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A lei da pessoa com deficiência e a incapacidade absoluta

Agenda 20/05/2017 às 15:16

Com a entrada em vigor da Lei nº 13.146/2015, conhecida como o Estatuto da Pessoa com Deficiência, esta trouxe diversos direitos, bem como fortalece a ideia de igualdade para a pessoa com deficiência.

RESUMO

Com a entrada em vigor da Lei nº 13.146/2015, conhecida como o Estatuto da Pessoa com Deficiência, esta trouxe diversos direitos, bem como fortalece a ideia de igualdade para a pessoa com deficiência. Assim, a própria lei determina que a deficiência não obsta que a pessoa possa exercer seus direitos, desde a casar, até participar da vida política e pública, sendo vedada qualquer tipo de discriminação, como por exemplo, verifica-se no Art. 6º da referida lei. Ademais, o mesmo alterou o texto do Art. 3º do Código Civil, que trata dos absolutamente incapazes dos atos da vida civil, onde na atual redação, a pessoa com deficiência não mais se enquadra na referida hipótese, sendo hoje a regra a responsabilidade limitada, sendo avaliado a deficiência por meio de equipe multiprofissional e interdisciplinar conforme o Art. 2 §1º da referida lei. Com relação a curatela, o mesmo somente é nomeado para a pessoa com deficiência para reger relações patrimoniais, e sendo ainda de caráter excepcional.

Palavras-Chave: Estatuto da Pessoa com Deficiência; Modificação do Art. 3º do Código Civil; Igualdade de condições para a pessoa com deficiência; Caráter excepcional da curatela.

INTRODUÇÃO

O presente artigo visa estudar, comentar e analisar a mudança legislativa dada pela Lei nº 13.146 em relação ao Código Civil.

A presente mudança legislativa modificou significativamente os conteúdos contidos nos Art. 3º e 4º do Código Civil, na qual se trata na capacidade da pessoa natural, trazendo uma nova perspectiva sobre os direitos do incapaz e da pessoa com deficiência.

O tema em análise é a modificação legislativa quanto ao Art. 3º do Código Civil, e qual a nova sistemática em relação à condição da pessoa que, anteriormente era considerado como absolutamente incapaz, hoje não mais prevê como absolutamente incapaz, mas tão somente, existe a previsão dos menores de 16 (dezesseis) anos considerado como absolutamente incapaz.

No presente artigo, visa esclarecer a importante modificação trazida pela Lei 13.146/2015 com relação ao Art. 3º do Código Civil, matéria que trata do rol dos absolutamente incapazes de exercer os atos da vida civil. Com a presente modificação legislativa, na forma do Art. 3º do Código Civil, é agora considerado somente como absolutamente incapaz o menor de 16 (dezesseis) anos, onde faz presente a indagação quanto a capacidade das pessoas com deficiência. Logo, o objetivo que se pretende alcançar é compreender a referida mudança legislativa seu impacto perante o conceito de incapacidade. O procedimento metodológico adotada giro em torno da própria legislação, artigos, e doutrina, com posições significativas para elucidação.

Qualquer mudança legislativa possui pontos importantes, o direito está em constante modificação e atualização para melhor atender as necessidades da sociedade.

1 BREVES CONSIDERAÇÕES DA TEORIA DA CAPACIDADE

A entrada em vigor do Código Civil de 2002 tratou logo em seu primeiro capítulo o tema das pessoas naturais. No referido capítulo trata do assunto ora objeto do presente artigo, qual seja, da capacidade de exercer os atos da vida civil.

Todos possuem capacidade de direito, que adquirimos com o nascimento com vida, mas nem todos possuem a capacidade de fato. Ambos não devem ser confundidos.

A capacidade de direito é comum a todo o ser humano, perdendo-se somente com a morte. Já a capacidade de fato, não é todas as pessoas naturais que possuem, pois nesta relaciona-se com a capacidade de exercer os atos da vida civil.

Assim preleciona Flávio Tartuce em seu Manual de Direito Civil a respeito do tema:

A norma em questão trata da capacidade de direito ou de gozo, que é aquela para ser sujeito de direitos e deveres na ordem privada, e que todas as pessoas têm sem distinção. Em suma, em havendo pessoa, está presente tal capacidade, não importanto questões formais como ausência de certidão de nascimento ou de documentos. É notório ainda uma outra capacidade, aquela para exercer direitos, denominada como capacidade de fato ou de exercício, e que algumas pessoas não tem. São incapazes, especificados pelos arts. 3º e 4º do CC/2002, e que receberão estudo em tópico próprio. Pois bem, a fórmula a seguir demonstra a questão da capacidade da pessoa natural: CAPACIDADE DE DIREITO (GOZO) + CAPACIDADE DE FATO (EXERCÍCIO) = CAPACIDADE CIVIL PLENA. (TARTUCE, Flávio, 2011, p. 66)

O velho brocado de todos possuírem capacidade de direito, mas nem todos possuem capacidade de fato é algo até hoje recente.

A Capacidade de Fato, na lição de Luciano Figueiredo e Roberto Figueiredo traduz um poder de autodeterminação e discernimento, reunindo capacidades físicas e psíquicas de compreender as consequências de seus atos. (FIGUEIREDO e FIGUEIREDO, 2016, p. 141).

Por consequência lógica, assim como estudado antes da lei 13.146/2015, aqueles que não são dotados de capacidade de fato, são considerados como incapazes.

Quando existe a somatória da capacidade de direito e da capacidade de fato, a doutrina costuma dizer que está presente a capacidade geral ou plena, podendo praticar todos os atos da vida civil, salvo algumas exceções previstas em lei onde se exige a autorização para a prática de determinado ato, podendo ser denominado como legitimação.

    1. DOS ABSOLUTAMENTE INCAPAZES ANTES DO ESTATUTO

No antigo texto disposto no Livro I, Título I do Código Civil, em seu Art. 3º dispõe o rol dos absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil.

Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I-os menores de dezesseis anos;

II-os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;

III- os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.

Verifica-se que na antiga redação, três eram as hipóteses que levariam a incapacidade absoluta em nossa codificação civilista, não sendo permitido à pessoa exercer sozinha os atos da vida civil.

Repita-se que não se trata aqui da não existência da capacidade de direito, mas trata-se da capacidade de fato, na qual, se o absolutamente incapaz exercer um ato, este será considerado nulo, pois na antiga redação, a sua vontade era irrelevante.

Quanto a inciso I, era considerado incapaz o menor de 16 (dezesseis) anos, pois, na inteligência do legislador, abaixo desse limite etário a pessoa é inteiramente imatura para atuar na orbita do direito.

Contudo, na forma do Enunciado 138 do CJF, dispõem que a vontade dos absolutamente incapazes, na hipótese do inc. I do Art. 3º é juridicamente relevante na concretização de situações existenciais a eles concernentes, desde que demonstrem discernimento bastante para tanto (Enunciados da III Jornada de Direito Civil). A título de exemplo quanto a aplicabilidade do Enunciado ora invocado é nas Ações de Adoção e Guarda.

No inciso II do artigo em comento, trata das pessoas que são acometidas de doença, ou deficiência mental, tornando-as incapazes de praticar os atos da vida civil. Conforme nos ensina Flávio Tartuce em seu Manual de Direito Civil:

O comando legal em questão trata das pessoas que padeçam de doença ou deficiência mental, congênita ou adquirida em vida de caráter duradouro ou permanente, e que não estão em condições de administrar seus bens ou praticar atos jurídicos de qualquer espécie. O ordenamento não admite os chamados intervalos lúcidos, pelo fato de a incapacidade mental estar revestida desse caráter permanente. (TARTUCE, 2011, pg.76)

A título de mera curiosidade, até porque o Código Civil de 1916 não está em vigor, mas nesta continha a expressão louca de todos os gêneros, em seu Art. 5º II do CC/1916. Com o Código Civil de 2002, tal expressão não é mais utilizada, entendendo o legislador que a expressão era injuriosa, discriminadora, violando a dignidade da pessoa humana.

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Por fim no inciso III nos trás o caso de uma causa transitória que impossibilita a manifestação de vontade, e a prática de um ato. Podemos citar como exemplo o estado de coma, em virtude de um acidente, onde a pessoa, transitoriamente está impossibilitada de manifestar sua vontade.

Em arremate, importante mencionar que os absolutamente incapazes, nos três incisos comentados na redação antiga do Art. 3º do Código Civil, estes são representados, pois sua vontade para o direito era irrelevante, sendo nulos os atos praticados sem a representação.

2 O ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA E A MODIFICAÇÃO DO ART.3º

Foi vislumbrado no tópico anterior como era a antiga redação disposto no Art. 3º do Código Civil, bem como quais eram considerado como absolutamente incapazes na orbita civil.

No dia 07 de julho de 2015 foi publicada a Lei 13.146/2015 que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), com objetivo de assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando a sua inclusão social e cidadania. Tal preceito vem disposto no Art. 1º do referido Estatuto.

Até então foi rapidamente analisado o instituto do Art. 3º do Código Civil em sua redação antiga demonstrando quem era para o direito os considerados absolutamente incapazes. Tal se justifica tendo em vista que com a entrada em vigor do Estatuto da Pessoa com Deficiência, o Art. 3º do Código Civil, bem como a ideia de incapacidade do Deficiente para o direito modificou conforme a frente será demonstrada.

Conforme o Parágrafo Único do Art. 1º do Estatuto da Pessoa com Deficiência nos trás a sua inspiração que é a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, ratificados pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 186/2008, em conformidade com o previsto no §3º do Art. 5º da Constituição Federal.

No Art. 2º do referido Estatuto nos mostra o conceito para o direito de Pessoa com Deficiência, na qual temos a seguinte redação:

Art.2º. Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

§1º. A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:

I-os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;

II-os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;

III-a limitação no desempenho de atividades; e

IV-a restrição de participação.

Logo, verifica-se que serão considerados como pessoa com deficiência aqueles que têm algum impedimento em suas faculdades físicas, mentais, intelectuais, onde dificulta a sua vida em sociedade.

Tal impedimento, conforme a letra da lei é de longo prazo, o que se verifica que não existe mais a incapacidade permanente para o direito, pois todas poderão ser de forma transitória, independente da enfermidade que incapacita a pessoa.

Nas lições de Luciano Figueiredo e Roberto Figueiredo em seu livro de Direito Civil Parte Geral, com as devidas modificações em relação a Lei 13.146/2015 assim dispõe:

Inicialmente, deve-se ressaltar que o Estatuto da Pessoa com Deficiência, Lei Federal nº. 13.146/2015, alterou significativamente a teoria das incapacidades e impactou sobremaneira os Art. 3º e 4º do CC. Veja-se por exemplo, que agora será absolutamente incapaz apenas o menor de 16 anos. A causa transitória, por outro viés, é hipótese de incapacidade relativa. (FIGUEIREDO Luciano, FUGUEIREDO Roberto, 2016, pg.156)

Conforme já mencionado pelos juristas, agora é considerado como absolutamente incapaz, na forma do Art. 3º do Código Civil o menor de 16 anos, não existindo assim, mais os três incisos que na redação antiga continha.

Na forma do Art. 3º do Código Civil, agora possui esta redação, com a modificação prevista no Art. 114 do Estatuto das Pessoas com Deficiência:

Art. 114. A Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art.3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.

I-(Revogado);

II-(Revogado);

III-(Revogado)” (NR)

Pontuda ainda o jurista e professor Cristiano Sobral em seu artigo “Confira o que muda no Código Civil após o Estatuto da Pessoa com Deficiência” quanto a modificação do Art. 3º do Código Civil, não havendo para a referida legislação civilista, qualquer tipo de incapacidade para o maior de 16 anos:

A alteração do art. 3º, do CC através da Lei n. 13.146/15 implica na não existência de pessoa absolutamente incapaz que seja maior de idade, pois a partir de sua entrada em vigor, apenas pessoas de 16 anos podem ser consideradas absolutamente incapazes. (SOBRAL, Cristiano, Confira o que muda no Código Civil, após o Estatuto da Pessoa com Deficiência).

Portanto, qualquer matéria referente a capacidade em razão da deficiência de pessoa, deverá ser observado a Lei nº. 13.146/2015.

2.1 A CAPACIDADE CIVIL DA PESSOA COM DEFÍCIÊNCIA

Conforme exaustivamente comentado em tópicos anteriores, verifica-se que para efeitos civis, o absolutamente incapaz na forma do Art. 3º do Código Civil é tão somente o menor de 16 (dezesseis) anos, e assim sendo, deverá o mesmo ser representado, sendo nulos os atos por si só praticados sem representação.

Contudo, indaga-se quanto à pessoa com deficiência e sua capacidade civil, esta continua sendo incapaz?

É de se observar primeiramente que o referido estatuto visa a igualdade e a não discriminação das pessoas com deficiência, onde em teoria, verifica-se ser uma ideologia bela.

No texto do Art. 4º do referido estatuto dispõe que toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação. Pontua ainda em seu §1º que considera-se discriminação em razão da deficiência toda forma de distinção, restrição ou exclusão, por ação ou omissão, que tenha o propósito ou efeito de prejudicar, impedir ou anular o reconhecimento ou o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais de pessoa com deficiência, incluindo a recusa de adaptações razoáveis e de fornecimento de tecnologias assistivas.

Assim, deixa bem claro que a ideia é a inclusão social da pessoa com deficiência, conferindo igualdade de direitos sendo vedado qualquer tipo de discriminação em razão de sua deficiência.

Eis que então, na nova sistemática quanto a preocupação de conferir a pessoa com deficiência igualdade de direitos, melhor sorte é em relação a capacidade civil.

No caput do Art. 6º do Estatuto da Pessoa com Deficiência dispõe que a plena capacidade civil não é afetada pela deficiência, conforme podemos observar no dispositivo supra:

Art.6º. A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para:

I-casar-se e constituir união estável;

II-exercer direitos sexuais e reprodutivos;

III-exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;

IV-conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;

V-exercer direito à família e à convivência familiar e comunitária; e

VI-exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

Verifica-se assim, que a pessoa com deficiência possui para o direito a capacidade civil. Um contrassenso uma vez que anteriormente o mesmo não havia se quer plena capacidade de gerir seus atos da vida civil, ou de geri-los parcialmente, e agora, o direito confere-lhe plena capacidade, inclusive de casar, ser adotante, exercer até mesmo a curatela. Verifica-se no dispositivo em comento que a igualdade de condições para a pessoa com deficiência foi elevada ao extremo.

Assim várias indagações surgem quanto a necessidade de curador para gerir seus negócios, de decidir determinados atos da vida civil, prescrição, e dentre outros, face à nova sistemática e a nova ideologia empregada no direito.

Com relação à prescrição, esta também teve o entendimento alterado, pois, na forma do Art. 198 I dispõe que também interromperia a prescrição contra os incapazes que trata o Art. 3º. Atualmente, a prescrição somente será interrompida na forma do Art. 3º do Código Civil na hipótese do menor de 16 (dezesseis) anos, estando excluída a pessoa com deficiência. Portanto, Como regra é a capacidade limitada, correrá a prescrição e decadência contra a pessoa com deficiência que tratava a antiga redação do Art. 3º do Código Civil, o que anteriormente não ocorria.

Ademais, conforme leciona Flávio Tartuce em seu Artigo Alterações do Código Civil pela Lei 13.146/2015. Repercussões para o Direito de Família e Confrontações com o Novo CPC. Primeira Parte, nos trás a ideia de que o sistema de incapacidades tornou-se um modelo mais maleável, pensando as circunstâncias no caso concreto em prol da inclusão das pessoas com deficiência.

Verificadas as alterações, parece-nos que o sistema de incapacidades deixou de ter um modelo rígido, passando a ser mais maleável, pensado a partir das circunstâncias do caso concreto e em prol da inclusão das pessoas com deficiência, tutelando a sua dignidade e a sua interação social. Isso já tinha ocorrido na comparação das redações do Código Civil de 2002 e do seu antecessor. Como é notório, a codificação material de 1916 mencionava os surdos-mudos que não pudessem se expressar como absolutamente incapazes (art. 5º, III, do CC/1916). A norma então em vigor, antes das recentes alterações ora comentadas, tratava das pessoas que, por causa transitória ou definitiva, não pudessem exprimir sua vontade, agora tidas como relativamente incapazes, reafirme-se.(TARTUCE, Flavio, Alterações do Código Civil pela Lei 13.146/2015. Repercussões para o Direito de Família e Confrontações com o Novo CPC. Primeira Parte).

Em arremate, verificou-se a mudança significativa, assumindo uma abordagem diferente, elevando a igualdade a não discriminação da pessoa com deficiência em caráter quase que absoluto, conferindo-lhe igualdade de direito, e até mesmo, em determinados casos (com caráter excepcional o Art. 84 do Estatuto ora ser verificado posteriormente, bem como ser avaliado caso a caso) deveres na órbita civil.

Com relação a postulação no Juizado Especial Cível, situação demonstra ser interessante, haja vista que, na forma do Art. 8º da Lei 9099/95 dispõe a vedação do incapaz para postular por este rito. Contudo, nos dizeres de Pablo Stolze em seu artigo O Estatuto da Pessoa com Deficiência e o Sistema Jurídico Brasileiro de Incapacidade Civil, levanta ideia interessante na qual, com todas as vênias, passamos a expor:

Certamente, o impacto do novo diploma se fará sentir em outros ramos do Direito brasileiro, inclusive no âmbito processual. Destacamos, a título ilustrativo, o art. 8º da Lei 9.099 de 1995, que impede o incapaz de postular em Juizado Especial. A partir da entrada em vigor do Estatuto, certamente perderá fundamento a vedação, quando se tratar de demanda proposta por pessoa com deficiência. (STOLZE, Pablo, O Estatuto da Pessoa com Deficiência e o Sistema Brasileiro de Incapacidade Civil).

Contudo, verifica-se ainda a problemática não solucionada, pois, caso a pessoa com deficiência considerada capaz ser conferido o direito a postulação perante o rito da Lei 9099/05, forçoso será, em determinadas situações, a possibilidade de o curador representar a pessoa com deficiência em juízo pela Lei 9099/95, o que até antes era vedado. Embora o assunto da curatela ser discorrido adiante, adiantando que a mesma será em caráter excepcional, entendemos que no presente caso, afim de se adequar a normativa da Lei 13.146/2015, o Art. 8º da Lei 9099/95 poderá sofrer mudanças.

Cabe lembrar rapidamente, que para o Direito Penal, tais continuam sendo classificados como inimputáveis na forma do Art. 26, porém não será matéria aqui tratada.

3 DA NECESSIDADE DE CURADOR APÓS A MODIFICAÇÃO

Aqui tratamos de outro tema de suma relevância, quanto à necessidade de curador para a pessoa com deficiência, na qual também houve importante impacto quanto a vinda da Lei nº 13.146/2015.

Anteriormente foi informado de que o absolutamente incapaz deverá estar acompanhado de seu curador, e o relativamente incapaz, devidamente assistido, e qualquer ato que o absolutamente incapaz praticar, este tornar-se-á nulo de pleno direito.

Antigamente a pessoa com deficiência, conforme aqui é objeto deste artigo, necessitava de curador para a prática de seus atos haja vista que, na antiga redação do Art. 3º do Código Civil, o mesmo era considerado como incapaz absoluto para a prática dos atos da vida civil.

Com a modificação, verifica-se que agora a regra é a capacidade, quanto não muito, a capacidade relativa, onde paira a indagação quanto a necessidade de curador para que a pessoa com deficiência, que anteriormente necessitava por haver expressa previsão de lei, agora não mais existe tal limitação.

Ao percorrer todo o estatuto, verifica-se que diversos direitos são assegurados, para a pessoa com deficiência, desde a saúde, até a participação na vida política. Mas como exercer?

Na forma do Art. 84 do Estatuto novamente nos leva a ideia da igualdade em caráter absoluto ao dispor que a pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao exercício de sua capacidade legal de condições com as demais pessoas.

No que se refere à necessidade da curatela, dispõe o parágrafo primeiro do Art. 84 do referido estatuto que quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida a curatela, conforme a lei. Logo, verifica-se que existirá para a pessoa com deficiência, a nomeação de curador em caráter excepcional, não mais sendo regra em nosso ordenamento jurídico pátrio, e ainda somente nas hipóteses previstos em lei.

Ademais, no parágrafo segundo do artigo 84 trás ainda o direito de escolha da pessoa com deficiência a adoção do processo de tomada de decisão apoiada, dando ainda a margem do mesmo divergir do curador quando nomeado ou não.

Dois parágrafos que ainda merecem destaques, o §3º e §4º que possuem como redação:

Art. 84. A pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas.

§1º. Quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida à curatela, conforme a lei.

§2º É facultado à pessoa com deficiência a adoção de processo de tomada de decisão apoiada

§3º. A definição da curatela de pessoa com deficiência constitui medida protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, que durará o menor tempo possível.

§4º. Os curadores são obrigados a prestar, anualmente, contas de sua administração ao juiz, apresentando o balanço do respectivo ano.”

Reforça os dois últimos parágrafos quanto ao caráter extraordinário da nomeação de curador para a pessoa com deficiência afim de não ceifar seu direito a igualdade e seu caráter de pessoa capaz, não sendo a curadoria um caráter permanente, tendo sua atuação fiscalizada, onde o curador deverá prestar contas ao juiz anualmente de sua administração, devendo o mesmo ser comprovado em juízo.

Outra indagação que surge é em relação às quais direitos afetarão a curatela no presente caso, tendo em vista que agora a curatela é de caráter excepcional?

Verificou-se até então a excepcionalidade da nomeação de curador, que antes era a regra para a prática de atos jurídicos. Verificou-se ainda que o mesmo será nomeado pelas circunstâncias previstas em lei, podendo ainda a pessoa com deficiência discordar de determinadas decisões de seu curado.

Conforme a redação prevista no Art. 85 do estatuto é claro quais atos deverão ser atingidos pela curatela, bem como reforça ainda mais o caráter excepcional da curatela.

Conforme os juristas Pablo Stolze Gagliano em seu Artigo “É o fim da interdição” dispõe:

E, se é uma medida extraordinária, é porque existe uma outra via assistencial de que pode se valer a pessoa com deficiência - livre do estigma da incapacidade - para que possa atuar na vida social: a “tomada de decisão apoiada", processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade.(GAGLIANO, Stolze, Pablo, )

Assim, verifica-se que a curatela somente incidirá quanto aos atos relacionados à questão patrimonial e negocial, excluídos quando ao direito pessoal, como se infere no §1º do Art. 85 do referido estatuto. Tal se justifica uma vez que no Art. 6º do Estatuto, e já comentando anteriormente, a deficiência não afeta o exercício do direito de casar, constituir família e dentre outros. Assim, o Art. 85 dispõe que:

Art. 85. A curatela afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial.

§1º. A definição da curatela não alcança o direito ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto.

§2º A curatela constitui medida extraordinária, devendo constar da sentença, as razões e motivações de sua definição, preservados os interesses do curatelado.

§3º. No caso de pessoa em situação de institucionalização, ao nomear curador, o juiz deve dar preferência a pessoa que tenha vínculo de natureza familiar, afetiva ou comunitária com o curatelado.

Ademais, conforme exaustivamente mencionado, sendo a curatela um caráter excepcional, o juiz, ao constitui-la, deverá constar na sentença as razões e motivações de sua definição, devendo ser preservado os interesses da pessoa com deficiência, pois a regra é que a capacidade da pessoa com deficiência, devendo dar preferência da curadoria a pessoa que tenha vínculo familiar com o curatelado.

Ainda já podemos verificar a atual jurisprudência acerca do tema quanto a excepcionalidade da curatela, onde verifica-se que o atual entendimento vem inclinado conforme a letra da lei.

CIVIL E PROCESSO CIVIL. INTERDIÇÃO. CURATELA. MEDIDA EXCEPCIONAL. APLICAÇÃO RESTRITA. ATOS RELACIONADOS AOS DIREITOS DE NATUREZA PATRIMONIAL E NEGOCIAL. NOVAS DIRETRIZES PRINCIPIOLÓGICAS. 1. A proteção à dignidade da pessoa humana se materializa na concessão de tratamento isonômico a todos os indivíduos, excepcionando-se esse padrão somente quando não restar outra alternativa para garantir a igualdade e a dignidade humana, de modo que somente se admite o rompimento da igualdade jurídico-formal quando se objetivar a garantia da igualdade material. 2. O Estatuto da Pessoa com Deficiência. Lei nº 13.146/15, em seus artigos 84 e seguintes, disciplina a curatela e seu exercício, estabelecendo sua adoção como medida protetiva extraordinária e que afeta, tão somente, os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial. 3. Estando, pois, a r. Sentença de acordo com as novas diretrizes principiológicas adotadas pelo Código Civil e Estatuto da Pessoa com Deficiência, negou-se provimento ao recurso. (TJDF; APC 2015.06.1.010882-8; Ac. 964.739; Terceira Turma Cível; Rel. Des. Flavio Renato Jaquet Rostirola; Julg. 31/08/2016; DJDFTE 14/09/2016).

Em arremate, com relação à emissão de documentos oficiais, não é exigido a situação de curatela da pessoa com deficiência, e em casos relevantes e urgentes, no intuito de proteger o interesse da pessoa com deficiência, a nomeação de curador provisório pelo juiz, devendo ser ouvido o Ministério Publico. Tais estão previstos nos Arts. 86 e 87 do referido Estatuto.

CONCLUSÃO

Conforme se verificou perante todo o discorrer do presente artigo, a ideia de incapacidade para o direito modificou de sobre maneira, sendo que, para a pessoa com deficiência, este não poderá mais ser imputado como absolutamente incapaz como era na orbita civil, na antiga redação do Art. 3º do Código Civil.

Com a entrada em vigor do Estatuto da Pessoa com Deficiência, o direito a igualdade e a liberdade para a pessoa com deficiência foi elevada ao extremo, podendo o mesmo ter direito, desde a casar e exercer direitos sexuais, até a sua inclusão ao mercado de trabalho e a participação na vida pública e política, havendo curatela tão somente para questões negociais e patrimoniais, sendo ainda um caso excepcional.

Embora possamos concordar ou não com a norma em vigor, ela existe e deve ser aplicada ao caso concreto, envidando esforços para a boa aplicação do direito, conferindo todas as prerrogativas e deveres a pessoa com deficiência, olhando a mesma com outra olhar jurídico onde anteriormente este era considerado como absolutamente incapaz, e agora é considerado como limitadamente capaz, verificando caso a caso por meio de equipe interdisciplinar, biopsicossocial, e multiprofissional.

REFERÊNCIAS

FIGUEIREDO, Luciano e Roberto. Direito Civil, Parte Geral. 6ª ed. Salvador Bahia: JusPodvim, 2016. 603 p.

TARTUCE, Flavio É o Fim da Interdição? Artigo de Pablo Stolze. Disponível em: < https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/304255875/e-o-fim-da-interdicao-artigo-de-pablo-stolze-gagliano>. Acesso em: 18 dez. 2016.

TARTUCE, Flávio Alterações do Código Civil pela Lei 13.146/2015. Repercussões para o Direito de Família e Confrontações com o Novo CPC. Primeira Parte. Disponível em: < http://professorflaviotartuce.blogspot.com.br/2015/07/alteracoes-do-codigo-civil-pela-lei.html> Acesso em: 09 de jan. 2017.

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 3ª. ed. São Paulo: Gen Metodo, 2011. 1356 p.

RODRIGUES, Silvio. Manual de Direito Civil, Parte Geral. Época. São Paulo, v.3, n. 30, p. 72-73, 14 dez. 1998.

STOLZE, Pablo O Estatuto da Pessoa com Deficiência e o Sistema Jurídico Brasileiro de Incapacidade. Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/41381/o-estatuto-da-pessoa-com-deficiencia-e-o-sistema-juridico-brasileiro-de-incapacidade-civil>. Acesso em: 06 jan. 2017.

SOBRAL, Cristiano Confira o que muda no Código Civil após o Estatuto da Pessoa com Deficiência. Disponível em: < https://www.cers.com.br/noticias-e-blogs/noticia/confira-o-que-muda-no-codigo-civil-apos-o-estatuto-da-pessoa-com-deficiencia>. Acesso em: 06 jan. 2017.

Sobre o autor
Bruno Bremenkamp Ronconi

Bacharel em Direito pelo Centro Universitário do Espírito Santo - UNESC . Pós Graduado em Direito Civil e Processo Civil pelo Centro Universitário do Espírito Santo - UNESC . Servidor Público Estadual

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo apresentado como título de Pós Graduação no Centro Universitário do Espírito Santo - UNESC, Campus Colatina.

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