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Despesas de condomínio na Lei do Inquilinato

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Agenda 01/09/2000 às 00:00

8. É VÁLIDA A DISPOSIÇÃO DE QUE O INQUILINO RESPONDA POR
DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS, SE LIVREMENTE PACTUADA?

As disposições referentes às relações locatícias são preceitos de ordem pública, indisponíveis portanto, sendo nulas as disposições que firmem em sentido contrário, especialmente no contrato de locação.

Logo, uma cláusula contratual transferindo para o locatário as obrigações enumeradas pela lei como sendo de responsabilidade do locador, considerar-se-á não escrita, posto que eivada de nulidade (v. RT, 666/128).

IVAN DE HUGO SILVA aduz que "O preceito nulo há de ser considerado como não escrito; inaproveitável, portanto, para qualquer das partes, devendo ser desprezado pelo juiz, independente de solicitação nesse sentido, dado o interesse da justiça em salvaguardar a integridade da lei ser mais forte que o dos litigantes." (14)

À guisa de ilustração, cabe observar que as poucas exceções à regra supramencionada vêm expressas na própria lei, como se pode inferir da redação do artigo 35, da Lei 8.245/91, que assim é iniciada: salvo expressa disposição contratual em contrário.... Vale dizer, que em todos os casos em que o legislador abriu para as partes contratantes a faculdade de disposição diversa daquela estabelecida, efetuou literal ressalva da possibilidade de disposição contratual.

Exemplo disso é o que dispõe o artigo 22, VIII: O locador é obrigado a: VIII- pagar os impostos e taxas, e ainda o prêmio de seguro complementar contra fogo, que incidam ou venham a incidir sobre o imóvel, salvo disposição expressa em contrário no contrato;

É o que ocorre com o IPTU. ARAMY DORNELLES DA LUZ, comenta que este é um dos casos em que há a possibilidade de inversão do ônus, dizendo:

          Os impostos e taxas que caem sobre o imóvel são, por óbvio, de responsabilidade do locador, pois o fato gerador é a propriedade. Também o seguro contra fogo. Tradicionalmente, porém, o legislador tem consentido que o locador contrate a inversão do ônus. Não há uma razão bem clara para isso. (15)

Em todas as demais situações, prevalece a regra da indisponibilidade.

TARCHA e SCAVONE JÚNIOR entendem que "quando a Lei diz que a despesa de pintura de fachada do edifício é extraordinária (do locador), mesmo que o contrato estabeleça que o locatário concorda em pagar esta despesa, mesmo que ele assine o contrato, não terá que pagá-la, e, se por acaso pagá-la, terá o prazo de vinte anos para ingressar com ação judicial de repetição de indébito pelo rito ordinário ou sumário conforme o valor, pedindo de volta o que pagou." (16)

AMÉRICO LUÍS MARTINS DA SILVA(17) complementa a lição:

          Duas observações devem ser feitas no momento. A primeira se refere ao fato de se considerar cláusula nula ou completamente inválida, se as partes estipularem no contrato de locação que o locatário arcará com o pagamento das despesas extraordinárias de condomínio, uma vez que a disposição que determinou ser de responsabilidade do locador seu pagamento não é supletiva, portanto não admite estipulação em contrário.

A segunda observação refere-se ao fato de, sendo o locador responsável pelas despesas extraordinárias de condomínio, cabe ao locatário exigir a eliminação de qualquer cobrança indevida neste sentido quando o locador exibir o comprovante relativo à cobrança do suposto encargo.

Não se perca de vista, ainda, que pela norma insculpida no inciso I, do artigo 43 da Lei Inquilinária, constitui contravenção penal, punível com prisão simples de cinco dias a seis meses, cobrar o locador do locatário as despesas extraordinárias de condomínio, posto que configura encargo indevido.


9. OUTRAS QUESTÕES ACERCA DAS DESPESAS DE CONDOMÍNIO:

9.1. SE O IMÓVEL ESTÁ FECHADO, CABE AO CONDÔMINO PARTICIPAR DO RATEIO?

Indagação interessante. Se o rateio das despesas tem relação com o uso, poder-se-ia pensar que o condômino que esteja mantendo sua unidade condominial fechada ou sem utilização, pudesse eximir-se de pagar as despesas gerais.

A Lei 4.591/64(18), entretanto, determina a concorrência dos condôminos para as despesas do condomínio sem excepcionar o fato de estar a unidade condominial fora de uso. Isto porque a estrutura condominial deve ser mantida e preservada, independentemente de todos a estarem usando ou não. Fica à disposição. O condômino não utiliza porque não quer. Seria de todo ilógico pensar que somente os usuários efetivos das unidades ficassem sujeitos ao rateio das despesas com iluminação e água das áreas comuns, vigilância, serviços de zeladoria do prédio, produtos de limpeza e de expediente, porque alguns, por motivos pessoais, preferem deixar inativo o seu imóvel.

Entendemos, porém, que se os condôminos dispuserem em convenção de condomínio algum tratamento diferenciado, como por exemplo, a não participação no rateio de gás e água, em condomínios em que estes produtos são usados coletivamente, sem medição por registros individuais, tal disposição será válida.

          9.2. O CONDÔMINO INADIMPLENTE PODE SER IMPEDIDO DE PARTICIPAR DE ASSEMBLÉIAS QUE DELIBERAM SOBRE DESPESAS OU TER SEU DIREITO A VOTO SUSPENSO? E QUANTO AO USO DAS ÁREAS DE LAZER?

A questão é polêmica no âmbito da doutrina. Prevalece a tese de nulidade de qualquer restrição de direitos, posto que a convenção de condomínio já traz em seu bojo as penalidades pecuniárias (multas) para o descumprimento das obrigações pelo condômino faltoso, não sendo lícito, portanto, restringir ou impedir sua participação nas assembléias gerais, nem cassar-lhe o direito ao voto.

O mesmo raciocínio se impõe à restrição de uso, pelo faltoso, das áreas comuns do condomínio, tais como salão de festas, churrasqueira, playground, sala de ginástica, etc.

O Tribunal de Alçada do Paraná já decidiu ser arbitrária e passível de indenização por danos morais a determinação pelo síndico de suspensão no fornecimento de gás e da comunicação por interfone de morador inadimplente. (19)

J. NASCIMENTO FRANCO(20) discorda desse entendimento, sustentando que não é justo que o condomínio custeie serviços que aproveitam a todos, sem participação dos condôminos em débito e que estes ainda usufruam das áreas de lazer, sob as expensas dos demais moradores.

JORGE TARCHA e LUIZ ANTONIO SCAVONE JUNIOR afirmam que tais restrições importariam em dupla penalidade pelo mesmo fato e aduzem: "O fato de o condômino estar inadimplente não autoriza, manus militaris, o rompimento dos serviços, e, tampouco, o impedimento à utilização de salões de festa, piscinas, churrasqueiras, quadras e demais equipamentos comuns, até porque o condomínio possui meios processuais e legais de fazer valer seu direito subjetivo de receber as quotas em atraso." (21)

No mesmo diapasão, porém no âmbito da relação locador/locatário, SILVIO DE SALVO VENOSA(22) leciona: "o não pagamento das contas constitui grave infração autorizando o despejo dadas as graves conseqüências que pode acarretar. Não pode porém o locador, sem justa causa, solicitar o desligamento da linha telefônica, ou transferi-la de local, porque estará obstando o pleno uso da coisa locada".

E advertem TARCHA e SCAVON JUNIOR, que o síndico deve acautelar-se de tais atitudes, sob pena de responder pessoalmente pelo delito de exercício arbitrário das próprias razões, capitulado no art. 345 do Código Penal. (23)

          9.3. O CONDÔMINO DEVE PARTICIPAR DO RATEIO DE DESPESAS REFERENTES AO PROCESSO JUDICIAL QUANDO ELE PRÓPRIO LITIGA CONTRA O CONDOMÍNIO?

Consolidou-se na doutrina e jurisprudência o entendimento de que o condômino que move ação contra o condomínio dele se separa, desvincula-se, posto que é inadmissível considerar alguém litigando contra si mesmo.

J. NASCIMENTO FRANCO, citado por TARCHA e SCAVONI JR, tratou do tema de forma esclarecedora:

          Quando entram em conflito interesses estranhos à simples administração e conservação do edifício, o condômino dissidente desliga-se da coletividade condominial e passa, no curso dos processos judiciais, a ser considerado terceiro, para todos os efeitos jurídicos".(24)

Fácil depreender-se daí, que o condômino dissidente, que figura no pólo ativo ou passivo de ação que tenha como parte contrária o condomínio, não arcará com as despesas decorrentes do processo, seja a condenação no pedido, sejam as custas e honorários advocatícios.

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Não haveria lógica em pleitear o condômino uma indenização, sair vencedor na demanda e depois arcar com uma parcela do pagamento no rateio da despesa gerada por sua ação.

Igualmente inconcebível que seja réu em ação de cobrança, pague os valores devidos, os honorários da sucumbência e as custas processuais e, depois, ainda tenha que participar do rateio dos honorários contratados pelo condomínio. Haveria, então, incidência de duplo ônus, caracterizando o bis in idem.

Difícil definir se tais despesas serão ordinárias ou extraordinárias. A doutrina inclina-se a classificá-las de acordo com a natureza da demanda. Se esta versar sobre fatos ou questões que sejam por natureza originadoras de despesas ordinárias, como tal serão consideradas, sendo devidas pelo inquilino. Se versar a lide sobre matéria atinente a questões relacionadas com despesas extraordinárias, assim serão interpretadas, correndo a cargo do locador.

          9.4. PODE O INQUILINO DESCONTAR DO VALOR DO ALUGUEL AS DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS QUE PAGOU INDEVIDAMENTE?

Se eram extraordinárias as despesas, não competiam ao locatário e sim ao locador. O pagamento assume o caráter de indevido, passível de restituição. E quando o locador recusa-se a reembolsar o locatário, a questão resolve-se pelo Código Civil, já que sendo credor e devedor um do outro, pode-se exercitar os mecanismos da compensação, previstos nos artigos 1.009 e 1010 do CC, provando o locatário que pagou erroneamente.

Assim, pode efetuar o pagamento do aluguel superveniente deduzindo as despesas extraordinárias a cargo do locador, que indevidamente havia pago.

Havendo recusa no recebimento, por parte do locador, deve o inquilino valer-se da consignatória para desincumbir-se de sua obrigação e não incidir em mora, senão vejamos:

          11002689 – CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – CONDOMÍNIO – DESPESAS – LOCAÇÃO RESIDENCIAL – ENCARGOS – DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS DO CONDOMÍNIO – Injusta recusa da locadora em receber e dar a quitação de alugueres, porque o locatário deixou de incluir os custos cobrados com obras da troca da coluna geral de água e troca da coluna de água esgoto. Sendo tais despesas extraordinárias do condomínio, são encargos da locadora pois são tendentes a repor o imóvel locado em condições de habitabilidade. (TACRJ – AC 10958/91 – (Reg. 2663) – Cód. 91.001.10958 – 6ª C. – Rel. Juiz Arruda Franca – J. 14.05.1991 - Ementário TACRJ 20/91 – Ementa 33917 – in Juris Síntese).

          9.5. APLICA-SE O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ÀS RELAÇÕES ENTRE CONDOMÍNIO, CONDÔMINO E LOCATÁRIO?

Inicialmente faz-se necessário identificar o que sejam consumidor e fornecedor, nos moldes da Lei 8.078/90, posto que a presença dessas duas figuras é essencial para que se possa falar em aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor.

DOMINGOS AFONSO KRIGER FILHO reúne alguns conceitos, que chamou de operacionais, dentre eles o de consumidor e fornecedor, verbis:

          CONSUMIDOR – É toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Exclui-se da conceituação o intermediário, aquele que medeia o negócio entre o comerciante que vende e a pessoa que adquire o produto ou serviço, uma vez que não usufrui destes de acordo com a finalidade para os quais foram criados.

FORNECEDOR – É toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como, os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. (25)

Quando se analisa as relações entre condomínio e condôminos, percebe-se que não se reveste do caráter de relação de consumo, posto que não envolve nem a figura de um consumidor nem de fornecedor, seja de produtos ou serviços, mas sim uma identidade de propósitos e interesses comuns. O síndico não presta serviços aos demais condôminos. Apenas administra e representa o condomínio, voltado a uma finalidade comum, que é a gestão dos interesses da coletividade condominial. Vejamos a jurisprudência a respeito:

          CONDOMÍNIO – DESPESAS – COTAS CONDOMINIAIS – MORA DE CONDÔMINO – CÓDIGO DO CONSUMIDOR – INAPLICABILIDADE – Não se aplicam aos condôminos, em mora, as disposições legais do Código do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) mas as da Lei Especial 4.591/1964, posto não se tratar de uma relação de consumo, mas relação decorrente de co-propriedade. (TACRJ – AI 1296/95 – (Reg. 599-3 – Cód. 95.002.01296 – 8ª C. – Rel. Juiz Jayro Ferreira – J. 04.10.1995 - in Juris Síntese 11002341).

          CONDOMÍNIO - Multa moratória – Pretendida aplicação do art. 52, § 1º, da Lei 8.078/90 com a nova redação da Lei 9.298/96 – Inadmissibilidade pois não se trata de relação de consumo. (2º TACivSP – in RT-757/220).

Seguindo o mesmo entendimento, RT-747/303, RT-750/418 e RT-751/317.

Diferentemente se dá quando o condomínio contrata uma empresa para administrá-lo. Torna-se, então, consumidor dos serviços daquela, que responde por sua qualidade nos moldes do CDC.

A maior controvérsia está na relação que se opera entre o condômino locador e o locatário. A doutrina e a jurisprudência se dividem, ora admitindo, ora não, a existência de uma relação de consumo nos contratos de locação.

LUIZ ANTONIO SCAVONE JUNIOR posiciona-se pela aplicabilidade da Lei 8.078/90, entendendo presente a relação de consumo tanto entre locador e locatário como entre locador e imobiliária. (26)

Mas o STJ, por sua 5ª Turma, não endossa esta linha de entendimento:

          As relações locatícias possuem lei própria que as regule. Ademais, falta-lhes as características delineadoras da relação de consumo apontadas nos arts. 2º e 3º da Lei 8.078/90. O Código de Defesa do Consumidor, no que se refere à multa por inadimplemento, não é aplicável às locações prediais urbanas. (Ac. un. da 5ª T. do STJ- REsp 204244-MG – Rel. Min. Felix Fischer – j. 11.5.99 – DJU-e 1 de 1º.07.99, p. 206 – in Repertório IOB de Jurisprudência 15/99, Verbete 3/15814).

          9.6. É LÍCITO CONCEDER DESCONTOS ELEVADOS PARA PAGAMENTO EM DIA DAS DESPESAS DE CONDOMÍNIO? QUAL O PERCENTUAL MÁXIMO DE MULTA PERMITIDO?

Esse questionamento merece estudo mais detalhado. A Lei 4.591/64, em seu artigo 12, § 3º, estipulou um teto para a imposição de penalidade pela mora no pagamento, em 20% sobre o valor do débito atualizado.

Logo, qualquer majoração nesse percentual de multa constitui infração à lei. Que dizer então de um desconto substancial concedido para pagamento pontual? Ora, a pontualidade do pagamento já é regra natural das obrigações, tanto que estabelecida multa para o pagamento efetuado a destempo.

SÍLVIO DE SALVO VENOSA, ao discorrer sobre a Lei do Inquilinato, por ocasião de sua edição, já identificava uma tentativa de burla que vinha da legislação passada, em relação à concessão de desconto elevado para pagamento do aluguel com pontualidade, situação esta análoga à da prestação do condomínio, que conduz às mesmas conclusões:

          "Converteu-se em prática generalizada estipular-se no contrato que o locatário gozará de certo desconto se efetuar o pagamento antecipadamente, antes de determinado dia. Embora existam opiniões em contrário, as quais entendem que aí existe um verdadeiro incentivo para a pontualidade e pagamento antecipado, temos para nós que as partes aí erigem uma cláusula penal ao inverso." (27)

E a jurisprudência, atenta às práticas irregulares, tem servido de instrumento regulador e protetor do equilíbrio contratual, versando:

          CONDOMÍNIO – DESPESAS – CONDOMÍNIO – MULTA – COTAS CONDOMINIAIS – DESCONTO DE 45%. MULTA – O desconto de 45% concedido pelo condomínio para o pagamento das cotas condominiais efetuado até o dia 05 do mês equivale à imposição de uma multa para os pagamentos efetuados após essa data. Provimento parcial do recurso para excluir do débito o acréscimo de 45%, referente ao pagamento efetuado após o dia 05 de cada mês. (TACRJ – AC 6540/95 – (Reg. 4227-3) – 8ª C. – Rel. Juiz Cássia Medeiros – J. 11.10.1995 - Ementa 41327 - in Juris Síntese 11002243).

Assim, a concessão de "desconto" de pontualidade é, em verdade, pena disfarçada, multa exorbitante camuflada, posto que o valor normal da despesa de condomínio (ou do aluguel, no que pertine às relações locatícias) realmente pactuado, é, na generalidade dos casos, aquele previsto para pagamento pontual com desconto e não o valor cheio.

Finalmente, inocorrendo relação de consumo entre condomínio e condômino, a multa devida em caso de mora rege-se pela Lei 4.591/64 e pode ser fixada em até 20%, não havendo que se falar em incidência da limitação de 2%, de que trata o Código de Defesa e Proteção do Consumidor.

          9.7. IMÓVEIS NO ANDAR TÉRREO DEVEM PARTICIPAR DO RATEIO DE DESPESAS COM ELEVADOR?

O elevador destina-se a servir ao conjunto de unidades condominiais. As despesas com sua instalação, reforma ou manutenção são devidas pelo locador ou pelo locatário, dependendo da situação. E a obrigação de pagá-las não se prende à efetiva utilização e sim, à utilização potencial.

Pode-se conceber que o lojista instalado no andar térreo ou o morador de apartamento situado nos primeiros pavimentos utilize pouco ou raramente o elevador, posto que a facilidade de acesso direto ou por escadas dispensa esse uso. Mas isso, a rigor, em nada o diferencia dos demais condôminos e moradores quando do rateio das despesas.

Isto porque, poderá valer-se do elevador para visitar outras unidades do condomínio, situadas em andares mais elevados e, não raramente, será o elevador usado para que se realizem serviços em áreas comuns, como caixas d’água e antenas, situadas na cobertura do prédio.

A questão suscitou controvérsias na jurisprudência. Hoje a tese mais aceita é a da participação de todos os condôminos no rateio, não obstante haja diversas decisões reconhecendo validade à estipulação da convenção de condomínio que isente ou reduza a quota-parte de estabelecimentos térreos, quando estes possuam acesso independente à via pública. (28)

É o que se extrai dos julgamentos proferidos pelos Tribunais de Justiça do Distrito Federal e de Alçada do Rio Grande do Sul:

          Verbete: CONDOMÍNIO - PROPRIETÁRIO de IMÓVEL térreo - Participação das DESPESAS CONDOMINIAIS - Necessidade - Não estipulação em contrário pela convenção.

Condomínio. Convenção. Não dispondo a convenção em contrário, antes prevendo expressamente, a participação dos proprietários das lojas e dos apartamentos do pavimento térreo, nas despesas comuns do edifício, não podem eles, moto próprio se eximir dessa obrigação. Precedentes do TACív. RJ. (TJ/DF - Ap. Cível n. 33536 - Brasília - Ac. 76603 - unân. - 2a. T. Cív. - Rel: Des. Paulo Evandro - Fonte: DJU III, 31.05.95, pág. 7295 - In Bonijuris, 25125).

          Despesas condominiais – Condômino localizado no andar térreo – Alegação de não se beneficiar de muitos serviços – Inadmissibilidade – Inteligência do art. 9º da Lei 4.591/64 (TA/RS - in RT-749/435). (29)

TARCHA e SCAVONE JR, aduzem coerentemente que, "Interpretação diversa levaria ao absurdo de ratear-se despesas de elevador proporcionalmente ao andar em que se encontra a unidade, uma vez que aquela localizada no primeiro andar utiliza menos que aquela que se encontra no último". (30)

          9.8. A UNIDADE AUTÔNOMA PODE SER ALIENADA JUDICIALMENTE EM RAZÃO DE DESPESAS DE CONDOMÍNIO?

Esta, talvez, uma das mais controvertidas e polêmicas questões que se desdobra do estudo acerca das despesas de condomínio.

Citando mais uma vez J. NASCIMENTO FRANCO, TARCHA e SCAVON JR, sustentam que sim, afirmando ainda ser ineficaz a cláusula de impenhorabilidade e aplicável o disposto no inciso IV, do art. 3º, da Lei 8.009/90, ao dizer que fica afastada a proteção a penhora do imóvel familiar por motivo de cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função desse imóvel. (31)

Nesse diapasão o Tribunal de Alçada Civil do Rio de Janeiro, por sua 1ª Câmara:

          EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL – EXECUÇÃO DE TÍTULOS EXTRAJUDICIAIS –ALUGUÉIS/CONDOMÍNIO – PENHORA – LEI Nº 8.009/1990 – APARTAMENTO RESIDENCIAL DO DEVEDOR – DÉBITO DECORRENTE DE DESPESAS E TAXAS CONDOMINIAIS – PENHORA – POSSIBILIDADE – A Lei nº 8.009/1990 visa impedir ou cancelar a penhora de bem tido como impenhorável. No-lo é o imóvel de que resulta o débito condominial. Logo, apartamento residencial de devedor pode ser penhorado em execução dessas despesas e taxas. Desimportante a alegação de que o condomínio credor não estaria regularmente registrado, pois a execução é contra o condômino e não em face de terceiros. (TACivRJ – AC 9977/95 – (Reg. 589-3) – 1ª C. – Rel. Juiz Mauro Fonseca Pinto Nogueira – J. 27.02.1996 – in Juris Síntese – 11005745).

O Primeiro e Segundo Tribunais de Alçada Civil de São Paulo também pacificaram esse entendimento:

          As despesas condominiais, em face da obrigatoriedade do artigo 12 da Lei nº 4.591/64, não estão amparadas pelas benesses da Lei nº 8.009/90, ficando sujeitos à penhora o imóvel e os bens que o guarnecem. (1º TACIVIL - 1ª Câm. Civil; Ap. nº 604.042-6-SP; Rel. Juiz Ademir de Carvalho Benedito; j. 14.08.1995; v.u.; ementa. – in Boletim AASP, 1964/65-e, de 14.08.1996 e RT-726/295).

PENHORA – Bem de família – Condomínio – Despesas condominiais – Evocação da Lei 8.009/90 para evitar a constrição sobre a unidade devedora – Inadmissibilidade – Obrigações de natureza propter rem – Interpretação do art. 3º, IV, da referida lei (1º TACivSP – in RT-739/307).

Despesas condominiais – Penhora – Impenhorabilidade de unidade autônoma de condômino inadimplente – Inadmissibilidade, uma vez que é dívida inerente à própria coisa (2º TACivSP – in RT-747/303).

No mesmo sentido: RT-746/294, RT-748/296, RT-749/328 e RT-753/289 e RJ IOB-15808, esta última versando sobre penhorabilidade de box de garagem.

Mas não foi este o entendimento da 4ª Turma do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, quando julgou em sede de Recurso Especial caso semelhante:

          BEM DE FAMÍLIA - O inciso IV do artigo 3º da Lei nº 8.009/90 não compreende as despesas ordinárias de condomínio. Recurso especial atendido em parte. Unânime (STJ-4ª T.; Rec. Esp. nº 52.156-SP; Rel. Min. Fontes de Alencar; j. 23.08.1994; v.u.). BAASP, 2023/313-j, de 06.10.1997.

Vejamos os votos proferidos pelo Exmo. Ministro FONTES DE ALENCAR, que figurou como relator no acórdão em referência, e dos que o acompanharam à unanimidade:

          VOTO - O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR (RELATOR):
(..) No entanto, quanto à aplicação do art. 3º, inciso IV, da Lei nº 8.009/90, entendo que a interpretação extensiva dada pelo aresto violou a disposição ora referida que assim estabelece: "IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar."
O inciso IV do art. 3º da Lei nº 8.009/90 não compreende as despesas ordinárias de condomínio. Com efeito a norma referida faz paralelo com a ressalva final do art. 70, caput, do Código Civil. Portanto, tenho como correta a decisão monocrática que assim concluiu: "Inaplicável o disposto no artigo 3º, inciso IV, da Lei nº 8.009/90, pois há referência aos tributos (impostos, taxas e contribuições de melhoria), e não às contribuições outras, inclusive condominiais. Dessa forma, insubsistente a penhora do imóvel familiar. Manifeste-se o Exeqüente sobre o prosseguimento, indicando, se o caso, bem para penhora." (fl. 17). Em face do exposto, conheço do recurso em parte, e nessa parte lhe dou provimento, para restaurar a decisão singular, arredando a penhora do imóvel residencial pertencente ao executado.

VOTO - O SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO: Confesso que preferiria ver a matéria disciplinada de forma diversa em hipóteses como a retratada na espécie. Não vejo, no entanto, como divergir em face da legislação vigente, como demonstrado pelo Sr. Ministro Relator, a quem acompanho.

VOTO - O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Sr. Presidente, acompanho o voto de V. Exa., por considerar que atribuiu à norma em questão a interpretação escorreita.

VOTO - O SR. MINISTRO ANTÔNIO TORREÃO BRAZ: - Sr. Presidente, a lei, neste caso, é protetiva. Não se pode, então, interpretar um dos seus dispositivos, cuja clareza me parece indiscutível, de modo ampliativo, em desfavor da pessoa que ela visa proteger. Contribuição não pode ser tomada na acepção de despesa de condomínio. Acompanho V. Exa.

Como se percebe, a questão ainda suscitará muitas divergências, mas seu deslinde já começa a ser delineado na instância superior, diferentemente do que vinha entendendo a maioria dos Tribunais Estaduais.

          9.9. CONTRA QUEM O CONDOMÍNIO DEVE PROPOR AÇÃO PARA RECEBER AS DESPESAS E QUAL O RITO PARA SUA COBRANÇA?

Conforme já mencionamos, a obrigação direta pelo pagamento das despesas de condomínio, sejam elas ordinárias ou extraordinárias, é do condômino.

O locatário não possui obrigações em face do condomínio, posto que sua responsabilidade decorre do contrato firmado com o condômino locador.

Se o primeiro não cumprir com suas obrigações, de pagar as despesas ordinárias de condomínio, poderá o locador exercitar seu direito de rescindir o contrato de locação, movimentando a ação de despejo por falta de pagamento. (32)

Mas o condomínio não pode cobrar as despesas do locatário, já que carece de legitimidade para tanto, posto que com ele não mantém qualquer relação de direito material.

Logo, deverá o condomínio voltar sua pretensão em ação de conhecimento contra o condômino titular da unidade condominial, visto tratar-se de obrigação propter rem, instruindo a ação com o demonstrativo das despesas do condomínio.

Esta ação, nos moldes do artigo 275, II, b, do CPC, segue o rito sumário.

THEOTONIO NEGRÃO(33), em nota ao artigo 275, do Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor, aponta uma divergência jurisprudencial quanto à vigência da parte final do art. 12, § 2º, (34) da Lei 4.591, que estaria, segundo julgados majoritários, revogada.

Com efeito, decidiu o Tribunal de Justiça da Bahia:

          Encargos de Condomínio. Título líquido, certo e exigível. Exeqüibilidade. A existência de condomínio regular, bem assim de despesas orçadas e aprovadas pela assembléia geral, legitima o processo de execução para a cobrança de encargos, vez que não há responsabilidade a apurar, mas obrigação a exigir." (Ap. 186/83 – 1ª C. – j. 28.9.83 – rel. Des. Paulo Furtado. v.u. RT- 583/199).

Dentre os diversos arestos que se posicionam em sentido contrário, destacamos o proferido pelo 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, que aduz:

          "É tranqüilo o entendimento de que o art. 12, § 2º , da Lei 4.591/64 acha-se revogado pelo art. 275, II, "c", do CPC, devendo o condomínio reclamar do condômino em atraso o pagamento das cotas vencidas e vincendas pelo disposto no mencionado dispositivo do Código de Processo Civil, ressalvada ao locador a via executiva para que, por força do contrato, lhe caiba regressivamente pagar, nos termos do art. 585, IV, do mesmo diploma legal." (Ap. 332.383 – 1ª Câm. j. 13.11.84 – rel. Juiz Guimarães e Souza, in RT-594/116).

THEOTONIO NEGRÃO, desta vez em seu Código Civil e Legislação Civil em Vigor, é mais taxativo ao apontar, na nota 1, ao artigo 12, da Lei 4.591/64, que "A via executiva é, atualmente, incabível. Aplica-se à hipótese o art. 275-II-"b" (35) do CPC. A execução com base no CPC 585-IV só tem lugar quando o condômino locador, fundado em contrato escrito, cobra as despesas condominiais ao locatário". (36)

Portanto, o rito para a ação de cobrança, seria o sumário. O STJ, no entanto, abriu recentemente ao credor uma interessante faculdade, de optar pela ação monitória para cobrar as despesas de condomínio. É o que se extrai do seguinte acórdão:

          CONDOMÍNIO – COBRANÇA DE DESPESAS – AÇÃO MONITÓRIA – MEIO HÁBIL. Processual Civil. Cobrança de despesas de condomínio. Art. 275, II, b, do CPC. Procedimento monitório ou sumário. Faculdade do credor. Recurso desacolhido. I – O procedimento monitório, também conhecido como injuntivo, introduzido no atual processo civil brasileiro, largamente difundido e utilizado na Europa, com amplo sucesso, tem por objetivo abreviar a formação do título executivo, encurtando a via procedimental do processo de conhecimento. II – A ação monitória tem a natureza de processo cognitivo sumário e a finalidade de agilizar a prestação jurisdicional, sendo facultada a sua utilização, em nosso sistema, ao credor que possuir prova escrita do débito, sem força de título executivo, nos termos do art. 1.102a, CPC. (Ac. un. da 4ª T. do STJ – REsp 208.870-SP – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira. DJU-e 1 de 28.06.1999, p. 124 – in Repertório IOB de Jurisprudência, Bol. 15/99, verbete 3/15826).

          9.10. COMO DEVEM SER COBRADAS AS DESPESAS EM CONDOMÍNIO DE UM SÓ DONO?

Quando se trata de edifício em condomínio que possui um só dono, não surgem maiores dificuldades para a cobrança das despesas, posto que o § 3º do artigo 23 tratou expressamente do assunto.

Difere a sistemática de cobrança no que tange à fundamentação das despesas, que não se baseará em previsão orçamentária mas, sim, nas despesas efetivamente realizadas e comprovadas.

CARLYLE POPP(37) entende que nesses casos não haverá propriamente um condomínio e afirma: "Na hipótese de ser o edifício onde reside o locatário de propriedade de uma única pessoa, inexistirá condomínio, pois pressuposto legal para tanto é a divisão dos domínios. Neste caso, a possibilidade de cobrança dos encargos mencionados no § 1º do presente dispositivo ficará condicionada à prévia comprovação. Ou seja, o pagamento não pode ser exigido anteriormente ao gasto efetivado."

Estas, como se percebe, são apenas algumas das incontáveis situações que assolam o dia-a-dia daqueles que se enquadram na posição de condômino/locador ou locatário de unidade imóvel condominial. É evidente a evolução da lei reguladora das relações locatícias e certamente, a jurisprudência cuidará de ajustar situações conflituosas, apontando as soluções mais justas e resguardando o equilíbrio nas relações contratuais.

Sobre o autor
Helder Martinez Dal Col

Advogado e Professor no Paraná, Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ), Mestre em Direito Civil pela Universidade Estadual de Maringá (UEM/PR)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COL, Helder Martinez Dal. Despesas de condomínio na Lei do Inquilinato. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 45, 1 set. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/588. Acesso em: 26 nov. 2024.

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