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Justiça Restaurativa:uma opção à lotação do sistema carcerário brasileiro.

O objetivo do artigo é trazer à tona uma reflexão sobre o problema da violência e da criminalidade no Brasil, apontando a Justiça Restaurativa como um caminho para a resolução dos conflitos que existem entre a vítima e o acusado.

Resumo

          O presente trabalho, vinculado à linha de pesquisa em Direito Penal, aborda o tema da justiça restaurativa, tanto de um ponto de vista teórico quanto a partir de algumas experiências de implementação no Brasil e em outros contextos. O objetivo geral é trazer à reflexão o problema da violência e da criminalidade no Brasil, apontando a Justiça Restaurativa como um caminho para a resolução dos conflitos que existem entre a vítima e acusado.

Justificativa

        Mostrar a possibilidade que há dentro do sistema penal a resolução de conflitos entre a vítima e o ofensor por meio de terceiros que conduzem o processo buscando um entendimento entre as partes, e não obstante, a viabilização de uma alternativa à teoria penal mista adotada expressamente pelo ordenamento jurídico brasileiro nos termos do artigo 59 do Código Penal.

Introdução

            A Justiça Criminal implementada e ratificada pelo ordenamento jurídico brasileiro apresenta-se em crise, diante de práticas políticas e sociais, que diante dos fatos demonstram não surtir os efeitos esperados, desta forma, não atendendo a finalidade de reprovar e prevenir o crime como disposto no artigo 59 do Código Penal, e assim os conflitos se tornam cada vez mais constantes. Ora, devemos nos atentar a qual seria a finalidade da teoria mista das penas, para isto necessita de um estudo detalhado das duas principais finalidades. A começar pela reprovação do crime, este instituto visa retribuir o crime ao individuo infrator, como um meio direto de punição àquele que infringiu a norma, notadamente essa ação tem como único objetivo o sujeito ativo do crime. Já a prevenção do crime pode ser específica e geral, no primeiro caso a aplicação da pena visa, também, o sujeito ativo do crime, já na segunda visa toda a sociedade, ambas com a finalidade de que, a aplicação daquela pena mostre que o Estado está presente para coibir atos ilícitos, de certa forma este instituto tem por objetivo impor umas espécie de medo de ser punido.

            Porém, a Justiça Criminal no Brasil sofre com as dificuldades para efetivamente cumprir o que determina o ordenamento jurídico. E o pouco que consegue efetivar, não o faz de forma adequada. Podemos observar isto, com as numerosas demandas enfrentadas pelos juízos penais, e por consequente a longa espera por um julgamento, fato que por si já atrasa o direito ao contraditório e a ampla defesa. Outro problema, ainda processual, está na defesa do acusado, grande parte dos acusados não têm condições financeiras – tão pouco patrimoniais- de arcar com honorários advocatícios, e a defensoria pública (garantia constitucional) é tão sobrecarregada quanto o judiciário. Contudo, o maior problema está na execução das penas, onde temos estabelecimentos penais insuficientes e desestruturados, a população carcerária cresce enquanto a capacidade dos estabelecimentos muda de forma inversamente proporcional, quase não se investe nestes locais, o que se pode tirar por resultado disto, é uma completa violação do maior de todos os direitos fundamentais: a dignidade da pessoa humana. Outra crítica ao sistema penal atual é numérica ao se falar em reincidência, dados de meados de 2013 indicavam a exorbitante marca de 47,4% de reincidentes. Algo que intensifica uma teoria chamada de “escola do crime”, que diz que os condenados estão tocando experiências e com isso, cometendo novos delitos ao serem reintegrados a sociedade, o que derruba por terra a finalidade de prevenir novos atos ilícitos.

Notavelmente existe uma larga dificuldade de resolver tais mazelas sociais com a Justiça Retributiva e eminentemente punitiva, pois um conflito mal solucionado gera outros conflitos, seguindo, deste modo, uma cadeia incessante de criminalidade, com a consequente impunidade. Provocando, as seguintes indagações: Será que a Justiça está sendo feita?; Será que não há um outro modelo a ser seguido?; Até quando é possível viver com tanta violência e intolerância? Diante dessa realidade cabe a todos iniciar a quebra de paradigmas, com novas visões de Justiça e com a cultura de que cada comunidade deve ser respeitada, porém, lhes deve ser apresentadas novas formas de resoluções de conflitos.

            Por conseguinte, resta claro a importância do tema Justiça Restaurativa por ser atual e trazer consigo uma carga de discussão valorativa muito extensa, com implementação recente no país, embora já venha sendo adotada em outras nações com resultado de sucesso. A pretensão neste trabalho é apresentar sua definição de forma clara e objetiva, sua evolução histórica até o surgimento no Brasil, seus objetivos, identificando as formas restaurativas e sua aplicabilidade no direito brasileiro, além do que, se pretende trazer a baila uma análise da realidade da política criminal brasileira de maneira sucinta, de modo a identificar pontos importantes, através dos quais a Justiça Restaurativa teria significante aplicabilidade, porque sempre voltada para a transformação de pensamentos e concepções, com o objetivo de promover os Direitos Humanos e a paz social.

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Hoje a Justiça Restaurativa pode ser uma boa alternativa à justiça criminal, pois se propõe a solucionar questões para além da punição. Com ela pretende-se solucionar o conflito e restabelecer o convívio social, resgatando a sensação de segurança, mas sabemos que tal proposta não vai funcionar em todo e qualquer tipo de crime.
 

Desenvolvimento

         A justiça restaurativa destaca-se no cenário internacional contemporâneo como uma forma de resolução de conflitos diversa do modelo de justiça criminal tradicional. Surge a partir dos movimentos de contestação das instituições repressivas e da participação dada às vítimas no processo penal e, assim, passa a ser construída sob princípios diversos. No Brasil, diante da realidade seletiva, repressiva e desproporcional apresentada pelo nosso sistema penal, a justiça restaurativa ganha força como outra opção no controle de crime. A partir da implantação, em 2005, de projetos-piloto restaurativos no cenário pátrio, o tema recebeu maior atenção nos meios acadêmicos e institucionais brasileiros. Contudo, as experiências restaurativas nacionais, principalmente quanto à justiça penal para adultos, limitam-se aos casos dos crimes tidos como de menor potencial ofensivo, embora não haja um momento rigidamente estabelecido dentro do organograma procedimental para sua realização, podendo a prática anteceder a própria acusação, ocorrer antes ou após a sentença ou no curso da própria execução da pena, deve haver indícios que sustentem o recebimento de uma acusação formal para que possa ela ser iniciada. A preparação do caso compreende as ações que são adotadas antes da realização da prática restaurativa, e tem uma importância tão fundamental quanto estes atos (conferências, painéis, círculos), tidos como o momento crucial do Renato Campos Pinto De Vitto Justiça Restaurativa 45 procedimento restaurativo. Para que se tenha condições de lograr bons resultados na aproximação da vítima e ofensor, deve ser dispensada cuidadosa seleção e preparação do caso para a realização da prática restaurativo, o que inclui análise pormenorizada dos autos e outros atos investigativos voltados ao conhecimento das suas circunstâncias, o que deve ser efetuado por profissional dotado de conhecimento multidisciplinar e capacitação específica, a fim de se confirmar a possibilidade de aplicação da prática àquele caso concreto. Segue-se a tal análise a realização de contatos com as partes envolvidas, que visam a confirmação da adequação do caso à prática, bem como o esclarecimento destas em relação ao funcionamento da prática restaurativa e identificação de pessoas próximas às partes, ou representantes da comunidade afetada, bem como sua preparação para tomarem parte na prática restaurativa adotada. A prática restaurativa em si, que deve reunir essencialmente vítima e ofensor e os técnicos responsáveis pela condução dos trabalhos (normalmente denominados facilitadores), e podem incluir familiares ou pessoas próximas a estes, além de representantes da comunidade, e os advogados dos interessados, se o caso. Deve ocorrer preferencialmente em local neutro para as partes, e se desenrola, basicamente, em duas etapas: uma na qual são ouvidas as partes acerca dos fatos ocorridos, suas causas e conseqüências, e outra na qual às partes devem apresentar, discutir e acordar um plano de restauração. Ressalte-se que é fundamental assegurar aos participantes boa informação sobre as etapas do procedimento e conseqüências de suas decisões, bem como garantir sua segurança física e emocional. Nesta ocasião o papel dos facilitadores é muito importante, os quais devem ser tão discretos quanto possível, no sentido de não dominarem as ações do evento, mas conduzirem as partes no caminho de lograr, por seus próprios meios, o encontro da solução mais adequada ao caso. Há de ser resguardado o sigilo de todas as discussões travadas durante o processo restaurativo, e seu teor não pode ser revelado ou levado em consideração nos atos subseqüentes do processo, o que inclui a própria admissão da responsabilidade deduzida com o fim de deflagrar a prática restaurativa. A impossibilidade de obtenção de um acordo restaurativo, igualmente, não pode ser utilizado como fundamento para o agravamento da sanção imposta ao ofensor. O eventual acordo obtido na prática restaurativa deve ser redigido em termos precisos e claros, sendo que as eventuais obrigações nele estampadas devem ser razoáveis, proporcionais e líquidas, devendo prever as formas de se garantir o cumprimento e a fiscalização das condições nele estatuídas. É de se ponderar que o plano restaurativo pode estar sujeito à análise judicial antes de sua homologação e por certo deverá influir na definição da reprimenda aplicada àquele caso concreto. O amadurecimento do modelo trazido pela justiça restaurativa deve precipitar uma discussão sobre quais são as expectativas dos protagonistas do acontecimento delitivo em relação às possíveis formas de reação do Estado, e bom por isso tal paradigma guarda um potencial revolucionário no que tange ao Direito Penal. A correta aplicação do modelo, deve provocar, em longo prazo, uma mudança de concepção em relação ao papel do Estado no fenômeno criminal com a definitiva inclusão da vítima e com o fortalecimento do papel da comunidade nesse processo. No entanto, em um contexto de proliferação da chamada “cultura do medo” e a amplificação, pelos meios de comunicação de massa, da doutrina da lei e da ordem, há que se cercar de todas as cautelas possíveis para que o empoderamento da comunidade na busca das soluções de seus próprios conflitos não se dê em detrimento de todo o processo histórico de proteção e afirmação dos direitos humanos.

Conclusão

          A Justiça Restaurativa representa um novo paradigma aplicado ao processo penal, que busca intervir de forma efetiva no conflito que é exteriorizado pelo crime, e restaurar as relações que foram abaladas a partir desse evento. Assim, e desde que seja adequadamente monitorada essa intervenção, o modelo traduz possibilidade real de inclusão da vítima no processo penal sem abalo do sistema de proteção aos direitos humanos construído historicamente. Com isto, é possível a diminuição do número de processos existentes, e da população carcerária, existindo assim a possibilidade de se efetivado o caráter humanitário de execução das penas.  É necessário, porém, compreender corretamente os pressupostos teóricos e principiológicos das práticas restaurativas, a fim de que seja afastado o risco existente no modelo retributivo e não estar embutido em um discurso supostamente progressista e garantista. Ressalte-se, neste diapasão, que há de ser repelida a visão reducionista que identifica a Justiça Restaurativa com mecanismos de mera reparação pecuniária, ou submissão do infrator a constrangimento ou humilhação. Daí a importância de não se descurar da indissociabilidade do sistema com o aparato de proteção aos direitos humanos. O modelo de justiça restaurativa busca intervir positivamente em todos os envolvidos no fenômeno criminal. Pretende, destarte, tocar a origem e causa daquele conflito, e a partir daí possibilitar o amadurecimento pessoal do infrator, redução dos danos aproveitados pela vítima e comunidade, com notável ganho na segurança social. 

Referências

PINTO, Renato Sócrates Gomes. A construção da Justiça Restaurativa no Brasil. O impacto no sistema de Justiça criminal. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n.1432, 3 jun. 2007.

LOPES JUNIOR, Aury. Introdução crítica ao processo penal: fundamentos da instrumentalidade constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

SICA, Leonardo. Justiça Restaurativa e Mediação Penal. O Novo Modelo de Justiça Criminal e de Gestão do Crime. Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris, 2007.

Sobre os autores
Lucineudo Oliveira de Lucena

Escrivão da polícia civil do estado ceará

Eduardo Gonçalves Amorim

Discente do 7º Semestre do Curso de Direito da Faculdade Paraíso do Ceará, em Juazeiro do Norte.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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