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Tutela do Ministério Público sobre os direitos coletivos do consumidor

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Agenda 23/09/2016 às 00:37

Neste trabalho, analisa-se o Código de Defesa do Consumidor, destacando os direitos básicos dos consumidores, os direitos metaindividuais e individuais homogêneos. O Ministério Público se afigura importante por ser um dos legitimados para tutelá-los.

RESUMO

Neste   trabalho, analisa-se o Código de Defesa do Consumidor, inicialmente traça considerações pontuais acerca de seu advento. Mostrando que a partir da Segunda Guerra Mundial os  produtores alavancaram as produções em larga escala e os consumidores adquiriam bens e serviços em quantidade considerável, contudo a qualidade do que se oferecia no mercado não era priorizada, surgiu, então, a necessidade de a legislação acompanhar o novo modelo de sociedade. No Brasil, até o ano de 1990 havia, essencialmente, o Código Civil de 19916 e a Lei de Crimes contra a economia popular, a resguardarem os direitos consumeristas, contudo, tornaram-se defasadas, até que foi instituída a Lei 8.078/90, o Código de Defesa do Consumidor. O CDC possui três características basilares, é lei principiológica; traz normas de ordem pública e interesse social e microssistema multidisciplinar. A relação de consumo também será abordada, nela obrigatoriamente há a figura do consumidor e do fornecedor. Será dado destaque aos direitos básicos dos consumidores, bem como os direitos metaindividuais e individuais homogêneos. Um dos legitimados para tutelar esses direitos é o Ministério Público, que para bem servir à sociedade ostenta garantias constitucionais, são elas: autonomia funcional, autonomia administrativa e autonomia financeira. Em seu modelo resolutivo, o MP resolve os conflitos extrajudicialmente, utilizando, especialmente, o Inquérito Civil e o Compromisso de Ajustamento de Conduta, já no modelo demandista, o Órgão Ministerial atua por meio das demandas judiciais, na seara da defesa do consumidor a ação proposta é a Ação Civil Pública.                                                                                                                                         Palavras-chave: Direito do consumidor. Ministério Público. Tutela coletiva.

  INTRODUÇÃO

O consumo faz parte do cotidiano da sociedade, as relações de consumo evoluíram em larga escala, são muitas as operações de compra e venda, leasing, comércio eletrônico. Quando se tem produção em massa, muitas das vezes, o consumidor torna-se segundo plano, pois o produtor foca na quantidade e não se preocupa com a qualidade ofertada. O consumidor acaba se tornando alvo de práticas abusivas perpetradas pelos fornecedores. Desse modo a relação de consumo torna-se desequilibrada.

O presente trabalho guarda relevância social no sentido de apresentar a profícua e importe Lei 8.078 de 11 de setembro de 1990, nosso Código de Defesa do Consumidor, Lei que possibilita proteger aquele que é considerado vulnerável na relação consumerista.

A Constituição Federal de 1988 positivou a defesa do consumidor no inciso XXXII do seu artigo 5º, estabelecendo que o Estado deve proteger o consumidor. A relevância jurídica reside em apresentar o Ministério Público na vanguarda da defesa dos interesses mais relevantes da sociedade, dentre esses o direito do consumidor. O MP prontamente atuará quando a lesão atinge uma coletividade de pessoas que estejam na mesma situação de fato. A partir da Constituição de 1988 o Parquet assumiu a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, então, sempre que estiver presente interesse ou direito inegociável, nos mais diversos campos, como meio ambiente, direito do consumidor, saúde, educação, idosos e outros, o Ministério Público terá titularidade para interceder por eles.

Dessa forma, o artigo tem como tema a tutela do Ministério Público sobre os direitos coletivos consumerista.

O artigo tem como objetivos: analisar a efetividade da atuação do Ministério Público na defesa dos direitos coletivos do consumidor; elucidar o desenvolvimento do Código de Defesa do Consumidor; definir quem é considerado consumidor, fornecedor, produtos e serviços; apontar as atribuições legais do Ministério Público, bem como suas ferramentas de proteção ao consumidor; demonstrar a efetividade conferida às leis consumeristas após a intervenção do Ministério Público.

A metodologia que será empregada no presente trabalho é o método de pesquisa bibliográfico. Desenvolvida a partir de materiais publicadas em livros, artigos, periódicos, embasando-se legalmente em leis e jurisprudências. O trabalho em mãos faz a opção pelo método dialético. Esta opção se justifica porque o método escolhido permite analisar que tudo se transforma permanentemente, tudo se relaciona, impulsionando a transformação e analisa objetivamente as contradições.

Dessa forma, o artigo encontra-se assim organizado: logo após a introdução, abordaremos considerações sobre o advento do código de defesa do consumidor; características acerca do código de defesa do consumidor; no segundo capítulo, estuda-se a figura do consumidor; o capítulo seguinte se debruça em analisar o fornecedor; o capítulos posterior trata sobre produtos e serviços; no capítulo cinco cuida dos direitos básicos do consumidor, desdobrando-se em apreciar direitos metaindividuais: difusos e coletivos, e interesses individuais homogêneos;  no capítulo sexto, será feito um estudo sobre o ministério público, apontando as garantias, funções e princípios institucionais; o sétimo capítulo aborda o Inquérito Civil, da instrução ao arquivamento; em seguida tem-se a Ação Civil  Pública; o capítulo nono traz alguns casos concretos que demonstram a efetividade conferida às leis especiais consumeristas após a intervenção do ministério público; por fim, a conclusão expõe o resultado da pesquisa, traçando considerações sobre a relevância do Órgão Ministerial frente a defesa dos direitos dos consumidores.                                                                                                          

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   1 CONSIDERAÇÕES SOBRE O ADVENTO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

 

Tornou-se cada vez maior o acesso das pessoas a bens e serviços prestados por fornecedores, graças aos avanços industriais, tecnológicos e às novas formas de comunicação. Nas palavras de Fabrício Bolzan,

O novo modelo de sociedade de consumo ora apresentado ganhou força com a Revolução Tecnológica decorrente do período Pós-Segunda Guerra Mundial. Realmente, os avanços na tecnologia couberam na medida ao novel panorama de modelo produtivo que se consolidava na história. Tendo por objetivo principal o atendimento da enorme demanda no aspecto quantitativo, o moderno maquinário industrial facilitou a produção e atendeu a este tipo de expectativa.[1]

A partir da Segunda Guerra Mundial os produtores estavam empenhados em vender cada vez mais, a seu turno os consumidores estavam inclinados a comprar, muitas vezes sendo enganados por propaganda enganosa. Segundo Catalan

[...] após o fim da Segunda Grande Guerra, as práticas comerciais evoluíram bem mais rápido que as leis editadas visando sua regulamentação, por exemplo, com a oferta crescente de novos produtos e serviços à coletividade, com o aparecimento de técnicas publicitárias mais agressivas, e ainda, com a crescente especialização dos entes coorporativos.[2]

Com as produções em massa, a qualidade não era o foco central, e sim a quantidade. Começavam a surgir os problemas, produtos e serviços viciados ou com defeitos que causavam prejuízos econômicos ou até mesmo físicos. Como as produções eram em grande escala, os contratos que predominavam eram os de adesão, neste o destinatário não tem o poder de alterar cláusula. Conforme Serrano,

Veio a necessidade de intervenção do estado para regular, estabelecer normas protetoras das relações de consumo, impondo responsabilidade aos intermediários e produtores pela qualidade de seus produtos e transparência de seus defeitos ao público.[3]

Para resguardar os direitos dos que adquiriam bens e produtos, até o ano de 1990, havia, essencialmente, duas leis, quais sejam: a Lei 3.071/1916 – antigo Código Civil, e a Lei 1.521/1951 – Crimes contra a economia popular.

Contudo, o Código Civil de 1916 tornou-se defasado, haja vista ter sido criado inspirado no liberalismo econômico do século XIX que se pautava nas relações individualizadas, o qual se caracterizava por um equilíbrio entre os sujeitos que firmavam o contrato. Acontece que no novo modelo de sociedade os vícios e defeitos se apresentavam com frequência. Mas o Direito em voga na época não estava apto a cuidar da parte mais fraca na relação de consumo, o consumidor. A transformação que se sucedeu clamou por legislações específicas.

Foi então que 11 de setembro de 1990 foi instituída a Lei 8.078, o Código de Defesa do Consumidor - CDC. Ele veio justamente para sanar as deficiências do Código Civil, lacunas que tornavam insuficientes a proteção ao consumidor.

Também vale destacar importantes mandamentos da Constituição da República de 1988 concernentes à defesa do consumidor, temos os arts. 5º, XXXII e 170, V, e o art. 48 no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Pelo art. 5º da CF/88 todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade, nos termos seguintes: XXXII – o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor.

A CF/88 aborda a defesa do consumidor como princípio fundamental porque o consumidor busca no mercado tudo o que é produzido, almejando satisfazer suas necessidades básicas.

Conforme os ensinamentos de Catalan:

Visando solucionar parte dos conflitos de interesses que explodiram diuturnamente no seio social, enquanto fruto de determinação insculpida no artigo 5º da Constituição Federal, o Código de Defesa do Consumidor, foi aprovado em 1990, objetivando ser um instrumento efetivo de proteção às relações de consumo, mas principalmente, visando salvaguardar o pólo mais fraco da relação negocial, explorando desde antes de seu nascimento e até mesmo após sua morte.[4]

O Art. 170 da CF/88 determina que a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social, observando princípios, dentre eles no V consta a defesa do consumidor.

Já o art. 48 do ADCT diz que O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do consumidor.

Como dita a Constituição, é do Estado o dever de amparar o consumidor na relação jurídica de consumo, Bolzan explica que

O legislador constituinte optou pela elaboração codificada do Direito do Consumidor, e não pela edição de leis específicas, cada uma disciplinadora de assuntos afetos às relações jurídicas de consumo. Apesar de existirem outras leis especiais dentro do sistema de proteção do consumidor, no momento da elaboração do Diploma de defesa do consumidor a opção pela codificação foi a mais acertada.[5]

O Direito do Consumidor é ferramenta de suma importância nas regulamentações das relações jurídicas, nas quais de um lado está o consumidor vulnerável e do outro o fornecedor que detém todo o conhecimento técnico da produção.                                                                                                                                                                                                                                                        

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                      1.2 CARACTERÍSTICAS ACERCA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

O Código de Defesa do Consumidor possui três características basilares: lei principiológica; normas de ordem pública e interesse social e microssistema multidisciplinar.

Lei principiológica se deve ao fato de o CDC ser constituído por inúmeros princípios que visam conferir direitos aos consumidores e a impor deveres aos fornecedores.

Por sua vez, norma de ordem pública e interesse social é garantia expressa no art. 1º da Lei 8.078/90. Significa dizer que o Juiz pode de ofício reconhecer direitos do consumidor; as decisões têm caráter educativo e de alerta para a toda a sociedade e para os fornecedores; as partes não podem abolir direitos, leciona Bolzan:

A autonomia da vontade e a pacta sunt servanda, institutos muito presentes no Direito Civil clássico, foram mitigadas no CDC em razão da necessidade do intervencionismo estatal que buscou atingir, em última análise, o reequilíbrio da relação de consumo que é muito desigual. Desta forma, sendo abusiva uma cláusula contratual, ela será anulada, não cabendo a alegação de que o consumidor estava consciente e de que gozava da plenitude de sua capacidade mental.[6]

Por fim, como microssistema multidisciplinar, o CDC agrega múltiplas disciplinas jurídicas, tais como, direito constitucional, direito processual civil, direito civil, direito penal, direito administrativo.

Foi então que 11 de setembro de 1990 foi instituída a Lei 8.078, o Código de Defesa do Consumidor – CDC.

     2 CONSUMIDOR

 

 Perante o CDC, em seu artigo 2º, consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

De acordo com a Teoria Finalista ou subjetiva, conceituar consumidor é o cerne da proteção do CDC, para essa Teoria quando se fala em "destinatário" no artigo 2º está se referindo ao destinatário fático e econômico do bem ou do serviço, ou seja, a interpretação é feita de forma restrita, a relação não engloba fins profissionais, mas sim considera consumidor aquele que adquire produto para seu uso próprio ou de sua família.

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Há de se destacar que após o Código Civil de 2002 a Teoria Finalista ganhou amplitude e se aprofundou nos conceitos de consumidor imediato e também no conceito de vulnerabilidade.

À guisa de exemplo do finalismo aprofundado é a aceitação da pessoa jurídica como consumidora, porém, ela deve comprovar fragilidade no caso concreto.

Interessante observar a jurisprudência do STJ (REsp. 476.428/SC, Rel. Nancy Andrigui, j. 19.04.2005, DJ. 09.05.2005): Direito do Consumidor. Recurso especial. Conceito de consumidor. Critério subjetivo ou finalista. Mitigação. Pessoa Jurídica. Excepcionalidade. Vulnerabilidade. Constatação na hipótese dos autos. Prática abusiva. Oferta inadequada. Característica, quantidade e composição do produto. Equiparação (art. 29). Decadência. Inexistência. Relação jurídica sob a premissa de trato sucessivo. Renovação do compromisso. Vício oculto. – A relação jurídica qualificada por ser “de consumo” não se caracteriza pela presença de pessoa física ou jurídica em seus polos, mas pela presença de uma parte vulnerável de uma lado (consumidor), e de um fornecedor, de outro. – Mesmo nas relações entre pessoas jurídicas, se da análise da hipótese concreta decorrer inegável vulnerabilidade entre a pessoa-jurídica consumidora e a fornecedora, deve-se aplicar o CDC na busca do equilíbrio entre as partes.

Ao consagrar o critério finalista para interpretação do conceito de consumidor, a jurisprudência deste STJ também reconhece a necessidade de, em situações específicas, abrandar o rigor do critério subjetivo do conceito de consumidor, para admitir a aplicabilidade do CDC nas relações entre fornecedores e consumidores-empresários em que fique evidenciada a relação de consumo. – São equiparáveis a consumidor todas as pessoas, determináveis ou não, expostas às práticas comerciais abusivas. – Não se conhece de matéria levantada em sede de embargos de declaração, fora dos limites da lide”.

Pelo exposto fica claro que a vulnerabilidade será presumida quando o consumidor for pessoa física; e no caso de consumidor pessoa jurídica a vulnerabilidade deve ser comprovada.

O CDC também contempla a figura do consumidor por equiparação, o qual engloba e tutela outras pessoas, além do adquirente direto de um produto ou um serviço. O CDC trata desse assunto em três momentos. O parágrafo único do artigo 2º diz que "equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo". Esse dispositivo almeja evitar ou reparar a ocorrência de um dano em face dessa coletividade de consumidores.

Em seguida o artigo 17 informa que "para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento". A seção a que se refere trata da Responsabilidade pelo "Fato do Produto e do Serviço", logo, o simples fato de ser vítima de um produto ou serviço será o tutelado pelo CDC. É, portanto, irrelevante identificar a pessoa que adquiriu o produto ou o serviço.

A vítima do evento danoso também é conhecida como bystanders, que será equiparada ao consumidor não por ser destinatária final de um produto ou serviço, mas por estar no local dos fatos quando da ocorrência do acidente de consumo.

Ainda, o artigo 29 dita: "para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas". Ele está relacionado aos consumidores expostos às práticas comerciais.

3 FORNECEDOR

Impreterivelmente há a figura do fornecedor na relação de consumo, sendo conceituado de forma ampla no artigo 3º do CDC:

Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

O artigo acima trazer à baila toda a cadeia de fornecimento. A habitualidade é a característica principal para considerar as pessoas físicas como fornecedoras; conforme preleciona Rizzatto Nunes (2009), também estão enquadradas os que atuarem com eventualidade e fins lucrativos, como os profissionais liberais.

A partir do ensinamento extraído da jurisprudência do STJ constante do Agravo em Recurso Especial 1.963, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, publicado em 04.04.2011, depreende-se com precisão que o CDC não exige expressamente que o fornecedor de produtos e serviços seja um profissional, no entanto há o requisito da habitualidade:

Destaca-se que para serem fornecedoras as recorrentes teriam que desenvolver habitualmente como sua atividade a comercialização de lotes, situação esta que como vimos acima não ocorreu, pois conforme se depreende dos documentos acostados com a exordial, elas somente cederam alguns lotes por imposição da situação já explanada.

Quanto a esse assunto, Rizatto Nunes discorre:

No caso de uma pessoa física, ao exercer uma atividade atípica ou eventual, quando praticar atos de comércio ou indústria, a exemplo de um estudante que compra e revende lingerie para poder pagar seus estudos, isto o caracteriza como fornecedor perante o CDC, porém se ele somente revender seu produto no período natalino, ainda assim é considerado fornecedor, trata-se de atividade comercial.[7]

O Estatuto do Torcedor, Lei n. 10.671/2003 em seu art. 3º, apresenta o fornecedor equiparado, sua redação diz que para todos os efeitos legais a entidade responsável pela organização da competição e a entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo equiparam-se a fornecedor, nos termos da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990.

O equiparado não é o fornecedor do contrato principal de consumo, mas o intermediário, o titular da relação conexa e principal de consumo.

 4 PRODUTOS E SERVIÇOS

É considerado produto qualquer bem novo ou usado, móvel ou imóvel, material ou imaterial dentre outras características dos bens, tal definição se encontra no parágrafo 1º do artigo 3º do CDC.

O Código de Defesa do Consumidor também se aplica aos produtos distribuídos como amostra grátis, uma vez que o Código não estabelece que a aquisição se dê de forma remunerada, e também porque esses produtos visam lucro, pois a partir do momento que o consumidor passa a conhecer o produto e, caso goste, passará a comprá-lo com frequência.

Nunes aponta que "a relevância do produto gratuito é que ele também está submetido a todas as exigências de qualidade, garantia, durabilidade, proteção contra vícios e etc".[8]

O parágrafo 2º do art. 3º nos dá a definição de serviço,

[...] é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Aqui vale o ensinamento de Nascimento “serviço é a prestação de atividade, é o laborar em favor de outrem".[9]

A palavra-chave da definição de serviço é "remuneração", a qual inclui todas as relações que possuem uma remuneração direta, feita imediatamente pelo consumidor e indireta, isto é, sendo remunerado pela comunidade, a exemplo do benefício de transporte gratuito aos idosos.

O STJ já possui decisão nesse diapasão, vejamos:

Recurso Especial 566.468, Ministro Relator Jorge Scartezzini, 4ª T., DJ. 17.12.2004: “para a caracterização da relação de consumo, o serviço pode ser prestado pelo fornecedor mediante remuneração obtidade forma indireta.

Com isso percebemos que a expressão remuneração foi uma feliz escolha do legislador.                                         

        5 DIREITOS BÁSICOS DO CONSUMIDOR

Os direitos básicos estão previstos no artigo 6º, mas não ficam restritos a ele, pois é possível encontrá-los ao longo d CDC e em outras leis, como, por exemplo, o Código Civil.

Os direitos e garantias elencados no CDC servem para orientar a relação de consumo.

Com precisão Serrano conceitua que "o Direito do Consumidor tem como objeto regular relações que se constituem entre fornecedor e consumidor, a partir das necessidades sociais e da distribuição de bens e serviços".[10]

O Código do Consumidor se debruça em assegurar os direitos à vida, à saúde, à segurança, à liberdade de escolha e igualdade nas contratações, direito à informação adequada e clara, à proteção contra as práticas comerciais abusivas, à modificação e revisão como formas de preservação do contrato de consumo, à efetiva prevenção e reparação de danos materiais e morais, assegura também o direito ao acesso à justiça, direito à inversão do ônus da prova, direito ao recebimento de serviços públicos adequados e eficazes.

Havendo violação aos direitos, o Ministério Público tem atribuição para defender os interesses do consumidor difusa e coletivamente, objetivando resguardar o respeito à dignidade, saúde e segurança, proteger os interesses econômicos em busca da melhoria da qualidade de vida, bem como a harmonização das relações de consumo, sempre pautando-se nos direitos básicos, dispostos no Código de Defesa do Consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 81 declara que a defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo. E segue:

 

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

 I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

 II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

 III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

 E o artigo 82 legitima o Ministério Público para atuar na defesa dos direitos do artigo anterior, ainda o artigo 83 assegura que todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela são aceitas para a defesa dos direitos e interesses protegidos pelo CDC.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                        

5.1 DIREITOS METAINDIVIDUAIS: DIFUSOS E COLETIVOS

Interesses que não pertencem à administração pública nem a particulares são denominadas metaindividuais, divididos em difusos e coletivos.

Os direitos difusos e coletivos não podem ser titularizados individualmente, em regra são indisponíveis e abarcam matéria de ordem pública, consubstanciada no interesse social.

Antes de adentrar à tutela dos direitos coletivos consumeristas pelo Ministério Público, cumpre diferenciar direito difuso e coletivo.

5.2 DIREITO DIFUSO

   Este trata de interesse de pessoas unidas pelo mesmo fato, porém essas pessoas são em indetermináveis, ou seja, não tem um grupo titular individual.

Quando este direito é ofendido, a titularidade na defesa é estendida a todos que direta ou indiretamente tenham sido ofendidos.

A título de exemplo tem-se o dano ao meio ambiente, haja vista que meio ambiente é um bem de titularidade indeterminada, por que pertence a todos.

Motauri traz como exemplo “uma publicidade enganosa que esteja sendo divulgada pela televisão: ou ela se encontra no ar – e atinge potencialmente a todos – ou ela é proibida de ser veiculadas, de sorte que a sociedade estará resguardada”.[11]

É possível afirmar que quando um fato jurídico atinge um grupo indeterminável da sociedade, sua tutela será difusa.

Temos a questão da indivisibilidade, quando um problema é solucionado não valerá para um ou alguns, sim para todos afetados, por ser um direito de bem comum, a lesão que um indivíduo sofreu não pode ser reparada sem antes o benefício contemplar toda a comunidade.

5.3 DIREITO COLETIVO

Por sua vez, os interesses coletivos possuem uma só base jurídica e abrange um grupo ou categoria de pessoas determináveis. A titularidade do direito ofendido fica por conta de um número de pessoas indeterminado de um grupo social determinado.

No caso de interesse coletivo, a lesão ao grupo surge da própria relação jurídica viciada que une o grupo.

Tanto o interesse difuso quanto o coletivo tem como características objeto indivisível, isto é, não se pode identificar a parcela respectiva de direito que cada um receberá.

     5.4 DOS INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

Impende asseverar que interesses individuais homogêneos dizem respeito a um número determinável de pessoas lesadas, objeto divisível e existência de vínculo fático entre os sujeitos que sofreram a lesão comum.

Nesse caso não se tem um grupo, classe de pessoas ou categoria. Fica difícil quantificar os lesados porque em certos casos dependerá da própria manifestação de vontades destes.

As lesões individuais podem possuir repercussão econômica distinta, supondo que uma fabricante de automóvel tenha inserido no mercado 15 mil veículos com o mesmo vício, e um taxista tenha levado o carro para reparo e por isso ficou sem trabalhar, neste caso ele ficou com o prejuízo do reparo e lucros cessantes, na liquidação de sentença, nos moldes do art. 97 do CDC ele terá sua lesão diferenciada julgada.

O Código de Defesa do Consumidor permitiu a tutela coletiva dos interesses individuais homogêneos, permitiu o legislador que as 15 mil lesões fossem tuteladas em um único processo.

   6 MINISTÉRIO PÚBLICO: ESSENCIAL À JUSTIÇA

É de bom grado entender quem é esta instituição que a Constituição Federal de 1988 atribuiu status de função essencial a Justiça.

O Ministério Público se divide em Ministério Público da União e Ministério Público Estadual, o MPU abarca o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar, o Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios.

O MPF atua na Justiça comum, em matérias de competência Federal, o MPE, como o próprio nome sugere, atua perante a Justiça Estadual. Nos ramos especializados da Justiça Federal temos o MPT, MPM e a Justiça Eleitoral. A Constituição não prevê a carreira do MP Eleitoral, sendo assim, sua formação é composta por membro do MPF e MPE.

O Ministério Público tratado no presente trabalho é o Ministério Público Estadual.

A Carta Magna, com maestria, apregoa no artigo 127 que

O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Corroborando a importância do Órgão Ministerial frisou o STJ:

Na sociedade contemporânea, marcadamente de massa, e sob os influxos de uma nova atmosfera cultural, o processo civil, vinculado estritamente aos princípios constitucionais e dando-lhes efetividade, encontra no Ministério Público uma instituição de extraordinário valor na defesa da cidadania.(STJ, REsp. 105.215, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4a T., p. 18/08/97).

Segundo Macêdo (2012), Marcelo Pedroso Goulart em 1998 foi o primeiro a identificar os dois modelos de atuar do Ministério Público: o demandista e o resolutivo.

A seu turno, o demandista é quando os membros do MP se valem das demandas judiciais no exercício de suas funções institucionais, seja como autor, seja como fiscal da lei.

Enquanto o modelo resolutivo se dá quando o órgão do MP se vale de instrumentos extraprocessuais para resolver os conflitos, o que acaba sendo mais célere. Dentre os mecanismos, merecem destaque o Termo de Ajustamento de Conduta, a recomendação e o inquérito civil.

 6.1 GARANTIAS, FUNÇÕES E PRINCÍPIOS INSTITUCIONAIS DO MP

Para bem servir à sociedade, ao Ministério Público são asseguradas garantias constitucionais. São três as garantias, a saber, autonomia funcional, autonomia administrativa e autonomia financeira. A mais relevante para o presente estudo é a autonomia funcional, prevista no artigo 127, §2º da CF/88, informa que o membro do MP cumprirá seus deveres institucionais desvinculado do Legislativo, Executivo e Judiciário. Obviamente obedecerá a sua própria consciência, as leis e a Constituição da República.

O artigo 129 da CF/88 traz um rol exemplificativo, eis que o inciso IX dita que compete ao MP exercer outras funções que lhe forem conferidas.

Dentre todas as funções destacam-se algumas:

Os princípios do MP estão previstos na CF/88 no artigo 127, §1º, são eles: princípio da unidade, significa dizer que todos os membros fazem parte de um só órgão. A subdivisão em MPF, MPT, MPE, dá-se pela forma Federativa adotada pelo Estado brasileiro e pela distinção que é feita em razão da matéria e da pessoa.

 Princípio da indivisibilidade, entende-se aqui que um membro pode ser substituído por outro sem afetar o processo ou procedimento, contudo, a substituição deve seguir forma prescrita em lei, sob o risco de ferir o princípio do promotor natural, porque cada promotoria tem suas atribuições definidas em lei.

Nas palavras de Mazilli citado por Macêdo:

 

Unidade significa que os membros de cada Ministério Público integram um só órgão, sob uma só direção; indivisibilidade quer dizer que seus membros podem ser substituídos uns pelos outros na forma estabelecida na lei. Assim, cada Ministério Público tem sua unidade: em vista da característica de nosso Estado federado, o Ministério Público de cada Estado é uno; e cada um dos ramos do Ministério Público da União também tem sua própria unidade. Uma unidade nacional do Ministério Público só existe abstratamente na lei, quando esta, por exemplo, confere uma atribuição à instituição, como por exemplo, ao lhe cometer a promoção da ação penal pública. Mas, funcionalmente, cada um dos Ministérios Públicos brasileiros tem sua própria unidade, e as substituições de seus membros só podem ser feitas dentro de cada um deles, sempre por integrantes da respectiva carreira.[12]

Pelo princípio institucional da autonomia funcional, entende-se que cada Promotor ou Procurador tem plena liberdade para agir de acordo com sua convicção jurídica. A hierarquia no órgão é administrativa e não funcional.

Evidencie-se que a autonomia funcional não dá ao membro ministerial o poder de dizer a última palavra, quando se trata da defesa de determinados interesses sociais. No inquérito civil, por exemplo, o Conselho Superiro do Ministério Público deve concordar com o pedido de arquivamento.

Bom é verificar que o artigo 85, II, da Constituição da República Federativa de Brasil, considera crime de responsabilidade do Presidente da República qualquer atentado contra o livre exercício do MP.

7 INQUÉRITO CIVIL

O atual capítulo tratará sobre o inquérito civil, traçando considerações pontuais, ainda, será visto seu desenrolar desde a instauração ao arquivamento.

O inquérito civil é um instrumento privativo do Ministério Público, se trata de um procedimento administrativo inquisitivo, com ele a Instituição angaria subsídios para, se for necessário, propor a ação civil pública.

Segundo Wallace Paiva Martins Júnior citado por Macêdo, a origem histórica do inquérito civil é a seguinte:

[...] derivou de sugestão apresentada em 1980 por José Fernando da Silva Lopes, originariamente como um mecanismo conduzido por organismos administrativos para que o Ministério Público, através dele, realizasse atividades investigatórias à eventual propositura da ação civil pública, tendo poderes de requisição, acompanhamento e controle. Em 1983, Antonio Augusto Melo de Camargo Ferraz, Edis Milaré e Nelson Nery Júnior adaptaram essa proposta para que o inquérito civil fosse dirigido pelo Ministério Público, e assim foi previsto na Lei Federal n. 7347/85 e, posteriormente, na Constituição Federal de 1988.[13]

Impende acrescentar que a natureza do IC é inquisitiva para que o órgão colha elementos probatórios suficientes para se convencer de que o interesse difuso ou coletivo que esteja investigando realmente sofreu um dano.

O IC ingressou no ordenamento jurídico pátrio com a lei de Ação Civil Pública, n. 7347/85, §1º do artigo 8º

§ 1º O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames              ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis.

 Foi então consagrado pela constituição Federal de 1988 no artigo 129, III:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;

 A Lei Orgânica Nacional do MP, n. 8625/93, prevê e regulamenta o poder investigatório civil do Ministério Público nos artigos 26 a 27.

Uma das mais importantes normas que regulamentam esse poder é a Lei Complementar n. 75/93, a Lei Orgânica Nacional do MPU no artigo 8º, que por força do artigo 80 se aplica subsidiariamente aos Ministérios Públicos dos Estados.

A instauração do IC é dispensável, quando o Ministério Público tiver em mãos elementos suficientes para propor a ação civil pública a fará desde logo.

Importa frisar que quando o inquérito civil serve de base para propor a ação, deverá instruir a petição inicial, só desta forma é que o procedimento administrativo ingressará no Poder Judiciário.

Cumpre consignar, na oportunidade, as três características do IC: a informalidade, a inquisitoriedade e a publicidade.

Por sua natureza de instrumento administrativo de investigação ele é informal. A dinâmica dos atos não está prevista em lei, é o presidente do IC quem ditará a sequência lógica dos atos na investigação.

Como já explanado, é inquisitivo, tendo em vista que é um procedimento que se destina a apurar um fato e sua autoria, portanto, não há que falar em acusação contra alguém, logo, não comporta defesa.

E, por ser público, qualquer pessoa pode consultá-lo, excepcionalmente poderá ser sigiloso, apenas quando for conveniente.

Queiroz Macedo explica sobre o aspecto resolutivo e a importância do IC:

O ambiente “resolutivo” é o habitat natural do inquérito civil, pois este é o instrumento utilizado primordialmente para a resolução de pendengas pelo Ministério Público sem acionamento do Poder Judiciário, por meio da utilização de Termo de Ajustamento de Conduta e Recomendações, os quais, como regra, são sedimentados no interior daquele.Por isso, o inquérito civil tem tanta importância no exercício das funções institucionais do Ministério Público.[14]

Sobretudo, o inquérito civil será de suma importância quando for necessário o ajuizamento da demanda, pois ele embasará a ação civil pública.

 7.1 ANTECEDENTE DO IC: PROCEDIMENTO PREPARATÓRIO         

A lei Orgânica do Ministério Público em seu artigo 26, I, autoriza o órgão a instaurar medidas e procedimentos administrativos pertinentes ao IC. Com esse permissivo as Promotorias lançam mão do procedimento preparatório de inquérito civil, ele será instaurado quando o Parquet necessitar de verificar se determinado fato realmente pode ser tutelado ou quando a autoria for incerta.

A seguir o art. 7º da Resolução GPGJ 1.522/09

Art. 7º - O órgão de execução poderá instaurar procedimento preparatório de inquérito civil, de ofício ou a partir de representação, quando esclarecimentos complementares se fizerem necessários para formar o seu convencimento sobre o cabimento, em tese, da tutela de interesses ou direitos a que se refere o art. 1º desta Resolução.§ 1º - O procedimento preparatório deverá ser instaurado por portaria, observado, no que couber, o disposto no art. 6º desta Resolução, sendo autuado com numeração seqüencial à do inquérito civil e registrado em sistema próprio, mantendo-se a numeração quando de eventual conversão.§ 2º - O procedimento preparatório deverá ser concluído no prazo de 90 (noventa) dias, prorrogável por igual período, uma única vez, por meio de promoção fundamentada. [15]

Quando estiver convicto, deverá o órgão do MP converte-lo em inquérito civil, não obstante, a ação pode ser proposta sem que seja instaurado.

Em regra o procedimento preparatório não atenderá o princípio da publicidade.

   7. 2 INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO CIVIL

O inquérito civil nasce com a instauração de ofício ou por representação, a instauração se dá por portaria, despacho acolhendo representação, ou por determinação do Procurador-Geral de Justiça ou do Conselho Superior do Ministério Público.

A instauração mais comum é por intermédio de portaria. Nele deverá conter dados do fato, de como ele chegou ao conhecimento do MP, se por representação, ouvidoria, notícia veiculada pela imprensa, a qualificação do investigado e instrução para as primeiras diligências a serem realizadas.

Qualquer pessoa física ou jurídica que tome conhecimento de um ato ilegal pode se dirigir até o Ministério Público e representar. Ao contrário da ouvidoria e da denúncia feita por telefone aos Direitos Humanos, a representação não pode ser anônima, logo, deve conter a qualificação do representante, descrição dos fatos a serem investigados, qualificação do suposto autor.

Caso falte algum item, o representante será notificado para suprir a falta num prazo de dez dias, se ainda assim não o fizer, ela servirá de base para instauração do IC, posto que o MP pode fazê-lo de ofício.

Após receber a representação, o Parquet poderá prontamente instaurar o IC por intermédio de portaria ou com despacho no rosto do documento ou, então, indeferir.

A instauração por despacho acolhendo representação é feita no rosto da petição, nele deverá ditar as diligências a serem logo realizadas. E, pelo fato de todos os dados pertinentes ao fato estarem na representação, não é necessário que o órgão do MP os reproduza no despacho.

Por fim, a instauração por determinação do PGJ ou do CSMP é excepcional. A única hipótese de o IC ser instaurado por determinação do PGJ é quando ele delega sua atribuição a outro órgão do MP, nesse caso a delegação pode ser acompanhada da ordem para o órgão delegado instaurar o devido IC.

A instauração do inquisitivo por ordem do Conselho Superior se dá quando ele dá provimento a recurso que foi interposto contra representação indeferida, porque aí o Conselho estará determinando que o IC deve ser instaurado. Essa situação não fere a independência funcional do Promotor que indeferiu a representação, embora ele tenha que iniciar a investigação nada impede que ao final determine o arquivamento.

Nos dois casos supra a instauração se fará por meio de portaria.

       7. 3 MEIOS DE INSTRUÇÃO DO IC

O Promotor tem dois instrumentos para coletar provas, um é a notificação, outro é a requisição.

Um dos dispositivos que prevêem a notificação é o artigo 129, VI da CF, ela é um comunicado que determina que alguém compareça ao Ministério Público para depor ou fornecer esclarecimentos. Se a pessoa não atendê-la poderá ser conduzida coercitivamente e responder por crime de desobediência caso tenha descumprido a notificação dolosamente.

Caso a pessoa que deva prestar depoimento resida em outra comarca, deve ser expedida carta precatória ou rogatória para a oitiva, aplica-se o artigo 222 do Código de Processo Penal por analogia.

O instrumento usado pedindo que apresentem certidões, documentos ou resultados periciais, é a requisição, esta se encontra prevista no art. 129, VI e VIII da CF/88.

Qualquer autoridade pode ser destinatária da requisição, bem como pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado, sendo esta ordem lega desatendida, em tese, configura-se crime, podendo ser aplicado o disposto nos artigos 10 da lei de Ação Civil Pública (que traz em seu bojo pena de reclusão e multa), 319 do CP (prevaricação) ou 330 do CP (desobediência). No entanto, só o desentendimento doloso gera sanção na esfera criminal.

Insta destacar que as requisições feitas pelo Ministério Público têm limitações, Motauri explica:

Com efeito, não pode o Ministério Público requisitar, por exemplo, de um engenheiro autônomo a realização de uma perícia que o manterá ocupado por vários dias, durante os quais estaria impedido de exercer sua função remunerada. Igualmente não poderá fazê-lo de uma empresa – ainda que esta seja a única habilitada, no Brasil, a realizar aquele determinado trabalho.[16]

Em contra partida, os órgãos públicos têm por dever atender gratuitamente às requisições.

O Parquet não pode requisitar toda e qualquer informação sigilosa, haja vista que a CF exige autorização judicial para algumas hipóteses, como sigilo das comunicações. Neste caso deve peticionar ao juiz competente. Ao obtê-las, lhe compete responsabilidade por seu uso e guarda, nos termos do artigo 26, §2º da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público.

  7.4 COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA (TAC)       

Como dito alhures, o órgão do Ministério Público pode firmar TAC durante o inquérito civil e até mesmo na ação civil pública.

O nome do ato é “compromisso de ajustamento de conduta” e o “termo” é o meio no qual se materializa; ou seja, é seu registro escrito.

Na lei de ação civil pública consta no artigo 5º, §6º.

O Termo de Ajustamento de Conduta é a celebração de acordo entre o legitimado ativo e o autor do dano, este deve adequar sua conduta às exigências legais, ao ser firmado e não cumprido poderá ensejar execução, posto que a lei lhe confere força de título executivo.

No termo de compromisso deve constar sanção específica prevendo a hipótese de inadimplemento das obrigações assumidas por parte do tomador do compromisso. Motarui conta que “a sanção pode ser de ordem econômica (multa), consistir em obrigação de fazer, de não fazer, de dar coisa certa, etc”[17].

Com efeito, os interesses resguardados não são exclusivos do legitimado ativo, nada impede que outro legitimado impetre ação civil pública tratando sobre o objeto apreciado no TAC. De certo, a ação não pode ter os mesmos pedidos do TAC, sob o risco de faltar interesse de agir.

Vejamos ressalva feita pelo autor,

Contudo, o questionamento judicial poderá sempre ter por objeto abrangência (ou alcance) do acordo, assim como discutir seu próprio mérito, quando, por exemplo, o autor da ação alegar que ocorreu transação acerca do direito por ele tratado, de natureza indisponível.[18]

            Se as medidas tratadas no compromisso não forem adequadas para tutelar o bem jurídico, a ação ajuizada deve trazer nos pedidos a rescisão do TAC, tendo em vista que é inadmissível a existência de dois títulos executivos sobre a mesma coisa.

7.5 DESFECHO DO INQUÉRITO CIVIL

Não existe um prazo comum para a conclusão do IC; tal fato deve ser verificado na esfera de cada MP, isto se deve ao fato de que o IC é objeto de tratamento pelas leis orgânicas estaduais dos MPs, bem como é regulamentado dentro da esfera administrativa de cada instituição por ato dos Colégios de Procuradores de Justiça. No que for omisso usa por analogia os preceitos contidos no art. 4º e seguintes do Código de Processo Penal.

Conforme bem adverte Paulo Bessa citado por Macêdo “já é tempo para que o inquérito civil mereça uma regulamentação mais detalhada e precisa, com base legal definida, o que ainda não tem”[19].

A título ilustrativo, no MP de São Paulo, o prazo para encerramento do IC é de 180 dias, prorrogáveis por despacho fundamentado, informado pelo art. 24 do Ato CPJ 484/2006. No MPRJ o prazo para a conclusão de é um ano, que poderá ser prorrogado quantas vezes forem necessário, informação encontrada no art. 17 da Resolução GPGJ 1522/09, que disciplina a instauração e tramitação do inquérito civil no âmbito do MPRJ.

            Dado por encerrado o procedimento investigatório, o Promotor de Justiça proporá a Ação Civil Pública ou o seu arquivamento.

            Em capítulo à parte do presente trabalho será tratado brevemente acerca da Ação Civil Pública.

7.6 ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO CIVIL

Depois de todas as provas colhidas e o órgão do Ministério Público tê-las avaliado e formado convicção, Motauri (2013) aduz que se há dano (ou ameaça de dano) o interesse deve ser tutelado pela Instituição, que deve agir, visando saná-lo.

Ação esta que poderá ser pela via administrativa, por meio de TAC – Termo de Ajustamento de Conduta ou pela via Judicial com a Ação Civil Pública.

Havendo, porém, ilegalidade que enseje a propositura de ACP depois de ter sido firmado o TAC, deverá o Promotor de Justiça promover o arquivamento do respectivo inquérito civil. Um breve relatório com a sucessão dos acontecimentos deve ser remetido ao Conselho Superior do Ministério Público requerendo a homologação, apenas para reexame necessário, tendo em vista que o Promotor não requer o arquivamento, ele o determina.

A homologação do arquivamento não impede a propositura de ação civil pública por qualquer dos legitimados ativos, afinal, como diz o inciso XXXV do artigo 5º da CF, não ficará excluído da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito, outrossim, o §1º do artigo 129 da CF preconiza que a legitimação de terceiros não ficará prejudicada pela legitimação do MP para as ações civis. Se os legitimados quiserem podem requer cópias do IC.

Não obstante, pode ainda o próprio MP reabrir as investigações e em consequência propor a ACP se de outras provas tiver notícia. Reitere-se, caso a lei orgânica de determinado MP for omissa sobre o tema, por analogia se aplica o art. 18 do CPP.

Pese a conclusão acima externada, se o desarquivamento do inquisitivo não resultar em ajuizamento de ação civil pública, se dará novo arquivamento e nova remessa ao Conselho Superior do Ministério Público.

8 CONSIDERAÇÕES SOBRE AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Mister se faz tratar sobre a ação civil pública, vez que o IC pode culminar em na sua propositura.

A lei Federal nº 7347/85 disciplina a ação.

Ao contrário do inquérito civil, o Ministério Público não é o único legitimado ativo para propor a ACP.

A sua finalidade é buscar reparação dos danos morais e patrimoniais a interesses difusos e coletivos. Excepcionalmente um direito individual homogêneo pode ser tutelado quando esta for a forma para que indiretamente se possa defender um interesse difuso ou coletivo.

A ação civil pública tem por objetivos prevenir, reparar e ressarcir os danos causados a interesses metaindividuais, nesta ordem de importância, vez que são extremamente relevantes para a sociedade e são indisponíveis; é melhor evitar o dano, porque almejar reparação significa que ele já foi causado. Não obstante, os três objetivos podem coexistir em determinada situação.

A ação deve ser proposta no local onde ocorreu o dano, a ser julgada pelo juiz do local, isto porque, teoricamente, o magistrado do local resguarda melhor os interesses da comunidade, tendo em vista que poderá avaliar melhor o prejuízo e colher provas com mais presteza.

Nas ações que figurem a união, suas autarquias ou empresas públicas, competente será o juiz federal que exerce jurisdição sobre o local onde ocorreu ou deveria ocorrer o dano.

O artigo 5º da Lei de Ação Civil Pública arrola os seguintes legitimados ativos: Ministério Público; Defensoria Pública; União, Estados, Distrito Federal e Municípios; autarquias; empresas públicas; fundações; sociedades de economia mista e associações civis.

8.1 LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO      

O artigo 129, III da CF/88 preconiza ser função institucional do MP “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.

Ao Ministério Público não cabe condenação ao pagamento de verbas sucumbenciais.

Cumpre afiançar que o MP não possui legitimidade ativa para a tutela de todo e qualquer interesse metaindividual. O direito dever ser indisponível. O Parquet não atuará em defesa de um interesse disponível, como no caso de um condomínio com problemas no fornecimento de energia elétrica.

Desta maneira, o MP somente poderá ingressar no Judiciário com a ação civil pública em defesa de interesses difusos ou coletivos indisponíveis,

No campo dos interesses difusos todos podem ser tutelados pelo MP, pois em se tratando de direitos sociais, são indisponíveis. Já os coletivos podem ser ou não indisponíveis.

9 EFETIVIDADE CONFERIDA ÀS LEIS ESPECIAIS CONSUMERISTAS APÓS A INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Neste capítulo serão apresentados alguns casos concretos que demonstram a eficiente atuação do Órgão Ministerial defendendo os direitos coletivos, difusos ou direitos individuais homogêneos do consumidor, quer seja extrajudicialmente por meio do Inquérito Civil e o consequente Termo de Ajustamento de Conduta, ou judicialmente por meio da Ação Civil Pública.

Os exemplos supra citados são alguns dos inúmeros casos de intervenções exitosas do Ministério Público por todo o Brasil. Pelo todo exposto é possível perceber que no que tange à defesa dos direitos consumeristas, a atuação Ministerial é aguerrida e profícua, com empenho fiscalizam as leis e garantem os meios para que se efetivem. São múltiplas demandas, versando sobre os mais variados temas, como oferta de alimentos, combustíveis e medicamentos adulterados, publicidade enganosa ou abusiva, transporte coletivo, planos de saúde, comércio eletrônico, vícios e defeitos em produtos e serviços em geral, água, telefonia, ensino privado, contrato imobiliário, práticas e cláusulas abusivas no fornecimento de energia elétrica.

CONCLUSÃO

A forma de consumir das pessoas veio mudando ao longo dos tempos, até que ela tornou-se uma relação em massa, de tal modo que implicou em conflitos que passaram a exigir a atuação do Estado para solucioná-los. A tutela coletiva dos consumidores é um dos aspectos mais importantes da relação de consumo, tendo em vista ser a parte técnica e economicamente vulnerável na relação de consumo.

O grande marco na defesa do consumidor é a Constituição Federal de 88, pois ela o elevou ao nível de direito fundamental e princípio da ordem econômica. Proteger o cidadão é zelar pela dignidade, integridade, liberdade.

Tem-se o Ministério Público como fiscal da lei e parte legitimada para atuar na defesa coletiva nos casos de interesses ou direitos difusos, os interesses ou direitos coletivos, e interesses ou direitos individuais homogêneos. E para isso o Código de Defesa do Consumidor no artigo 83 assegura que todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela são aceitas para a defesa dos direitos e interesses protegidos pelo CDC.

É inegável o fato de que o MP é essencial à função jurisdicional do Estado e que defende com maestria a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis, como bem diz a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 em seu artigo 127.

Como visto alhures, o inquérito civil é um dos instrumentos mais eficazes que o Ministério Público tem para recolher elementos de prova.

A instauração do inquérito civil não se destina exclusivamente a possibilitar a propositura da ação civil pública, mas, antes de tudo e fundamentalmente, visa à apuração séria de fatos que cheguem ao conhecimento do Parquet, tendo a precípua finalidade de permitir a atuação legítima e a formação do convencimento do agente político ministerial quanto à verificação da hipótese concreta que exija a interveniência da Instituição, tanto no que diga respeito à tomada de providências de caráter extrajudicial, como a expedição de recomendação e o compromisso de ajustamento de conduta com o inquirido, quanto na persecução da justa tutela de direito.

Pela via Judicial o MP se vale da Ação Civil Pública para pleitear a reparação dos danos morais e patrimoniais a interesses difusos e coletivos. Excepcionalmente um direito individual homogêneo pode ser tutelado quando esta for a forma para que indiretamente se possa defender um interesse difuso ou coletivo. A ação civil pública tem por objetivos prevenir, reparar e ressarcir os danos causados a interesses metaindividuais.

Conclui-se, portanto, que em suas profícuas atividades cotidianas o Ministério Público assegura a defesa plena dos direitos dos consumidores, bem com perpetua o respeito pelos princípios que norteiam o Código de Defesa do Consumidor, tanto extrajudicialmente, quanto judicialmente.

 

Sobre o autor
Midian Dias Monteiro

Bacharel em Direito. Pós-graduada em Direito Civil e Processual Civil

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo elaborado em cumprimento ao trabalho de conclusão do curso de Pós-graduação em Direito Civil e Processual Civil.

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