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Os bancos privados querem o FGTS

Agenda 29/07/2016 às 10:42

O texto a seguir traz um retrato do que foi e o que poderá ser o FGTS, diante dos interesses atuais dos banqueiros do país.

De há muito se sabe que é uma história mal contada a fusão entre o BNH e a CEF há cerca de trinta anos. Queriam os polpudos recursos do FGTS. E conseguiram.

Desde aquela época o sistema financeiro da habitação, que oxigenava a construção de casas populares com o dinheiro do FGTS não foi mais o mesmo. Lembrem-se do número de conjuntos habitacionais que foram criados com casas e infraestrutura edificadas com recursos do FGTS. O próprio trabalhador financiou, com seus recursos do trabalho diário, a construção de milhares de moradias em todo o país.

Realmente, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço é um fundo privado, um patrimônio do trabalhador, que deve ser gerido com rentabilidade a permitir o acesso à casa própria a quem trabalha e não pode ser usado em fundo perdido, sem retorno.

Os recursos do FGTS não podem servir para assistencialismo.

Não se pode conceber doação de dinheiro do FGTS, pois isso é usar dinheiro que é do trabalhador e para ele deve servir.

É o Fundo de Garantia de Serviço um feixe de direitos e obrigações tendo como sujeitos ativos e passivos os trabalhadores, a Caixa Econômica Federal, os bancos depositários ou recebedores, as empresas e o Tesouro Nacional. Uma verdadeira garantia de caráter institucional, dotada de âmbito de proteção marcantemente normativo.

Os trabalhadores têm direito ao depósito mensal de 8% da sua remuneração na conta vinculada; a União tem o direito de aplicar multas às empresas inadimplentes; o Agente Operador faz jus à remuneração dos serviços que presta ao Fundo.

Estabelecia-se um regime de opção, com a Lei 5.107, de 13 de setembro de 1966, que criou o FGTS, com outro regime que era o da CLT, que possibilitava o direito à estabilidade, a teor do artigo 492. Essa Lei, além de manter a estabilidade prevista na Consolidação das Leis do Trabalho, permitia que os empregados optassem pelo novo regime, que foi ali instituído. Esse diploma legal entrou em vigor em 1º de janeiro de 1967.

A estabilidade, conforme ensinava José Martins Catharino, "é meio de valorização do trabalho como condição da dignidade humana. É forma de repressão ao abuso do poder econômico e instrumento para que a propriedade tenha função social, sendo que a mesma justifica a desapropriação por utilidade pública ou social e também justifica a subtração do direito de despedir" (in "Estabilidade e Fundo de Garantia"- Simpósio promovido pelo Instituto de Direito Social - p. 161).

Para Eduardo Gabriel Saad (Comentários à Lei do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, 1991, pág. 363), as contribuições previdenciárias como as contribuições ao FGTS são espécies do gênero contribuições sociais. No entanto, para o Ministro Sidney Sanches, o FGTS não é tributo, mas direito social do empregado, garantido pela Constituição Federal e foi regulado pelo artigo 20 da Lei 5.107/66. Nesse último entendimento, o FGTS tem natureza trabalhista e social, não se aplicando as normas de prescrição e decadência relativas aos tributos (RE 100.249, Relator designado Ministro Néri da Silveira).

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Agora os neoliberais e seus grandes mosqueteiros, os banqueiros, estão de olho no FGTS.

Com saldo de mais de R$ 300 bilhões, o FGTS, administrado pela Caixa Econômica Federal, desperta o apetite de bancos privados. De acordo com fontes do setor, instituições como Santander e Bradesco estão interessadas em quebrar o monopólio da Caixa e, nessa disputa, estariam dispostas a pagar mais pela poupança do trabalhador. Hoje, o dinheiro depositado no Fundo rende 3% ao ano mais Taxa Referencial (TR), que está em 2% no acumulado em 12 meses, abaixo da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), de 9,49% em 12 meses. O indicador mede a variação do custo de vida de famílias com renda de até cinco salários-mínimos, realidade de boa parte dos trabalhadores. Para os bancos, a principal vantagem seria o acesso a uma montanha de recursos, considerada estável, que lhes permitiria investir em projetos de longo prazo, com retorno atraente. Uma eventual mudança, mesmo que apoiada pelo governo, dependeria do aval do Congresso.

Construtoras elevam número de lançamentos diante de aumento da confiança do consumidor e de estímulos de crédito para a compra da casa própria pela Caixa Econômica Federal, que liberou R$ 16 bilhões.

O número de novos imóveis cresce 24,7%, e o de lançamentos, até 72%.

Alguns especialistas alertam, porém, que uma eventual melhora na remuneração do Fundo poderia comprometer sua missão social. O dinheiro do FGTS é usado para financiar habitação, saneamento e infraestrutura, em geral com taxas abaixo das do mercado. Se os juros para captar recursos sobem, o efeito é uma alta na outra ponta, ou seja, vamos ver uma casa própria cada vez mais cara.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Os bancos privados querem o FGTS. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4776, 29 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/50996. Acesso em: 18 dez. 2024.

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