V - CONCLUSÃO
Para tratar do tema que nos propusemos a abordar vários são os caminhos que podem ser trilhados, os quais dependem, essencialmente, da nossa postura ideológica em face da própria Constituição Federal.
De fato, ao tratar dos limites eventualmente existentes para a atuação do Poder Constituinte Derivado Reformador, ou simplesmente "competência reformadora", como preferem alguns juristas, esbarramos em determinados conceitos, ou melhor, preconceitos que são inerentes a todo e qualquer operador do direito. Assim, há seguramente muitos que defendem uma maior flexibilidade das chamadas "cláusulas pétreas", entendendo ser possível alterar até mesmo certos comandos existentes nos incisos do artigo 5º da Constituição Federal.
Outros, por seu turno, crêem na intangibilidade dos direitos e garantias individuais, mas, preocupam-se em limitar ao extremo sua eventual ampliação a outros dispositivos da Constituição, admitindo tal situação apenas em casos extremos, muito embora percam-se na tentativa de justificar tais limitações, como ocorre, por exemplo, na inclusão tão somente dos artigos 150 e 151 da Lei Maior sob o manto da perenidade.
Nós, por outro lado, nos filiamos a corrente de pensamento que entendemos ser a mais coerente e democrática, optamos por defender uma interpretação extensiva do § 2º do artigo 5º da Constituição Federal, incluindo entre as cláusulas pétreas toda e qualquer princípio constitucional que assegure direitos e garantias individuais aos contribuintes, independentemente de sua localização topográfica na Constituição.
Essa postura nos permite concluir, especialmente no que respeita às Emendas Constitucionais, que sua edição pode sim ser questionada toda vez que for detectada ofensa, violação, ou tentativa de supressão dos princípios constitucionais tributários, desde que estes possam ser caracterizados como verdadeira cristalização de direitos e garantias individuais.
Entretanto, a mera postura ideológica não se revela suficiente para fundamentar nossa conclusão, e, é por essa razão que buscamos apresentar nos capítulos que compõem o presente trabalho bases sólidas para a tese adotada, bem assim demonstrar sua aplicação prática de forma a que a discussão não fosse entendida como mera divagação, sem importância prática real.
Assim, ao tratarmos da função do Poder Constituinte Derivado Reformador, nos moldes em que foi instituído pela Constituição federal de 1988, buscamos na melhor doutrina a ratificação da tese segundo a qual este (o Poder Reformador) não pode ser exercido sem respeitar os limites, os parâmetros, impostos pela própria Lei Maior.
Nesse contexto, diferenciar o Poder de Reforma da Constituição daquele que efetivamente é exercido para inaugurar a ordem jurídica de uma sociedade (Poder Constituinte Originário) revelou ser de importância fundamental, principalmente para demonstrar que somente este último é que pode ser exercido sem qualquer tipo de limite ou condição.
Caracterizada a existência de limites para a edição de Emendas Constitucionais - que nada mais são do que a exteriorização da atuação do Poder Constituinte Derivado Reformador - necessário indicar quais seriam estes limites, e, graças a uma expressa previsão constitucional não é difícil fazê-lo, bastando singela leitura do § 4º do artigo 60 da Carta Magna.
Mas, faltava ainda saber se, no âmbito do direito tributário, existiriam comandos que pudessem ser incluídos entre tais cláusulas pétreas, e, principalmente, se o ordenamento admitia tal inclusão, no que concluímos que aos princípios constitucionais tributários pode ser atribuído tal adjetivo, desde que, por óbvio, tragam em seu bojo verdadeiros direitos e garantais individuais dos contribuintes.
O mais importante, assim, é compreender a razão que levou renomados juristas como Sacha Calmom Navarro Coelho e Clélio Chiesa a defender a perenidade de determinados princípios constitucionais tributários, estendendo-a além daqueles elencados nos artigos 5º, 105 e 151 da Constituição Federal.
A resposta, como não poderia deixar de ser, é simples e envolve, além da postura ideológica já mencionada – referente adoção de uma interpretação extensiva do art. 5º, § 2º da CF -, a postura no sentido de reconhecer nestes princípios verdadeiras reafirmações ou extensões dos direitos e garantias individuais.
Enumerar, um a um, os citados princípios, como o fez o Professor Sacha Calmom Navarro Coelho, não era nosso objetivo, posto que entendemos que os princípios constitucionais podem e devem ser extraídos pelo próprio operador do direito, bastando, para tanto, que compreenda a razão pela qual os juristas usualmente os apontam como tais.
A conclusão, portanto, que efetivamente responde aos questionamentos de nosso espírito e intelecto é no sentido de que as violações aos princípios constitucionais tributários – entendidos estes como verdadeiras exteriorizações de direitos e garantias individuais dos contribuintes constitucionalmente positivadas - implicam, sim, em argumento sólido e juridicamente plausível a fim de promover o questionamento das Emendas Constitucionais que pretendam alterar a redação original da Lei Maior a fim de assegurar que não permaneçam no ordenamento aquelas que não respeitem o limite material consubstanciados nas cláusulas pétreas.
Entendemos, por fim, que o presente estudo pode e deve ser estendido a todo e qualquer remo do direito, envolvendo todos os princípios constitucionais que se caracterizem por externar ampliações ou reafirmações de direitos e garantias individuais, de forma a minimizar o crescente desvirtuamento no exercício do Poder Constituinte Derivado Reformador, limitando-o à função que originalmente lhe foi outorgada pela Assembléia Nacional Constituinte de 1988, e, principalmente, respeitando os limites por ela impostos.
VI - BIBLIOGRAFIA
Chiesa, Clélio. O ICMS e a EC33. São Paulo: Dialética, 2003.
Cretella Júnior, José. Elementos de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tributnais, 1998.
David Araújo, Luiz Alberto; Nunes Júnior, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1998.
FREU ROSA, Antônio José Miguel. Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1998.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2001.
Navarro Coelho, Sacha Calmon. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2001
Salomão, Marcelo Viana. O ICMS e a EC 33. São Paulo: Dialética, 2003.
Temer, Michel. Elementos de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1995.
Notas
1
Alexandre de MORAES. Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 34.2
Antônio José Miguel FREU ROSA. Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1998., p. 2.3
José Cretella Júnior. Elementos de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tributnais, 1998. p. 86.4
Op. Cit., p.178.5
Michel Temer. Elementos de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 34.6
Op. Cit., p.527.7
Ob. Cit., p. 5298
In: Revista Dialética de Direito Tributário nº 92., p. 42.9
In: Revista de Direito Tributário nº 69, p. 218.10
Ob. Cit., p. 54.11
Vale destacar, novamente, a já citada posição do Ministro Carlos Velloso no sentido de incluir tão somente os princípios constitucionais insertos nos artigos 150 e 151 dentre as cláusulas pétreas.12
Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 315.13
Sacha Calmon Navarro Coelho. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 179.14
Clélio Chiesa. O ICMS e a EC33. São Paulo: Dialética, 2003. p. 16.15
Op. Cit. p. 492.16
Marcelo Viana Salomão. O ICMS e a EC 33. São Paulo: Dialética, 2003. p. 153.