4.Conclusão
A licitação foi introduzida no Brasil há mais de cento e trinta anos, somente sendo sistematizada através do Decreto-Lei nº 200/67. Posteriormente, o Decreto-lei nº 2.300, de 21.11.86, atualizado em 1987, pelos Decretos-lei 2.348 e 2.360, instituiu, pela primeira vez, o Estatuto Jurídico das Licitações e Contratos Administrativos, reunindo normas gerais e especiais relacionadas à matéria, tendo sido substituído pela Lei nº 8.666/93, em vigor atualmente.
A Constituição Federal promulgada em 1988 conferiu à licitação status de princípio constitucional, de observância obrigatória pela Administração Pública direta e indireta de todos os poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
A licitação foi concebida como procedimento prévio à celebração dos contratos pela Administração, objetivando, em especial, assegurar a impessoalidade do administrador na busca da contratação mais vantajosa para a Administração, e conferir igualdade de tratamento aos administrados que com ela quiserem contratar.
O pregão surgiu em um momento de reestruturação do Estado, que deixou de ser um "Estado Executor" para passar a ser um "Estado Regulador". Esta reestruturação trouxe uma cobrança por uma maior eficiência do serviço prestado pelo Estado, bem como a necessidade de diminuição dos gastos públicos.
Assim, o pregão foi concebido para permitir à Administração atender às suas necessidades mais simples, de modo mais rápido e econômico. A rapidez e a economia proporcionadas pela utilização do pregão advém de características próprias desta modalidade, como a inversão da fase de habilitação, a simplificação do procedimento e a possibilidade de lances verbais, não previstas para as demais modalidades.
Outra novidade do pregão diz respeito à inexistência de restrição quanto ao valor do futuro contrato para fins de escolha da modalidade.
A dificuldade consiste na caracterização do objeto como bem ou serviço comum, sendo que a opção pelo agente público pelo pregão deverá ser feita de forma criteriosa, levando-se em consideração as exigências do interesse público, a natureza e as peculiaridades procedimentais do próprio pregão.
Pode-se concluir, a final, que a instituição do pregão como nova modalidade de licitação aponta para uma modernização do sistema de licitação, objetivando conferir à Administração um meio mais eficiente para as contratações e, conseqüentemente, para atingir a finalidade precípua do Estado, que é o atendimento ao interesse público.
NOTAS
01. Helio Saul Mileski, citando Darcy Azambuja, define Estado como "a organização político-jurídica de uma sociedade para realizar o bem público, com governo próprio e território determinado." (O Controle da gestão Pública, 2003 – p.26)
02. Segundo Sílvio Roberto Seixas Rego "O inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal de 1988 determina que a Administração Pública, aqui em sentido lato, somente poderá contratar obras, serviços, efetuar compras e alienações, através de procedimento licitatório com vistas a obter a proposta mais vantajosa e proporcionar tratamento igualitário entre aqueles interessados em contratar com a Administração. (...) Em breve síntese, no direito positivo privado nacional, os particulares contratam e se obrigam com fundamento na teoria da autonomia da vontade, valendo dizer, contratam aquilo que do seu ponto de vista pareçam-lhes mais vantajoso e que não seja proibido por lei. Assim, o particular pode contratar aquilo que desejar, desde que o objeto de contrato seja lícito. Desse modo, exsurge que a vontade livremente manifestada dos particulares, com algumas exceções, os vinculam aos termos do combinado, ou seja, obrigam-se mutuamente diante do pactuado, cabendo a cada um cumprir com a sua contraprestação. Todavia, diverso ocorre quando o particular contrata com a Administração Pública. Nestes casos, o interessado responde ao chamamento do ente, submetendo-se a condições previamente estabelecidas pelo Edital. Decorre daí que, muito embora a sua vontade também se manifeste, esta manifestação somente se dá no sentido de querer ou não contratar, pois as condições pré-contratuais e da contratação propriamente dita são previamente estipuladas pela Administração. Daí, o porquê, as relações contratuais entre a Administração e o particular (o administrado) são reguladas por normas do Direito Administrativo, valendo dizer, normas do Direito Público onde o interesse do particular sucumbe frente à supremacia e indisponibilidade do interesse público.
Assim, o ente público no exercício da sua função administrativa para contratar, deve convocar, chamar, como regra geral, e a fim de se obter uma maior vantagem, seja técnica ou econômica, a maior quantidade possível de interessados, que atendendo tal chamamento estarão aceitando previamente as condições do contrato estabelecido pelo ente. (Processo licitatório: contraditório e ampla defesa: doutrina e jurisprudência,, 2003, p. 77/78)
03. Para Carlos Ari Sundfeld, "a igualdade de tratamento entre os possíveis interessados é a espinha dorsal da licitação" (Licitação e Contrato Administrativo, 2ª Ed., 1995, p. 20)
04. MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo 13ª Ed, 2002 - p. 25
05. JUSTEN Filho, Marçal. Comentário a Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 9ª Ed., 2002 – p. 18
06. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo – p. 466
07. SUNDFELD, Carlos Ari, Licitação e Contrato Administrativo, 2ª Ed., 1995 – p. 15
08. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 15ª Ed., 2003 - p. 299
09. Conforme Antonio Roque Citadini, " Dois autores estrangeiros são particularmente incisivos quanto à natureza jurídica da licitação. Alcides Greca:"analisando o regime da licitação, a temos definido como um ato condição prévio, sendo sua finalidade estabelecer um rigoroso controle na disposição dos bens do Estado, um tratamento igual para os particulares que comerciam com a Administração Pública e uma eficaz defesa dos interesses coletivos". E José Roberto Dromi: "a licitação pública é um procedimento administrativo preparatório da vontade contratual. Esta é sua natureza jurídica." (Comentários e Jurisprudência sobre a Lei de Licitações Públicas. p. 35)
10. Conforme Sílvio Roberto Seixas Rego, "Normas são preceitos jurídicos que tutelam situações subjetivas, reconhecendo a pessoas ou entidades, a faculdade de realizar certos interesses por ato próprio, ou exigindo ação, ou abstenção de outrem, como também vinculam pessoas ou entidades à obrigação de realizar uma prestação, ação ou abstenção em favor de outrem. Para J.J. Gomes Canotilho, "uma norma vincula um sujeito em termos objectivos quando fundamenta deveres que não estão em relação com qualquer titular concreto" Já os princípios, segundo o renomado autor: "são normas que exigem a realização de algo, da melhor forma possível, de acordo com as possibilidades fácticas e jurídicas. Os princípios não proíbem, permitem ou exigem algo em termos de "tudo ou nada"; impõem a optimização de um direito ou de um bem jurídico, tendo em conta a "reserva do possível", fáctica ou jurídica". (Processo licitatório: contraditório e ampla defesa: doutrina e jurisprudência São Paulo: EDIPRO, 2003–p. 60/61)
11. Neste sentido decidiu o STF : "Ação direta de Inconstitucionalidade – Lei nº 147, de 18 de abril de 1990, do Estado do Tocantins, que estabelece normas para venda de lotes e moradias, no perímetro urbano, independentemente de licitação, a servidores da administração pública estadual e de outras entidades – Alegada ofensa ao art. 37, XXI, da Constituição Federal – Suspensão cautelar de sua eficácia. Normas que se afiguram violadoras do princípio da licitação, assegurador da moralidade dos atos administrativos e do tratamento isonômico que é devido aos que contratam com o Poder Público. Concorrência manifesta dos requisitos da relevância da questão jurídica e do periculum in mora. Cautelar deferida." (STF – ADIMC 651 – TO – T.P. – rel. Min. Ilmar Galvão – DJU 28.8.1992).
12. REGO, Roberto Seixas. Processo licitatório: contraditório e ampla defesa: doutrina e jurisprudência, p. 63
13. Para José Eduardo Faria, a globalização impôs " um inédito processo de superação das restrições de espaço pela minimização das limitações de tempo, graças ao vertiginoso aumento da capacidade de tratamento instantâneo de um gigantesco volume de informações; a um fenômeno complexo e intenso de interações transnacionais, onde a empresa privada progressivamente substituiu o stado como ator principal, criando algo qualitativamente diferenciado de quase tudo o que se teve até agora em matéria de ordenação sócio-econômica e de regulação político-jurídica; à avassaladora dimensão alcançada pelos movimentos transnacionais de capital, especialmente o financeiro; e à formação de uma hierarquia dinâmica de acesso e trocas desiguais entre os fatores de produção, com amplitude mundial" (O Direito na Era Globalizada, p. 62)
14. Para Luiz Carlos Bresser-Pereira, "o desenvolvimento é um processo de transformação econômica, política e social, através do qual o crescimento do padrão de vida da população tende a tornar-se automático e autônomo. Trata-se de um processo social global, em que as estruturas econômicas, políticas e sociais de um país sofrem contínuas e profundas transformações." (Desenvolvimento e Crise no Brasil: história, economia e política de Getúlio Vargas a Lula. 5ª Ed., 2003 – p. 31)
15. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 9. Ed., 1979, p. 157.
16. BAPTISTA, Patrícia. Transformações do Direito Administrativo. p. 297/299
17. BORGES, Alice Gonzalez. Inovações nas licitações e seus aspectos constitucionais. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ – Centro de Atualização Jurídica, v. I, nº 3, junho, 2001– p. 04
18. Sobre o assunto anota Jessé Torres Pereira Junior: " Pena que a inversão seja privativa do pregão. O que se pretendia provocar era o estudo sobre a possibilidade de introduzi-la no rito procedimental de todas as modalidades de licitação, do tipo "menor preço", o que demandaria reforma da estrutura traçada na Lei nº 8.666/93. O tema decerto que comporta evolução" (Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública. 6ª ed. 2003 – p. 1001)
19. BORGES, Alice Gonzalez. O pregão criado pela MP 2026/00: breves reflexões e aspectos polêmico. In Jus Navegandi, Teresina, a. 4, n. 43, jul. 2000.
20. Segundo Hely Lopes Meirelles, "nos Estados medievais da Europa usou-se o sistema denominado "vela e pregão", que consistia em apregoar-se a obra desejada, e, enquanto ardia uma vela os construtores interessados faziam sua ofertas. Quando extinguia a chama adjudicava-se a obra a quem houvesse oferecido o melhor preço. Reminiscência desse sistema medieval é a modalidade de licitação italiana denominada "estinzione di candela vergine", em que as ofertas são feitas verbalmente enquanto se acendem três velas, uma após a outra. Extinta a última sem nenhum lance, a licitação é declarada deserta; caso contrário, acende-se uma quarta vela e assim sucessivamente, pois, para que se possa adjudicar o objeto do certame, é obrigatório que uma vela tenha ardido por inteiro sem nenhum lance superior precedente" (Licitação e Contrato Administrativo. 13ª Ed., 2002, p. 27 )
21. Apesar do pregão ter sido instituído em 1997, segundo Carlos Pinto Coelho Motta "já em 1592, nas Ordenações Filipinas, observava-se a preocupação de "em fazendo obra, primeiro andar em pregão, para se dar a empreitada a quem houver de fazer melhor e por menos preços" ( Eficácia nas Licitações e Contratos 9ª Ed. 2002 – p. 23)
22. SCARPINELLA, Vera. Licitação na Modalidade de Pregão. São Paulo: Malheiros, 2003 – p. 37
23. JUSTEN Filho, Marçal. Pregão (comentários à legislação do pregão comum e eletrônico). São Paulo : Dialética, 2001 – p. 16
24. BORGES, Alice Gonzalez. Inovações nas licitações e seus aspectos constitucionais. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ – Centro de Atualização Jurídica, v. I, nº 3, junho, 2001– p. 13
25. SCARPINELLA, Vera. Licitação na Modalidade de Pregão, 2003 – p. 65
26. Como bem ressalta José dos Santos Carvalho Filho, "a lei fala impropriamente em aquisição de bens e serviços comuns. Bens são realmente adquiridos, mas serviços, sendo atividades, são tecnicamente contratados" (Manual de Direito Administrativo, 8ª ed., p. 231)
27. Esta situação foi apontada pelo próprio Tribunal de Contas da União. Na decisão 165/2003 (Plenário, DOU de 17/03/2003), o Ministro Relator Benjamim Zymler salientou, expressamente, a dificuldade na conceituação dos bens e serviços comuns: " 18.No caso concreto, verifico que a questão jurídica subjacente aos fatos arrolados não se apresenta de fácil solução. Diversas dúvidas razoáveis se apresentam na aplicação das normas referentes ao pregão para a aquisição dos produtos objeto da licitação sob comento. Discute-se se o Decreto mencionado seria aplicável a empresa pública, regida por normas de direito privado. Ainda que fosse, surge a questão de poder o Decreto restringir determinados bens ou produtos, de qualquer natureza, enquadráveis, em tese, no conceito legal de bens e serviços comuns. Além disso, seria desarrazoado considerar os terminais de computadores adquiridos via pregão pela CEF bens comuns. 19.As indagações levantadas não são de fácil solução, nem se apresentam de forma imediata e clara ao administrador. Há razões jurídicas suficientemente fundamentadas para defender mais de uma solução possível. Dessa forma, afasto, de imediato, a culpabilidade dos agentes públicos envolvidos na escolha da modalidade pregão para a aquisição dos bens questionados pela Unidade Técnica. Sendo a responsabilidade, para fins de punição administrativa, de natureza subjetiva, afastada a culpabilidade do agente, não há fundamento para aplicação de multa pelo Tribunal. "
28. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 8ª ed., p. 231
29. JUSTEN Filho, Marçal. Pregão (comentários à legislação do pregão comum e eletrônico)., 2001, p. 20
30. JUSTEN Filho, Marçal, ob cit. P. 19
31. PEREIRA Junior, Jessé Torres. Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública. 6ª ed., 2003 – p. 1006
32. PERIN, Armando Moutinho. Pregão: breves considerações sobre a nova modalidade de licitação, na forma presencial. In Interesse Público, Ano 5, nº 18, março/abril de 2003. Porto Alegre: Notadez, 2003, p. 174
33. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 28ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 39
34. BERLOFFA, Ricardo Ribas da Costa. A Nova Modalidade de Licitação : Pregão., 2002, p. 33
35. SCARPINELLA, Vera. Licitação na Modalidade de Pregão, 2003 – p. 81
36. JUSTEN Filho, Marçal. Pregão (comentários à legislação do pregão comum e eletrônico 2ª Ed.., 2003, p. 30
37. JUSTEN Filho, Marçal. Pregão (comentários à legislação do pregão comum e eletrônico 2ª Ed.., 2003, p. 32
38. MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo 13ª Ed, 2002 - p. 97
39. Acórdão 615/2003 – Primeira Câmara, Min. Relator Humberto Guimarães Souto, DOU 09/04/2003
No mesmo sentido cabe mencionar as decisões 343/2002 (Plenário, Min. Relator Adylson Motta, j. 10.4.2002) e 384/2002 (Plenário, Min. Relator Adylson Motta, DOU 26/04/2002)
40. SCARPINELLA, Vera. Licitação na Modalidade de Pregão, 2003 – p. 167
41. MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo 13ª Ed, 2002 - p. 97
42. JUSTEN Filho, Marçal. Pregão (comentários à legislação do pregão comum e eletrônico 2ª Ed.., 2003, p. 42
43. idem, p. 43