Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Dano Moral Punitivo x Indústria do Dano Moral

Agenda 28/09/2016 às 11:08

Em uma época de grandes violações de direito das pessoas e da chamada "indústria do dano moral", o que podemos trazer de novo para solucionar esse problema, punindo os violadores de direito sem alimentar a "indústria do dano moral"?

Tendência na atualidade, o dano moral sempre foi visto como uma forma de indenizar uma pessoa que teve sua honra e seu moral ofendidos, deixando-os com uma péssima imagem perante a sociedade ou com sentimentos de inferioridade, por conduta ilegal de uma pessoa.

            Entretanto, com o passar dos anos, as pessoas começaram a adentrar com processos na Justiça – principalmente no Juizado Especial, onde o processo é mais célere e, em primeiro grau, não possui custas nem honorários de sucumbência – com o intuito de cobrar dano moral junto do direito que o motivou a impetrar a ação, ou em situações de pequeno desgaste emocional, onde raramente acreditamos que houe dano à honra ou moral do impetrante, e sim mero aborrecimento ocorrido pelo convívio diário entre as pessoas. De qualquer forma, o Judiciário começou a abarrotar de ações de danos morais, o que os juristas passaram a acreditar na chamada “indústria do dano moral”, quando meros aborrecimentos passaram a ser qualificados com graves danos à honra e moral, gerando devida indenização.

            Junto da chamada “indústria do dano moral” – e até a incentivando -, nasceu o chamado Dano Moral Punitivo. No chamado Dano Moral Punitivo, não basta para incidir o dano moral a violação da honra ou moral do ofendido, mas também que o réu da ação – normalmente empresas – violem direitos daquela pessoa de forma grave e o pagamento do respectivo Dano Moral seria uma forma não apenas de indenizar a honra e o moral ofendido, mas de punir (por isso o nome punitivo) pela violação ocorrida – como uma espécie de multa por ocorrência de ato ilegal, mas devido e recolhido pelo próprio autor.

            Contudo, o Judiciário brasileiro, por ocasião da “indústria do dano moral”, passou a acreditar que determinar o pagamento de indenização por dano moral à vítima da ofensa a seu direito, a título ofensivo, era errôneo, por entender que seria enriquecimento sem causa, vedado pelo ordenamento jurídico – ou, quando determinava o respectivo pagamento, fazia em termos chulos, com valores irrisórios e que não cumpre a intenção de, de fato, punir o autor da violação, principalmente empresas de grande porte. Nem mesmo em situações mais graves o valor era demasiadamente alto, incentivando aos que possuem grande valor econômico, principalmente empresas, a continuarem violando direitos das pessoas, sem qualquer sanção de grande porte por parte do Estado.

            Dessa forma, o que poderia ser feito? Se condenarmos aos violadores de direito a pagarem exorbitantes valores a título de punição, com o intuito de desincentivar a prática ilegal, faríamos que as vítimas enriquecem sem causa e poderíamos motivar mais e mais ações de dano moral, alimentando a “indústria do dano moral”. Se não condernarmos, incentiva-se a prática ilegal por parte dos violares de direito, já que a condenação é irrisória e pouco faz diferença em seu bolso. A resposta, talvez, se encontra no Direito Penal, a qual podemos aplicar analogicamente – lembrando que, pelo certo, ao se falar de punição, é devido fazer tal aplicação análoga dos direitos e garantias próprias do Direito Penal, como o indubio pro reo.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

            O art. 43 do Código Penal, com redação dada pela Lei 7.209/84 (Reforma da Parte Geral do Código Penal), trata das chamadas penas restritivas de direito, a qual decorrem quando o réu, não reincidente em crime doloso e que foi apenado a até 4 (quatro) anos de prisão, por crime sem violência ou grave ameaça, pode trocar a pena privativa de liberdade (prisão) por penas restritivas de direito, a qual, logicamente, restringem direitos do réu, sem, contudo, restringir com o peso da prisão, em qualquer regime. E uma das penas restritivas de direito é a prestação pecuniária (inciso I do referido art. 43), que consiste “no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos.” (art. 45, § 1º).

            Ou seja, aquele réu condenado por um crime, quando presentes os requisitos, pode pagar – a qual popularmente chamamos de “cesta básica” – para a vítima ou para entidades públicas ou privadas de destinação social, ao invés de ser preso pelo tempo imposto na sentença criminal a qual lhe condenou. E o que podemos usar analogicamente a prestação pecuniária para o Dano Moral Punitivo? Simples. Pode-se obrigar o autor da violação de direitos alheios a pagar, a título de Dano Moral Punitivo, um montante à vítima, que não cause locupletamento sem causa, e o restante da punição poderá ir a entidades públicas ou privadas de assistência social. Assim, a vítima é ressarcida sem que se enriqueça sem causa – não alimentando a “indústria do dano moral” – e o violador de direitos ainda é punido de forma a desincentivar a continuação de violação de direitos alheios.

Sobre o autor
Rodrigo Picon

Formado em Direito pelo Instituto Tancredo de Almeida Neves e pós-graduado em Direito Penal Econômico Aplicado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), Rodrigo Picon é advogado, regularmente inscrito pela Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais, escritor e contista. Atua nas áreas criminal, empresarial, penal econômica, tributária, difusos e coletivos e de adequação à Lei Geral de Proteção de Dados. É autor dos livros "Direitos Difusos e Coletivos" e "Código Penal Comentado".

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!