RESUMO
Análise do instituto da decadência no Código Tributário Nacional, incluindo os pontos polêmicos sobre o prazo e seus termos.
SUMÁRIO: Abreviaturas. Introdução. 1. Do lançamento.1.1.conceito. 1.2.Lançamento como dever e como direito.1.3.Lançamento como ato administrativo.1.4.Lançamento como ato declaratório e constitutivo. 1.5.Lançamento como ato dotado de ato. 1.6.Modalidades de lançamento.1.6.1.Lançamento por declaração. 1.6.2.Lançamento por ofício. 1.6.3.Lançamento por homologação. 2. A decadência no direito tributário. 2.1.Conceito de decadência. 2.2.Fundamentos zetéticos do instituto. 2.3.Prescrição. 2.4.Regra geral da decadência no direito tributário.2.4.1.Art. 173, inciso I. 2.4.1.1.No laçamento por declaração . 2.4.1.2.No lançamento do ofício. 2.4.1.3.No lançamento por homologação. 2.4.2.Art. 173, Inciso II. 2.4.2.1.Interrupção do prazo decadencial?. 2.4.3Art. 173, parágrafo único. 3.Decadência no lançamento por homologação. 3.1.Definição das hipóteses. 3.1.1.Pagamento integral. 3.1.2.Inadimplemento total. 3.1.3.Pagamento parcial. 3.1.4.Existência do Dolo. Fraude ou simulação. Conclusão. Bibliografia.
ABREVIATURAS
CTNCódigo Tributário Nacional
CRConstituição da República Federativa do Brasil
CPCCódigo de Processo Civil
IPTUImposto sobre a propriedade predial e territorial urbana
IPVAImposto sobre a propriedade de veículos automotores
ITBIImposto sobre a transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis.
ITCDImposto sobre a transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos
ITRImposto sobre a propriedade territorial rural
RESPRecurso Especial
STJSuperior Tribunal de Justiça
INTRODUÇÃO
Nota-se grande controvérsia acerca dos prazos de que dispõe a Fazenda Pública para efetuar o lançamento do crédito tributário.
Grande parte das polêmicas surge da própria interpretação do Código Tributário Nacional que, em alguns pontos, pode levar a crer que existam contradições.
Mas a própria doutrina contribui para os entraves quando, equivocadamente, lança-se à análise do Código Tributário Nacional com conceitos preconcebidos, e fica chocada quando estes não são adequados àquele.
Questões são levantadas como: seria possível haver interrupção do prazo decadencial? Traria o inciso II e o parágrafo único do art. 173 do CTN hipóteses de interrupção do prazo decadencial?
Outras ainda que, em princípio, parecem mais intrincadas: como pode a decadência extinguir o crédito tributário (art. 156, V, CTN) se para este existir é necessário o lançamento (art. 142, CTN), mas é justamente por não lançar que ocorre a decadência (art. 173, CTN)?
Mas a principal questão é justamente qual o prazo de decadência para a modalidade de lançamento por homologação (art. 150, CTN), em face das disposições aparentemente antinômicas do art. 173 do CTN e do parágrafo 4.º do art. 150 do CTN.
Para tentar solucionar esses problemas, far-se-á, inicialmente, um estudo do instituto do lançamento.
Após, será verificada a decadência no âmbito do direito tributário, bem como seus prazos.
Por fim, pretende-se chegar a uma resposta sobre o prazo decadencial no lançamento por homologação, refutando algumas teses levantadas sobre o mesmo tema.
1. DO LANÇAMENTO
1.1 CONCEITO
Os elementos do conceito de lançamento são extraídos do disposto no art. 142 do Código Tributário Nacional, verbis:
"Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível."
Por meio do lançamento, a Administração chega ao valor devido pelo sujeito passivo, que tem oportunidade de acompanhar o procedimento, bem como impugná-lo.
Seus pontos essenciais são:
- Ato privativo da Administração, excluindo, portanto, qualquer outro ente, inclusive o sujeito passivo;
- Apuração da obrigação tributária, com todos seus elementos: sujeito passivo, crédito, prazo etc..
- Constituição do crédito tributário, que, embora exista desde o nascimento da respectiva obrigação, somente se torna certo e exigível após a apuração;
- Imposição de penalidade, caso seja verificada alguma infração.
1.2 LANÇAMENTO COMO DEVER E COMO DIREITO
Todo direito pressupõe relação jurídica. Se alguém tem direito, esse sempre é exigível perante outrem, que, por sua vez, tem o correlativo dever.
Ainda que se encare o direito de uma forma objetiva, e se negue o direito subjetivo, é inquestionável que, se de um lado o ordenamento impõe deveres a determinados sujeitos, de outro, tem que atribuir a exigibilidade de seu cumprimento a alguém.
Aliás, essa atribuição do "poder de exigir" é indispensável na medida em que o Judiciário, órgão a quem se reclama quando violada a norma (art. 5.º XXXV, CR), rege-se pelo princípio da inércia.
Seja como for, o exercício do lançamento é um direito, conforme expressamente menciona o art. 173, caput, do CTN.
Na relação jurídica envolvendo o lançamento, a Administração ocupa o pólo ativo com o direito ao seu exercício, cabendo ao sujeito passivo o dever de suportá-lo.
Note-se que referido direito é potestativo, pois influi na esfera jurídica do sujeito passivo independentemente da vontade deste.
Esse entendimento é encontrado em CARLOS AUGUSTO JENIÊR (In MACHADO, 2002, p. 63).
PAULO DE BARROS CARVALHO (1996), todavia, aponta o caráter de poder do lançamento. Mas seria o poder figura jurídica?
Embora o Estado de direito reconheça a existência do poder, este é submetido à supremacia constitucional, que regula a forma pela qual é exercido.
É o que se depreende do parágrafo único do art. 1.º da Constituição da República, verbis:
"Art. 1.º [...]
Parágrafo único - Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição."
Nessa linha, infere-se que o exercício do poder implicará a criação de direito, consubstanciado no ordenamento jurídico.
A partir daí, somente existe direito. E o exercício do direito, de forma coativa, somente raramente é permitido ao indivíduo, pelas seguintes razões:
- De um lado, se tudo fosse permitido sem a intervenção do Estado, este perderia sua razão de ser. O homem voltaria ao estado de natureza. Reinaria o capricho e a arbitrariedade. Todas relações seriam regidas pelo poder do mais forte. Cada qual defendendo a própria conservação, e os conseqüentes próprios interesses;
- De outro, se fosse exigido pelo direito a intervenção do Estado em toda e qualquer relação, haveria muitas injustiças. Os casos de urgência não seriam atendidos. Em muitos casos se estaria permitindo que primeiro viesse a injustiça para depois o Estado garantir o status quo ante, mas que nem sempre seria possível.
Da síntese das razões expostas, busca-se uma situação de equilíbrio. Certas situações são escolhidas, em que é vedado ao indivíduo exercitar, per se, as próprias razões (art. 345 do Código Penal).
Em outros casos, permite-se o agir pelo próprio indivíduo, como, por exemplo: art. 1.210, § 1.º, CC; art. 9.º CR; art. 142 c.c. art. 149 do CTN.
Nessa linha, ressuma não ser o lançamento um poder, mas direito potestativo e que se exerce sem prévia autorização judicial.
A sujeição dos indivíduos fiscalizados é a figura jurídica correlata a esse direito: o dever de abster-se de impedir e, em certos casos, de colaborar.
De outro lado, a Administração tem o dever de lançar, sob pena de responsabilidade. Depreende-se esse dever tanto da adstrição ao princípio da legalidade, insculpido no art. 37, caput, da Constituição da República, quanto do parágrafo único do art. 142 do CTN, que prevê, verbis:
"Art. 142 [...]
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional."
Se há dever, deve-se perquirir onde está o direito e a relação a que se referem.
O crédito tributário diz respeito ao direito público. Ao Administrador, esse crédito é indisponível. A aparente disposição decorre de autorização legal.
Nessa linha, o direito é da sociedade. O não cumprimento do dever de lançar, viola o direito correlativo da sociedade, a quem em última análise pertence o erário.
A violação desse direito dá ensejo a medida no âmbito administrativo consistente, por exemplo, no processo administrativo para punição do servidor faltoso.
Pode ensejar, eventualmente, conseqüências no âmbito penal.
Dá azo à propositura de ação popular, nos termos do art. 5.°, LXXIII, da Constituição da República.
Pode, ainda, na esfera civil, gerar direito ao ressarcimento.
Conclui-se, então, que o lançamento está entre duas relações.
A primeira relação é entre a pessoa política e a sociedade. Dentro da pessoa política há sub-relações. O dever que se inicia no funcionário a quem a competência foi delegada. Por sua vez, ele tem dever perante o delegante, que, por sua vez, tem-no para a pessoa política, que, por fim, está vinculada à lei (art. 37, caput, da Constituição da República).
A segunda relação está entre a pessoa política e o sujeito passivo. Aquela tem o direito, este, o dever.
Portanto, lançamento é dever e é direito, conforme a relação que se enfoca.
Por fim, vale registrar que, sendo o ordenamento jurídico –ainda que idealmente– um todo consistente, ou seja, sem a existência de antinomias jurídicas (FERRAZ JUNIOR, 2003, p. 206), não seria concebível que dentro dele houvesse normas impondo deveres ao mesmo outras normas proibissem o cumprimento destes.
1.3 LANÇAMENTO COMO ATO ADMINISTRATIVO
Há certa controvérsia quanto ao lançamento ser ato ou procedimento, conforme aponta PAULO DE BARROS CARVALHO (1996, p. 256 e segs.).
HELY LOPES MEIRELLES define o procedimento administrativo nos seguintes termos (2001, p.148):
"Procedimento administrativo (procedimento administrativo – opération administrative – Administrativverfahren) é a sucessão ordenada de operações que propiciam a formação de um ato final objetivado pela Administração. É o iter legal a ser percorrido pelos agentes públicos para a obtenção dos efeitos regulares de um ato administrativo principal."
Mesmo na formação de um ato administrativo, não se pode desconsiderar a existência de um procedimento próprio e específico, ainda que simples, conforme lembra CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO:
"É certo, como bem salienta Carlos Ari Sundfeld, que entre a lei e o ato administrativo existe um intervalo, pois o ato não surge como um passe de mágica. Ele é o produto de um processo ou procedimento através do qual a possibilidade ou a exigência supostas na lei em abstrato passam para o plano de concreção. No final se estampa a ‘vontade’ administrativa. Evidentemente, existe sempre um modus operandi para chegar-se a um ato administrativo final.
Assim, não é difícil perceber que um procedimento sempre haverá, pois o ato, como dito, não surge do nada. Tal procedimento –isto, sim- terá sido mais ou menos amplo, mais ou menos formalizado, mais ou menos acessível aos administrados, mais ou menos respeitador de exigências inadversáveis do Estado de Direito ou de regras explícitas do ordenamento positivo. Sua ocorrência é induvidosa, exista ou não uma lei geral de processo ou procedimentos administrativos.’
Sob essa ótica, embora seja correto o entendimento de PAULO DE BARROS CARVALHO no sentido de que o lançamento seja um ato administrativo (1996. p. 262 e segs.), não se pode negar a existência de um procedimento para sua realização.
Aliás, SACHA CALMON NAVARRO COÊLHO (2003, p. 651) menciona que:
"O lançamento é ato. Antes dele há um procedimento preparatório. Depois dele podem ocorrer, também, procedimentos revisionais, visando confirmar ou infirmar, no todo ou em parte, a sua integridade, por iniciativa do contribuinte ou do Estado, nos casos previstos em lei."
Por fim, vale mencionar as palavras de LUCIA VALLE FIGUEIREDO, que define o lançamento como "ato constitutivo-formal, resultante de procedimento administrativo" (In MACHADO, 2002, p. 366).
1.4 LANÇAMENTO COMO ATO DECLARATÓRIO E CONSTITUTIVO
Com o fato gerador, nasce a obrigação tributária, conforme § 1.º do art. 113 do Código Tributário Nacional, verbis:
"Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.
§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente."
Sendo certo que não há obrigação sem crédito, suscitou grande divergência doutrinária o fato de o art. 142 do CTN afirmar que o lançamento "constituiria" o crédito tributário.
Essa controvérsia é apontada, por exemplo, por LUCIANO AMARO (2002, p.324).
Para FÁBIO FANUCCHI, o lançamento tem por efeito principal o de constituir o crédito tributário e o do declarar a obrigação que lhe corresponde (1979, p.280).
Indubitavelmente, se existe algum crédito, este nasce com sua obrigação correspondente. Sob esse enfoque, o lançamento apenas declararia uma situação preexistente, fixando a liqüidez e certeza do crédito tributário.
De outro lado, para que a Administração Pública passe a ter pretensão, o lançamento é imprescindível. Nesse prisma, nota-se o caráter constitutivo do lançamento.
VITTORIO CASSONE (2001, p. 183), contudo, anota que o caráter constitutivo do lançamento está na individualização do fato gerador, na apuração do montante do tributo devido.
Assim, embora o lançamento apresente caráter declaratório e constitutivo, deve ser ressaltado que o objeto da declaração não é o mesmo da constituição.
Nessa esteira, lembra SACHA CALMON NAVARRO COÊLHO (2003, p. 651) que a expressão "constituir" não é utilizada no art. 142 do CTN com o sentido de criar, "nem se reporta ao significado de ato jurídico constitutivo".
1.5 LANÇAMENTO COMO ATO DOTADO DE AUTO-EXECUTORIEDADE
O lançamento é um ato administrativo dotado do atributo da auto-executoriedade, que consiste na possibilidade de execução independentemente de autorização judicial.
Sobre referido atributo, preleciona CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (2003, p 383):
"é a qualidade pela qual o Poder Público pode compelir materialmente o administrado, sem precisão de buscar previamente as vias judiciais, ao cumprimento da obrigação que impôs e exigiu."
Decorre expressamente da lei, ou implicitamente, "quando a executoriedade é condição indispensável à eficaz garantia do interesse público confiado pela lei à Administração; isto é, nas situações em que, se não for utilizada, haverá grave comprometimento do interesse que incumbe à Administração assegurar" (MELLO, 2003, p. 385).
PAULO DE BARROS CARVALHO (1996, p.275) também aponta esse atributo do lançamento.
1.6 MODALIDADES DE LANÇAMENTO
Embora a lei diga modalidades, na realidade o que mudam são as circunstâncias em que o lançamento é realizado, e não o lançamento em si, que sempre é realizado pelo próprio fisco, por ser-lhe atividade privativa.
Assim, em alguns casos a Fazenda Pública dispõe de todas as informações necessárias para o lançamento, não dependendo de qualquer auxílio do sujeito passivo.
Em outros, depende de declarações a serem prestadas pelo sujeito passivo antes de cada lançamento.
Há outras situações em que o próprio sujeito passivo realiza a atividade de apurar o tributo devido e recolhê-lo, sendo que o fisco, ao fiscalizá-lo, verifica a exatidão de seu procedimento. Essa verificação envolve a atividade do lançamento, pois, para verificar, é necessário, ainda que apenas mentalmente, apurar o montante devido e comparar com o resultado a que chegou o sujeito passivo. Assim, estando correto, a Administração apenas homologa a apuração realizada por este.
Conquanto o tema desse trabalho esteja ligado ao lançamento por homologação, mister, ainda que superficialmente, tecer algumas considerações sobre cada modalidade.
1.6.1 LANÇAMENTO POR DECLARAÇÃO
Essa modalidade também é conhecida como lançamento misto, uma vez que a atividade do fisco é auxiliada pelo sujeito passivo por meio de declarações prestadas.
A base legal dessa modalidade é o art. 147 do Código Tributário Nacional, verbis:
"Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.
§ 1º A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento.
§ 2º Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela."
O § 1.º apresenta uma aparente contradição: Ora. Se o declarante alega que errou, tem que provar seu erro somente quando a correção da declaração reduzir ou excluir o tributo devido. Porém, se houver alegação de erro na declaração anteriormente prestada, e a nova levar à cobrança de quantia superior, não é necessária a comprovação.
Qualquer declaração deveria estar acompanhada de provas, uma vez que a obrigação tributária decorre da incidência da lei, e não da simples declaração.
De outro lado, o erro deve ser comprovado por quem o alega.
Outro problema está na restrição que se impõe ao estabelecer que só é possível corrigir o erro antes da notificação do lançamento. Se após o lançamento o fisco descobrir que está cobrando mais do que o devido, deve, de ofício, corrigir o erro. O mesmo se estiver cobrando menos (art. 149 do CTN).
O lançamento por declaração é utilizado, por exemplo, em relação ao imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis e direitos a estes relativos – ITBI, bem como no imposto sobre transmissão causa mortis e doação – ITCD (COÊLHO, 2000, p. 226).
VITTORIO CASSONE (2001, p. 184) aponta o Imposto de Renda como sujeito ao lançamento por declaração.
Porém, não se pode concordar com esse entendimento, na medida em que o sujeito passivo recolhe o tributo sem prévio lançamento por parte do fisco. As informações prestadas apenas auxiliarão em eventual fiscalização para conferir a exatidão do montante recolhido.
Como se vê, o Imposto de Renda está sujeito ao lançamento por homologação.
1.6.2 LANÇAMENTO DE OFÍCIO
Todo lançamento é de ofício, no sentido de que é feito pela autoridade administrativa sem provocação de ninguém.
Porém, quando se trata de modalidade de lançamento, o de ofício é aquele realizado nas hipóteses do art. 149 do CTN.
HUGO DE BRITO MACHADO (2003, p.155) menciona que referido lançamento ocorre sem a colaboração do sujeito passivo.
Porém, isso nem sempre é assim. Nos casos em que o fisco necessite de informações para realizar o lançamento, ele notificará o sujeito passivo, ou mesmo terceiros, para que prestem esclarecimentos. Isso não deixa de ser uma colaboração.
Obviamente que, sem referidos esclarecimentos, o fisco pode recorrer a outros remédios –multas, arbitramento etc.–. Nesse sentido, sim, pode-se falar em realização do lançamento independentemente de colaboração.
No CTN, o lançamento de ofício aparece nesses termos, verbis:
"Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:
I - quando a lei assim o determine;
II - quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;
III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;
IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;
V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;
VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;
VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;
VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior;
IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial.
Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não existindo o direito da Fazenda Pública."
O que pode ser notado aqui é que, se o sujeito passivo não realizar a conduta que lhe é determinada por lei nas modalidades de lançamento por declaração e por homologação, surge para o fisco o dever de lançar de ofício.
São lançados de ofício, por exemplo, o IPTU, o ITR e o IPVA (COÊLHO, 2000, p. 226).
1.6.3 LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO
Essa modalidade tem sua matriz no art. 150 do CTN, verbis:
"Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento.
§ 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito.
§ 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação.
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação."
Nos termos expostos supra, ficou esclarecido que o lançamento é privativo da Administração.
Como se disse, nessa modalidade de lançamento, o fisco verifica a exatidão da apuração realizada pelo sujeito passivo.
Estando correto o valor recolhido, ocorre a homologação, com a extinção da condição resolutória, tornando-se definitivo o pagamento efetuado.
O termo "antecipado" previsto no caput e no § 1.º significa que o pagamento deve ser feito antes de o fisco efetuar o lançamento, ou sem aguardar que este seja realizado (AMARO, 2002, p. 352).
Não é antecipado em relação ao vencimento, que, se não observado, implicará mora do sujeito passivo, e as conseqüências pertinentes, como multa, juros, correção monetária etc.
Caso o sujeito passivo efetue o pagamento com atraso, mas antes do lançamento, e sem recolher os acessórios devidos pela mora, o valor pago será considerado, nos termos do §3.º supramencionado, ficando em aberto apenas o saldo.
Note-se que, embora o sujeito passivo realize a atividade que seria realizada pelo fisco na apuração do tributo devido, isso não é lançamento. Contudo, LUCIANO AMARO (2002, p. 354) anota que JOSÉ SOUTO MAIOR BORGES atribui a qualidade de lançamento a essa atividade do sujeito passivo.
De outro lado, quando a Administração fiscaliza o sujeito passivo e encontra os tributos apurados e recolhidos, obviamente que não é necessário realizar novamente a apuração, mas tão-somente conferi-la e, estando correta, homologá-la.
Com relação ao prazo para essa homologação será visto no capítulo seguinte.