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Genoma humano:

um bem jurídico-ambiental

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Agenda 25/04/2004 às 00:00

3. A concepção de meio ambiente e a localização jurídica do genoma humano

A visão antropocêntrica alargada acerca da relação homem-natureza, com algumas de suas características já relatadas [44], possibilita que se respalde uma noção holística de meio ambiente [45], medida que se mostra imprescindível para que se efetue uma adequada tutela jurídica do bem "genoma humano".

A noção de profunda interação entre homem e natureza (e principalmente a compreensão de que aquele está impossibilitado de sobreviver sem o equilíbrio deste), atinge, como se pretende demonstrar, algumas formulações recentes (que assimilaram a idéia aqui exposta) acerca do meio ambiente e de todo o seu patrimônio natural (composto também, pelo elemento humano) – embora essas posições não se exteriorizem de maneira muito clara, no tratamento jurídico conferido ao genoma humano.

Justifica-se, portanto, a análise a título exemplificativo, de um segmento da doutrina nacional de direito ambiental, bem como do tratamento por ela conferido ao genoma humano, a fim de serem fixados parâmetros teóricos, que concomitantes com as referências normativas encontradas em nossa ordem jurídica interna, posteriormente analisadas [46], possibilitarão que se confira uma adequada tutela dessa "nova" realidade que está a reclamar efetiva proteção: o genoma humano.

3.1 As concepções de meio ambiente encontradas na doutrina de direito ambiental

Inicialmente, relata-se o tratamento conferido por Celso Antônio Pacheco FIORILLO, ao conceito de meio ambiente [47]. Sem se lançar a conceituar doutrinariamente o elemento aqui em estudo, o autor se vale de definições juridicamente positivadas de meio ambiente, lançando mão, tanto da lei que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6938/81 [48]), como da Constituição Federal de 1988. Apesar de concluir que "a definição de meio ambiente é ampla, devendo-se observar que o legislador optou por trazer um conceito jurídico indeterminado, a fim de criar um espaço positivo de incidência da norma" [49], esse autor não engloba o patrimônio genético entre os bens integrados pela divisão proposta de ‘meio ambiente natural’, como faz com o solo, água, ar atmosférico, flora e fauna. Deixa para tratar, em capítulo autônomo do patrimônio genético (Capítulo XVII), e apenas se refere aos genes humanos, como tradução "da imagem científica dos seres humanos, constituindo a ‘alma bioquímica do homem’ e integrando um dos direitos da personalidade" [50] (cuja proteção estaria resguardada pelo art. 5º. X, da CF).

José Afonso da SILVA, conceitua meio ambiente, como sendo a "interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas" [51], fazendo a ressalva de que esta indicação dividida em três aspectos "apenas revela um visão jurídica, fundada no fato de que estão sujeitos a regimes jurídicos distintos" [52] (o que demonstra a utilização de uma concepção unitária e ampla de meio ambiente). Mas a despeito de tratar do patrimônio genético em capítulo destinado às "provisões constitucionais sobre a conservação ecológica", não engloba o genoma humano no rol dos bens abrangidos pelo chamado "meio ambiente natural", quando afirma que "O conceito de meio ambiente há de ser... abrangente de toda a Natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e arqueológico" [53] (sublinhou-se).

Já Edis MILARÉ, sem defini-lo, mas demonstrando também uma forte assimilação de uma noção ampla de meio ambiente [54], procede a um detalhamento desse objeto: "de um lado com o meio ambiente natural, ou físico, constituído pelo solo, pela água, pelo ar, pela energia, pela fauna e pela flora; e, de outro, com o meio ambiente artificial (ou humano), formado pelas edificações..." [55] (sublinhou-se). Como se pôde observar, também não há a inclusão dos genes (muito menos os do conjunto humano) no âmbito do meio ambiente natural (apesar dele tratar, em seção titulada "Biodiversidade e Patrimônio Genético", divisão do capítulo "Patrimônio Ambiental Natural"), nem passa a tratar diretamente dessa realidade quando qualificada pelo elemento humano.

De Paulo Affonso Leme MACHADO, também se infere um posicionamento consentâneo com as novas necessidades sócio-ambientais, a partir do tratamento que dispensa aos vocábulos ‘meio’ e ‘ambiente’ - diz que entre os seus significados encontramos ‘meio em que vivemos’ [56] – bem como do conceito de direito ambiental, para quem este ramo do direito "é um direito sistematizador, que faz a articulação da legislação, da doutrina e da jurisprudência, concernentes aos elementos que integram o ambiente. Procura evitar o isolamento dos temas ambientais e sua abordagem antagônica". [57] (sublinhou-se). Ainda que também não insira o genoma humano no âmbito de classificação do meio ambiente natural, dele trata, em capítulo à parte (Título XIV - Engenharia genética e meio ambiente – aspectos jurídicos) quando se reporta à lei 8974/95 [58], que veda certas intervenções no material genético humano.

Paulo de Bessa ANTUNES, é amplo ao construir o conceito de meio ambiente: "é um conjunto de ações, circunstâncias, de origem culturais, sociais, físicas, naturais e econômicas que envolvem o homem e todas as formas de vida" [59]. Conquanto tenha tratado do assunto patrimônio genético, o faz nas subdivisões da "Quarta Parte: Proteção Ambiental" do seu Direito do Ambiente, no Capítulo 17, titulado "Engenharia genética e meio ambiente", o que não demonstra uma inclinação para realmente tratar do elemento genoma humano como elemento integrante do patrimônio ambiental natural. Conclusão essa que pode ser defendida, quando se analisa outra obra sua, em que afirma que "...o legislador constituinte entendeu que a conservação do patrimônio genético, é, reflexamente, uma questão ambiental" [60] (sublinhou-se).

Vale ressaltar que a doutrina também tem como base, os conceitos jurídicos extraídos do nossa ordem normativa, que também deverão ser analisados para que se possa aferir se realmente há suporte normativo (uma vez que teórico, pretendeu-se ter demonstrado) suficiente para sustentar uma inserção do genoma humano na noção de bem integrante do meio ambiente natural.

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3.2 A concepção de meio ambiente positivada no ordenamento jurídico brasileiro

O legislador infraconstitucional se lançou a conceituar ‘meio ambiente’, por intermédio da Lei 6938/81, que estatuiu a Política Nacional do Meio Ambiente. In verbis:

"Art. 3o. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

I – meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida, em todas as suas formas;" (sublinhou-se).

Como se observa, a definição legal é ampla – respaldada por uma noção holística de meio ambiente [61] – apesar de não estarem englobados outros elementos importantes que compõem o meio ambiente, como o fez a Constituição Federal de 1988, tais como o artificial, o cultural e do trabalho [62].

Com o advento da Constituição Federal de 1988, houve uma ampliação do âmbito de proteção do meio ambiente, com a inserção de novos elementos à noção trazida pela Lei 6938/81 [63]. Segundo dispositivo da Carta Política,

"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações" (sublinhou-se).

Portanto, as fronteiras regulamentares do meio ambiente (bem como de seus componentes) e de sua concepção no direito brasileiro apenas serão adequadamente percebidas, se houver uma coordenação entre a normatividade instituída em sede infraconstitucional e a tutela concebida constitucionalmente.

Desse sistema normativo, que tem por finalidade a proteção do meio ambiente, é que se pode extrair um significado desse bem: "o legislador acabou retratando em sua concepção de meio ambiente, não apenas a idéia de espaço, de simples ambiente, mas, pelo contrário, vai além, para significar, ainda, o conjunto de relações (físicas, químicas e biológicas) entre os fatores vivos (bióticos) e não vivos (abióticos) ocorrentes nesse ambiente e que são responsáveis pela manutenção, abrigo e regência de todas as formas de vida existentes nesse ambiente.... proteger o meio ambiente significa proteger o espaço, o lugar, o recinto que abriga, que permite e que conserva todas as formas de vida" [64] (sublinhou-se). Mas esse espaço é exatamente o resultante da combinação, relação e interação de diversos fatores que o constituem e a ele pertencem: os elementos bióticos e abióticos.

O texto constitucional, no já referido art. 225, determina que "todos têm direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida...", de modo que resta claro que o direito reconhecido pela Constituição a todos, refere-se a um meio ambiente "ecologicamente equilibrado". Portanto, o "equilíbrio ecológico é exatamente o bem jurídico (imaterial) que constitui o objeto do direito a que alude o texto constitucional" [65]. E como o meio ambiente ecologicamente equilibrado é formado por um conjunto de interações entre fatores bióticos e abióticos, sem dúvida alguma que a proteção desses elementos legitima-se como forma de se proceder a uma proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Nesse sentido RODRIGUES se manifesta, afirmando que se protegem os elementos bióticos e abióticos e sua respectiva interação, para se atingir o resguardo do meio ambiente ecologicamente equilibrado, justamente porque esse bem é responsável pela conservação de todas as formas de vida [66].

Não é, como visto, qualquer meio ambiente que se decidiu tutelar normativamente, mas sim o meio ambiente "ecologicamente equilibrado". E esse bem é o produto da inter-relação de seus componentes (bióticos e abióticos), o que nos leva a concluir que a noção positivada de meio ambiente compreende seus elementos e suas relações.

E entre seus elementos, encontra-se sem dúvida alguma, o genoma humano, uma vez que estatui a Constituição Federal (art. 225, parágrafo 1º.), que "para assegurar a efetividade desse direito [meio ambiente ecologicamente equilibrado], incumbe ao Poder Público:... II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético." Situação jurídica que só vem a explicitar e recepcionar o que já vinha consagrado infraconstitucionalmente (mas não vislumbrado pela doutrina, até por conta de ter o início das pesquisas com os patrimônios genéticos ocorrido recentemente) por intermédio da já referida Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, segundo a qual se deve entender por meio ambiente "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida, em todas as suas formas." (art. 3º, I).


4. Regime jurídico incidente sobre o genoma humano

Já tendo sido estabelecido, a partir de um novo panorama existente acerca da relação homem-natureza, uma noção ampla de meio ambiente – já encontrada no tratamento doutrinário conferido ao tema, bem como localizada no próprio ordenamento jurídico nacional – resta proceder à análise da normatividade incidente sobre esse elemento integrante do meio ambiente.

Deve-se, para tanto, levar em consideração a dúplice característica que envolve o genoma: de uma lado, o genoma humano possui como característica, efetuar a diferenciação dos seres humanos – realçando suas conotações individuais; de outro lado, é exatamente o elemento responsável pela identificação do homem considerado enquanto espécie – momento em que aflora sua faceta comunitária.

Essa diferenciação de funções do genoma (ao mesmo tempo é o que distingue e o que une) acaba desencadeando uma incidência normativa distinta, quando se considera um, ou outro aspecto específico – ambos tutelados pelo direito e tendo como fulcro o princípio da dignidade humana e a normatividade dos direitos fundamentais. É o que se passa a analisar.

4.1 Normas de direitos da personalidade

Para efeito de delimitação do tema, podemos nos servir da afirmação de BITTAR, segundo o qual "consideram-se como da personalidade os direitos reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade, previstos no ordenamento jurídico exatamente para a defesa de valores inatos no homem, como a vida, a higidez física, a intimidade, a honra, a intelectualidade e outros tantos" (sublinhou-se) [67].

É a mais clássica maneira de ser observada essa espécie de direito, sendo apreciado sob o prisma das relações privadas [68]. Objetiva-se, por meio do reconhecimento [69] dessa gama de direitos, a possibilidade de proteção da esfera mais íntima dos indivíduos, traduzida no aspecto físico (o direito à vida e ao próprio corpo), no aspecto intelectual (o direito à liberdade de pensamento, direito de autor e de inventor) e no aspecto moral (o direito à liberdade, à honra, ao recato, ao segredo, à imagem, à identidade e ainda o direito de exigir de terceiros o respeito a esses direitos) [70].

Justifica-se a incidência dessas normas sobre o genoma humano, enquanto elemento integrante de determinado indivíduo, uma vez que esse objeto de uma das maiores descobertas científicas do séc. XX, é constituído por um conjunto de genes responsáveis por conterem milhares de informações singularizantes desse indivíduo. Atribui-se, portanto, a ele próprio, a possibilidade de gerir, de decidir acerca e permitir a atuação sobre essas informações (e sobre seus genes), possibilitando ou não o acesso a elas por quem quer que seja – Estado ou particulares. "Nos próprios termos do art. 5º da Declaração [71], cada sujeito é colocado na condição de titular de direito sobre o genoma, sendo-lhe exigido, inclusive, o consentimento informado para permitir o acesso a esse bem" [72].

O embasamento constitucional para essa proteção, encontra-se no Título II da Constituição Federal de 1988, que alude aos direitos e garantias fundamentais. O art. 5º. inciso X, determina que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação" (sublinhou-se).

Entre os aspectos estabelecidos nesse dispositivo, o que diretamente pode ser vinculado à proteção do genoma humano, é exatamente a intimidade, que "consubstancia-se em mecanismo de defesa da personalidade humana, contra injunções, indiscrições ou intromissões alheias" [73], cujo alcance se encontra na possibilidade de a pessoa não desejar que certos aspectos da sua personalidade cheguem ao conhecimento de terceiros [74].

Mas a despeito de esse panorama estar contaminado por um alto grau de disponibilidade [75], (76), há características singularizantes que podem ser observadas quando se está a analisar o genoma humano. Uma delas é a possibilidade de os efeitos dessa declaração individual, poderem atingir a esfera de outros sujeitos, "uma vez que o genoma, nos termos da própria Declaração [Universal sobre Genoma Humano e Direitos Humanos] (art. 1º.), "subjaz à unidade fundamental da família humana e também ao reconhecimento de sua dignidade e diversidade inerentes". Seu acesso, ainda que consentido por um só indivíduo, pode pôr em risco a biodiversidade e a sobrevivência da própria espécie [77]. E esse aspecto pode ser adequadamente tutelado, quando se estabelecer, por premissa, que o homem pertence a determinada comunidade biológica (espécie humana), que compreende uma das espécies que encontram guarida no meio ambiente.

4.2 Normas de direito ambiental

A partir de uma concepção holística de meio ambiente (utilizado pela doutrina e positivado no direito brasileiro), pode-se localizar o genoma humano como bem integrante do patrimônio ambiental natural, a fim de se proceder a uma tutela mais completa desse bem – abarcando também as situações em que o genoma não pode ser considerado simplesmente como um elemento pertencente a apenas um indivíduo, por conter informações que também dizem respeito ao restante da espécie humana.

O art. 1º. da Declaração Universal sobre Genoma e Direitos Humanos, como já referido, define o genoma humano como "unidade fundamental de todos os membros da família humana", panorama que serve de pano de fundo para que se vislumbre a presença de uma dimensão universal nessa definição, em que a referência aos direitos fundamentais valorizam a ‘lógica da comunidade’, calcada na unidade da espécie humana [78].

Desse modo, pode-se justificar uma tutela do genoma humano – no que concerne aos seus aspectos referentes a toda a humanidade – a fim de se defender toda a espécie humana de, por exemplo, pesquisas ou intervenções científicas que venham a ser efetuadas nesse bem, de modo inadequado, ou com duvidosa necessidade. Esse bem, com isso, resta contemplado pela noção de interesse difuso (que corresponde ao interesse transindividual, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato, segundo a Lei 8078/90 [79], art. 81, parágrafo único, I), decorrente da identidade biológica, natural, presente entre as pessoas. Este cenário normativo vem a reafirmar a condição de bem integrante do patrimônio ambiental natural do genoma humano, propiciando a incidência das normas de direito ambiental, uma vez que estas possuem por objetivo, a manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado (protegendo, para tanto, todos os elementos do meio ambiente - dentre eles o genoma humano).

Como a ‘dimensão biológica’ do sujeito é ressaltada, o homem acaba sendo requalificado, como fonte elementar do genoma, na comunidade humana e, em razão disso, passa a ter ampliada sua proteção pelos direitos fundamentais [80].

O que se pretende, com essa ampliação, é justamente conferir uma maior proteção ao ser humano – só que a partir de um dos seus aspectos naturais: o genoma – e não reduzí-lo apenas a um aspecto biológico. Atribuindo-se, portanto, um mínimo normativo ao ser humano (relacionado a uma das faces dos direitos fundamentais, especificamente a normatividade decorrente da sistematização do direito ambiental [81], (82)), pode-se tutelá-lo sem se correr o risco de que um eventual consentimento individual possa se tornar óbice a um completo e adequado tratamento de um dos elementos naturais que compõem toda a espécie humana e por conseguinte, o meio ambiente.

Vislumbra-se por exemplo, a partir desse panorama de incidência normativa aqui desenhado, a possibilidade de se submeter qualquer atividade científica que possua como objeto de investigação o genoma humano por ser um elemento integrante do meio ambiente, ao princípio da precaução (tão difundido em matéria ambiental). Segundo o Princípio 15 da Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992, "De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas possibilidades. Quando houver ameaças de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental". Caracteriza-se esse princípio pela ação antecipada diante do risco ou do perigo. Paulo Affonso Leme Machado, ensina-nos que "A implementação do princípio da precaução não tem por finalidade imobilizar as atividades humanas. (...). O princípio da precaução visa à durabilidade da sadia qualidade de vida das gerações humanas e à continuidade da natureza existente no planeta" [83]. Desse modo, torna-se possível se exigir que pesquisadores que se proponham a manipular o genoma humano não se utilizem do argumento da falta de certeza científica sobre as conseqüências danosas de suas atividades à espécie humana, para não tomarem as medidas preventivas que se façam necessárias.

Inserindo-se o genoma humano na categoria de bem integrante do patrimônio ambiental natural, também se promove um alargamento das possibilidades de atuação direta dos cidadãos no controle das atividades de pesquisa de entidades públicas ou privadas sobre o material genético humano. A Ação Popular passa a ser um instrumento judicial idôneo a tutelar essa nova realidade, haja vista o art. 5º, inciso LXXIII da Constituição Federal de 1988, que reza que "qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente...".

A normatividade ambiental, incidindo sobre o genoma humano, respeitadas suas especificidades e seus limites, torna-se uma fonte potencial importante de regulação complementar do bem objeto central desse trabalho.

Sobre o autor
Markian Kalinoski

Advogado em Curitiba/PR, bacharel pela faculdade de Direito da UFPR.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KALINOSKI, Markian. Genoma humano:: um bem jurídico-ambiental. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 292, 25 abr. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5057. Acesso em: 15 nov. 2024.

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