9. CONCLUSÃO
.A compensação por danos morais não pode ter como fim causar mal (retribuição) e tampouco prevenir outros ilícitos. Sua finalidade exclusiva deve ser a exata medida da compensação do dano, proporcionando-se bem que atenue o sofrimento experimentado. Nisto não há qualquer punição. A interpretação não pode ser diversa, em que pese o argumento da mais gabaritada doutrina. Punir pelo arbitramento judicial é conferir poderes ao judiciário sem autorização legal. É ferir direitos e garantias individuais; é a própria negação do Estado Democrático de Direito.
Gostaríamos aqui, de firmar nossa posição como bem o fez nosso ilustre mestre, o Professor José Ignácio Botelho de Mesquita, para quem "nem é preciso ir tão longe, pois é intuitivo que, em matéria civil, não cabe ao juiz, por sentença, criar multas, que antes não existiam, ou aumentar as que já existissem". [8]
Por fim, por serem lapidares as palavras [9] do Juiz Breyer da Suprema Corte dos Estados Unidos no mesmo recurso ante citado, entendemos que sua conclusão é irretocável, razão pela qual transcreveremos abaixo suas palavras:
Esta preocupação constitucional, presente na Magna Carta, surge da injustiça de privar os cidadãos da vida, da liberdade, ou da propriedade, com a aplicação, não da lei e de devidos processos legais, mas da coerção arbitrária. Requerendo a aplicação da lei, ao invés de um capricho do julgador, tem-se mais do que simplesmente fazer que os cidadãos observem as medidas que podem sujeitá-los à punição; ajuda também assegurar o tratamento uniforme das pessoas, que é a essência da própria lei. – versão livre dos próprios autores [14].
BIBLIOGRAFIA
GOMES, Orlando. Obrigações. 9ª ed. Rio de Janeiro. Forense. 1994
SILVA, Américo Luis da. O Dano moral e sua reparação civil. São Paulo: RT, 1999.
JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal. vol. I. São Paulo: Saraiva, 1995.
VON TUHR, Andrea. Tratado de las obligaciones. Trad. W. Roces. Tomo I. 1ª ed. Madrid, Reus, 1934.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. trad. João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
VOCI, Pasquale. Risarcimento e Pena Privata nel Dirito Romano Classico. R. Università di Roma. Milão: Dott. A. Giuffrè, 1939.
AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Dano moral - Lei de imprensa e interpretação conforme a Constituição. in Direito ao Avesso, vol 4. (Esta é uma publicação do Grupo de Direito Privado)
BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade Civil - Teoria & Prática. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990.
SCHECARIA, Sérgio Salomão et ali. Pena e Constituição. São Paulo: RT, 1995
Notas Bibliograficas
1 STOCO, Rui. RESPONSABILIDADE CIVIL E SUA INTERPRETAÇÃO JURISPRUDENCIAL, 4ª ed., revista, atualizada e ampliada, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, pp. 761-762.
2RESPONSABILIDADE CIVIL, Ed. Forense, Rio, 3.º ed., 1992, n. 45, p. 55.
3 CAHALI, Yussef. INDENIZAÇÃO SEGUNDO A GRAVIDADE DA CULPA, Revista da Escola Paulista da Magistratura, Ano l, n. 1, setembro-dezembro/96, p. 26.
4 (5). Pœnalia non sunt extendenda. Interpretatione legum pœnce molliendœ sunt potius quam asperandœ (Digesto, liv, 48, tit.19. – De pœnis, frag. 42) – Não se aplique extensivamente o que é concernente a punição. Na interpretação das leis sejam as penas antes abrandadas, ao invés de agravadas". cfr. MAXIMILIANO, Carlos. HERMENÊUTICA E APLICAÇÃO DO DIREITO. Rio de Janeiro, Forense, 11ª ed. 1991, pp. 225.
5 Cfr. Caldara, op. cit, nº 195; Francesco Degni – L’Interpretazione della Legge, 1909, p. 23; nota 2, e p 38, nºs 13e 20; Mário Rotondi, monografia in Nuovo Digesto Italiano, 1937-1940; verbo "Legge" (Interpretazione della), nº 4. apud MAXIMILIANO, Carlos. op. cit, p. 328.
6 BARROSO, Luís Roberto. INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO: FUNDAMENTOS DE UMA DOGMÁTICA CONSTITUCIONAL TRANSFORMADORA. São Paulo, Saraiva, 1996, pp.252-255.
7BMW of North America, Inc. v. Gore, 517 U.S. 559 (1996), Suprema Corte do Estados Unidos da América. Opinion of Justice Stevens.
8 BOTELHO DE MESQUITA, José Ignácio. O DANO MORAL NA LEI DE IMPRENSA, O ESTADO DE SÃO PAULO, 12.9.97.
9BMW of North America, Inc. v. Gore, 517 U.S. 559 (1996), Suprema Corte do Estados Unidos da América. Opinion of Justice Breyer.
Notas
1 Para uma crítica a este método vide AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Dano moral - Lei de imprensa e interpretação conforme a Constituição. in Direito ao Avesso, vol 4. (Esta é uma publicação do Grupo de Direito Privado)
2 BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade Civil - Teoria & Prática. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990. p. 77/78.
3 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal. vol. I. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 457
4 Hans Kelsen é de opinião diametralmente oposta: "A custo será possível determinar o conceito de pena pelo seu fim. Com efeito, o fim da pena não resulta – ou não resulta imediatamente – do conteúdo da ordem jurídica. A interpretação segundo a qual a pena é dirigida, é uma interpretação que também é possível em face de ordenamentos jurídico-penais cujo aparecimento não foi determinado pela idéia de prevenção, mas o foi tão simplesmente pelo princípio de que se deve retribuir o mal com o mal. As penas de morte e de prisão permanecem as mesmas, quer se vise ou não, ao estatuí-las, um fim de prevenção. Sob este aspecto não existe qualquer diferença essencial entre pena e execução (civil), pois também esta pode – sendo, como é, sentida como um mal pelo indivíduo que atinge – ter um efeito preventivo, de tal forma que o fim de indenização se pode combinar, aqui, com o fim de prevenção" (KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. trad. João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1991).
5 ROXIN, Claus. Problemas Fundamentais de Direito Penal. p. 20 apud SCHECARIA, Sérgio Salomão et ali. Pena e Constituição. São Paulo: RT, 1995. p. 100.
6 A questão das finalidades da pena é extremamente controversa entre os penalistas. Além das mencionadas correntes (retributiva e preventiva), há, ainda, teorias mistas que procuram fundir as duas finalidades. Já em menor número pode-se encontrar aqueles que negam qualquer finalidade à punição (para maiores detalhes sobre o tema vide SCHECARIA, Sérgio Salomão. op. cit. ).
7 SILVA, Américo Luis da. O Dano moral e sua reparação civil. São Paulo: RT, 1999. p. 320.
8 VOCI, Pasquale. Risarcimento e Pena Privata nel Dirito Romano Classico. R. Università di Roma. Milão: Dott. A. Giuffrè, 1939. p. 11 – A opinião do autor é muito interessante. A pena seria caracterizada por sua função e estrutura. À toda aplicação de pena corresponde uma respectiva ação penal. A rei persecutio só tem escopo de restabelecer o patrimônio do lesado quanto o ilícito haja subtraído, sendo que seu fim é diretamente patrimonial; a poenae persecutio tem o escopo de punir o réu, ainda que pecuniariamente, sendo que seu fim é atingido através do patrimônio.
9"In our federal system, States necessarily have considerable flexibility in determining the level of punitive damages that they will allow in different classes of cases and in any particular case. Most States that authorize exemplary damages afford the jury similar latitude, requiring only that the damages awarded be reasonably necessary to vindicate the State''s legitimate interests in punishment and deterrence. (...) Only when an award can fairly be categorized as ‘grossly excessive’ in relation to these interests does it enter the zone of arbitrariness that violates the Due Process Clause of the Fourteenth Amendment. (...) For that reason, the federal excessiveness inquiry appropriately begins with an identification of the state interests that a punitive award is designed to serve. We therefore focus our attention first on the scope of Alabama''s legitimate interests in punishing BMW and deterring it from future misconduct."
10"Perhaps the most important indicium of the reasonableness of a punitive damages award is the degree of reprehensibility of the defendant''s conduct. As the Court stated nearly 150 years ago, exemplary damages imposed on a defendant should reflect "the enormity of his offense." This principle reflects the accepted view that some wrongs are more blameworthy than others. Thus, we have said that "nonviolent crimes are less serious than crimes marked by violence or the threat of violence." Similarly, "trickery and deceit", at are more reprehensible than negligence. In both the West Virginia Supreme Court and the Justices of this Court placed special emphasis on the principle that punitive damages may not be "grossly out of proportion to the severity of the offense." Indeed, for Justice Kennedy, the defendant''s intentional malice was the decisive element in a "close and difficult case" (...)
Certainly, evidence that a defendant has repeatedly engaged in prohibited conduct while knowing or suspecting that it was unlawful would provide relevant support for an argument that strong medicine is required to cure the defendant''s disrespect for the law."
11 "The second and perhaps most commonly cited indicium of an unreasonable or excessive punitive damages award is its ratio to the actual harm inflicted on the plaintiff. See TXO, 509 U. S., at 459; Haslip, 499 U. S., at 23. The principle that exemplary damages must bear a "reasonable relationship" to compensatory damages has a long pedigree. Scholars have identified a number of early English statutes authorizing the award of multiple damages for particular wrongs. Some 65 different enactments during the period between 1275 and 1753 provided for double, treble, or quadruple damages. Our decisions in both Haslip and TXO endorsed the proposition that a comparison between the compensatory award and the punitive award is significant.
Of course, we have consistently rejected the notion that the constitutional line is marked by a simple mathematical formula, even one that compares actual and potential damages to the punitive award. Indeed, low awards of compensatory damages may properly support a higher ratio than high compensatory awards, if, for example, a particularly egregious act has resulted in only a small amount of economic damages. A higher ratio may also be justified in cases in which the injury is hard to detect or the monetary value of noneconomic harm might have been difficult to determine. It is appropriate, therefore, to reiterate our rejection of a categorical approach. Once again, "we return to what we said... in Haslip: `We need not, and indeed we cannot, draw a mathematical bright line between the constitutionally acceptable and the constitutionally unacceptable that would fit every case. We can say, however, that [a] general concer[n] of reasonableness... properly enter[s] into the constitutional calculus.'' In most cases, the ratio will be within a constitutionally acceptable range, and remittitur will not be justified on this basis. When the ratio is a breathtaking 500 to 1, however, the award must surely "raise a suspicious judicial eyebrow."
12"Comparing the punitive damages award and the civil or criminal penalties that could be imposed for comparable misconduct provides a third indicium of excessiveness. As Justice O''Connor has correctly observed, a reviewing court engaged in determining whether an award of punitive damages is excessive should "accord `substantial deference'' to legislative judgments concerning appropriate sanctions for the conduct at issue.
In Haslip, 499 U. S., at 23, the Court noted that although the exemplary award was "much in excess of the fine that could be imposed," imprisonment was also authorized in the criminal context. In this case the $2 million economic sanction imposed on BMW is substantially greater than the statutory fines available in Alabama and elsewhere for similar malfeasance.
The sanction imposed in this case cannot be justified on the ground that it was necessary to deter future misconduct without considering whether less drastic remedies could be expected to achieve that goal. The fact that a multimillion dollar penalty prompted a change in policy sheds no light on the question whether a lesser deterrent would have adequately protected the interests of Alabama consumers. In the absence of a history of noncompliance with known statutory requirements, there is no basis for assuming that a more modest sanction would not have been sufficient to motivate full compliance with the disclosure requirement imposed by the Alabama Supreme Court in this case."
13"Moreover, we of course accept the Alabama courts'' view that the state interest in protecting its citizens from deceptive trade practices justifies a sanction in addition to the recovery of compensatory damages. We cannot, however, accept the conclusion of the Alabama Supreme Court that BMW''s conduct was sufficiently egregious to justify a punitive sanction that is tantamount to a severe criminal penalty. (...)
(...)
The judgement is reversed, and the case remanded for further proceedings not inconsistent with this opinion."
14"This constitutional concern, itself harkening back to the Magna Carta, arises out of the basic unfairness of depriving citizens of life, liberty, or property, through the application, not of law and legal processes, but of arbitrary coercion. Requiring the application of law, rather than a decisionmaker''s caprice, does more than simply provide citizens notice of what actions may subject them to punishment; it also helps to assure the uniform general treatment of similarly situated persons that is the essence of law itself.