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Ministério Público:

questões polêmicas

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Agenda 22/02/2004 às 00:00

3. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público

Um exemplo atual de retrocesso judiciário e legislativo, em detrimento dos interesses da sociedade como um todo, é a tentativa de retirar do Ministério Público seu poder de investigação criminal direta, sem a presença da Polícia, em nome de (improváveis) excessos que possa vir a cometer. Desde já, deve ser dito que tais possíveis excessos são facilmente puníveis, além do que a história comprova que eles mais ocorrem quando da investigação criminal patrocinada pelo tradicional sistema. E assim, nestes casos, a quem incumbiria a investigação? À mesma corporação da qual participa o investigado?

Antes da celeuma causada por recentes (e hermeneuticamente errôneas) decisões da 2ª Turma do Egrégio Supremo Tribunal Federal [13], o professor Afrânio da Silva Jardim já afirmava que é "até mesmo intuitivo que o Promotor de Justiça deva dispor de mecanismos técnico-jurídicos que permitam exercer plenamente a sua atribuição-fim, qual seja instaurar a ‘persecutio criminis in judicio’. Não estivesse expresso na Constituição e na legislação ordinária, de qualquer sorte, tratar-se-ia dos chamados poderes implícitos." [14]

Valter Foleto Santin, em obra de técnica apurada, assevera que "a previsão constitucional do Ministério Público ‘expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los’ (129, VI, CF) traz evidente a existência de vários ‘procedimentos administrativos’ de atribuição do parquet, além do inquérito civil. Para que serviria o poder de expedir notificação e requisitar informes e documentos para a sua instrução se o Ministério Público não pudesse instaurar os procedimentos administrativos?" [15]

Paulo Rangel assim se pronuncia: "A persecução penal feita, diretamente, pelo Ministério Público encontra amparo assim, na própria Constituição, pois, na medida em que se lhe entrega a defesa da ordem jurídica e dos direitos e garantias fundamentais, deve-se-lhe entregar também os meios pelos quais irá atuar para exercer tal mister. Até para que possa conter os abusos por parte dos agentes públicos que possuem função de investigar". [16]

Ademais deve ser grifado texto de Mario Luiz Bonsaglia, onde diz que "não existe, porém, no âmbito do MP, qualquer espírito de emulação para com a Polícia. A faculdade de efetuar diretamente as investigações é utilizada com prudência e parcimônia, como um complemento à função de controle externo da atividade policial, particularmente nos casos envolvendo delitos econômico-financeiros, em que a atuação da Polícia fica restringida diante da dificuldade de obtenção de informações sigilosas (bancárias ou fiscais)..." [17].

Nunca é demais citar Hugo Nigro Mazzilli: "Há larga diferença entre a diligência, comandada hoje pelo Ministério Público sob autorização judicial, e os execráveis tempos do arbítrio. Nos tempos da ditadura, o Ministério Público não raro era servil ao governo, e uma providência como esta de hoje jamais poderia ter sido tomada, a não ser que conviesse aos governantes de plantão. Hoje, ao contrário, o Ministério Público e o Poder Judiciário têm garantias, oriundas de uma Constituição legítima e democrática..." [18]

Importantíssima contribuição de direito comparado nos traz a Sub-Procuradora Geral da República Ela Wiecko de Castilho: "A tese de que o MP não pode participar da investigação criminal presta um desserviço à sociedade brasileira e se distancia da tendência mundial. A comparação entre os sistemas procedimentais penais mostra que há três grandes grupos de legislação, no tocante à investigação. O primeiro grupo, que dá à Polícia o monopólio, só existe na common law e os abusos motivaram a introdução de uma instituição semelhante ao MP, a Crown Prosecution Service. O segundo se caracteriza por uma associação da Polícia e do MP. O terceiro grupo prevê a investigação pela Polícia, pelo MP, e pelos juizados de instrução. Os juizados de instrução estão sendo abandonados pouco a pouco e, na prática, o papel fundamental tem sido o do MP. Em diversos países, as investigações são conduzidas pelo MP com o auxílio da Polícia. O 8° Congresso das Nações Unidas sobre o Delito, realizado em Havana, em 1990, aprovou a diretriz segundo a qual os membros do MP desempenharão um papel ativo no procedimento penal, incluída a iniciativa do procedimento e, nos termos da lei ou da prática local, na investigação dos crimes, na supervisão da legalidade dessas investigações, na supervisão das execuções judiciais e no exercício de outras funções como representantes do interesse público." [19]

Muitas vezes, o Promotor não se dá por satisfeito com os elementos que consegue reunir, nestes procedimentos de sua lavra, e requisita a instauração de inquérito policial, com o fito de obter elementos comprobatórios suficientes para denunciar. Todavia, tal inquérito policial é totalmente dispensável, segundo legislação, doutrina e jurisprudência solidificadas [20]. Fernando Capez, verbi gratia, afirma: "O inquérito policial não é fase obrigatória da persecução penal, podendo ser dispensado caso o Ministério Público ou o ofendido já disponha de suficientes elementos para a propositura da ação penal (CPP, arts. 12, 27, 39, §5°, e 46, §1°)" [21].

Também o STJ já tinha pacificado o tema, editando, em dezembro de 1999, a Súmula 234, onde diz que: "a participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia". Desta forma, não caberia, em hipótese alguma, argüir por uma imparcialidade do Promotor de Justiça nas investigações por ele realizadas. Inolvide-se que ele faz parte do aparato estatal de persecução criminal, sendo parte no processo penal. Hélio Tornaghi, há mais de quinze anos, já afirmava que: "(...) não há que se falar em imparcialidade do Ministério Público, porque então não haveria necessidade de um juiz para decidir a acusação (...). no procedimento acusatório, deve o promotor atuar como parte, pois se assim não for, debilitada estará a função repressiva do Estado. O seu papel, no processo, não é o de defensor do réu nem o de juiz, e sim o de órgão do interesse punitivo do Estado." [22]

Paulo Gustavo Guedes Fontes, Procurador da República em Sergipe, nos traz percuciente contribuição, que demonstra o quanto são infelizes e ilógicos os pensamentos contrários à tese ora defendida: "(...) deve-se ter em mente que a Lei n°. 8.429/92 autorizou o Ministério Público a conduzir inquéritos civis para apurar atos de improbidade administrativa. Existem milhares deles espalhados pelo país, no Ministério Público Federal e estaduais, em que se apuram atos de corrupção, dispensa indevida de licitações, superfaturamento etc., questões complexas do ponto de vista jurídico para as quais a Polícia nem sempre está preparada. Ao fim dessas investigações, o membro do Ministério Público dispõe de elementos suficientes para a propositura de ações civis por atos de improbidade administrativa. Pois bem, se as provas obtidas no inquérito civil indicarem também a prática de crime, devem ser consideradas imprestáveis para fins penais? Estará o procurador ou promotor proibido de ajuizar as ações penais cabíveis pelo fato de ter realizado as apurações? Estaríamos diante de um absurdo jurídico e prático, com afronta, inclusive, ao princípio constitucional da eficiência, que deve pautar a atuação de todas as esferas estatais." [23]

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Ademais, já é até uma rotina ministerial, a instauração de procedimentos administrativos tendentes a apurar uma notitia criminis. Tal rotina jamais poderá deixar de existir, sob pena de ofensa ao direito difuso da coletividade a uma escorreita administração da segurança pública. Em posição de vanguarda, já há até quem defenda a impetração de ação civil pública para defesa deste direito difuso à segurança pública!!! [24]

Por fim, vale salientar a existência de jurisprudência no seio do próprio STF, da lavra de seu Tribunal Pleno, que deverá, por óbvio, prevalecer sobre as malsinadas decisões da Segunda Turma. Falamos da decisão da ADIN n°. 1.571/97, impetrada pelo Ministério Público Federal, onde se discutia a inconstitucionalidade (e assim foi declarada) do art. 83 da Lei n°. 9.430/96. Seu acórdão foi publicado no DJU, em 25/09/1998 e no Informativo 64 do STF, e nela foi relator o Exmo. Ministro Néri da Silveira. Eis brilhante trecho do venerando acórdão:

"É de observar, ademais, que, para promover a ação penal pública, ut art. 129, I, da Lei Magna da República, pode o MP proceder às averiguações cabíveis, requisitando informações e documentos para instruir seus procedimentos administrativos preparatórios da ação penal (CF, art. 129, VI), requisitando também diligências investigatórias e instauração de inquérito policial (CF, art. 129, VIII), o que, à evidência, não se poderia obstar por norma legal, nem a isso conduz a inteligência da regra legis impugnada ao definir disciplina para os procedimentos da Administração Fazendária."(grifo nosso)

Como pode o Ministério Público ajuizar uma ação penal contra o criminoso, e não poder investigá-lo? Qual dispositivo legal ou constitucional faz esta vedação? Há melhor forma de se convencer da culpa de um acusado do que acompanhar diretamente as investigações ou diretamente investigando-o? Não é o Ministério Público parte na ação penal? Com que finalidade se realiza esta empreitada jurídica desairosa e futuramente desastrosa de se retirar o poder investigatório do Ministério Público? Respondamos-nos, urgentemente!

Certamente, as respostas destas indagações obrigar-nos-ão a declarar-se totalmente contrários a esta exclusão, por ferir a Constituição Federal e todo o ordenamento jurídico nela alicerçado, conclamando toda a comunidade jurídica a colaborar e abraçar esta causa em nome do Ministério Público e de toda a sociedade!


4. Nomeação do Procurador-Geral da República

É muito óbvio que os membros do Ministério Público não são funcionários caracteristicamente subordinados, delegatários da legitimidade de outros Poderes do Estado, supostamente maiores. Subordinam-se, sim, ao reinado da legalidade e ao império de sua independência e consciência profissionais. Labutam eles com necessária parcela da soberania estatal, munus público outorgado pelo povo, através de sua Assembléia Nacional Constituinte. Nunca olvidemos que o poder é uno, e emana do Povo.

Desta feita, no cerne deste debate acerca de subordinação ministerial, vivemos a discussão sobre a pertinência e proveito social da atual forma de nomeação do Procurador Geral da República, por parte do Chefe do Executivo.

Até o advento da Constituição Federal de 1988 o sistema de escolha e nomeação do Procurador Geral da República era bastante precário, fragilizando em demasia a Instituição. Era ele nomeado e demitido ad nutum pelo chefe do Poder Executivo.

A Constituição de 1891 assim o tratava, em seu art. 58, §2°: "O Presidente da República designará, dentre os membros do Supremo Tribunal Federal, o Procurador Geral da República, cujas atribuições se definirão em lei".

Por sua vez, a Constituição de 1934, no art. 95, §1° afirmava: "§ 1º - O Chefe do Ministério Público Federal nos Juízos comuns é o Procurador-Geral da República, de nomeação do Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos estabelecidos para os Ministros da Corte Suprema. Terá os mesmos vencimentos desses Ministros, sendo, porém, demissível ad nutum".

A CF de 1937 dizia em seu art. 99: "O Ministério Público Federal terá por Chefe o Procurador-Geral da República, que funcionará junto ao Supremo Tribunal Federal, e será de livre nomeação e demissão do Presidente da República, devendo recair a escolha em pessoa que reúna os requisitos exigidos para Ministro do Supremo Tribunal Federal."

Assim dispunha o art. 126 da Carta de 1946 a respeito da escolha do Procurador-Geral da República: "Art 126 - O Ministério Público federal tem por Chefe o Procurador-Geral da República. O Procurador, nomeado pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos indicados no artigo 99, é demissível ad nutum".

Nesta evolução, basta relermos o art. 138 da CF/67 (cópia praticamente fiel do art. 126 da CF/46) e compreenderemos a fragilidade e a parcialidade com que era tratada a Chefia da Instituição noutros tempos: "O Ministério Público Federal tem por Chefe o Procurador-Geral da República, o qual será nomeado pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos Indicados no art. 113, § 1º".

Por fim, assim dizia o art. 95 da Constituição Outorgada de 1969: "O Ministério Público federal tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República, dentre cidadãos maiores de trinta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada".

Sauwen Filho nos traz contribuições de Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda: "Comentando esse dispositivo, Pontes de Miranda reprova-o, advertindo ser inconveniente a uma concepção de Ministério Público onde a independência é indispensável, afirmando que ‘órgão que fica exposto à vontade de outro órgão não tem independência que fora de mister à concepção do Ministério Público.’ É ainda Pontes de Miranda quem propõe a eleição direta do Procurador-Geral da República e por sufrágio universal, (...)." [25]

Atualmente, o Presidente da República escolherá dentre os integrantes da carreira com mais de 35 anos de idade, aquele que será o Procurador-Geral da República, e esta escolha deverá passar pelo crivo do Senado Federal, em argüição pública. Aprovada a escolha, o novo Procurador-Geral passa a ter mandato de dois anos, podendo ser reconduzido reiteradas e ilimitadas vezes. Todavia – em um dos maiores avanços da Constituição de 1988 –, não poderá ele ser destituído sem a deliberação da maioria absoluta do Senado. [26] Um outro avanço significativo é que ele somente poderá vir da própria carreira ministerial, não sendo mais um estranho aos quadros, o que era absurdamente pernicioso.

Este atual sistema estabeleceu, inegavelmente, algumas mudanças bastante proveitosas nos critérios de escolha, nomeação e demissão do Procurador-Geral da República. Todavia ainda há falhas. O sistema mostra-se inadequado para o fortalecimento da Instituição e a consecução dos direitos por ela defendidos, quebrantando sua independência perante os Poderes constituídos, mormente diante de nosso hipertrofiado Poder Executivo, e de um Poder Legislativo muitas vezes subserviente. Ao invés de demonstrar um critério de legitimidade, de um ponto de vista de representação política, presta-se a um crescente sentimento de descrédito e falta de confiança nas instituições públicas, sempre que as medidas adotadas pelo Ministério Público, mormente por este seu órgão maior – o Procurador Geral, refiram-se a atos, serviços e contratos da Administração, controlada que esta é pelo Executivo. Isto, além de muito enfraquecer a Instituição, colabora também para esmorecer a necessária crença no correto funcionamento da máquina administrativa.

É conforme já foi dito anteriormente: "a forma de escolha dos chefes do Ministério Público, tal como consagrada nos dispositivos constitucionais referidos, se bem analisada, peca pelo contraponto teleológico em relação ao próprio princípio da independência da Instituição. Isto porque a história tem sido farta em demonstrar que a opção por este ou aquele nome, realizada pelo chefe do Executivo, tem-se pautado, boa parte das vezes, em critérios de afinidade e comprometimento político do escolhido, com evidente prejuízo para os ditames finalísticos decorrentes da independência do ''Parquet'' e, bem por isso, atentando contra os princípios que, mercê do artigo 127, § 1º, da mesma Constituição, devem nortear todo o sistema" [27].

A exemplo do que acontece na totalidade dos Estados-membros da Federação brasileira, em respeito à regra do art. 9° da Lei n°. 8.625/93 [28], (que se baseou no art. 128, §3°, da Constituição), a maioria dos doutrinadores defende que deve haver a eleição direta dentro do seio da Instituição, estabelecendo-se uma lista tríplice, que seria encaminhada ao chefe do Poder Executivo, para a escolha do novo Procurador-Geral da República. Oficiosamente (posto que ainda não foi modificada a CF neste sentido), foi assim que ocorreu com a nomeação do atual Procurador-Geral da República, Cláudio Lemos Fonteles. Nos anos de 2001 e 2002, a ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) organizou pleito informal com vistas de elaborar lista tríplice, a ser enviada ao chefe do Poder Executivo. Em ato pioneiro, foi através desta lista que, após entrevistas com os candidatos à Chefia da Instituição, foi escolhido pelo Presidente da República o nome do atual Procurador-Geral da República.

Feitas as devidas adaptações à realidade da União, importante contributo é trazido pelos membros ministeriais Antônio Augusto Mello de Camargo Ferraz e Paulo Roberto Dias Júnior, na análise deste sistema da lista tríplice: "Recaindo a escolha sobre outro integrante da lista tríplice que não o mais votado, o Procurador-Geral de Justiça corre o risco de passar seu curto mandato como Dâmocles, tendo sob sua cabeça a espada da desconfiança (de que esteja a serviço daquele que o nomeou). Mesmo quando agir de forma isenta, não faltará quem o acuse de parcialidade, comprometendo assim o conceito da instituição perante a sociedade. Pior: como o sistema admite uma recondução ao cargo, até mesmo a indicação do mais votado deixará plantada a semente da suspeita de que o Procurador-Geral não agirá com a independência esperada, sob pena de perder pontos na corrida para o eventual segundo mandato." [29]

Por sua vez, há quem defenda que o Chefe do Ministério Público da União deveria ser escolhido diretamente entre os próprios membros da classe. Tal sistema é temerário no que toca à legitimidade para atuação do Procurador-Geral. Corre-se, com ele, o grave risco de, legislativamente, verem-se perdidas funções instituições, que, pouco a pouco, seriam transferidas a outras instituições de cunho popular, como Comissões Parlamentares de Inquéritos, Ouvidorias eleitas pelo povo, júris populares etc. Deve-se buscar um ponto de equilíbrio entre a independência funcional da Instituição e a sua legitimidade. Assim, vale salientar a enfática análise de Antônio Augusto Mello de Camargo Ferraz e Paulo Roberto Dias Júnior: "Por essa razão, corre o Ministério Público – e, mais ainda do que ele, o Judiciário –, por insuficiência ou por falta de mecanismos adequados, o risco de viver permanente e invencível crise de legitimidade, a qual, paradoxalmente tende a se agravar na medida em que maior se tornar a relevância concreta de sua atuação. (...) Sob certo ângulo, o Ministério Público precisa ainda mais do que o Judiciário dessa legitimidade, pois não é (nem pretende ser) órgão imparcial e inerte, mas instituição ativa, agente, comprometida direta e exclusivamente com a defesa dos interesses da sociedade. (...) Vale enfatizar: perdendo todos os fios condutores com a sociedade, o Ministério Público não seria visto como instituição, mas como autêntica corporação, aquela que, na aguda observação de Hugo Nigro Mazzilli, passa a ‘viver precipuamente para suas atividades-meio, em vez de viver para suas atividades-fins [30]".

Outros há que optam pelo modelo da eleição direta, com a escolha do chefe de um órgão técnico sendo realizada pelos próprios cidadãos, no exercício do sufrágio universal. Pensamos haver um sério risco ao correto andamento das funções institucionais da corporação ministerial com tal adoção, baseada em conhecido modelo norte-americano. Mazzilli preconiza: "...os candidatos a Procurador-Geral poderiam assumir na campanha compromissos irrealizáveis, quando, na verdade, não depende deles toda a execução da atuação do Ministério Público, dada a independência funcional de cada membro da instituição. A tendência seria que os Procuradores-Gerais procurassem impor à instituição seus planos e projetos de campanha, com riscos à independência funcional dos Promotores, que, a bem da verdade, são hoje muito mais independentes e fazem muito mais o ofício de Ministério Público que os próprios Procuradores-Gerais" [31].

Inobstante as variegadas opiniões, a tendência do constituinte derivado é a escolha pelo sistema da lista tríplice, junto à posterior indicação do Presidente da República. No Projeto de Emenda Constitucional que cuida da afamada Reforma do Judiciário [32], introduziu-se modificação no §1° do art. 128 da CF. Diz ele, se for aprovado, que o Procurador-Geral da República será "escolhido pelo Presidente da República em lista tríplice de integrantes do Ministério Público Federal maiores de trinta e cinco anos e com mais de dez anos de carreira, eleitos por seus membros, e nomeado após aprovação da maioria absoluta do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida uma recondução".

Enfim, o mais importante para o Ministério Público é a diuturna busca pela sua independência e autonomia; e esta busca passará inelutavelmente pelo sistema de escolha do Procurador-Geral da República, que necessita ser modificado. Do contrário, com subordinação política externa, limitando seus poderes e sua autonomia, e com ostensiva manipulação política dos demais Poderes, certamente, os membros ministeriais atuarão menos em nome da sociedade que os legitima que em nome da autoridade que os nomeia, por estarem minudentemente preocupados com a repercussão política de suas decisões.

Sobre o autor
Victor Roberto Corrêa de Souza

Servidor Público Federal na Procuradoria Regional da República - 5ª Região – em Recife/PE

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Victor Roberto Corrêa. Ministério Público:: questões polêmicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 229, 22 fev. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4866. Acesso em: 22 dez. 2024.

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