4. Conclusão
Os contratos atípicos surgiram em razão da proliferação das modalidades de negócios na sociedade moderna, decorrendo diretamente da autonomia da vontade privada, em razão da qual às partes é conferida ampla liberdade de regulamentação de suas avenças.
Ocorre, contudo, que tal liberdade encontra limites intransponíveis que devem ser observados quando uma das partes é colocada em situação de nítida desvantagem na contratação. Tal situação é verificada com muito maior freqüência nos contratos atípicos, que, por não estarem previstos em lei, e, por conseqüência, sujeitos a normas legais balizadoras, conferem às partes (especialmente para aquelas que obram de má-fé) um campo fértil para a imposição de iniqüidades.
Infelizmente, o Código Civil de 2002 dedicou apenas um dispositivo aos contratos atípicos (art. 425), que timidamente dispõe ser "lícito às partes a celebração de contratos atípicos, desde que observadas as normas gerais fixadas neste Código".
Por esta razão, outra não pode ser a interpretação do aludido dispositivo senão a de que, nos contratos atípicos, devem ser observados os princípios da proibição da onerosidade excessiva, da boa-fé objetiva e da função social do contrato, os dois últimos inseridos no novel diploma como verdadeiras cláusulas gerais.
Referidos princípios, de maneira inovadora, foram expressamente mencionados na parte geral dos contratos do Código Civil de 2002 (arts. 421, 422 e 478).
Sendo assim, ao aplicador do direito, cumpre o papel de aplicá-los com rigor e destemor aos contratos atípicos, a fim de que a ampla liberdade que caracteriza esses ajustes não se transforme em "liberdade escravidão", instrumento de opressão ou de enriquecimento indevido de uma das partes contratantes.
Notas
- A Comissão Elaboradora do Projeto de Código Civil de 1975, projeto que deu origem ao ora vigente Código Civil de 2002, tinha como diretriz a unificação do direito obrigacional num único diploma legislativo. E assim o fez, disciplinando, dentro do Livro I da Parte Especial (Livro das Obrigações), alguns contratos tipicamente empresariais, e dedicando livro próprio para o chamado Direito de Empresa, que contém regras de direito societário e do exercício da atividade empresarial.
- AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria geral dos contratos típicos e atípicos. São Paulo: Atlas, 2002. p. 132.
- Francesco Messineo classifica os contratos atípicos da seguinte forma: contratos inominados em sentido estrito ou puros: (a) com conteúdo completamente estranho aos tipos legais (por exemplo, contrato de garantia); (b) com, somente, alguns elementos estranhos aos legais, enquanto outros, com função prevalente, são legais (por exemplo, contrato de bolsa simples); contratos inominados mistos: (c) com elementos todos conhecidos (elementos legais), dispostos em combinações distintas (tomada mais de uma das figuras contratuais nominadas), elementos que podem estar entre si em relações de coordenação ou subordinação. Essa categoria é a mais numerosa, integrada por contratos unitários. A causa do contrato misto é, igualmente, mista, e advém de uma ou mais causas heterogêneas entre si. AZEVEDO, op. cit., p. 135.
- Idem, ibidem, p. 136.
- GOMES, Orlando. Contratos. 17.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 103.
- Nesse sentido, o Prof. Villaça acabou por formular um "Esboço de Anteprojeto de Lei para regulamentação geral dos contratos atípicos", em que elenca normas de caráter geral que visam a coibir os excessos de liberdade nocivos ao equilíbrio econômico dos contratantes nos contratos atípicos.
- O Prof. Álvaro Villaça Azevedo, reconhecendo a necessidade de aplicação aos contratos atípicos das três inovações em matéria contratual, trazidas pela teoria geral dos contratos do Código Civil de 2002 - todas analisadas no item 3 trabalho -, a elas faz alusão no art. 4º de seu "Esboço de Anteprojeto de Lei para regulamentação geral dos contratos atípicos", cuja redação é a seguinte: Art. 4º. "As partes devem utilizar-se do contrato atípico, segundo sua função social, observando os princípios da boa-fé objetiva, desde o momento anterior à formação do contrato até o posterior a sua extinção; o princípio da igualdade entre as partes contratantes, e, principalmente, o da onerosidade excessiva para que não exista enriquecimento injusto ou indevido". AZEVEDO, op. cit., p. 195.
- WAYAR, Ernesto. in Derecho Civil - Obligaciones. Tomo I, p. 19. apud MARTINS-COSTA, Judith. O Direito Privado como um "sistema em construção": as cláusulas gerais no Projeto do Código Civil brasileiro. Jus Navegandi, Teresina, abr. 2001. Disponível em <http://www.1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=513> Acesso em: 07 jun. 2004.
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- PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 10.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 98.
- A cláusula rebus sic stantibus entrou no direito moderno como teoria da imprevisão (bastante difundida no Brasil por Arnoldo Medeiros da Fonseca), teoria da base do negócio jurídico (Karl Larenz), e teoria da superveniência (Osti). PEREIRA, op. cit., p. 99.
Referências bibliográficas
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