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Defesa do consumidor: crimes previstos no Código Penal

Agenda 20/09/2016 às 09:25

O presente trabalho versa sobre as infrações penais contra o consumidor. O fato de estas não se encontrarem apenas no Código de Defesa do Consumidor leva o legislador a se preocupar no sentido de não arranhar a legislação penal.

SUMÁRIO

1. Introdução; 2. Evolução dos Direitos do Consumidor; 3. As Infrações Penais contidas no Código de Defesa do Consumidor; 4. Considerações Finais; Referências Bibliográficas.

RESUMO

O presente trabalho versa sobre as infrações penais contra o consumidor. O fato de estas não se encontrarem apenas no Código de Defesa do Consumidor leva o legislador a se preocupar no sentido de não arranhar a legislação penal, tanto a codificada como a extravagante, tendo assim, o objetivo de tipificar condutas ainda não contempladas no caso em discussão.

Pretende-se explanar cada dispositivo que exemplifica os crimes contra o consumidor, e ainda enfatizar a importância do conhecimento por parte desses acerca dos seus diretos, evitando que estes sejam violados nas relações de consumo, bem como analisar se todos esses crimes merecem de fato a tutela penal.

PALAVRAS-CHAVE: Consumidor. Fornecedor. Infrações Penais.

1 INTRODUÇÃO

O artigo tem por objeto de estudos os crimes previstos no Código de Defesa do Consumidor. O trabalho tem início com a evolução dos direitos do consumidor, em um segundo momento trata sobre as infrações penais contidas no CDC, posteriormente adentra na questão da importância do conhecimento dos consumidores a respeito dos seus direitos, e finalmente entra na questão da possível descriminalização de alguns dos dispositivos.

O trabalho teve por base a seguinte problemática: Quais as razões para o legislador ter inserido no Código de Defesa do Consumidor infrações penais? Alguns desses crimes deverão sair da tutela penal e serem tutelados por outras esferas do direito? Para tal problemática levantou-se uma hipótese: Pretendeu-se encontrar uma maneira mais severa de punir aqueles que de alguma forma burlassem a Lei, lesando o consumidor. Entretanto, algumas condutas poderiam ser punidas na esfera cível ou administrativa, são significando que o consumidor estará desprotegido.

A pesquisa encerra-se com as considerações finais acerca do assunto, sendo ainda explanado se a hipótese se confirma, dando conclusão ao trabalho.

2 A EVOLUÇÃO DOS DIREITOS DO CONSUMIDOR

O Direito do Consumidor nasce, desenvolve-se e justifica-se na sociedade de consumo, seu surgimento decorre diretamente da revolução industrial, com o aumento considerável da produção, comercialização, consumo, crédito e comunicação.

Do ponto de vista psicológico, considera-se consumidor o sujeito sobre o qual se estudam as reações a fim de se individualizar os critérios para a produção e as motivações internas que o levam ao consumo. Nesse aspecto, pois, perscruta-se das circunstâncias subjetivas que levam determinado indivíduo ou grupo de indivíduos a ter preferência por este ou aquele tipo de produto ou serviço, preocupando-se com tal aspecto certamente a ciência do Marketing e da publicidade, assumindo especial interesse quando se trata, sobretudo, dos devastadores efeitos dessa, se enganosa ou tendenciosa, diante das modernas e sofisticadas técnicas do mencionado marketing e merchandisting. (FILOMENO, José Geraldo Brito, p. 21)

Segundo Horkheimer e Adorno, Apud Guido Alpa (1977), consumir, pois nesse aspecto, significa ceder sempre às sugestões veiculadas pela publicidade. Significa em última análise, estar sempre de acordo, a fim de que não se rompa o próprio consenso imposto, bem como alienar-se ante a apologia da sociedade de consumo.

Já existiam no antigo “Código de Hamurabi” algumas regras que tinham como objetivo a proteção do consumidor, por exemplo, a Lei nº233obrigava o arquiteto que viesse a construir uma casa cujas paredes se revelassem deficientes, a reconstruí-las ás suas próprias custas, rezava ainda que o cirurgião que “operasse alguém com bisturi de bronze” e lhe causasse a morte por imperícia: indenização cabal e pena capital.

É evidente que de acordo com a evolução da sociedade, o movimento consumerista esteve ao lado dos movimentos que lutaram por melhores condições de trabalho e de poder aquisitivo, bem como por direitos humanos e universais, com maior intensidade a partir da segunda metade do século XIX.

As regras foram sendo aos poucos amoldadas. O Brasil, por exemplo, possui o Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC), com sede em São Paulo, e vem realizando pesquisas com ênfase na questão da qualidade dos produtos de segurança, em razão da incolumidade do consumidor, e vem contribuindo também para que os fornecedores busquem corrigir possíveis vícios dos produtos.

A Constituição Federal de 1988, em seus artigos 5º, inciso XXXII, e 170, V, dizem que dentre os deveres impostos ao Estado brasileiro, está o de promover, na forma da lei, a defesa do consumidor. Tal lei é exatamente o Código de defesa do consumidor, instituído pela Lei número 8.078/90 e veio ampliar os direitos e deveres, construindo um sistema de responsabilidade capaz de transformar aquilo que antes não passava de um mero esboço de proteção contra os abusos praticados no mercado.

No início da década de 90 com o advento do Código de defesa do Consumidor e depois de alguns meses da Lei 8.137/1990 – que veio definir os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo – tínhamos uma sociedade marcada pela ebulição infracionária e caminhando para uma sociedade de consumo que viria a se concretizar depois com o governo FHC e o modelo neoliberal. Era o momento oportuno para começar a tutelar as relações de consumo e a tutela penal desta relação.

A lei 8.137/1990 diz respeito a proteção à ordem econômica, sendo assim mais ampla, enquanto que a Lei 8.078/1990 dispõe sobre a proteção na figura específica do consumidor. Existiu um embaraço legislativo, pois algumas condutas de uma lei foram revogadas pela outra.

O artigo 2º do CDC traz o conceito de consumidor:

Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

Já o artigo 3º do mesmo Código, dispõe sobre o conceito de fornecedor:

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1º Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Tais dispositivos expressam a preocupação do legislador em conceituar de forma ampla e clara quem é consumidor e fornecedor, especificando suas principais características.

O Código de Defesa do Consumidor veio definir os direitos de ambos os participantes das relações de consumo, entretanto, em seu artigo 6º trata especificamente dos direitos básicos do consumidor, procurando assim ser persuasivo ao demonstrar que este é dotado de uma maior vulnerabilidade, seja no aspecto fático, jurídico ou técnico, em regra constituem a parte economicamente mais frágil no âmbito das relações de consumo.

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O artigo 7º do CDC estabelece que:

Art. 7º Os direitos previstos neste código não excluem outros tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, e de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade.

O artigo exposto representa uma evolução tecnológica, tendo em vista que as normas encontram-se em constantes adequações.

É indiscutível que com a transformação da sociedade foi surgindo essa nova forma de relação de compra e venda na qual o consumidor fica em situação vulnerável em detrimento do produto ou serviço. Com o objetivo de impedir tal situação, é que foram estabelecidos regramentos que proporcionam uma proteção a essa parte mais frágil da relação, e com isso reestabelecer o equilíbrio nas relações de consumo.

3 AS INFRAÇÕES PENAIS CONTIDAS NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

As infrações cometidas contra os consumidores são previstas também no Código Penal e em Leis especiais, provocando assim um conflito aparente de normas, e que em observância ao princípio do ne is in dem, apenas uma norma deverá prevalecer, tal conflito é solucionado em decorrência do princípio da especialidade, em que a Lei especial derroga a geral.

É razoável observar que embora por motivos distintos, consumidor e fornecedor possuem o mesmo objetivo no momento da relação de consumo, o primeiro tem o interesse em adquirir determinado bem, e o segundo tem na venda um meio de garantir lucros, a partir de uma disputa com a concorrência. Em razão de tal disputa no mercado, é notória a vulnerabilidade dos consumidores perante a relação travada com o fornecedor e bens de serviço, que muitas vezes desrespeitam os direitos daqueles, seja com um mau serviço, ou com um produto de má qualidade. Por tais motivos, é imprescindível a inserção de normas capazes de punir comportamentos onde a simples indenização cível ou as punições administrativas seriam consideradas ineficazes, dando origem assim às normas penais no âmbito do CDC.

Os crimes arrolados no Código de Defesa do Consumidor têm, como sujeito ativo, o fornecedor, como sujeito passivo, o consumidor e, como objeto especial, o produto ou o serviço. É o Código do Consumidor uma lei especial e em razão dessa circunstância ele prevalece sobre o Código Penal, a lei geral quando houver conflito entre as normas. (SAAD, Eduardo Gabriel, p. 519. 1)

Art. 61. Constituem crimes contra as relações de consumo previstas neste código, sem prejuízo do disposto no Código Penal e leis especiais, as condutas tipificadas nos artigos seguintes.

Fica claro que além das condutas tipificas pelo código, outras do âmbito penal poderão ser utilizadas na relação de consumo, quando houver ações atentatórias aos direitos dos consumidores. Tais normas têm o objetivo de desestimular as infrações ou a reincidência dessas, vale ainda salientar que as penas previstas são para os responsáveis por fraudes na venda de produtos ou prestação de serviços e não para aqueles que agem de acordo com a Lei.

3.1 OMISSÃO DE DIZERES OU SINAIS OSTENSIVOS (ART. 63)

Aduz o artigo 63, CDC:

Art. 63. Omitir dizeres ou sinais ostensivos sobre a nocividade ou periculosidade de produtos, nas embalagens, nos invólucros, recipientes ou publicidade:

Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa.

§ 1º Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de alertar, mediante recomendações escritas, sobre a periculosidade do serviço prestado.

§ 2º Se o crime é culposo:

Pena: Detenção de um a seis meses e multa.

O referido dispositivo em consonância com o art. 9º tem o objetivo de exigir dos fornecedores que informem sobre a periculosidade ou nocividade dos produtos ou serviços, de maneira clara e inequívoca, estando intrinsecamente relacionado aos direitos básicos do consumidor, tais como: A proteção a vida, a saúde e segurança.

Ora, é evidente que o comportamento delituoso é claramente definido pelo verbo omitir, e consiste no fato de alguém, qualquer pessoa tenha a obrigação em questão, deixar de alertar o consumidor, aqui difusamente considerado, dos riscos porventura oferecidos por produtos e serviços colocados no mercado (FILOMENO, José Geraldo Brito, p. 349).

A conduta delituosa anteriormente descrita trata de informações a respeito de substâncias que compõe o produto e possam representar riscos para a integridade física do consumidor. O que deve ser encarado como uma ação omissiva e portanto, o infrator deverá ser punido penalmente.

O artigo mencionado é resguardado pelo princípio da transparência, com o intuito de proteger a coletividade de consumidores. Caberá ao julgador estabelecer em qual medida que produtos devam ser considerados nocivos ou perigosos, em razão do estabelecido no artigo, a merecer a tutela penal.

3.2 A OMISSÃO NA COMUNICAÇÃO ÀS AUTORIDADES COMPETENTES (ART. 64)

Segundo o art. 64, CDC:

Art. 64. Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado:

Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa.

Parágrafo único. Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do mercado, imediatamente quando determinado pela autoridade competente, os produtos nocivos ou perigosos, na forma deste artigo.

Difere do artigo anterior, pois aqui a conduta é outra. Após a colocação no mercado, o fornecedor tem conhecimento, por razões diversas, inclusive defeitos de fabricação, que o produto é perigoso, e tem uma conduta omissa em não comunicar a coletividade dos consumidores e as autoridades tal informação. O Parágrafo único ainda traz outra conduta, quando o produto nocivo não for retirado de acordo com o determinado pela autoridade competente.

É possível perceber que o objetivo aqui é garantir o direito de informações que digam respeito a produtos que venham a apresentar algum problema após o seu lançamento, devendo ser sanado em primeiro lugar pelo responsável e em segundo plano pela autoridade competente.

3.3 EXECUÇÃO DE SERVIÇOS PERIGOSOS (ART, 65)

Reza o artigo 65:

Art. 65. Executar serviço de alto grau de periculosidade, contrariando determinação de autoridade competente:

Pena Detenção de seis meses a dois anos e multa.

Parágrafo único. As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à lesão corporal e à morte.

[...]O mencionado parágrafo único da Lei de proteção ao consumidor pátrio prevê expressamente que as penas se haverão de ser somadas no caso de resultado morte ou lesão corporal às cominadas à simples omissão. E isto porque a figura do art. 65 apenas contempla a forma dolosa na ação de se executar os mencionados serviços – note-se – Já notoriamente perigosos, circunstância tal incontroversa, e já de pleno conhecimento do agente que, mesmo assim as desempenha – contraindo as normas de segurança. E destarte assume também os resultados lesivos que deles possam advir, aliás mais do que presumíveis”. (FILOMENO, José Geraldo Brito, p. 355)

O que se pune aqui é a execução de tais serviços manifestamente perigosos contrariando-se determinações das autoridades competente.

Há uma grande crítica acerca desse artigo, tendo em vista que o Legislador não indica a autoridade competente tampouco qual seria esse serviço de alto grau de periculosidade.

3.4 DOS ABUSOS DA PUBLICIDADE (ART. 66 A 69)

Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços:

Pena - Detenção de três meses a um ano e multa.

§ 1.º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta.

§ 2.º Se o crime é culposo; Pena Detenção de um a seis meses ou multa.

Esse artigo vem tipificar o crime de informação falsa ou enganosa, tendo como objeto jurídico protegido a confiança e a segurança que deverão prevalecer na relação de consumo. O agente poderá agir de forma comissiva, quando afirma ter o seu produto qualidades que na realidade não possui, ou omissiva quando deixa de prestar as informações necessárias a respeito do produto.

Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva:

Pena Detenção de três meses a um ano e multa.

Parágrafo único. (vetado).

Ora, quem deveria saber ou então sabe que determinada publicidade encomendada por dado fornecedor (anunciante) é enganosa ou abusiva, aqui certamente não necessária, ou propriamente mendaz, ou falsa mas exagerada, ou então preconceituosa, escandalosa ou de qualquer forma violentadora dos sentimentos e pudores do público-alvo, como de resto bem definidos pelo “Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária [...] (FILOMENO, José Geraldo Brito, p. 365)

É notório que os fornecedores vêm utilizando diferentes maneiras para divulgarem seus produtos e ou serviços, entretanto, alguns desses abusam da boa-fé dos consumidores e prestam informações não verdadeiras ou as omitem, por tais razões é que o art. 67 busca punir todos aqueles que assim agirem.

Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde ou segurança: Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa:

Parágrafo único. (Vetado).

A conduta do sujeito ativo neste caso é efetivar a publicidade sabendo conscientemente que o seu conteúdo instigará o consumidor a adquirir o seu produto, mas que o mesmo, poderá causar danos de ordem material ou à saúde do consumidor.

Trata-se de um delito de natureza difusa, já que o sujeito passivo são todos os consumidores difusamente consumidores.

Art. 69. Deixar de organizar dados fáticos, técnicos e científicos que dão base à publicidade:

Pena Detenção de um a seis meses ou multa.

Neste caso trata-se de uma conduta omissiva na qual o fornecedor deixa de organizar os dados a respeito do produto que deveriam constar na publicidade, sejam fáticos, técnicos ou científicos.

É o mesmo que criar tipo criminal para punir o cidadão que pagou seus impostos, mas não guardou o comprovante do pagamento, ou puni-lo porque não guardou os dados que comprovam a receita...” (NUNES, Luiz Antonio Rizzatto, p. 708).

Já para Filomeno (2015, p.370):

No caso da não existência legal da guarda de tais materiais, sobretudo, como já asseverado atrás, de pareceres técnicos e científicos, eventual pleito judicial visando à indenização dos prejuízos causados pela má publicidade ou então a simples retirada de uma publicidade abusiva ou enganosa em caráter preventivo, seria totalmente inviável.

Analisando formalmente o tipo penal citado e as opiniões os renomados autores, temos como tipo objetivo as relações de consumo e a veracidade da publicidade, sob a ótica que norteia o presente trabalho, pode-se observar que esse dispositivo contém uma norma importante, mas a meu ver, uma pena exacerbada.

3.5 EMPREGO DE PEÇAS E COMPONENTES DE REPOSIÇÃO USADOS (ART. 70)

Art. 70. Empregar na reparação de produtos, peça ou componentes de reposição usados, sem autorização do consumidor:

Pena Detenção de três meses a um ano e multa.

Esta norma procura assegurar o disposto no art. 21, CDC:

Art. 21. No fornecimento de serviços que tenham por objetivo a reparação de qualquer produto considerar-se-á implícita a obrigação do fornecedor de empregar componentes de reposição originais adequados e novos, ou que mantenham as especificações técnicas do fabricante, salvo, quanto a estes últimos, autorização em contrário do consumidor.

Tais dispositivos têm o objetivo de proteger o patrimônio do consumidor contra ações do fornecedor, uma vez que a desvalorização do produto será certa, após a utilização de peças de má qualidade.

O que se visa punir aqui é a troca de peças usadas por outras que também sejam usadas e tragam efetivo prejuízo, sem que o consumidor tenha conhecimento.

3.6 MEIOS VEXATÓRIOS PARA COBRANÇA DE DÍVIDAS (ART. 71)

Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer:

Pena Detenção de três meses a um ano e multa.

Tal norma tem o intuito de estabelecer limites para o exercício do direito de cobrar, e está em pleno acordo com os direitos estabelecidos na Constituição: o direito à honra e a imagem.

Dentre os meios abusivos estão: a coação, ameaças, constrangimento físico ou psíquico, ou outros meios que exponham moralmente o devedor ao ridículo.

3.7 IMPEDIMENTO DE ACESSO A BANCO DE DADOS (ART. 72)

Art. 72. Impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações que sobre ele constem em cadastros, banco de dados, fichas e registros:

Pena: Detenção de seis meses a um ano ou multa.

A infração penal aqui descrita diz respeito a conduta do fornecedor de impedir ou dificultar o consumidor a ter acesso a informações. Trata-se de um crime de mera conduta, que só se consumará com a ação do agente, sendo portanto, inadmissível a tentativa. O objetivo é proteger o direito à informação, garantido constitucionalmente.

3.8 OMISSÃO NA CORREÇÃO DE DADOS INCORRETOS (ART. 73)

Art. 73. Deixar de corrigir imediatamente informação sobre consumidor constante de cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber ser inexata:

Pena Detenção de um a seis meses ou multa.

Neste caso a informação se deu de forma equivocada, onde o sujeito ativo deverá corrigir imediatamente, sendo assim um delito omissivo próprio, não admitindo assim a modalidade tentada. Tal artigo tem por objetivo a proteção da dignidade do consumidor.

3.8 OMISSÃO NA ENTREGA DE TERMOS DE GARANTIA (ART. 74)

Art. 74. Deixar de entregar ao consumidor o termo de garantia adequadamente preenchido e com especificação clara de seu conteúdo;

Pena Detenção de um a seis meses ou multa.

A última infração penal contra as relações de consumo busca-se assegurar a proteção contratual. Com o objetivo de evitar constrangimentos futuros ao consumidor, é que o fornecedor mediante declaração unilateral de vontade sela o compromisso de reparar ou trocar o produto que apresente vício, assegurando assim o patrimônio do consumidor, que não deverá arcar com as despesas causadas unicamente pelo fornecedor.

4 A TUTELA PENAL

É relevante observarmos que os dispositivos anteriormente analisados envolvem tudo que esteja relacionado à relação de consumo, protegendo o consumidor contra inúmeras práticas tidas como crimes. Para verificar se tais normas estão sendo cumpridas, surgiram órgãos para cuidar desses aspectos, como delegacias especializadas para tratar só de crimes desse tipo.

A dificuldade encontrada é que essas delegacias vêm sofrendo com uma grande quantidade de inquéritos, o que chega a gerar uma tutela penal quase que inefetiva. Compreender o que constitui ou não um crime e procurar a delegacia quando este efetivamente existir, são mecanismos imprescindíveis para garantirmos uma melhor atuação desses órgãos.

O anti projeto do novo Código Penal traz disposição específica acerca do assunto, unificou a matéria, e nesse processo de unificação muitas das figuras que são crimes não foram incluídas. A prática mostrou que muitas daquelas condutas não eram dignas de tutela penal, por exemplo: Não fornecer termo de garantia ao consumidor, ou, não atualizar os dados cadastrais do consumidor quando ele solicitar. Acredito que não seria justa a imputação de uma prisão por essas razões. Neste anti projeto as penas foram diminuídas, principalmente as dos crimes previstos na Lei 8.137, onde os crimes têm penas de dois a cinco anos, assim as penas passariam a ser de no máximo dois anos. O artigo 273 que trata sobre falsificação de cosméticos e tem a pena de 10 a 15 anos e multa, foi remodelado e suas penas foram reduzidas.

A maioria desses crimes é processada no Juizado Especial Criminal, sendo assim, é possível que o autor do crime se valha de alguns benefícios da lei que impeçam uma efetiva condenação, aceitam a proposta de transação penal ou suspensão condicional do processo (SURSIS), que são mecanismos que a legislação penal criou para que o autor evite uma condenação penal e repare o prejuízo causado de outras formas, e por isso, torna-se raro haver reincidência sobre esses crimes.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em razão dos abusos cometidos por alguns fornecedores contra os consumidores, colocando no mercado produtos ou serviços de baixa qualidade, pondo em risco a saúde e a integridade física desses, é que surge o Código de Defesa do Consumidor, com o objetivo de proteger o patrimônio e a integridade dos consumidores individualmente ou coletivamente. O Legislador então procurou inserir tipos penais no Código, punindo severamente aqueles que atentassem contra as normas estabelecidas, não apenas civilmente ou administrativamente. Verificou-se ainda o objetivo de cada dispositivo que versa sobre tais infrações, e quando são aplicáveis.

Infelizmente, esses crimes tendem a se perpetuar, entretanto, pode-se observar que alguns desses são altamente necessários, outros não, mas o que deve ser refletido é quais desses merecem de fato a tutela penal, e quais daqueles podem ser descriminalizados e serem tutelados por outras esferas do direito, para assim evitarmos o atulhamento na estrutura da justiça criminal para apurar esses delitos, que acabam sendo resolvidos com sanções pecuniárias muito equivalentes ao que aconteceria no juizado cível. Então, data vênia, por que mobilizar a esfera penal para que o autor seja condenado ao pagamento em pecúnia sem nenhum tipo de efeito penal propriamente dito? Deve-se pensar em uma maneira mais inteligente, despenalizando algumas condutas e investir, por exemplo, em sanções administrativas mais severas, como multas e até fechar o estabelecimento.

Pôde-se concluir a importância de os consumidores conhecerem seus direitos, e não permitir que estes sejam violados, e ainda que aqueles que contrariarem as normas expressas no código deverão ser penalizados, pois de nada adiantaria todo esse rol de normas que garantem direitos, se estas não fossem efetivamente aplicadas. Os crimes contra as relações de consumo têm tutela, e sanções, entretanto, torna-se necessário analisar quais dessas condutas merecem de fato a tutela penal, uma vez que a esfera criminal não pode ser banalizada, pois este deverá ser sempre o último recurso a ser utilizado para solucionar litígios. Vale ressaltar que dessa forma o consumidor não estará desprotegido, há muitos instrumentos que realizam essa proteção, resta escolher aquele que é mais útil, e, sobretudo, correto, sob pena de ferir a boa técnica do direito. É importante salientar ainda que nem sempre as condutas que acreditamos ser lesivas, são habitas a serem analisadas por um juiz criminal. Para finalizar o presente trabalho deve-se analisar que a hipótese levantada para a problemática em questão foi confirmada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. São Paulo: Atlas, 2015.

SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao código de defesa do consumidor: lei n. 8.078, de 11.9.90. 4. Ed. São Paulo: LTr, 1999.

NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor.4. Ed. Ver. - São Paulo: Saraiva, 2009.


 


 

Sobre o autor
Maiara de Sousa Silva

Graduanda em Direito pela Faculdade Luciano Feijão, nordestina e cearense com orgulho.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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