houver sido meramente privada.

Na esfera civil, a responsabilidade por erro judicial converte-se em perdas e danos nos termos que se segue:

Art. 133. Responderá por perdas e danos o juiz quando:

I – no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude;

II – recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de oficio, ou a requerimento da parte.

Parágrafo único. Reputar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no nº II só depois que a parte, por intermédio do escrivão, requerer ao juiz que determine a providência e este não lhe atender o pedido dentro de dez dias.

A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar n° 35/1979) também trata sobre o assunto da responsabilidade civil dos magistrados em seu artigo 49, rezando que “Responderá por perdas e danos o magistrado, quando: I) no exercício de suas funções proceder com dolo ou fraude; II) recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício ou a requerimento das partes”.

Segundo o magistério de Dirley da Cunha Júnior[1], o magistrado só responde pessoalmente nos termos do art. 133 do CPC, ou seja, em caso de dolo, fraude, recusa, omissão ou retardamento injustificado de providências de seu ofício.

A jurisprudência do STF era contrária à tese da responsabilidade objetiva do Estado por ato judicial, como se verifica do teor do RE nº 35.500, Rel. A. Vilas Boas, DJ. 09.12.1958, segundo o qual, deveria prevalecer o princípio da irresponsabilidade, em respeito à coisa julgada, bem como, à liberdade e independência dos magistrados. Entretanto, esse entendimento foi ultrapassado e, atualmente, o STF vem reconhecendo a responsabilidade objetiva do Estado por ato judicial[2].

Nas palavras de José dos Santos Carvalho Filho (2011, p. 525-528), como todo poder do Estado o Judiciário produz inúmeros atos de administração além daqueles que correspondem efetivamente à sua função típica.

No que concerne aos atos administrativos, desde que presentes todos os pressupostos, incide normalmente sobre eles a responsabilidade civil objetiva do Estado. “Enquadram-se aqui os atos de todos os órgãos de apoio administrativo e judicial do Poder Judiciário, bem como os praticados por motoristas, agente de limpeza e conservação, enfim, de todos aqueles que se caracterizam como agentes do Estado.”

Quanto aos atos jurisdicionais, “são aqueles praticados pelos magistrados no exercício da respectiva função. São, afinal, os atos processuais caracterizadores da função jurisdicional, como os despachos, decisões interlocutórias e as sentenças. Em relação a tais atos é que surgem vários aspectos a serem considerados”.

Os atos jurisdicionais típicos são, em princípio, insuscetíveis de redundar na responsabilidade objetiva do Estado, pois são protegidos por dois princípios básicos. O da soberania do Estado e o princípio da recorribilidade dos atos jurisdicionais, uma vez que, a parte prejudicada no processo conta com mecanismos recursais e até mesmo outras ações para postular a sua revisão, sendo-lhe assegurado nesse caso o duplo grau de jurisdição.

Ainda sob a ótica do ilustre José dos Santos Carvalho Filho[3], há hipóteses em que o juiz pratica ato jurisdicional com o intuito deliberado de causar prejuízo à parte ou a terceiro, violando seu dever funcional. Nesse caso, o juiz responde por seus atos.

Segundo o art. 133 do CPC, o juiz responde por perdas e danos quando no exercício de suas funções procede dolosamente, inclusive com fraude, bem como quando recusa, omite ou retarda, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício ou a requerimento da parte. Nesse caso, a responsabilidade é individual do juiz, cabendo-lhe, em consequência, o dever de reparar os prejuízos que causou.

Para dos José dos Santos Carvalho Filho (2011, p. 528), apesar de tratar-se de conduta dolosa, ninguém pode negar que o juiz é um agente do Estado, e por ostentar essa condição, não pode deixar de incidir também a regra do art. 37, §6º, da CF, sendo então, civilmente responsável a pessoa federativa na qual o causador do dano exerce suas funções. Cabendo ao prejudicado pelo ato jurisdicional doloso a alternativa de propor a ação indenizatória contra o juiz responsável pelo dano ou contra o Estado, ou ainda, contra ambos.

Segundo ele[4], o ato causador do dano pode, entretanto, ter sido praticado de forma culposa. Se o ato for natureza penal, existe a possibilidade de revisão criminal visando a desconstituição da sentença que contenha o erro judiciário, além da hipótese de reparação por parte do Estado, dos danos sofridos, consoante dispõe o art. 5º, LXXV, da CF, segundo o qual “o Estado indenizará o condenado por erro judiciário...”.

Com relação aos atos de natureza civil, prevalece o entendimento de que, desde que provados o dano e o nexo causal, a responsabilidade civil do Estado e ao consequente dever de indenizar, sem contar, é obvio, a responsabilidade funcional do juiz. O Estado, todavia, nos termos do art. 37, §6º, tem direito de regresso contra o juiz responsável pelo dano, demonstrada a sua culpa.

2.5. JURISPRUDÊNCIA PÁTRIA.

O Supremo Tribunal Federal, muito pouco se manifestou sobre o tema. Por muito tempo imperou a teoria da irresponsabilidade do Estado pelos atos judiciais, consoante foi exposto acima.

O Pretório Excelso assentou sua jurisprudência no sentido de que o Estado não é responsável civilmente por atos jurisdicionais, a não ser nos casos preceituados no art. 5º, LXXV, da Constituição Federal e art. 630, do CPP, consoante se verifica do teor dos seguintes julgados, vejamos:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO: ATOS DOS JUÍZES. C.F., ART. 37, § 6º. I. - A responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos dos juízes, a não ser nos casos expressamente declarados em lei. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. II. - Decreto judicial de prisão preventiva não se confunde com o erro judiciário, C.F., art. 5º, LXXV, mesmo que o réu, ao final da ação penal, venha a ser absolvido. III. - Negativa de trânsito ao RE. Agravo não provido. (STF – 2ª Turma - RE 429518 AgR / SC – Rel. Min. CARLOS VELLOSO - DJ 28.10.2004 p. 49).

ERRO JUDICIÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. DIREITO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DECORRENTES DE CONDENAÇÃO DESCONSTITUÍDA EM REVISÃO CRIMINAL E DE PRISÃO PREVENTIVA. CF, ART. 5º, LXXV. C.PR.PENAL, ART. 630. (RE 505393, Relator(a):  Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 26/06/2007, DJe-117 DIVULG 04-10-2007 PUBLIC 05-10-2007 DJ 05-10-2007)

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO DECORRENTE DE PRISÃO ILEGAL. HOMÔNIMO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 538 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REJEIÇÃO DOS EMBARGOS, SEM MULTA. SÚMULA Nº 284/STF. ERRO JUDICIÁRIO. VALOR INDENIZATÓRIO. REVISÃO DO CONJUNTO DA PROVA. SÚMULA Nº 7/STJ. (AgRg no AREsp 1.040/PE, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/04/2011, DJe 25/04/2011)

PROCESSO CIVIL. ERRO JUDICIÁRIO. ART. 5º, LXXV, DA CF. PRISÃO PROCESSUAL. POSTERIOR ABSOLVIÇÃO. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. (Resp 427.560/TO, DJ 30.09.2002 Rel. Ministro Luiz Fux)

RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO (CF, ART. 37, § 6º). CONFIGURAÇÃO. “BAR BODEGA”. Decretação de prisão cautelar, que se reconheceu indevida, contra pessoa que foi submetida a investigação penal pelo poder público. Adoção dessa medida de privação da liberdade contra quem não teve qualquer participação ou envolvimento com o fato criminoso. Inadmissibilidade desse comportamento imputável ao aparelho de estado. Perda do emprego como direta conseqüência da indevida prisão preventiva. (RE 385943/SP relator: Min. Celso de Mello. Informativo STF n°. 570). 

A responsabilidade civil dos magistrados ainda hoje suscita grandes discussões no âmbito da doutrina e jurisprudência.

O Supremo Tribunal Federal tem favorecido a irreparabilidade dos danos causados pelos atos do Poder Judiciário, salvo aqueles legalmente previstos. De seus julgados, extrai-se o entendimento de que o Poder Judiciário é soberano, não se enquadrando, portanto, no regime de responsabilidade do Estado por efeitos de atos de seus membros no exercício de suas funções, salvo nas hipóteses excepcionadas em lei.

O juiz, por desempenhar uma atividade privativa de Estado, carrega consigo a condição de agente público, condição esta que deveria ser suficiente para que o Estado respondesse por seus atos, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. No entanto, infelizmente esse não é o entendimento dominante nos nossos Tribunais Superiores.

Não é razoável sustentar que o magistrado não é agente público, segundo o qual o Estado responde por seus atos. Como todos os outros agentes, o juiz é um funcionário público, que por ostentar essa condição deve ser submetido à regra do art. 37, § 6º, CF/88. A responsabilidade, nesse caso, decorre da própria Constituição, não sendo necessária a previsão expressa para cada caso na legislação ordinária.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo teve por objetivo o estudo da responsabilidade civil do Estado por danos decorrentes da atividade jurisdicional.

Como foi abordado, no atual Estado Democrático de Direito, as ações e omissões praticadas pelos agentes do Estado que, agindo nessa qualidade, gerem danos a particulares atraem a responsabilização objetiva do Estado.

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 37, §6º, preceitua o dever de responsabilização do Estado por atos de seus agentes, dentre os quais, estão inclusos os atos jurisdicionais.

Os danos causados por juízes no desempenhar de sua função, devem, eventualmente, ser reparados pelo Estado, quando restar estabelecido o nexo de causalidade entre o prejuízo e a atuação de seu agente. Entretanto, a responsabilidade objetiva nesses casos deve ser analisada de forma crítica e cuidadosa, pois nem sempre o Estado responderá sozinho pelos danos decorrentes de atos jurisdicionais, existindo a possibilidade de responsabilização do agente público, na forma do art. 133, do CPC.

Assim, nos casos em que restar comprovado o dolo ou culpa por parte do magistrado, responderá pessoalmente o juiz por seus atos nocivos. Entretanto, vale acrescentar que, mesmo nessas circunstâncias, não há que ser excluída a responsabilidade do Estado, pois o magistrado, ao exercer sua função, comporta-se como agente estatal, não sendo, portanto, afastada a responsabilidade objetiva do Estado pelos atos que os magistrados, nessa condição, causem danos a terceiros.

Diante desse contexto, não há outra opção senão admitir que o Estado deve responder objetivamente por todos os seus atos, sejam eles administrativos, legislativos ou judiciais, quando prestados de forma lesiva aos cidadãos. Negar o dever de o Estado se responsabilizar pelos prejuízos decorrentes da atuação jurisdicional é afastar os preceitos do Estado Democrático de Direito assumidos pelo Estado brasileiro.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, promulgada em 10 de janeiro de 2002. Brasília, Distrito Federal, 2002.

BRASIL. Código de Processo Civil. Lei nº 5.869, promulgada em 11 de janeiro de 1973. Brasília, 1973.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado, 1988.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 505393, Relator:  Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, Brasília/DF, julgado em 26/06/2007, DJe-117 DIVULG 04-10-2007 PUBLIC 05-10-2007 DJ 05-10-2007)

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial n. 1.040/PE, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Primeira Turma, Brasília/DF, julgado em 12/04/2011, DJe 25/04/2011.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 427.560/TO, Rel. Ministro Luiz Fux. Brasília, DF, DJ 30.09.2002.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 385943/SP, Relator: Min. Celso de Mello. Informativo STF n°. 570, Brasília/DF.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 429518 AgR / SC – Rel. Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, Brasília/DF, DJ 28.10.2004 p. 49).

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed., rev., ampliada e atualizada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 5ª ed., rev. atual. e ampl., Salvador: Editora JusPodivm, 2011.

_____. Curso de Direito Administrativo. 10ª Ed., ver, ampl. e atual. Salvador: Editora JusPodivm, 2011.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol. 7: Responsabilidade Civil, 20 ed., São Paulo: Saraiva, 2006.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, vol. III: Responsabilidade Civil, 7 ed., São Paulo: Saraiva, 2009.

MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 5ª Ed. Niterói: Impetus, 2011.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed., revista e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2011.


[1] CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 5ª ed., rev. atual. e ampl., Salvador: Editora JusPodivm, 2011. p 349

[2]  STF, 2ª Turma, RE 228.977/SP, Rel. Min. Néri da Silveira, DJ 12.04.2002, p.66

[3] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed., rev., ampliada e atualizada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 525-528.

[4] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed., rev., ampliada e atualizada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 528.


Sobre a autora
Paula Argentino

Advogada inscrita na OAB/SE. Pós-graduada em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Tiradentes (2013). Pós-graduada em Direito do Estado pela Universidade Anhanguera – UNIDERP (2012). Graduada em Direito (2010) pela Universidade Tiradentes.

Informações sobre o texto

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