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O Direito Processual Penal Brasileiro

Agenda 27/04/2016 às 21:57

Pretende-se demonstrar uma abordagem geral sobre os componentes do processo penal brasileiro, destacando os princípios formadores deste ramo do Direito, os critérios para a sua aplicação, fontes e características inerentes ao seu regular desenvolvimento.

SUMÁRIO: Introdução; 1. O estado e o processo; 2. Garantias inerentes ao processo penal; 3. Princípios processuais penais; 4. Fontes do Direito processual penal; 5. Interpretação da norma processual penal 6. A lei processual no tempo e no espaço; Considerações finais; Referências.

RESUMO

Pretende-se demonstrar uma abordagem geral sobre os componentes do processo penal brasileiro, destacando os princípios formadores deste ramo do Direito, os critérios para a sua aplicação, fontes e características inerentes ao regular desenvolvimento do processo penal pátrio.

PALAVRAS-CHAVES:

Processo penal; aplicação; princípios; garantia

INTRODUÇÃO

No ordenamento jurídico pátrio, apenas o Estado é dotado do poder de punir, até mesmo quando se trata de ação privada, há apenas a concessão do jus persequendi ao cidadão, mas mantém para si o jus puniendi. Tendo em vista esse monopólio Estatal, é de vital importância que o cidadão comum tenha meios para se proteger da arbitrariedade do poder público, e é no processo penal que se encontrara as regras para um desenvolvimento processual justo, respeitando as garantias individuais de cada cidadão.

A sanção penal que restringe a liberdade do ser humano é uma das punições mais severas que pode acometer o cidadão. Devido à relevância deste bem juridicamente protegido, o legislador procurou atribuir limitações a esse poder de punir do Estado, fazendo com que haja uma preponderância dos interesses do réu, como a presunção de inocência ou o in dúbio pro reo, em face do jus puniendi estatal.

  1. O ESTADO E O PROCESSO

Entende-se por processo o conjunto de normas que guiam o desenvolvimento das lides, regulando a aplicação jurisdicional do Direito a cada caso. O processo é o caminho, é o instrumento de atuação da jurisdição.

Costuma-se classificar esse processo de busca pela satisfação de seus direitos em três momentos distintos na história: a autotutela, a autocomposição e a jurisdição. No primeiro momento com a autotutela, prevaleciam as vontades individuais, o direito era exercido pelas próprias forças. Em um segundo momento, passou-se a realizar concessões recíprocas para que com isso se chegasse a um resultado comum. Na terceira fase por fim, surge o Estado, postando-se de forma independente das partes para solucionar os litígios. É o surgimento propriamente dito do Estado de Direito.

O Estado surge já com diversas funções, no entanto, com uma função exclusiva, o direito de punir – jus puniendi. Tem um dever abstrato de punir todo aquele que comete fato definido como infração penal. É exatamente para dar uma correta solução aos conflitos entre o Estado e o infrator que surge o processo penal.

Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, o processo penal não tem como função precípua buscar a punição, mas sim demonstrar os fatos de forma verdadeira, para que se verifique se tal acontecimento é passível ou não de punição pelo direito material. Esse direito de perseguir a punição penal dá-se o nome de jus persequendi. Constado após perquirição penal a ocorrência da infração penal, resta, portanto, ao Estado, exercer o seu Direito de punir – jus puniendi, que não deve ser visto como uma mera faculdade, mas como um dever do Estado.

O processo penal brasileiro não se trata de uma área de uma matéria pronta, fechada, já previamente definida para os casos que trate de direito material penal. No processo penal ocorre a aplicação subsidiária do processo civil, isso porque as normas contidas no sistema processual civilista possuem um caráter ímpar na legislação brasileira. Isto porque elas são dotadas de uma grande versatilidade que afeta outros ramos processuais. Deste modo, há inúmeras possibilidades de haver supressão de lacunas legais por meio da analogia, ou seja, permite-se utilizar da legislação processual cível para preencher lacunas em outros ramos do Direito Processual, como no processo penal. Além dessa troca de informações com outras áreas processuais, o processo penal, de forma lógica, também traz garantias constitucionais para serem observadas durante o regular desenvolvimento do processo.

  1. GARANTIAS INERENTES AO PROCESSO PENAL

Quando comparado ao processo civil, o processo penal possui um número maior de garantias, isso se dá pelo bem que está diretamente envolvido com ele que é a liberdade humana, bem este de grande valor que merece uma tutela mais pormenorizada em nosso ordenamento.

Desde já, é importante destacar que além das garantias próprias do processo penal, ele também faz jus às garantias gerais pertencentes a todo e qualquer processo que transcorra sob a égide de nosso ordenamento jurídico, que são eles, por exemplo, as prerrogativas da magistratura, a proibição de tribunais de exceção, a do duplo grau de jurisdição, a da imparcialidade do juiz e a da motivação das sentenças.

Para um adequado desenvolvimento do processo na seara penal, uma das garantias mais importante e ao redor da qual todo o processo gravita é a da ampla defesa, com os recursos a ela inerentes, sobre a qual convém insistir e ampliar. A ampla defesa é possibilidade dada ao réu de se manifestar contrariamente às acusações a ele imputadas, dentro dos prazos legais. É dado ainda ao réu para que exerça a sua ampla defesa de forma mais efetiva um outro direito, o de ter um conhecimento prévio de forma clara e completa da acusação a qual esta sendo sendo-lhe imputada. Para que alguém possa preparar e realizar sua defesa é preciso que esteja claramente descrito o fato de que deve defender-se.

A ampla defesa que é dada ao réu, na verdade se perfaz em um conjunto de atos como a adoção do sistema acusatório, a apresentação formal da acusação, a citação regular, a instrução contraditória, o princípio da verdade real e o exercício de defesa técnica.

O sistema acusatório é a separação entre o órgão acusador e aquele que irá decidir a lide julgando-a. A representação formal é a garantia de pleno conhecimento do réu sobre o que está sendo-lhe atribuído. A citação regular é conhecimento da ação levado ao réu, a nulidade de citação é absoluta e insanável. O contraditório é a possibilidade de contrariar a acusação, requerer a produção de provas e recorrer quando houver inconformismo. O princípio da verdade real é aquele que permite ao juiz ultrapassar a descrição dos fatos como aparecem no processo, para determinar a realização ex officio de provas que tendam à verificação da verdade real e a defesa técnica é a garantia do réu ser acompanhado por um advogado, seja o réu presente ou revel, querendo ou não querendo.

  1. PRINCÍPIOS PROCESSUAIS PENAIS

O processo penal se baseia de forma imediata na Constituição Federal, são os seus preceitos que devem ser tidos com norte, para a proteção do cidadão contra possíveis abusos por parte do Estado. O processo deve conciliar tanto o cidadão individualmente falando contra tais abusos, como também o direito do Estado de punir aquele que contrariou normas previamente estabelecidas.

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Os princípios que regem o direito processual penal devem ser tidos como o ponto de partida da elaboração da dogmática penal processual. Muitas vezes, as respostas para problemas que surgem no decorrer do processo, são encontradas quando o intérprete aplica os princípios constituintes do processo penal. Tais princípios não são taxativos, podendo ser expressos ou não. São eles:

Princípio da presunção de inocência: A nossa Constituição, no seu art. 5º, LVII proclama que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Isto significa que antes de uma sentença condenatória ter transitado em julgado somos inocentes. A inocência é presumida, a culpabilidade é que deve ser comprovada, devido a essa presunção, a prisão do acusado só é permitida excepcionalmente, em circunstancias expressamente previstas. Fernando Capez analisando tal princípio destaca que:

O princípio da presunção de inocência desdobra-se em três aspectos: a) no momento da instrução processual, como presunção legal relativa de não culpabilidade, invertendo-se o ônus da prova; b) no momento da avaliação da prova, valorando-a em favor do acusado quando houver dúvida; c) no curso do processo penal, como paradigma de tratamento do imputado, especialmente no que concerne à análise da necessidade da prisão processual[3].

Como se constata, tal princípio possui uma grande dimensão, criando várias garantias para proteger o acusado, que na ordem constitucional contemporânea não admite a culpa antes de o processo transitar em julgado, no entanto, há a possibilidade da prisão processual em nosso ordenamento, sem que isso esteja ofendendo o princípio de presunção de inocência.

Princípio da igualdade processual: A igualdade a que se refere este princípio é a igualdade material, que afirma que os desiguais devem ser tratados desigualmente na medida de sua desigualdade. Apesar de a regra ser a da isonomia processual, em algumas circunstâncias específicas haverá preponderância de um interesse, como no caso da defesa está sendo exercida pelo defensor público, órgão que ainda se encontra em formação e com grande volume de trabalho que possui prazo em dobro para recorrer, sem esquecer que existe uma preponderância  dos interesses do acusado.

Princípio da verdade real: No processo penal, o juiz tem o dever de investigar como os fatos se passaram na realidade, não se conformando com a verdade formal constante dos autos. O magistrado, no exercício de seu oficio deve buscar sempre a verdade dos fatos, superando as carências de informações trazidas pelas partes para que com isso se faça justiça. É a imparcialidade do juiz na direção e apreciação da prova, podendo ele determinar de oficio, diligências para esclarecer alguns pontos, podendo até em alguns casos ordenar a produção de provas antes de iniciada a ação penal, possibilidade esta criticada por parte da doutrina que alega se tratar de um processo inquisitivo, onde não há separação das funções, e não retrata o sistema acusatório adotado pela legislação brasileira É um princípio característico do processo penal, pois no civil o juiz deve se ater ao que trazido pelas partes.

Princípio da legalidade: O referido princípio vem dizendo que os órgãos públicos responsáveis pela persecução penal devem promovê-la e não podem atuar de forma discricionária no prosseguimento da ação ou do inquérito, uma vez que não cabe os princípios da oportunidade e conveniência nas ações públicas incondicionadas, apenas nas ações privadas e públicas condicionadas. Devido a isso, nos casos de ação pública, a autoridade policial é obrigada a proceder às investigações preliminares e o Ministério Público é obrigado à apresentar a denuncia quando verificar a ocorrência de um fato delituoso. Caso o parquet requeira o arquivamento, tal pedido deve ser fundamentado.

Princípio da oficialidade: A função penal tem um caráter público e a pretensão punitiva do Estado deve se fazer valer por órgãos públicos, quais sejam, a autoridade policial, no caso do inquérito, e o Ministério Público, no caso da ação penal pública, sendo tais atribuições elencadas inclusive na Constituição nos artigos  144 § 4° no que se refere ao papel da polícia judiciária e o 129, I no que tange ao Ministério Público.

Princípio da oficiosidade: Os órgão responsáveis pela persecução penal devem proceder ex officio via de regra. Excepcionalmente, o início da persecução penal pressupõe autorização do legítimo interessado, como se dá na ação penal pública condicionada à representação da vítima ou à requisição do Ministro da Justiça.

Princípio da indisponibilidade: A autoridade policial não pode determinar o arquivamento do inquérito policial (CPP, art. 17) e o Ministério Público não pode desistir da ação penal pública, nem do recurso interposto. Uma vez iniciado o inquérito policial ou o processo penal, os órgãos incumbidos da persecução criminal não podem deles dispor. Esta disponibilidade só é permitida nos crimes de ação penal de iniciativa privada, em que se admite o perdão, a perempção e a desistência.

Nos Juizados especiais criminais, o princípio da indisponibilidade apresenta-se mitigado, pois trouxe o instituto da suspensão condicional do processo e da possibilidade da transação penal.

Princípio do contraditório: Este princípio impõe que o réu deve conhecer a acusação que se lhe imputa para poder contrariá-la, evitando, assim, possa ser condenado sem ser ouvido. Deve ser dado ás partes possibilidade de influir no convencimento do magistrado, oportunizando-se a participação e manifestação sobre os atos que constituem a evolução processual. O direito processual penal como trata de bens de maior relevância, exige a efetiva contrariedade à acusação, tarefa que só é possível com a absoluta paridade de armas conferidas às partes. O agente, autor ou réu, será admitido a influenciar o conteúdo da decisão judicial.

No que se refere á fase de inquérito, importante destaque faz Nestor Távora:

[...] não é exigível o direito ao contraditório em sede de inquérito policial, já que se trata de procedimento administrativo de caráter informativo. Não obstante, assegura-se o direito à publicidade, permitindo o "acesso amplo aos elementos de prova" colhidos no procedimento investigatório, nos termos da súmula vinculante n° 14[4].

Princípio da iniciativa das partes: Tal princípio veda o juiz de dar início ao processo sem a provocação da parte. Este ato inicial cabe ao Ministério Público na ação penal pública. E ao ofendido na ação penal privada. Este princípio é fruto da adoção pelo direito processual brasileiro, do sistema do processo acusatório (distribuição das funções de acusar, defender e julgar a órgãos distintos).

 Princípio do ne eat judex ultra petita partium: Este princípio traz que o juiz não pode ir além dos pedidos das partes, deve se pronunciar sobre aquilo que foi pedido. Se o promotor imputa o réu pela prática do crime de roubo por exemplo, e ao final verifica-se que ele praticou foi outro crime distinto, como por exemplo estupro, não pode  o juiz condenar por estupra uma vez que não foi pedido, e nem pelo furto que não ocorreu.

Princípio da publicidade: A publicidade dos atos processuais é a regra, no entanto o sigilo é admitido para defender a intimidade ou o interesse social, evitando escândalos ou perturbação da ordem. No interior do processo, é essencial que haja a publicidade dos atos para que possa se estabelecer o contraditório e a participação no processo. O máximo que se admite é a realização de atos sem a publicidade momentânea, como nos casos de interceptação momentânea.

No que refere ao inquérito policial, é regido pelo princípio do sigilo, porém é permitindo que o advogado possa consultar os autos como assegura o seu Estatuto e confirmado pela Súmula 14 do STF.

Princípio da identidade física do juiz: Consiste na vinculação do juiz aos processos cuja instrução acompanhou. O juiz que presidir a instrução deve proferir a sentença. Este princípio é essencial na busca da justiça, pois é o juiz que manteve um contato direto com as provas que deverá decidir, pois este que participou tem uma melhor percepção dos fatos.

Princípio do devido processo legal: Assegura a todos o direito de não ser privada de sua liberdade e de seus bens, sem a garantia de um processo desenvolvido conforme estabelece a lei. O acusado tem direito a uma defesa plena onde se enquadra o direito de ser ouvido, de ser informado pessoalmente de todos os atos processuais, de ter acesso à defesa técnica, manifestar-se sempre depois da acusação e em todas as oportunidades, à publicidade e motivação das decisões, de ser julgado perante o juízo competente, ao duplo grau de jurisdição, à revisão criminal e à imutabilidade das decisões favoráveis transitadas em julgado. Há a necessidade de o processo ser composto sem a supressão ou modificação de atos essenciais, a pretensão punitiva deve se dar dentro de um processo regular. O processo é o instrumento do cidadão contra a arbitrariedade do Estado, protegendo a sua liberdade.

Princípio do favor rei: A dúvida sempre beneficia o acusado. Se houver duas interpretações, deve-se optar pela mais benéfica (in dubio pro reo). Quando ponderado entre o direito de punir do Estado e a liberdade do acusado, esta última prevalece. Esse cuidado se justifica nos riscos advindos de uma condenação injusta, tendo em vista a relevância do direito à liberdade ao cidadão.

Principio da inexigibilidade de autoincriminação: Este princípio assegura que ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Traz consigo uma limitação do poder de punir do Estado. A jurisprudência brasileira afasta a possibilidade de obrigar o acusado ou até mesmo a testemunha, a praticar ato que será utilizado como prova contra si.

  1. FONTES DO DIREITO PROCESSUAL PENAL

Quando se fala em fonte, remete-se à origem, local de onde provem, e no que se refere ao Direito, fonte é tudo aquilo de onde provém um preceito jurídico. No estudo sobre as fontes do direito processual penal, pode-se classifica-las em duas espécies, a fonte material ou de produção que é aquela que cria o Direito ou a fonte formal ou de cognição, que é aquela que revela o Direito.

  1. Fontes de produção ou material: Como dito anteriormente, essa espécie de fonte é aquela que elabora a norma. No ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição determina que a competência para legislar sobre direito processual penal é da União. Contudo, em matéria de procedimentos, admite-se que os Estados-membros legislem concorrentemente a promulgar normas específicas, como por exemplo, sobre custas forenses.
  2. Fonte formal ou de cognição: São aquelas responsáveis por revelar a norma e podem ser tanto imediatas ou mediatas.

b.1)  Imediata: São as leis ou tratados

b 2) Mediatas: São os costumes e princípios gerais do Direito. Por costume tem-se o conjunto de normas de comportamento a que as pessoas obedecem de maneira uniforme e constante, pela convicção de sua obrigatoriedade jurídica. É diferente do hábito porque neste não há a convicção da obrigatoriedade jurídica. É uma regra de conduta praticada de forma geral que pode tanto ratificar e sedimentar a lei (secundum legem), podem suprir as lacunas da lei (praeter legem) ou ainda podem contrariar a lei (contra legem). No entanto, no que se refere a este último, é importante destacar que conforme dispões o art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, o costume nunca revoga uma lei. A outra fonte formal mediata são os princípios gerais do Direito que são postulados gerais  São estabelecidos

de acordo com a consciência ética do povo.

  1. INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROCESSUAL PENAL

Interpretar a norma significa buscar o seu real significado. A aplicação da lei processual penal segue as mesmas regras de hermenêutica que disciplinam a interpretação das leis em geral. Deve-se buscar a vontade da lei, e não a vontade do legislador que a fez.

O processo de interpretação da lei processual penal pode ser classificado quanto ao sujeito que a elabora, quanto aos meios empregados e quanto ao resultado. Na primeira classificação, quanto ao sujeito que a elabora, pode ser autêntica, quando feita pelo próprio órgão que criou a norma, seja no próprio texto interpretado ou após a entrada em vigor da lei; pode ser doutrinária, quando realizada pelos estudiosos do direito; ou judicial, realizada pelos órgãos jurisdicionais.

Na segunda classificação, quanto aos meios empregados, pode ser gramatical, quando se leva em conta o sentido literal das palavras ou lógica, quando procuram a vontade da lei.

A terceira classificação é quanto ao resultado, podendo ser declarativa, quando há uma exata relação entre a letra da lei e sua vontade; pode ser restritiva, quando a lei disse mais do que queria e por isso deve restringi-la. Existe por fim a interpretação extensiva, quando a lei disse menos que queria.

A lei processual penal ao contrário do direito material penal admite a interpretação extensiva, pois não lida diretamente com o direito de punir, no entanto, sofre limitações quando se refere a dispositivos restritivos da liberdade pessoal, e que afetem direito substancial do acusado, como a prisão em flagrante por exemplo. Em tais casos deve-se proceder com uma interpretação restrita.

  1. A LEI PROCESSUAL NO TEMPO E NO ESPAÇO

O período de atividade da lei é o lapso temporal situado entre a entrada em vigor e a revogação de uma lei, durante o qual ela está viva, vigente, produzindo efeitos e alcançando todas as situações ocorridas sob sua égide. Entrando em vigor, as normas processuais têm sua incidência regulada pelo art. 2º do CPP, segundo o qual “a lei processual aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo dos atos realizados sob a vigência da lei anterior”. A partir do instante que lei entra em vigor, ela se aplica inclusive aos processos que estão em curso, mesmo que porventura venha trazer uma situação gravosa ao réu. Isso se dá devido ao princípio da aplicação imediata. Sendo assim, os atos anteriores continuam válidos por imperativo constitucional, há de ser respeitado devido ao direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada e, com o advento de nova lei, já os atos futuros serão pautados pelas regras do novo diploma. O ato processual é regido pela lei processual que estiver em vigor naquele dia, ainda que seja mais gravosa do que a anterior e mesmo que o fato que deu ensejo ao processo tenha sido cometido antes de sua vigência.

Já no que se refere à eficácia da lei processual penal no espaço, a lei processual penal aplica-se a todas as infrações penais cometidas em território brasileiro, princípio da territorialidade absoluta segundo o qual, aos processos e julgamentos realizados no território brasileiro, aplica-se a lei processual penal nacional. A territorialidade vem consagrada no art. 1º do Código de Processo Penal, no entanto, excepcionalmente a lei admite a incidência de outros diplomas, expressos nos incisos do artigo 1º.

O inciso I trata de uma hipótese de exclusão da jurisdição pátria, em atenção aos tratados, convenções e regras de direito internacional, dando prevalência à própria ordem internacional, como acontece com a imunidade diplomática. O inciso II trata da jurisdição política destacando que os crimes de responsabilidade invocam, como regra, apreciação na esfera do Poder Legislativo, como afirma a Constituição Federal. O inciso III trata da Justiça Especializada Militar, que tem codificação própria tanto na esfera material, que define os crimes militares, quanto na processual. O inciso IV destaca o antigo Tribunal de Segurança Nacional que não mais existe. Hoje os crimes contra a segurança nacional são de responsabilidade da Justiça Federal. A última exceção a que refere o art. 1º, V,  é o referente ao crimes de imprensa tratado pela Lei de Imprensa, no entanto o STF, declarou não recepcionada esta lei.

A lei processual penal brasileira é regida pelo princípio da territorialidade estrita, no entanto há quem sustente que há possibilidade de aplicação da extraterritorialidade em três situações:1- em território nullius; 2- havendo autorização de um determinado país, para que o ato processual a ser praticado em seu território o fosse de acordo com a lei brasileira; 3-  nos casos de território ocupado em tempo de guerra.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Direito processual penal é um ramo do Direito destinado à função jurisdicional do Estado, é o caminho a ser observado obrigatoriamente para que ao final seja aplicada de maneira justa a sanção penal. O regular desenvolvimento do processo é uma garantia de todo cidadão. É através dele que se estabelece uma proteção contra os arbítrios na função de punir do Estado. Em sua primorosa obra “O processo”, o escritor checo Franz Kafka faz uma crítica exatamente sobre esse autoritarismo da Justiça, onde não há o menor respeito pelas garantias individuais, não permitindo o direito a defesa ou sequer informação sobre o que está sendo-lhe imputado. Esta obra demonstra com grande maestria os riscos de se estabelecer o jus puniendi público sem atentar às normas que regem a perquirição penal.

O processo penal, seja com suas normas expressamente estabelecidas no diploma legal, seja com os princípios que regem toda a construção deste instituto, busca rechaçar esse autoritarismo reafirmando assim o estado democrático de direito que nos encontramos. O Processo Penal vai muito além daquilo que se encontra redigido no código de processo penal, todo esse caminho processual deve atentar também às garantias constitucionais assim como as regras do processo civil que é aplicado subsidiariamente á área penal.

A finalidade do processo é propiciar a adequada solução jurisdicional do conflito de interesses entre o Estado e o transgressor das leis, através de uma sequência de atos estabelecidos, para que com isso se busque a verdade por trás dos fatos. O processo penal deve ser entendido como um meio para conferir efetividade ao direito penal, pois é o processo que fornece os meios para que se dê a materialização da pena ao caso concreto.

REFERÊNCIAS

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

GRECO FILHO, Vicente. Manual do processo penal. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

LOPES JR. Aury. Direito processual penal.  9. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2012.

TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 8. ed. rev. e atual. Salvador: Jus Podivm, 2013.


[3] Fernando Capez, Curso de Processo Penal – 19. ed. – São Paulo : Saraiva, 2012, p. 83.

[4] Nestor Távora, Rosmar Antonni Rodrigues Alencar. Curso de Direito Processual Penal – 8ª ed. Salvador: Juspodivm, 2013, p. 59.

Sobre o autor
Vinicius Maranhão Coelho Borges

Acadêmico de Direito da Universidade Federal do Maranhão.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Paper apresentado à disciplina de Processo Penal I para a obtenção parcial da 1ª nota.

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