CONCLUSÕES DO AUTOR
O loteamento fechado difere do loteamento convencional tão somente no tocante as áreas de domínio público, quanto ao demais é parcelamento de solo que tem previsão legal através da Lei 6.766/79.
O direito atribuído aos adquirentes de lote, nessa espécie de loteamento, decorre de ato da Administração, que pode ser conferido através da permissão de uso ou da concessão de uso pelo Município.
É importante que fique claro no projeto de loteamento, nele incluído as plantas, memoriais descritivos das áreas de domínio público e lotes, contrato padrão onde constarão por certo as restrições convencionais, Decreto Municicipal onde além das restrições legais, constem as convencionais, e porque não dizer o regulamento interno, esclarecimento detido do que se pretende no loteamento à ser aprovado pelo Município.
Tal acautelamento tem por escopo evitar "Ação Direta de Insconstitucionalidade", tendo por fundamento jurídico o desvio de finalidade dos bens públicos através da desafetação e por fundamento legal o contido no artigo 180, inciso VII, da Constituição do Estado de São Paulo.
Ainda que todas as cautelas possíveis, a ação referida poderá ser interposta.
Emprestadas palavras já escritas por José Carlos de Freitas, para melhor elucidar esse tópico:
"Sobre o tema, acompanhamos o Tribunal Paulista.
E mesmo que não tenham sido implantados os parques, jardins, áreas verdes e afins, nada altera para eles a proteção criada pela legislação dos loteamentos, na medida em que a tutela ecológica se faz não só em relação a situação fática presente, mas também visando a implantação futura dos melhoramentos ambientais, pois, caso contrário, estar-se-á em franca afronta à proteção do meio ambiente, no que ele tem de maior realce para a vida cotidiana das pessoas, isto é, a garantia dos cidadãos, já tão frágil e incompleta, de viverem em condições mais favoráveis (ou menos desfavoráveis) de salubridade.
A Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo, num primeiro momento, entendeu ser vedada a averbação de desafetação dessas áreas públicas. Hoje, prevalece posição contrária, de que não compete ao Juiz corregedor permanente nem ao registrador a verificação administrativa de eventual inconstitucionalidade de lei municipal autorizadora da desafetação, devendo, pois, ser feita a averbação. (grifo nosso).
Essa orientação, todavia, não inibe a discussão em sede de jurisdição contenciosa (ação direta de inconstitucionalidade ou ação civil pública)." (12)
Continuando em nossa conclusão, o ato da Administração Municipal que conferir esse direito aos adquirentes de lote em "loteamento fechado" deverá delimitar precisamente quais são esses direitos e quais os deveres da entidade associativa, que se responsabilizar pela manutenção das coisas comuns.
Essas associações formadas com o objetivo de manter as coisas públicas no loteamento fechado deverão ter seus preceitos estabelecidos em Regulamento Interno, delegando funções, atribuindo direitos e deveres, não somente aos proprietários, mas também aos moradores desse empreendimento.
O regulamento interno a que fazemos alusão é documento que tem por objetivo regular os direitos e deveres dos adquirentes dos lotes no "loteamento fechado".
Domina na Jurisprudência pátria o sentimento de suprir a lacuna deixada na lei, reconhecendo a cobrança das chamadas "despesas condominais", por analogia as despesas do condomínio especial, por essas associações.
Entendemos, entretanto ainda, que qualquer legislação municipal, que não seja específica para o caso concreto, mas que trate genéricamente dos "loteamentos fechados" é INCONSTITUCIONAL.
Não pode ser outra a interpretação desse preceito legal, senão haveria verdadeira burla a legislação federal que rege o parcelamento de solo urbano.
A constituição de 1.988, além de proclamar textualmente no artº 1º que o nosso Estado é do tipo federativo, afirma no artº 18:
"A organização política administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição".
Por conseqüência, a Constituição brasileira reparte competências entre as pessoas jurídicas de direito público interno que compõem o Estado brasileiro, repartição essa traçada pela constituição de 1988 de forma bastante complexa.
O que parece proporcionar nossa repartição de competências é a predominância do interesse, cabendo à União as matérias de interesse nacional ou geral, aos Estados as matérias de interesse regional e ao Município as de interesse local.
"Segundo José Afonso da Silva, é ainda muito difícil isolar o que seja de interesse nacional do que seja de interesse regional. Em face dessa dificuldade os Estados modernos utilizam outros princípios para repartir competências no Estado Federal. Reserva-se à União a legislação geral e aos Estados e Municípios a legislação supletiva, complementar, a legislação dos pormenores que preenchem as lacunas ou desenvolvem os princípios gerais da legislação federal" (13)
Diante do aludido, fica evidente que somente a UNIÃO é competente para legislar sobre o parcelamento do solo urbano, cabendo ao MUNICÍPIO apenas legislar sobre matéria que for de interesse local.
Não pode o Município, utilizar-se como escudo o fato de ter o poder de regulamentar sobre a ordenação de seu território, no que tange aos aspectos urbanísticos para criar nova forma de parcelamento de solo, não previsto, vez que, não tem competência para legislar sobre o assunto.
"Loteamento fechado" é uma criação da sociedade que não tem escopo em legislação federal, cabendo a União, quando for o caso, legislar sobre a matéria.
Entretanto, resta-nos por consolo, a evidência de que a mutabilidade do direito sempre deflui de antecedente costume social que, por sua constância se transforma em efetiva norma legal.
Com o "loteamento fechado" não será diferente, o legislador chegará ao ponto de ficar acuado, e não tendo como mais protelar questão tão importante para a sociedade, regulamentará de forma definitiva tal questão.
Esperamos que as falhas que se observam historicamente na legislação que trata do parcelamento do solo no Brasil, quando da elaboração desse texto legal, sejam levadas em consideração.
Por fim, é preciso que frisemos que, todos os mecanismos para a estruturação legal do "loteamento fechado" estão presentes em nossa legislação esparsa, cabendo apenas ao legislador o trabalho de aprimoramento do sistema para que o parcelamento de solo tenha a conotação legal que socialmente, desde os tempos mais remotos, em todas as civilizações conhecidas, sempre teve.
NOTAS
- MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Municipal Brasileiro. Citado por MEIRELLES, Hely Lopes Loteamento Fechado, Revista de Direito Imobiliário nº 9 - janeiro-junho de 1982, São Paulo, RT.
- SILVA, José Afonso da, Direito Urbanístico Brasileiro, 1ª ed., São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1981, pp. 400-402.
- PEREIRA, Caio Mário da Silva, Condomínio e Incorporações, Forense, 1965, p. 59.
- SILVA FILHO, Elvino, Loteamento fechado e condomínio deitado, Revista de Direito Imobiliário nº 14 - julho-dezembro de 1984, São Paulo, Ed., Revista dos Tribunais.
- Revista de Direito Imobiliário nº 42 - setembro-dezembro de 1997, São Paulo, RT, p. 208
- Revistra de Direito Imobiliário nº 42 - setembro-dezembro de 1997, São Paulo, RT, p. 210vº.
- Revistra de Direito Imobiliário nº 42 - setembro-dezembro de 1997, São Paulo, RT, p. 211.
- Revista de Direito Imobiliário nº 42, setembro-dezembro de 1997, São Paulo, RT, p. 212.
- Revista de Direito Imobiliário nº 41 - maio-agosto de 1997, São Paulo, RT, p. 108.
- Revista de Direito Imobiliário nº 41, maio-agosto de 1997, São Paulo, RT, p.153.
- Revista de Direito Imobiliário nº 46, janeiro-junho de 1999, São Paulo, RT, p.245.
- FREITAS, José Carlos de, Bens Públicos de loteamentos e sua proteção especial, Revista de Direito Imobiliário nº 46 - janeiro-junho de 1999, São Paulo, RT, p. 189.
- SILVA, José Afonso da, Curso de Direito Constitucional Positivo, citado por FERRARI, Regina Maria Macedo Nery, Controle da constitucionalidade das leis municipais, 2ª ed. , S.Paulo, RT. p.35.
BIBLIOGRAFIA
1. FERRARI, Regina Maria Macedo Nery, Controle da constitucionalidade das leis municipais, 2ª ed., 1994, São Paulo, ed. RT.
2. FREITAS, José Carlos de, Bens Públicos de loteamentos e sua proteção especial, Revista de Direito Imobiliário nº 46 - IRIB - janeiro-junho de 1999, São Paulo, ed., RT.
3. IRIB - Revista de Direito Imobiliário nº 41 - maio-agosto de 1997, São Paulo, ed., RT. , pgs. 108 e 153.
4. IRIB - Revista de Direito Imobiliário nº 42 - setembro-dezembro de 1997, São Paulo, ed., RT. , pgs. 208, 210vº, 211 e 212.
5. IRIB - Revista de Direito Imobiliário nº 46 - janeiro-junho de 1999, São Paulo, ed., RT. , p. 245.
6. MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Municipal Brasileiro, citado por MEIRELLES, Hely Lopes, Loteamento Fechado, Revista de Direito Imobiliário nº 9 - IRIB - janeiro-junho de 1982, São Paulo, ed., RT.
7. NEGRÃO, Theotonio, com a colaboração de GOUVÊA, José Roberto Ferreira, Código Civil e legislação civil em vigor, 18ª ed. , atualizada até 5 de janeiro de 1999, ed., Saraiva.
8. OLIVEIRA, Juarez de, Constituição da República Federativa do Brasil, 15ª ed., 1995, São Paulo, ed., Saraiva.
9. PEREIRA, Caio Mário da Silva, Condomínio e Incorporações, 1965, ed., Forense.
10. SILVA FILHO, Elvino, Loteamento fechado e condomínio deitado, Revista de Direito Imobiliário nº 14 - IRIB - julho-dezembro de 1984, São Paulo, ed., RT.
11. SILVA, José Afonso da, Curso de Direito Constitucional Positivo, 10ª ed., revista, 1995, São Paulo, Malheiros Editores.
12. SILVA, José Afonso da, Direito Urbanístico Brasileiro, 1ª ed., 1981, São Paulo, ed., RT.