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O Ministério Público no Brasil e na Argentina

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Agenda 09/02/2004 às 00:00

2 ORGANIZAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO BRASIL E NA ARGENTINA: DIVISÕES, CARGOS, CARREIRA E INVESTIDURA NOS CARGOS

Quanto ao Ministério Público no Brasil, é possível averiguar detalhadamente sua divisão, os cargos, a carreira e o modo de investidura nos cargos, diretamente da análise da Constituição Federal, pois esta adentra em praticamente todos os detalhes. O mesmo não se dá, porém, com relação ao Ministério Público Argentino. Nos tópicos seguintes constam os dados atinentes aos dois Parquets sob exame.

2.1 O Ministério Público do Brasil

No Brasil, a Constituição Federal é dividida em Títulos, Capítulos e Seções. A "Organização dos Poderes" corresponde ao Título IV, que por sua vez dedica seu Capítulo I ao "Poder Legislativo", seu Capítulo II ao "Poder Executivo", seu Capítulo III ao "Poder Judiciário" e seu Capítulo IV às denominadas "Funções essenciais à Justiça".

O Ministério Público está disciplinado no referido Capítulo IV, como uma das Funções essenciais à Justiça, especificamente na Seção I, intitulada "Do Ministério Público". Além do Ministério Público, são também inseridas e regulamentadas no Capítulo IV, como Funções essenciais à Justiça, a Advocacia-Geral da União (na Seção II, intitulada "Da Advocacia-Geral da União") e a Advocacia e a Defensoria Pública (estas, na Seção III, intitulada "Da Advocacia e da Defensoria Pública).

Como se nota, embora inserido no mesmo capítulo constitucional dedicado à organização dos Poderes, o Ministério Público não é relacionado como um Poder, mas sim como uma Função essencial à Justiça. A Seção I, do Capítulo IV, em referência, compreende os arts. 127 a 130.

O art. 127 da Constituição Federal contém a definição do Ministério Público – que vale, indistintamente, para o da União e para os dos Estados [23] – assim como a sua incumbência geral, ou seja, "(...) a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis".

Por sua vez, o art. 128, ao tempo em que antecipa que existirão Ministérios Públicos nos níveis da União e dos Estados, determina a composição do Ministério Público da União, a saber:

"Art. 128. O Ministério Público abrange:

I – o Ministério Público da União, que compreende:

a)o Ministério Público Federal;

b)o Ministério Público do Trabalho;

c)o Ministério Público Militar;

d)o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.

II – os Ministérios Públicos dos Estados".

Constam no citado artigo cinco parágrafos, os quatro primeiros definindo como deve ser a escolha dos dirigentes, tanto do Ministério Público da União quanto dos Estados. O quinto parágrafo do art. 128, por sua vez, dispõe:

"§ 5º Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:

Omissis".

Como se vê, a Constituição Federal deixa a cargo dos Procuradores-Gerais de cada Ministério Público [24] o encaminhamento dos projetos relativos às leis orgânicas que devem definir a organização, as atribuições e o estatuto dos Ministérios Públicos da União e dos Estados-membros, contudo, dede logo antecipa que haverá um Ministério Público organizado pela União e um organizado por cada Estado-Membro, além de estabelecer a subdivisão do primeiro (art. 128, caput e incisos I e II); e antecipa, ainda, como deve ser escolhido o dirigente de cada parquet (§§ 1º a 4º do art. 128), além das garantias (inciso I do § 5º, do art. 128) e das vedações aos membros (Inciso II do § 5º, do art. 128).

Importante, ainda, o parágrafo terceiro do art. 129 da Carta Federal de 1988, onde determina que o ingresso na carreira dar-se-á somente por meio de concurso público de provas e títulos, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil na sua realização e observada a ordem de classificação dos aprovados para a nomeação.

Em cada Estado já existe a lei orgânica do respectivo Ministério Público, o mesmo ocorrendo quanto ao Ministério Público da União, cuja lei orgânica é a Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993.

Outrossim, importa registrar que a Constituição Federal de 1988, além de estabelecer um perfil do Ministério Público que se impõe indistintamente à União, Estados Membros e Distrito Federal, ainda reservou ao Presidente da República, no art. 61, § 1º, II, "d", a iniciativa privativa da lei sobre as normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

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Em suma, passou a ser da esfera federal não apenas a iniciativa da Lei-Complementar para organização do Ministério Público da União, mas também a de lei (seja complementar ou ordinária) destinada a traçar normas gerais sobre a organização dos Ministérios Públicos dos Estados e do Distrito Federal e Territórios. Por isso mesmo, além da Lei Complementar Federal nº 75/1993, sobre o Ministério Público da União, restou editada também a Lei Ordinária Federal nº 8.625, de 12/3/1993, contendo diretrizes gerais que devem ser observadas pelos Estados e pelo Distrito Federal nas respectivas Leis Complementares de organização dos seus Ministérios Públicos [25].

Por fim, cabe indicar a denominação dos cargos no Ministério Público da União e nos dos Estados-Membros.

O Ministério Público da União, conforme visto, é integrado pelos Ministérios Públicos Federal, do Trabalho, Militar e, ainda, pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.

No Ministério Público Federal, os membros (também denominados de "órgãos") são o Procurador-Geral da República, os Subprocuradores-Gerais da República, os Procuradores Regionais da República e os Procuradores da República (art. 43 da LC nº 75/1993).

Por sua vez, os membros (igualmente, denominados "órgãos") do Ministério Público do Trabalho são o Procurador-Geral do Trabalho, os Subprocuradores-Gerais do Trabalho, os Procuradores Regionais do Trabalho e os Procuradores do Trabalho (art. 85 da LC nº 75/1993).

Finalmente, constituem cargos (órgãos) do Ministério Público Militar, o Procurador-Geral da Justiça Militar, os Subprocuradores-Gerais da Justiça Militar, os Procuradores Regionais Militares, os Procuradores da Justiça Militar e os Promotores da Justiça Militar (art. 118 da LC nº 75/1993).

2.2 O Ministério Público da Argentina

Já se ressaltou que, diferentemente do que se dá no Brasil, as províncias argentinas gozam de autonomia muito mais efetiva, o que lhes permite organizar livremente seus Ministérios Públicos. Por isso, justifica-se subdividir este tópico em mais dois, sendo um para tratar da organização do Ministério Público argentino na órbita federal e outro para fazê-lo quanto ao Ministério Público argentino na seara das províncias.

2.2.1 O Ministério Público Federal da Argentina

A Constituição da Nação Argentina é dividida em Partes, Títulos, Seções e Capítulos, distribuídos de maneira não uniforme. As Partes são duas, contendo a primeira apenas dois Capítulos destinados, exclusivamente, às declarações e à estipulação dos direitos e garantias fundamentais (o Capítulo Primeiro é intitulado "Declaraciones, Derechos y Garantias", e o segundo, "Nuevos Derechos y Garantias").

A Segunda Parte da Constituição da Nação Argentina destina-se a tratar das autoridades ou Poderes da Nação e das Províncias, sendo intitulada "Autoridades de la Nación". Contém a Segunda Parte dois Títulos, sendo o primeiro dedicado às autoridades federais ("Autoridades de la Nación") e o segundo aos governos das províncias ("Gobiernos de Província"); bem assim, quatro Seções e treze Capítulos dos quais, sete na Seção Primeira, quatro na Seção Segunda e dois na Seção Terceira. As Seções Primeira, Segunda e Terceira da Segunda Parte são dedicadas, respectivamente, aos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. O Ministério Público está disciplinado na Seção Quarta da mesma Segunda Parte, sob o título "Del Ministerio Público", que contém apenas um artigo (o artigo 120). Tal localização da disciplina do Ministério Público Federal Argentino – ou seja, numa Seção particular, igualmente aos Poderes do Estado – colocam-no em igualdade de condições com estes últimos, podendo-se concluir que foi intenção do constituinte de 1994 colocá-lo como um Poder do Estado Argentino [26].

Eis o teor do mencionado art. 120, da Constituição Argentina:

Art. 120 O Ministério Público é um órgão independente com autonomia funcional e autarquia financeira, que tem por função promover a atuação da justiça em defesa da legalidade, dos interesses gerais da sociedade, em coordenação com as demais autoridades da República.

Está integrado por um procurador geral da Nação e um defensor geral da Nação e dos demais membros que a lei estabeleça.

Seus membros gozam de imunidades funcionais e intangibilidade de remunerações.

Atualmente, a lei a que se refere o dispositivo constitucional transcrito é a Lei nº 24.946, de 11/3/1998 (Lei Orgânica Ministério Público Federal da Argentina), publicada no Boletim Oficial de 23/3/1998. Nessa lei, a estrutura do Ministério Público está disciplinada nos artigos 2º a 4º, que contém, igualmente, as denominações dos diversos cargos (órgãos) e os órgãos do Judiciário (federal) junto aos quais oficiam:

Artigo 2º – O Ministério Público está composto pelo Ministério Público Fiscal e o Ministério Público da Defesa.

Artigo 3º – O Ministério Público Fiscal está integrado pelos seguintes magistrados:

a) Procurador Geral da Nação.

b)Procuradores Fiscais ante a Corte Suprema de Justiça da Nação e Fiscal Nacional de Investigações Administrativas.

c)Fiscais Gerais ante os tribunais colegiados, de cassação, de segunda instância, de instância única, os da Procuração Geral da Nação e os de Investigações Administrativas.

d)Fiscais Gerais Adjuntos ante os tribunais e dos organismos enunciados no inciso "c".

e)Fiscais ante os juízes de primeira instância; os Fiscais da Procuração Geral da Nação e os Fiscais de Investigações Administrativas.

f)Fiscais Auxiliares das fiscalias de primeira instância e da Procuração Geral da Nação.

Artigo 4º – o Ministério Público da Defesa está integrado pelos seguintes magistrados:

g)Defensor Geral da Nação.

h)Defensores Oficiais ante a Corte Suprema de Justiça da Nação.

i)Defensores Públicos de Menores e Incapazes ante os Tribunais de Segunda Instância, de Cassação e ante os Tribunais orais no Criminal e seus Adjuntos; e Defensores Públicos Oficiais ante a Câmara de Cassação Penal, Adjuntos ante a Câmara de Cassação Penal, ante os Tribunais Orais no Criminal, Adjuntos ante os Tribunais Orais no Criminal, de Primeira e Segunda Instância do Interior do País, ante os Tribunais Federais da Capital Federal e os da Defensoria Geral da Nação.

j)Defensores Públicos de Menores e Incapazes Adjuntos de Segunda Instância, e Defensores Públicos Oficiais Adjuntos da Defensoria Geral da Nação.

k)Defensores Públicos de Menores e Incapazes de Primeira Instância e Defensores Públicos Oficiais ante os Juízes e Câmaras de Apelações.

l)Defensores Auxiliares da Defensoria Geral da Nação. Integram o Ministério Público da Defesa na qualidade de funcionários os Tutores e Curadores Públicos cuja atuação a presente lei regula.

Da leitura dos artigos acima transcritos, constata-se que o Ministério Público Federal da Argentina contém duas grandes subdivisões: um Ministério Público Fiscal e um Ministério Público da Defesa.

O Ministério Público Fiscal é chefiado pelo Procurador Geral da Nação, que é o fiscal perante a Corte Suprema de Justiça da Nação. Por sua vez, o Ministério Público da Defesa tem como chefe máximo o Defensor Geral da Nação, desempenhando suas funções perante a Corte Suprema de Justiça da Nação, conforme o artigo 5º da Lei nº 24.946 (Lei Orgânica do Ministério Público da Nação).

Os dois chefes acima mencionados são escolhidos pelo Executivo, devendo a escolha ser aprovada por dois terços dos membros presentes do Legislativo, à semelhança do que se dá no Brasil. Todavia, não se exige que o dirigente seja pertencente à carreira, como ocorre aqui (art. 5º da Lei nº 24.946). Para o ingresso nos demais cargos do Ministério Público (Federal) é necessária a aprovação em "concurso público de oposición y antecedentes" [27], do qual podem participar "abogados" com experiência na advocacia, na magistratura de império ou na magistratura do Ministério Público, de 2, 4, 6 ou 8 anos, conforme o cargo de que se cuide (art. 6º da Lei nº 24.946).

No Ministério Público Fiscal se destaca, como órgão dependente da Procuração Geral da Nação, um ramo especializado denominado "Fiscalia de Investigações Administrativas", que é comandado, por sua vez, pelo Fiscal Nacional de Investigações Administrativas, de que trata o art. 3º, "b", da Lei 24.946. O procedimento para ingresso nos cargos da Fiscalia de Investigações Administrativas é o mesmo para ingresso nos demais cargos do Ministério Público.

Vê-se, portanto, que o Ministério Público Federal da Argentina adota uma estrutura que lhe possibilita atuar por todo o território do país, perante as várias instâncias do Judiciário organizado pela esfera federal de governo. Visto isso, importa, agora, mencionar algo a respeito da organização do Ministério Público nas províncias.

2.2.2 Os Ministérios Públicos das Províncias argentinas

Conquanto cumpram, basicamente, o mesmo papel do Ministério Público Federal, os Ministérios Públicos das Províncias argentinas podem apresentar pequenas variações entre si e com relação àquele, no tocante à estrutura.

Para citar um exemplo de estruturação do Ministério Público em província, mais uma vez se toma o exemplo da província de Buenos Aires. Esta não dedica nenhum capítulo especial de sua Constituição ao Ministério Público, apenas a ele se referindo no artigo 189, para determinar que aquele será desempenhado pelo Procurador e pelo Subprocurador Geral da Suprema Corte de Justiça (dos quais se exige as mesmas qualidades exigidas para ser juiz da Suprema Corte – art. 177); pelos Fiscais de Câmaras, que deverão reunir as condições requeridas para ser juiz das Câmaras de Apelação; por Agentes Fiscais [28], Assessores de Menores e Defensores de Pobres e Ausentes, os quais devem reunir as condições requeridas pare ser juiz de primeira instância [29].

A organização detalhada do Ministério Público de Buenos Aires foi efetivada pela Lei 12.061, com vigência a partir de 1º de julho de 1998. Desta lei, destaca-se a previsão de sua inclusão no Poder Judiciário (art. 2º); a equiparação dos membros do Ministério Público aos do Judiciário, em termos de direitos e imunidades (art. 4º); e a previsão de partida orçamentária própria (art. 7º).

A discriminação dos cargos (membros ou órgãos) consta do artigo 9º da citada Lei Orgânica, a qual guarda correspondência com o referido art. 189, da Constituição da Província de Buenos Aires:

Art. 9º - Membros. São membros do Ministério Público:

1 O Procurador-Geral da Suprema Corte de Justiça.

2 O Subprocurador-Geral da Suprema Corte de Justiça.

3 O Fiscal do Tribunal de Cassação e o Defensor do Tribunal de Cassação.

4 Os Fiscais de Câmaras e os Defensores-Gerais Departamentais.

5 Os Adjuntos do Fiscal e Defensor do Tribunal de Cassação e dos Fiscais de Câmaras e Defensores-Gerais Departamentais.

6 Os Agentes Fiscais, os Defensores Oficiais e os Assessores de Incapazes.

7 Os Adjuntos dos Agentes Fiscais, dos Defensores Oficiais e dos Assessores de Incapazes.

Nas demais Províncias, a estrutura do Ministério Público é basicamente a mesma do Ministério Público Bonaerense, havendo apenas variações que não desnaturam o esquema geral acima visto.

O chefe do Ministério Público da Província é escolhido pelo Executivo, com a participação do Legislativo, à semelhança do que ocorre no Brasil. Para o ingresso nos demais cargos do Ministério Público na Província de Buenos Aires são exigidos os mesmos requisitos exigidos para o ingresso na carreira de Juiz, consoante dispõe o art. 10 da Lei nº 12.061. Significa que para o ingresso no Ministério Público da Província de Buenos Aires é necessária a aprovação em "concurso público de oposición y antecedentes". Nas demais Províncias, o ingresso nos cargos do Ministério Público também se dá pela via do concurso.

Sobre o autor
Marco Aurélio Lustosa Caminha

Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região. Ex-Procurador Regional do Trabalho. Professor Associado de Direito na Universidade Federal do Piauí. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino (Buenos Aires, Argentina). Doutor em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Maranhão.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMINHA, Marco Aurélio Lustosa. O Ministério Público no Brasil e na Argentina. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 218, 9 fev. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4800. Acesso em: 22 dez. 2024.

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