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A responsabilidade tributária dos sócios gerentes nas sociedades de cotas por responsabilidade limitada à luz do art. 135 do Código Tributário

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Agenda 05/08/2004 às 00:00

CAPÍTULO III

3. SUJEITO PASSIVO

3.1 NOÇÕES GERAIS

Ao presente trabalho interessa apenas a discussão no tocante ao sujeito passivo tributário, desconsiderando as divergências acerca do sujeito ativo.

Como foi exposto, a obrigação tributária surge com a eclosão da situação fática prevista na hipótese tributária. Conseqüentemente surge o sujeito passivo da obrigação tributária.

A obrigação tributária encontra-se como um antecedente lógico e necessário da sujeição passiva tributária, e corresponde à vinculação da pessoa obrigada ao pagamento ou cumprimento dessa obrigação.

No entanto, deve-se entender o assunto proposto, da forma em que foi analisada pelo autor LUCIANO AMARO [39]:

[...] a identificação do sujeito passivo da obrigação principal (gênero) depende apenas de verificar quem é a pessoa que, à vista da lei, tem o dever legal de efetuar o pagamento da obrigação, não importando indagar qual o tipo de relação que ela possui com o fato gerador.

Esse entendimento decorre em razão de nem sempre o sujeito passivo da obrigação tributária ser quem realize o cumprimento do crédito oriundo da obrigação. A lei pode imputar o cumprimento da obrigação a pessoa diversa da que deu causa a hipótese tributária.

RUBENS GOMES DE SOUZA [40] lembrava que, pelo critério econômico, o tributo deveria ser cobrado de quem "tira uma vantagem econômica do ato, fato ou negócio tributário".

Diante desse entendimento tem-se o chamado sujeito passivo direto, em que o crédito tributário é cobrado do indivíduo que se beneficia economicamente da situação que constitui o critério material da hipótese tributária. Ainda encontra-se o sujeito passivo indireto, em que o dever tributário é imputado a pessoa que não tenha tirado vantagem econômica do fato jurídico tributário.

O surgimento da sujeição passiva indireta pode dar-se por transferência e substituição. Nesta, a lei substitui o sujeito passivo direto por outro, fazendo a obrigação tributária nascer já com o substituto como sujeito passivo.

Já a transferência ocorre quando depois de a obrigação ter nascido contra o sujeito passivo direto, por força de acontecimento posterior ou concomitante àquele nascimento, a obrigação é transferida a outra pessoa.

Ainda com relação ao surgimento do sujeito passivo indireto através da transferência, esta é dividida em três modalidades: solidariedade, sucessão e responsabilidade.

Essas figuras são ensinadas por RUBENS GOMES DE SOUZA [41]:

a) Solidariedade: é a hipótese em que duas ou mais pessoas sejam simultaneamente obrigadas pela mesma obrigação;

b) Sucessão: é a hipótese em que a obrigação se transfere para outro devedor em virtude do desaparecimento do devedor original; e por fim,

c) Responsabilidade: é a hipótese em que a lei tributária responsabiliza outra pessoa pelo pagamento do tributo, quando não seja pago pelo sujeito passivo direto.

Dentre as três modalidades de transferência, a responsabilidade é mais importante para o presente trabalho, e será objeto de discussão no próximo capítulo.

3.2 CONTRIBUINTE

Como visto, na clássica dicotomia da sujeição passiva tributária, tem-se o sujeito passivo direto, que é aquele que beneficia-se economicamente com o fato jurídico tributário, sendo chamado de contribuinte.

O autor ALIOMAR BALEEIRO [42] entende diferente, afirmando que "o contribuinte caracteriza-se pela relação pessoal e direta com o fato gerador: quem pratica, em seu nome, o ato jurídico ou o fato previsto lei".

Observa-se que o enfoque econômico dado pela doutrina clássica não esta presente no ensinamento do autor. É dada importância a relação com o fato que desencadeou a incidência da norma tributaria.

No mesmo sentido LUCIANO AMARO [43] diz que "pela ligação entre a ação e o agente, é que estaria a relação pessoal e direta a que o Código Tributário Nacional se refere na identificação da figura o contribuinte".

Pode-se dizer que o indivíduo que realiza o aspecto material da hipótese tributária está pessoal e diretamente relacionada à obrigação tributária, podendo ser chamado de contribuinte.

O contribuinte deve ser aquele que praticou a situação descrita na hipótese tributária, aquele a quem pode ser imputada à autoria e a titularidade do fato jurídico tributário. A partir do momento em que o indivíduo realiza a hipótese tributária da regra jurídica, este incide sobre o fato lícito, irradiando relação jurídico-tributária entre um particular (sujeito passivo), na condição de devedor, e um órgão estatal, na condição de credor.

Assim, a pessoa que efetivamente obtiver renda, está praticando a materialidade da hipótese tributária do imposto sobre renda, definido como acréscimo patrimonial, e em regra só dele poderá ser cobrado tributo a este título.

Deve-se ainda observar, que a identificação do contribuinte fica adstrita a previsão legal, seja constitucional ou infraconstitucional, e esta última com observância à distribuição de competência tributária.


CAPÍTULO IV

4. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA

4.1 RESPONSÁVEL

Observa da explanação sobre o contribuinte, que este deve se achar ligado direta e pessoalmente à hipótese tributária, ou ao menos tirar algum proveito econômico da situação, conforme ensina a doutrina clássica.

No entanto, com o fim de ampliar o rol de sujeitos submetidos ao adimplemento da obrigação tributária, o legislador estabelece situações em que pessoas sem ligação pessoal e direta com a hipótese tributária podem ser compelidas ao pagamento do tributo.

Nesta idéia filia-se o autor HUGO DE BRITO MACHADO [44] ensinando que:

Por conveniência da administração tributária, a lei pode atribuir o dever de pagar o tributo à outra pessoa, que não tenha relação de fato com o fato tributário, eliminando ou não esse dever do contribuinte.

A responsabilidade no Direito Tributário decorre de expressa disposição legal. Assim é que o artigo 121 do Código Tributário Nacional a define:

Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.

Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:

I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;

II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação, decorra de disposição expressa em lei.

Desta forma, diz-se responsável à pessoa que, sem se revestir da condição de contribuinte, isto é, sem ter relação pessoal e direta com a hipótese tributária, tem um vínculo com a obrigação decorrente de dispositivo expresso na lei.

Assim, é atribuída a obrigação de saldar o crédito tributário, não só àquele diretamente ligado à relação jurídica tributária, ou seja, o contribuinte, mas também aquele que, por qualquer motivo, deva responder pela obrigação tributária em vez do contribuinte ou juntamente com este.

LUCIANO AMARO [45] explica que:

A presença do responsável como devedor na obrigação tributária traduz uma modificação subjetiva no pólo passivo da obrigação, na posição que, naturalmente, seria ocupada pela figura do contribuinte. Contribuinte é alguém que, naturalmente, seria o personagem a contracenar com o Fisco, se a lei não optasse por colocar outro figurante em seu lugar (ou ao seu lado), desde o momento da ocorrência do fato ou em razão de certos eventos futuros.

Às vezes, pessoas que não participam do fato jurídico tributário, sendo, por isso, completamente estranhas à relação tributária, acabam sendo chamadas para responderem pela obrigação tributária oriunda de fato jurídico tributário praticado por outrem. Tal acontece quando, por algum acontecimento concomitante ou subseqüente, a pessoa assuma a posição de responsável tributário, ou seja, de responsável pelo pagamento da obrigação tributária de outrem.

Mas através da dicção do artigo 128 do Código Tributário Nacional [46], observa-se à situação em que também serão atribuídas à qualidade de responsável, a terceiro ligado ao fato jurídico tributário.

No entanto, não se pode olvidar que só a lei pode atribuir a alguém a condição de sujeito passivo da obrigação tributária, seja na condição de contribuinte, substituto tributário ou responsável.

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Portanto, o sujeito passivo responsável é o que concretiza todos os atos elencados na hipótese de incidência especificamente da responsabilidade, e conseqüentemente é exigida a imposição do pagamento da obrigação tributária a terceira pessoa.

4.2 RESPONSABILIDADE DE TERCEIROS

Neste tópico, serão abordadas todas as peculiaridades da responsabilidade tributária de terceiros referente ao artigo 135, inciso III do Código Tributário Nacional.

4.2.1 Atribuição pessoal

A responsabilidade tributária de terceiros deve ser entendida como exceção no ordenamento jurídico, tendo em vista que a regra é a distinção entre as obrigações da sociedade e as dos sócios, como pôde ser visto no primeiro capítulo deste trabalho.

Por não ser o responsável tributário aquele que realiza o fato jurídico tributário que dá azo ao surgimento da obrigação tributária, observa-se que o responsável não é componente de um liame estritamente tributário, mas sim de outro, de cunho sancionatório.

Ainda, estabelece o artigo 135 do Código Tributário Nacional que:

Art. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados, com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:

I – [...];

II – [...];

III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Pode-se notar, pelo disposto no artigo supra, que se trata de uma responsabilidade pessoal, ou seja, que deve ser afastada a existência de solidariedade ou subsidiariedade nestes casos.

Tão somente o terceiro responsável é que suportará o crédito tributário, vez que se pode entender que o contribuinte será excluído da relação tributária.

Neste sentido ensina o doutrinador LUCIANO AMARO [47]:

Em confronto com o artigo anterior, verifica-se que esse dispositivo exclui do pólo passivo da obrigação a figura do contribuinte (que, em princípio, seria a pessoa em cujo nome e por cuja conta estaria agindo o terceiro), ao dispor no sentido que o executor do ato responda pessoalmente. A responsabilidade pessoal deve ter aí o sentido (que já se adivinha no art. 131) de que ela não é compartilhada com o devedor "original" ou "natural".

Aqui, com a devida venia, se faz necessário tecer uma crítica, ao sistema adotado para a imposição da responsabilidade estabelecida no artigo 135 do Código Tributário Nacional. O que se pode observar na maioria dos julgados acerca da responsabilidade tributária, é uma atribuição de responsabilidade subsidiária, em que se aguarda a inadimplência da sociedade, para após, requerer a substituição do contribuinte pelo responsável.

Pela compreensão do artigo 135 do Código Tributário Nacional, observa-se não ser assim, a forma mais acertada para agir, visto que, observado a prática dos atos descritos na norma, já dá ensejo à cobrança pessoal do responsável.

4.2.2 Extensão da responsabilidade tributária

Ainda analisando o dispositivo supra, evidencia-se que a pessoa a que foi atribuída a responsabilidade ficará obrigada não só ao tributo devido, mas também aos acréscimos previstos em lei.

Assim, também é o entendimento do autor GELSON AMARO DE SOUZA [48]:

[...] a restrição de ser expressa em lei e como não o foi neste ponto, não existe restrição, e a responsabilidade é, pois, integral e completa por toda a obrigação tributária, abrangendo tributos e outros encargos, inclusive multas, qualquer que seja a sua espécie ou origem.

4.2.3 Fatores de atribuição da responsabilidade tributária

Continuando a análise no artigo 135, encontram-se inúmeras discussões acerca das possibilidades de serem atribuídas a terceiros a responsabilidade pessoal pelo crédito tributário.

O texto normativo dispõe que o indivíduo para receber a sanção de assumir a obrigação tributária integralmente, deve ter praticado atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

Até aqui sem maiores transtornos. No entanto a doutrina diverge, se tais atos ensejadores da responsabilidade são os mesmo que deram origem a obrigação tributária, ou pode ser qualquer ato, mesmo que posterior a origem da obrigação tributária.

O doutrinador GELSON AMARO DE SOUZA [49] adere a segunda posição, ensinando que:

[...] não são os responsáveis tributários partícipes da situação geradora da obrigação tributária; a esta não se vinculam, apenas se tornam responsáveis por circunstâncias outras, e somente são responsáveis pelo pagamento da dívida tributária originada por outrem.

Às vezes, essa nova situação ocorre muito tempo depois e quanto o crédito tributário já se encontra constituído [...]

O autor citado entende ser irrelevante se os atos que ensejam a responsabilidade, são os mesmo que deram causa a obrigação tributária, assim não importando se o ato foi simultâneo ou posterior ao surgimento da obrigação tributária.

Ainda o mesmo autor [50], afirma que:

Essa atuação ou omissão, reclamada pela norma do art. 135, não tem como finalidade dar origem à obrigação tributária, como pode ser imaginado à primeira análise, mas apenas dar origem à transferência da responsabilidade por obrigações tributárias já existentes.

A ausência de ligação do responsável com o fato jurídico tributário que ensejou a obrigação tributária decorre do fato de que se a conduta do responsável foi fundamento para a exação, estaria-se diante de uma relação de contribuinte direito ou originário.

Já o autor ALIOMAR BALEEIRO [51], em posição diferente, entende que:

A peculiaridade do art. 135 está em que os atos ilícitos ali mencionados, que geram a responsabilidade do terceiro que os pratica, são causa (embora externa) do nascimento da obrigação tributária, contraída em nome do contribuinte; mas contrariamente a seus interesses.

O autor se posiciona no sentido de que para ocorrer subsunção da hipótese de incidência referente à responsabilidade aos atos praticados, devem ter ligação com os que fizeram eclodir a obrigação tributária.

Desta forma, pode-se dizer que a prática de tais atos, devem ser concomitantes ao surgimento da obrigação.

Esse entendimento decorre da interpretação do dispositivo estudado, na medida em que o mesmo reza que "são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados [...]", concluindo que o surgimento da obrigação foi resultado da prática do ato ilícito por uma das pessoas elencadas nos incisos do artigo supra, de forma contrária aos interesses do contribuinte.

Nesse mesmo sentido, é o entendimento o autor LUIZ EMYGDIO F. DA ROSA JUNIOR [52], ensinando que, "[...] só se pode aplicar a referida regra se o ato for ao mesmo tempo tributável, sem ter havido pagamento de tributo, e constituir infração de lei, contrato social ou estatuto".

Frise-se bem, que o sócio-gerente pratica atos, mas em nome e em proveito da sociedade, e na medida em que os praticam de forma dolosa ou fraudulenta, estar-se-ia agindo sem o consentimento da sociedade, vez que esta é instituída apenas para a prática de atos lícitos, como pôde ser visto no início deste trabalho.

E, não se esquecendo de que a prática dos atos descritos no artigo 135 do Código Tributário Nacional devem decorrer de dolo. Há necessidade de comprovação do elemento subjetivo. A conduta deve ser premeditada, com fim de fraudar ou praticar algum ilícito. Não basta o simples descuido, conhecido como culpa.

Fala-se que o indivíduo agiu com excesso de poderes, quando pratica atos sem a concessão de poderes específicos, ou seja, age fora dos limites que lhe são atribuídos através do contrato social ou estatuto. Sua conduta extrapola os poderes de gestão que lhe são autorizados.

O contrato social ou estatuto é um elemento da sociedade. É no contrato social ou estatuto que se concretiza as vontades dos sócios ao constituir a sociedade.

No contrato social ou estatuto deve constar todos os elementos necessários para a constituição e condução da sociedade.

O indivíduo apenas pode ser responsabilizado quando atue fora dos limites de sua competência. Esta atuação além de configurar excesso de poderes, se dá com infração das normas que limitam essa competência, que são exatamente a lei societária, o contrato social ou os estatutos.

Ao passo que o indivíduo age contrariamente a uma cláusula constante no contrato social ou estatuto, se sua conduta originou uma obrigação tributária, possível será atribuição de responsabilidade tributária, lembrando é claro que essa conduta dele ser dolosa.

Com relação à infração a lei, observa-se que o legislador não a especificou. Por isso muito se tem divergido no sentido de qual lei que contrariada, geraria a responsabilidade tributária.

HAROLDO FUNKE [53] explica que:

É sabido que os administradores de sociedades, além dos deveres previstos no contrato social ou nos estatutos, têm também deveres legais expressos e implícitos, previstos na legislação que rege os diversos tipos de sociedade (Código Comercial, Lei das Sociedades Anônimas, Lei das Sociedades Limitadas).

[...]

É a infração desses deveres que entendemos se refere à expressão infração de lei, contida na norma codificada, quando do mesmo ato, concomitantemente, resultam relações jurídicas diversas [...]

Raros os autores que ousam indicar qual lei deve ser infringida para caracterizar a responsabilidade. No entanto, pode-se encontrar doutrinadores que dizem serem suscetíveis de atribuição de responsabilidade, a infração de qualquer lei, como é o caso do autor GELSON AMARO DE SOUZA [54].

Parece esta a posição mais correta, mas não se pode olvidar que deve se tratar de um ilícito deliberado, arquitetado, marcado pelo elemento subjetivo doloso que fundamenta a fraude ou o excesso de poderes.

Com relação às pessoas passíveis de praticar os atos conforme estabelece o artigo 135 do Código Tributário Nacional, deve-se ater apenas as elencadas no inciso III do referido Código, e mais precisamente ao gerente.

O objetivo principal do presente trabalho é demonstrar as possibilidades de responsabilidade dos sócios da empresa em face do artigo estudado, e em que pese à doutrina e a jurisprudência, o único que pode ser responsabilizado é o sócio-gerente.

À mesma idéia filia-se o autor HUGO DE BRITO MACHADO [55]:

Destaque-se desde logo que a simples condição de sócio não implica responsabilidade tributária. O que gera a responsabilidade, nos termos do art. 135, III, do CTN, é a condição de administrador de bens alheios. Por isto a lei fala em diretores, gerentes ou representantes.

Mesmo porque o texto normativo determina a responsabilidade do gerente, e em nenhuma das hipóteses relaciona-se os sócios da empresa como responsáveis tributários, havendo impossibilidade, pois, de se cogitar na atribuição de tal responsabilidade quando o sócio sequer estava investido de funções diretivas da sociedade.

4.3 SITUAÇÕES CONFIGURADORAS DA RESPONSABILIDADE DE TERCEIROS

A partir de agora, estará sendo analisadas situações fáticas originárias da responsabilidade tributária, através de julgados, dando enfoque às principais circunstâncias que ao longo dos anos foram configurando o instituto ora estudado.

4.3.1 Atribuição da responsabilidade tributária ao sócio-gerente

A jurisprudência tem exigido que o sujeito ativo demonstre os fundamentos, de fato e de direito, para a exigência do crédito tributário da pessoa do sócio-gerente, enquanto responsável tributário.

Em se tratando de redirecionamento com espeque na responsabilidade de que trata o artigo 135, III, do Código Tributário Nacional, tem-se exigido dois requisitos:

I) que demonstre que o sócio exerceu a gerencia na época da ocorrência do fato jurídico tributário da obrigação tributária;

II) que a obrigação decorra de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

São requisitos que pela simples leitura do artigo 135 do Código Tributário Nacional pode ser extraído.

Atualmente os maiores problemas acerca do assunto estão guardados na interpretação do que venha a ser excesso de poderes e infração a lei, contrato social ou estatutos, mas nem sempre foi esse o grande dilema do instituto, vez que através de julgados antigos, pode-se encontrar inúmeras diferenças do atual entendimento.

É assente na doutrina e na jurisprudência atual que apenas os sócios incumbidos da função diretiva da sociedade pode ser responsabilizado, mas os nossos tribunais já decidiram de forma contraria. Veja-se o arresto do Tribunal Regional Federal da 4ª Região [56]:

Origem: Tribunal - Quarta Região

Processo: 91.04.09797-1 UF: PR

Órgão Julgador: Segunda Turma

Data da Decisão: 30/04/1992

Tributário. Execução Fiscal. Agravo de instrumento. Empresa irregularmente dissolvida. Débitos fiscais remanescentes. Sócio-quotista. Responsabilidade. Art. 135, III, do CTN. Lei 6830/80. Precedente. Recurso provido.

1. O sócio-quotista de sociedade por quotas de responsabilidade limitada irregularmente dissolvida responde pelas dívidas remanescentes perante a fazenda pública, ainda que não participante da administração, se não provada a regular extinção da empresa nem indicados bens (art. 135, III do CTN, lei 6830/80 e ac num: 66.160 uf: RJ, Rel. min. Geraldo Sobral, Trib: TRF, dj:040883), o que se faz possível via embargos, inclusive.

2. Agravo de instrumento provido.

Pode-se observar, que houve uma época em que era atribuída a responsabilidade aos sócios sem função diretiva, o que demonstra uma afronta ao texto do artigo 135 do Código Tributário Nacional, bem como ao princípio da legalidade.

Para impor um gravame a qualquer indivíduo no direito tributário, é notória a obrigatoriedade de que o mesmo esteja previsto em lei, e como já comentado, o artigo em discussão não faz alusão a atribuição de responsabilidade a sócio-cotista.

4.3.2 Responsabilidade tributária por inadimplência do tributo e ausência de bens para sua garantia

Se não bastassem os erros grosseiros que eram cometidos por nossos tribunais ao atribuir a responsabilidade ao sócio-cotista, era motivo de redirecionamento o simples fato de não serem nomeados bens a penhora, ou não os existirem para a solvência do crédito tributária.

Novamente a decisão vai de encontro ao sentido do texto normativo. Ao passo em que se responsabiliza um terceiro pelo fato da sociedade não ter bens para saldar o crédito, está-se diante do instituto da solidariedade, e como já foi visto, o artigo 135 do Código Tributário Nacional não a adota.

Ainda, é nítido o caráter objetivo ao atribuir a responsabilidade, esquecendo de analisar subjetivamente os atos que deveriam ter praticado o sócio-gerente para se ver colocado no pólo passivo da divida tributária.

Outra maneira de imputar a responsabilidade tributária ao sócio-gerente, é a do fato de não ter sido realizado o pagamento do crédito tributário, ou seja, a inadimplência dos tributos.

Observe-se o acórdão do Superior Tribunal de Justiça [57]:

Origem: Superior Tribunal de Justiça

Processo: RESP 211842/MG; RECURSO ESPECIAL

1999/0038092-4

Órgão Julgador: Primeira Turma

Relator: Min. GARCIA VIEIRA

Data da Decisão: 06/09/1999

PROCESSUAL CIVIL E COMERCIAL – RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS POR DÍVIDAS TRIBUTÁRIAS DA EMPRESA - PENHORABILIDADE DAS QUOTAS DE SÓCIO DE LIMITADA.

O não recolhimento de tributo devido pela pessoa jurídica constitui infração à lei, o que enseja responsabilidade dos sócios-gerentes. São penhoráveis, em execução, as quotas do sócio-gerente de sociedade por quotas de responsabilidade limitada e tal penhorabilidade não atenta contra o princípio da affectio societatis. Recurso improvido.

Esse entendimento foi alvo de inúmeras críticas. Utilizava os julgadores o argumento de que o não pagamento do tributo devido constituía infração à lei tributária, pelo fato não ter recolhido o tributo no prazo estabelecido.

Em que pese o atual entendimento dos tribunais pátrios, de que o simples inadimplemento, não gera a responsabilidade tributária, entende-se que a situação deve ser analisada com maior cautela.

O autor HUGO DE BRITO MACHADO [58] critica tal entendimento dizendo que:

Não se pode admitir que o não pagamento do tributo configure a infração de lei, capaz de ensejar tal responsabilidade, porque isto levaria a suprimir-se a regra, fazendo prevalecer, em todos os casos, a exceção.

Se considerar que o simples fato de não ser recolhido o tributo devido é caracterizador da responsabilidade, estar-se-ia diante mais uma vez de uma imputação objetiva.

Mas deve-se ressaltar que o estado de insolvência independe de vontade do sócio ou gerente. Simplesmente ele acontece em determinada conjuntura econômica afetando, com maior rigor, este ou aquele setor da atividade.

Assim, não há que se relacionar à responsabilidade com a falta (culposa ou não) de pagamento do tributo, mas sim com a forma em que se deu o nascimento do crédito tributário não pago.

E, considerando a situação do inadimplemento do tributo, deve-se entender que a simples falta de recolhimento do mesmo sem dolo e nem fraude, estaria representando tão-somente a mora do contribuinte, e não infração a lei, como já foi entendido.

O Superior Tribunal de Justiça [59] tem entendido da seguinte forma:

Origem: Superior Tribunal de Justiça

Processo: AGA 487076/SC; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2002/0162254-6

Órgão Julgador: Primeira Turma

Relator: Min. Luiz Fux

Data da Decisão: 29/09/2003

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ARTIGO 544 DO CPC. RECURSO ESPECIAL - EXECUÇÃO FISCAL - RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA - SÓCIO-GERENTE - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EXCESSO DE MANDATO, INFRAÇÃO À LEI OU AO REGULAMENTO.

1. A responsabilidade do sócio não é objetiva. Para que surja a

responsabilidade pessoal, disciplinada no art. 135 do CTN, é mister a comprovação de que ele, o sócio, agiu com excesso de mandato, ou infringiu a lei, o contrato social ou o estatuto. Precedentes jurisprudenciais.

2. Não havendo referida comprovação, não há como a execução fiscal ser redirecionada para ele.

3. Ressalva do voto com submissão à jurisprudência dominante, à luz da função precípua do E. STJ no sentido de que, em princípio, o sócio que recolhe os bônus lucrativos da sociedade, mas não verifica o adimplemento dos tributos, locupleta-se e a fortiori comete o ilícito que faz surgir a sua responsabilidade.

4. O sócio só deve ser acionado depois da empresa, não se lhe

imputando a responsabilidade por simples inadimplemento da obrigação tributária.(Precedentes)

5.Agravo regimental a que se nega provimento.

Aqui, observa-se o afastamento do entendimento da simples falta de recolhimento gerar responsabilidade. No entanto fica a ressalva de que agindo de forma fraudulenta deve o sócio-gerente ser responsabilizado.

O entendimento é de que se deparando com uma situação econômica da sociedade capaz de gerar lucros, e passíveis de serem percebidos pelos sócios, estaria caracterizada a intenção de não pagar o tributo não por dificuldades financeiras, mas sim com o fito de fraudar o fisco.

Ainda, o voto proferido pelo Ministro ARI PARGENDLER, nos autos de Recurso Especial [60] n.º 1.674, esclarece porque a simples falta de pagamento de tributos não gera responsabilidade:

[...] a falta de pagamento de tributos, quando resulta a álea natural aos negócios, não pode ser assimilada à infração prevista no art. 135, inciso III, do Código Tributário Nacional. Esta é modalidade restrita de infração à lei, aquela em que o sócio-gerente da pessoa jurídica, através de procedimentos ilícitos, visa encobrir a própria obrigação tributária (falta de escrituração regular) ou a diminuir as garantias do crédito tributário (dissolução irregular de sociedade).

4.3.3 Responsabilidade tributária pela dissolução irregular da sociedade

Ainda é muito debatido, o fato de atribuir a responsabilidade tributária ao sócio-gerente, por ter ocorrido à dissolução irregular da sociedade, ou seja, sem proceder ao distrato na Junta Comercial.

Para dissolver regularmente a sociedade perante a junta comercial, deve ser apresentado comprovante de pagamento de todos os débitos tributários, ou seja, através de certidão negativa dos órgãos incumbidos de tributar.

Com relação à comprovação de pagamento dos débitos fiscais, muito se tem discutido, porque estaria assim, ainda que indiretamente, responsabilizando o sócio-gerente que não dissolveu regularmente a sociedade pelo fato de não ter recolhido os tributos.

O indivíduo que está encerrando suas atividades, e não possui condições de saldar todas as dívidas tributárias, de maneira alguma teria possibilidade de proceder com a correta dissolução da sociedade, exceto se estivesse cometendo alguma fraude contra o fisco, tal como o desvio de bens da sociedade, mas que deve ser provado pelo fisco, ante se tratar de uma responsabilidade subjetiva.

O Superior Tribunal de Justiça [61] proferiu seguinte decisão, e que vem sendo seguida pelos demais tribunais:

Origem: Superior Tribunal de Justiça

Processo: RESP 513555/PR; RECURSO ESPECIAL 2003/0051437-0

Órgão Julgador: Primeira Turma

Relator: TEORI ALBINO ZAVASCKI

Data da Decisão: 06/10/2003

TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. PRESSUPOSTOS DE VIABILIDADE.

1. Para que se viabilize o redirecionamento da execução é indispensável que a respectiva petição descreva, como causa para redirecionar, uma das situações caracterizadoras da responsabilidade subsidiária do terceiro pela dívida do executado. Pode-se admitir que a efetiva configuração da responsabilidade e a produção da respectiva prova venham compor o objeto de embargos do novo executado. O que não se admite - e enseja desde logo o indeferimento da pretensão - é que o redirecionamento tenha como causa de pedir uma situação que, nem em tese, acarreta a responsabilidade subsidiária do terceiro requerido.

2. Segundo a jurisprudência do STJ, a simples falta de pagamento do tributo e a inexistência de bens penhoráveis no patrimônio da devedora (sociedade por quotas de responsabilidade limitada) não configuram, por si sós, nem em tese, situações que acarretam a responsabilidade subsidiária dos sócios

3. A ofensa à lei, que pode ensejar a responsabilidade do sócio, nos termos do art. 135, III, do CTN, é a que tem relação direta com a obrigação tributária objeto da execução. Não se enquadra nessa hipótese o descumprimento do dever legal do administrador de requerer a autofalência (art. 8º do Decreto-lei nº 7661/45).

4. Recurso Especial improvido.

O acórdão vem demonstrar, que a dissolução irregular da sociedade se dá pela omissão do sócio-gerente em requerer sua autofalência. Os argumento de que não teria outra forma de proceder a uma dissolução regular da sociedade sem o devido pagamento das dívidas tributária, é rechaçada, sob a alegação de que resta ao contribuinte requer sua autofalência.

Ainda, o julgado colacionado, retrata fielmente tudo o que até agora foi tentado demonstrar, ou seja, todas as peculiaridades do instituto, que parece estar sendo aplicada da forma mais correta, se comparada com as diversas fases de entendimento que o instituto sofreu.

Desta forma, deve-se entender que instituto da responsabilidade tributária teve uma evolução significativa nos últimos anos, a partir dos julgados apresentados.

Sobre o autor
Enéias dos Santos Coelho

Acadêmico do curso de Direito em Umuarama- PR

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COELHO, Enéias Santos. A responsabilidade tributária dos sócios gerentes nas sociedades de cotas por responsabilidade limitada à luz do art. 135 do Código Tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 394, 5 ago. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5522. Acesso em: 5 nov. 2024.

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