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A fungibilidade das medidas de urgência à luz da nova reforma processual

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Agenda 30/06/2004 às 00:00

3 A SISTEMÁTICA DO § 7º DO ARTIGO 273 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL:

3.1- O duplo sentido da fungibilidade das medidas de urgência:

A sistematização da fungibilidade vem a permitir, incidentalmente, a concessão de provimentos cautelares no bojo do processo de conhecimento, de modo que o autor, não correrá o risco de ver negada a providência requerida em decorrência da não interposição de processo autônomo, uma vez que os requisitos exigíveis naquele serão os mesmos destes. Neste sentido, faz-se pertinente transcrever os dizeres de Humberto Theodoro Jr., citado por Fredie Didier Jr., como sugestão que fora quase que literalmente acolhida pelo legislador pátrio :

Não se deve, portanto, indeferir tutela antecipada simplesmente porque a providência preventiva postulada se confundiria com medida cautelar, ou rigorosamente, não se incluiria, de forma direta, no âmbito do mérito da causa. Havendo evidente risco de dano grave e de difícil reparação, que possa, realmente, comprometer a efetividade da futura prestação jurisdicional, não cometerá pecado algum o decisório que admitir, na liminar do art. 273 do CPC, providências preventivas que, com mais rigor, deveriam ser tratadas como cautelares. Mesmo porque as exigências para o deferimento da tutela antecipada são maiores do que as da tutela cautelar. [40]

O §7º do artigo 273 trata, expressamente, da fungibilidade da tutela antecipada para a tutela cautelar, ou seja, tendo o autor requerido a antecipação de tutela, quando, na realidade, a providência pretendida possuir natureza cautelar, poderá o Juiz adaptar o requerimento, transformando o pedido de tutela antecipada em cautelar incidental. Neste caso, em termos processuais, a questão será resolvida nos próprios autos, assim como se procederia a um pedido de antecipação dos efeitos da tutela. Entende Marinoni que "o §7º do art. 273 não supõe a identidade entre a tutela cautelar e tutela antecipatória ou trata da possibilidade de toda e qualquer cautelar poder ser requerida no processo de conhecimento." Refere, ainda, que "tal norma, partindo do pressuposto de que, em alguns casos, pode haver confusão entre as tutelas cautelar e antecipatória, deseja apenas ressalvar a possibilidade de se conceder tutela urgente no processo de conhecimento nos casos em que houver dúvida fundada e razoável quanto à sua natureza (cautelar ou antecipatória)" [41].

Em uma análise superficial do dispositivo supra, poder-se-ia dizer que o legislador pretendeu consagrar norma já elencada no Estatuto Processual Civil, qual seja a disciplinada no artigo 250 [42], na medida em que o erro de forma não subsistirá em prejuízo do direito, devendo ser aproveitada a postulação efetuada pelo autor, muito embora a tenha sido feita nominalmente equivocada. Entretanto, apesar de a própria Exposição de Motivos do Projeto de Lei 3.476/00, no que pertine ao § 7º do artigo 273, registrar a expressão "fungibilidade de procedimento", entende-se ser equivocada tal interpretação, eis que a hipótese ali tratada não se limita a tão pouco, tratando-se sim de fungibilidade na prestação de tutela jurisdicional, ou seja, de pedidos.

Por outro lado, mesmo antes da primeira alteração sofrida no artigo 273 do Código de Processo de 1973, a fungibilidade não figurava como algo totalmente desconhecido dos doutrinadores, tendo em vista o poder geral de cautela conferido aos juízes, que possibilitava conceder medidas que nem ao menos restaram tipificadas pelo legislador, conhecidas por cautelares inominadas.

Convém notar, outrossim, que a fungibilidade tutelar prevista neste novo parágrafo, ora em análise, representa a consolidação de uma norma de extrema importância aos operadores do direito, pois tem por escopo proporcionar aos mesmos uma tranqüila aplicação das providências emergenciais, além de permitir ao juiz conhecer, acautelar e executar no mesmo processo, o que vem a favorecer os litigantes, e, conseqüentemente, realizar efetivamente o direito material, alcançando, desta forma, a paz social.

De outra banda, cumpre assinalar que o entendimento literal da norma em comento, é no sentido de que a fungibilidade somente será possível regressivamente, ou seja, requer-se a medida cautelar sob o título de tutela antecipada. A divergência se dá quanto à possibilidade da chamada fungibilidade "progressiva", na qual pleitear-se-ia a antecipação de tutela em providência cautelar, considerando-se que está é vista como menos rigorosa que aquela.

A relutância em aceitar tal entendimento encontra respaldo na falta de procedimento compatível com a pretensão satisfativa, de maneira que voltar-se-ia às incertezas iniciais, pois permitir a fungibilidade, sem alteração procedimental, seria incentivar o uso da ação cautelar satisfativa. No entanto, nada impede que o Juiz, ao deparar-se com pedido antecipatório em processo cautelar, conceda, por exemplo, a medida com a condição de que se proceda a conversão para o rito comum, o que, diga-se, é perfeitamente viável em consonância com o princípio da instrumentalidade das formas. Assim, tanto a parte não verá sua pretensão afastada por equívocos técnicos, quanto o Estado cumprirá sua função sem deter-se em questões meramente formais. Desta feita, a par do que fora dito, torna-se absurda qualquer determinação no sentido de extinguir-se o feito por desconformidade com o procedimento adotado [43].

Há casos, ainda, nos quais, a rigor, o que caberia era a antecipação de tutela, sendo que, no entanto, utiliza-se da medida cautelar preparatória pois face à urgência da situação, seria inviável o ajuizamento de uma ação de conhecimento, tendo em vista a indisponibilidade de elementos e meios de provas necessários.

Posta assim a questão, é de se dizer que, uma vez satisfeitos os pressupostos exigíveis para a concessão da tutela antecipada, nada impede que esta seja deferida sob a nomenclatura equivocada de medida cautelar, ou seja, o duplo sentido vetorial da fungibilidade das medidas de urgência deve ser cabalmente aceito pelos operadores do direito, desde que, obviamente, preenchidos os requisitos necessários para tanto [44].

Caso contrário, todo o discurso em defesa da busca por uma ordem jurídica justa, que propicie maior efetividade ao processo em geral, tornar-se-ia incoerente, pois novamente seria acatado apenas aquilo que fora previsto expressamente na lei, sem considerar a interpretação de uma tutela, cuja previsão seja abrangente às várias situações não especificadas na norma legal. Saliente-se que, ao surgir dúvidas quanto à possibilidade de fungibilidade das medidas, cai ao lanço analisar os fatos expendidos pela parte requerente, de modo que, independente da qualificação jurídica expressada na inicial, caberá ao Juiz, ao constatar a existência dos requisitos necessários, conceder o pedido, inobstante seja feito a outro título.

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Convém ponderar, de outra banda, que o texto do § 7º do artigo 273 comporta regra de exceção, devendo ser interpretado restritivamente. A par disso, suscitou Joel Dias Figueira Júnior que "o equívoco capaz de agasalhar a aplicação do princípio da fungibilidade há de ser escusável" [45]. Aduz, ainda, que "o chamado erro grosseiro ou evidente não comporta a incidência deste princípio, por revestir-se de caráter sempre excepcional, apropriado a corrigir distorções de ordem jurídica, justificáveis pelas circunstâncias, ou, em razão de modificações supervenientes no plano fatual" [46]. Com isto, percebe-se que a intenção do legislador não fora confundir os institutos da antecipação de tutela e medida cautelar, mas sim solucionar problemas muito comuns na prática forense, a fim de evitar dano ou perecimento do direito em face do formalismo exacerbado característico de alguns Magistrados ou, também, para os casos em que estes possuem uma interpretação diferenciada do procurador do autor, justamente porque a tutela pretendida encontra-se em uma zona limítrofe entre a satisfação e a asseguração de um direito.

Por outro lado, a rotina forense tem-se mostrado flexível à aplicação da fungibilidade às medidas de urgência, ou seja, apesar de ser qualificada como regra de exceção, a tendência é de que, estando presentes os requisitos para a concessão da tutela pretendida, embora sob errônea nomenclatura, seja adotada a fungibilidade.

Sendo assim, muito embora a lei tenha elencado a fungibilidade apenas em um sentido, sendo que muitos doutrinadores ainda entendam que a norma deva ser literalmente interpretada, o contexto atual preza por decisões aptas a uma compreensão mais ampla do preceito, aceitando, por vezes, a fungibilidade inversa das medidas de urgência e não prevista no texto, o que, notoriamente, dependerá do poder geral de cautela conferido ao juiz, bem como da presença dos requisitos necessários à admissibilidade da tutela pretendida.

Dito isto, importante assinalar que, parte da doutrina ainda reluta em aceitar plenamente a desnecessidade do processo cautelar, insurgindo-se pela utilização do processamento em apenso da demanda cautelar quando isto se mostrar necessário, ou seja, quando a fungibilidade dos pedidos representar complicações processuais e procedimentais que acarretem verdadeiros tumultos processuais. No entanto, seria extremado aceitar-se, especialmente com a introdução do § 7º ao artigo 273 do CPC, o indeferimento de plano do pedido de antecipação de tutela, em face da necessidade de processamento em separado. Estar-se-ia contrariando todo o discurso em prol da efetividade e economia processual, ao passo que, oportuna será a decisão que apenas não conhecer do pedido, determinando-se a adequação da peça, com o aproveitamento da mesma, e não, simplesmente, indeferindo-a.

O Desembargador Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, em recente Acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, no qual fora revisor e redator, decidiu favorável à tese aqui defendida, sendo oportuna a transcrição de algumas de suas palavras:

(...) Assim, do ponto de vista processual, não há óbice a que se conheça um pedido de liminar como antecipação de tutela ou como medida cautelar, pois o que define a natureza jurídica da postulação é a essência da pretensão deduzida em juízo e não o eventual nomen juris que a parte circunstancialmente tenha atribuído em sua petição. Em qualquer circunstância, cabe ao juiz, repita-se, em atenção à instrumentalidade, à efetividade do processo e à fungibilidade – que têm sua razão de ser apenas na realização efetiva dos direitos – conhecer do pedido segundo a sua natureza jurídica determinada em função da essência do que é postulado. (...) E se assim há de ser para o caso em que equivocadamente for postulada antecipação de tutela em lugar de cautelar, o mesmo deve ocorrer para a situação contrária, isto é, quando for erroneamente postulada medida cautelar em lugar de antecipação de tutela, tudo pelo simples fato que não há justificativa prestante para não se reconhecer a fungibilidade inversa. [47]

Por derradeiro, mister ressaltar que a adaptação da fungibilidade dos provimentos de urgência protege não somente aos interesses do autor, mas aos do réu também, eis que a dilação temporal do procedimento comum lhe permitirá oferecer defesa condizente com a pretensão satisfativa que lhe foi direcionada, o que não ocorreria no procedimento cautelar, considerando que o prazo de resposta neste é de apenas cinco dias, enquanto no procedimento cognitivo são quinze dias para oferecer a contestação, por exemplo.

3.2. A discricionariedade judicial:

Mister inferir, num primeiro momento, que o processo civil clássico afastava qualquer possibilidade de o juiz agir discricionariamente, eis que deveria estar extremamente vinculado à lei, não cabendo-lhe interpretá-la, mas tão-somente aplicá-la. É cediço que esta vinculação tornou-se impossível atualmente, uma vez que desumano seria exigir-se do legislador a elaboração de normas capazes de abarcar todas as situações passíveis de conflitos. Desta forma, os poderes conferidos ao juiz foram alargados, permitindo-se, por vezes, que interprete a norma legal, adaptando-a aos casos concretos, devendo, no entanto, fundamentar o ato jurisdicional prestado. Neste cerne, aduziu Eduardo Melo de Mesquita que

O ordenamento jurídico positivo pode ser completo em determinados sistemas e em certo momento histórico, mas isso não é regra geral e única, porque nem sempre é possível assegurar que todos os casos achem uma solução na legislação positiva. [48]

Convém ressaltar que a discricionariedade aqui tratada não deve ser confundida com arbitrariedade por parte do órgão julgador, eis que esta representa uma afronta ao estado democrático de direito, sugerindo sempre a prática de atos contrários ao ordenamento jurídico, geralmente acrescidos de alguma abusividade. Na verdade, quando se fala em discricionariedade judicial, deve-se fazer alusão ao livre arbítrio do julgador, ou seja, a faculdade concedida ao juiz, pela própria lei, de decidir com base no seu livre e prudente critério, conhecido por convencimento motivado [49].

De outra banda, vale dizer, também, que o tema proposto não deve comportar os conceitos utilizados no direito administrativo para conceituar o ato discricionário, no qual o juiz da discricionariedade será apenas a administração pública e jamais o Poder Judiciário, sendo que representa a possibilidade que tem o agente administrativo para agir ou não agir em determinada direção, consultando para isso apenas a oportunidade e conveniência. Caso contrário, se fossem transportados tais conceitos para o âmbito judicial, estar-se-ia admitindo a possibilidade de que, qualquer pronunciamento judicial realizado sob o manto da discricionariedade, pudesse encontrar mais de uma solução válida e correta, vinculada tão-somente na oportunidade e conveniência.

Pretende-se demonstrar, com isto, que há situações submetidas ao pleito judiciário para as quais existem alternativas de decisões válidas e legítimas, de maneira que o julgador, baseado nas peculiaridades do caso concreto, bem como nas suas convicções político-sociais, poderá optar livremente pela hipótese que lhe parece ser a mais coerente, ou seja, que melhor lhe convencer, considerando que sua escolha será feita sempre de forma motivada. Neste caso, a discricionariedade pode ser observada quando se ingressa na instância recursal, na qual, por meio de outros julgadores, altera-se a sentença impugnada, admitindo-se a outra hipótese que não fora acolhida pelo julgador a quo, sem considerar, todavia, errônea a decisão de primeira instância, denotando-se, assim, que foram admitidas duas interpretações e escolhas igualmente válidas. Nesse diapasão, suscitou Joel Dias Figueira Júnior que

O ato discricionário do juiz, na grande maioria das vezes, não passa de um ato decisório sem conteúdo algum de discricionariedade pura, tratando-se de interpretação e aplicação da norma jurídica ao caso concreto, utilizando-se o julgador de critérios previamente estabelecidos na lei e de métodos exegéticos diversos sem perder de vista os fins sociais da lei e as exigências do bem comum, podendo decidir-se entre uma das várias alternativas legítimas, apresentadas no processo (versões). [50]

Importante ressaltar que a discricionariedade conferida ao juiz possui uma zona de abrangência, ou seja, sua liberdade de convencimento não poderá extrapolar os limites do razoável, do exigível, do adequado e do proporcional, de modo que seja aplicada a solução que o julgador acreditar seja a melhor possível, desde que, para tanto, alcance a finalidade da norma legal. Na verdade, a valoração efetivada pelo juiz para a solução de questões não previstas expressamente no ordenamento jurídico deve coadunar-se com as concepções sociais vigentes, sendo que seus critérios pessoais não haverão de confrontar com o que se considera padrão na sociedade em que vive.

Ao tratar especificamente da antecipação de tutela e da tutela cautelar, isoladamente, não há que se falar em discricionariedade judicial, eis que, uma vez presentes os requisitos ou pressupostos de admissibilidade das respectivas medidas, estas deverão ser concedidas, não ficando subordinadas a critérios subjetivos, de modo que o julgador não terá liberdade decisória [51]. Obviamente que, a tarefa do juiz de avaliar os respectivos pressupostos de admissibilidade da antecipação de tutela e da tutela cautelar consiste em uma interpretação subjetiva, pois os conceitos acabam por ser indeterminados, o que resultará em uma decisão fundamentada em verdade aparente e não real, sendo que, no entanto, não se tem isto por discricionário, pois não há liberdade de escolha, mas apenas de interpretação [52]. Argumenta Eduardo Melo de Mesquita que, nestes casos, "a discricionariedade judicial localiza-se em momento anterior àquele em que ocorre a constatação fática dos elementos constantes da norma, pois aí não pode mais o julgador deixar de aplicá-la" [53].

No entanto, a dúvida surgida diz respeito à expressão "...poderá o juiz..." empregada no parágrafo 7º do artigo 273, centrando-se a questão no verbo poder, sendo que é questionado se o mesmo fora empregado para designar uma faculdade conferida ao juiz, ou seja, se ele poderá deixar de aplicar o princípio da fungibilidade se assim entender, ou, por outro lado, se fora incluído na norma para representar um poder-dever do julgador quando presentes os requisitos para a concessão da tutela cautelar incidental. Em outras palavras, faz-se relevante identificar se o ato judicial de deferimento ou indeferimento da fungibilidade dos pedidos da tutela é revestido de discricionariedade.

Urge inferir que, in casu, o verbo "poder" supõe a existência de discricionariedade judicial quanto à aplicação ou rejeição da fungibilidade entre as duas formas de tutela de urgência, preconizada no novo parágrafo do artigo 273, não representando, desta forma, um dever do órgão julgador. Isto porque, considera-se que caberá ao juiz avaliar as conseqüências de sua providência, ou seja, sopesar até que ponto será vantajoso aos litigantes a conversibilidade dos pedidos ou, de outra feita, se isto não tumultuará o processo, prejudicando a todos os envolvidos. Neste caso, pode-se afirmar que o ato de aceitação ou não da fungibilidade consiste em discricionariedade judicial pura, uma vez que o juiz decidirá sobre a conveniência e oportunidade procedimental da concessão da medida cautelar no bojo do processo de conhecimento. Ademais, como já fora exposto anteriormente, não se pode descartar a possibilidade de fungibilidade inversa ao que expressou a lei, o que, inclusive, tem sido acatado por muitos julgadores, corroborando, assim, com a aludida discricionariedade judicial na decisão a respeito da fungibilidade de medidas de urgência.

Percebe-se que, atualmente, a figura do juiz contemporâneo é orientada no sentido de que suas decisões sejam funcionais, na medida em que, ao considerar as condições socioeconômicas, o julgador sente-se bem mais atrelado à necessidade de proporcionar uma ordem jurídica justa, a qual atinja os reais anseios dos litigantes, do que vinculado aos exatos ditames da lei. Isto pode explicar a ocorrência de decisões judiciais que, aparentemente, são contrárias à lei, mas em perfeita harmonia com o sistema jurídico. A par disso, tem-se que o poder discricionário deve corresponder à satisfação do interesse público, pois ao juiz caberá efetuar a escolha da solução considerada mais justa e equânime, salientando-se ser esta a característica principal na diferenciação de um ato estatal livre daquele emanado de uma atividade particular, que tende a ser mais arbitrário do que discricionário, eis que não corresponde ao interesse coletivo.

Considerando que, por diversas vezes, a dúvida seja motivo de preocupação para o juiz, na medida em que passa a questionar-se qual a melhor solução a ser tomada, cabe ao mesmo cotejar as circunstâncias do caso concreto que está a decidir com a finalidade da norma, até mesmo para que possa mensurar a conveniência e oportunidade de adotar determinada solução, sendo que acabará por escolher aquela que for considerada a melhor possível, embora, em alguns casos, isto represente uma diminuição de sua liberdade valorativa. Sendo assim, a discricionariedade judicial esbarra em dois limites, quais sejam, um externo, relacionado ao princípio da legalidade, ao passo que sua liberdade de escolha estará jungida aos parâmetros da lei, ainda que estes sejam flexíveis e, outro interno, concernente à finalidade a ser alcançada com a escolha feita.

Feitas estas considerações, mister concluir que, o chamado "poder discricionário" conferido ao juiz contribuiu fundamentalmente para a efetivação da tutela jurisdicional, especialmente com a inserção no ordenamento da antecipação de tutela e do poder geral de cautela, este anterior àquela, tendo o legislador propiciado a tais normas uma carga de indeterminação suficiente para que o juiz se desvinculasse de certa forma das mesmas, a ponto de tornar-se imperativa a sua discricionariedade, ao menos quanto à interpretação de seus requisitos. Os resultados foram tão evidentes, que o próprio legislador ampliou este poder-dever discricionário na nova reforma processual, onde a liberdade do julgador é notória na admissão ou não da fungibilidade entre as medidas de urgência, demonstrando, com isto, o grau de confiança depositado na figura do aplicador da lei em favor de uma maior efetivação processual.

Sobre a autora
Andressa Bozzi Tonetto

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria/RS

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TONETTO, Andressa Bozzi. A fungibilidade das medidas de urgência à luz da nova reforma processual. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 358, 30 jun. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5404. Acesso em: 5 nov. 2024.

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