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Mutação constitucional: a mutação da família na sociedade

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Agenda 04/07/2017 às 12:45

A mutação constitucional é um processo não legislativo, através do qual é conferido um novo sentido ao texto positivado da Constituição, na atividade de interpretação, não havendo mudanças no seu conteúdo. No que diz respeito à instituição da família, a mutação vem trazendo vários modelos que devem ser analisados a partir das múltiplas transformações ocorridas ao longo dos anos, de forma gradativa.

1 INTRODUÇÃO

A Constituição é entendida com a Lei Maior de um país. É um texto escrito decorrente do exercício do poder constituinte originário, que, nos países democráticos, em regra, manifesta-se por meio de uma Assembleia Nacional Constituinte legitimamente eleita pelo povo, detentor do poder, para a elaboração da Constituição (VASQUES, 2016, p.2).

O texto constitucional prevê expressamente a possibilidade de reformas e revisões constitucionais (CF, 1988). Dessa forma, a mutação constitucional advém da necessidade de acompanhar a evolução da sociedade para que, dessa maneira, essas mudanças sociais radiquem ao texto normativo.

As mutações constitucionais tiveram início entre os séculos XIX e XX, na Alemanha. Uma importante obra sobre o tema em questão é a Reforma y Mutación de la Constituición por Georg Jellinek, na qualeste adotou, como forma de distinção para mutação constitucional da reforma constitucional, a intencionalidade (BULHOS, 2011, p.9).

Apesar de haver divergências entre doutrinadores sobre a classificação, pode-se citar que há duas formas clássicas de mutações: a mutação constitucional por interpretação e mutação constitucional pela prática constitucional.

A mutação por interpretação é a espécie mais clássica adotada pela doutrina e se dá através da adaptação do texto constitucional à nova realidade social-política. Esse tipo de mutação não altera o texto da lei nem seu conteúdo, mas modifica seu sentido. Encaixam-se na mutação pela prática constitucional os casos de omissão legislativa e falta de previsão legal. Esse tipo de mutação pode ser dividido em mutação constitucional pela prática política, mutação constitucional por desuso, mutação constitucional para preenchimento de lacunas, mutação constitucional pela legislação ordinária e mutação constitucional por interpretação judiciária (LENZA, 2010, p.2).

No Brasil, exemplo mais atual e significativo de mutação constitucional diz respeito ao recente julgamento da ADPF 54, que autorizou a interrupção terapêutica do parto em caso de feto comprovadamente anencefálico. No julgamento, o Supremo Tribunal Federal concluiu que não se trata de ofensa do direito à vida, afastando o crime de aborto, devendo-se prestigiar a dignidade da pessoa da gestante e a autonomia da sua vontade (STF, 2012).

As mutações constitucionais, portanto, exteriorizam o caráter dinâmico e de prospecção das normas jurídicas, por meio de processos informais. Informais no sentido de não serem previstos dentre aquelas mudanças formalmente estabelecidas no texto constitucional.

Buscando sua origem na doutrina alemã, Uadi Lammêgo Bulos denomina mutação Constitucional como sendo:

[...] O processo informal de mudança da constituição, por meio do qual são atribuídos novos sentidos, conteúdos até então não ressaltados à letra da Constituição, quer através da interpretação, em suas diversas modalidades e métodos, quer por intermédio da construção (construction), bem como dos usos e dos costumes constitucionais” (LENZA, 2014, p. 11).           

            De acordo com Henri Lévi-Bruhl (1997, p.1) as normas do direito possuem caráter essencialmente provisório, pois de acordo com esse autor “as normas jurídicas não têm caráter estável e perpétuo”. O Direito existe para regular o comportamento dos indivíduos dentro de uma sociedade segundo valores preestabelecidos e vigentes à época. Acontece que os grupos sociais são formados por indivíduos de opinião que se altera, uma vez que os elementos intrínsecos e extrínsecos alteram-se constantemente acarretando uma mudança de valores com o passar do tempo. 

A mutação no aspecto de família vem trazendo vários modelos, que serão analisados com as múltiplas transformações que, ao longo dos anos, estão acontecendo de forma gradativa, já nos dias atuais com o avassalador aumento do mercado de trabalho da mulher, ressaltando sua independência, tanto no campo financeiro, como no sustento da família, que antes era monopólio do homem como seu provedor e dono da razão.

Assim sendo, Orlando Gomes (2004, p.2) considera família como grupo fechado de pessoas composta dos genitores e filhos e para limitados efeitos outros parentes, unificados pela convivência e comunhão de afetos, em uma só e mesma economia, sob a mesma direção. 

Maria Berenice Dias preleciona sobre o novo modelo de família:

Do conceito unívoco de família do século passado, que o identificava exclusivamente pela existência do casamento, chegou-se as mais diversas estruturas relacionais, o que levou ao surgimento de novas expressões, como de “entidade familiar”, “união estável”, “família monoparental”, desbioligização”, “reprodução assistida”, “concepção homóloga", “heteróloga”, “homoafetividade”, “filiação afetiva”, etc. Tais vocábulos buscam adequar à linguagem as mudanças nas conformações sociais, que decorrem da evolução da sociedade e da redefinição do conceito de moralidade, bem como dos avanços da engenharia genética. Essas alterações acabaram por redefinir a família, que passou a ter um aspecto multifacetário (DIAS, 2004, p.11).

A família foi gradativamente evoluindo, sofrendo grandes mutações ao longo dos séculos. Conforme já salientado em momento anterior, o poder familiar que, antigamente, era chamado pátrio poder, também passou a ter novo conceito e nova aplicação, sendo que aquele princípio de superioridade do “pater familias”, ou até mesmo o exercício absoluto do poder marital passou a ficar de lado sendo consagrado o poder familiar após o advento do Código Civil de 2002, em seus artigos 1.630 a 1.638 (VENOSA, 2006, p.9).

Como já ressaltado, a mutação constitucional fornece um novo sentido para a norma interpretada decorrente da incompatibilidade entre a Constituição escrita e a real. Assim sendo, o fenômeno da mutação constitucional é capaz de influenciar direta e amplamente o conceito de família. Assim se afirma, pois restou demonstrado que os tribunais nacionais e a doutrina vêm buscando acompanhar as mudanças sociais, de forma a conferir às leis brasileiras uma aplicação contemporânea, menos estática, pelo que ocorreu a mudança da interpretação do conceito da palavra “família”.

No Brasil, considerando que as leis regem as mudanças sociais, vários foram as alterações introduzidas no âmbito familiar por leis esparsas depois de promulgado o Código Civil de 1916, dentre elas, podem ser citadas: Estatuto da Mulher Casada; Lei de Alimentos, de 25 de julho de 1968, que disciplinou as ações de alimentos; Lei do Divorcio, de 26 de dezembro de 1977, que introduziu o divórcio no país e permitiu aos casais o direito a novas uniões.

É notório que o modelo de família entrou em vertiginosa mudança a partir da década de 60 do século passado, fazendo com que a sociedade mudasse de forma admirável. Nas palavras de Francisco José de Oliveira (2006, p.04), no Brasil, a recepção de novos paradigmas em matéria de família, no sentido da rendição do direito ao quadro multifacetário característico da realidade familiar, só veio a ocorrer de fato, com a Constituição de 1988.

Pode-se concluir que, além da capacidade de adequar à Constituição à realidade social, esse fenômeno também respeita o princípio da segurança jurídica e somente será contrário se deixar de respeitar a proteção da confiança nas relações jurídicas. Fora isso, as mutações constitucionais são vistas, inclusive, como auxiliadoras da força normativa, podendo, até mesmo, proporcionar à sociedade uma maior confiabilidade no Estado, uma vez que tem a capacidade de conceder soluções aos casos concretos.

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A família vem mudando a cada dia, demonstrando uma forma diferente de ser, daquele que há muitas décadas eram inalterável. O presente estudo pretende demonstrar como a família mudou na sociedade, sem que haja uma mudança substancial na legislação.

Tendo em vista os temas abordados, a problemática gira em torno de quais mudanças acontece na concepção de família na sociedade e não mudaram o texto positivado da constituição.

Diante desse cenário vem ocorrendo modificações no conceito tradicional de família, porém, não se detém uma mudança no texto constitucional.

A escolha desse tema se deu, dentre tantos motivos, da necessidade atual de se questionar que, diante das inegáveis mudanças ocorridas na família perante a sociedade, o Direito precisa acompanhar as mudanças sociais.

Desse modo, busca-se analisar os atuais posicionamentos jurisprudenciais e doutrinários frente ao reconhecimento do novo modelo familiar brasileiro. Hoje são muitas as mudanças que acontecem e que são necessárias para regular a própria sociedade, visto que a mesma se manifesta à frente das leis, buscando uma maneira de auto se complementar.

Observa-se, então, que a mutação constitucional advém da necessidade de acompanhar a evolução societária, para que de tal maneira, essas mudanças sociais readéquem o texto normativo.


2 OBJETIVOS

2.1 Objetivo geral

Analisar quais mutações acontecem no conceito de família, sem que haja mudança de texto na Constituição Federal.

2.2 Objetivos específicos


3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O presente trabalho pretende analisar as mudanças que ao longo dos tempos vêm acontecendo na concepção de família na sociedade; como estas mudanças afetam a sociedade e as leis que regem todo um sistema jurídico positivado, sendo possível observar as transformações que aconteceram ao longo dos tempos desde o surgimento da sociedade, transformações estas que vem dando nova interpretação ao conceito de família não só na sociedade, como no mundo jurídico, que são regidos por leis nas formas formais e informais, tanto na sua lei maior, a Constituição, como nas suas leis infraconstitucionais.

A Constituição da República de 1988 nos dá a concepção de família, sua forma de construção e manutenção, sua proteção, seus diretos e suas obrigações, no Capítulo VII, que trata da seguinte forma: Da Família, Da Criança, Do Adolescente e Do Idoso. O art. 226, caput, mostra a família como sendo a base de sustento da sociedade, a qual terá especial proteção do Estado.

Os parágrafos primeiro e segundo do art. 226 nos evidencia como a família deve ser constituída, sendo que o casamento é o civil e gratuita a celebração, porém, o casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei, já a parágrafo terceiro do mesmo artigo mostra outras formas de casamento e de que maneira adquirirá a proteção do Estado.

A mutação constitucional é um processo não legislativo através do qual vem sendo dado um novo sentido ao texto positivado da Constituição; ora na atividade de interpretação, não havendo mudanças no seu conteúdo. Algumas decisões da Suprema Corte mostram a importância do conceito de família de acordo com o art. 226 da CF/88, com a inserção de diversas formas de construção dessas, que não então expressas na Constituição Federal.

Sendo que a mutação constitucional acontece na norma, senão vejamos a doutrina de Branco et al.:

O estudo do poder constituinte de reforma instrui sobre o modo como o Texto Constitucional pode ser formalmente alterado.

Ocorre que, por vezes, em virtude de uma evolução na situação de fato sobre a qual incide a norma, ou ainda por força de uma nova visão jurídica que passa a predominar na sociedade, a Constituição muda, sem que as palavras hajam sofrido modificação alguma. O texto é o meso, mas o sentido que lhe é atribuído é outro. Como a norma não se confunde com o texto, repara-se, aí, uma mudança da norma, mantido o texto. Quando isso ocorre no âmbito constitucional, fala-se em mutação constitucional (BRANCO, 2012, p.13-14).

No Brasil, o direito reconhece o matrimônio como sendo a forma primária de constituição da família, que tem sua origem na união estável e na monoparental. Contudo, o conceito de família vem sofrendo transformações através da mutação constitucional, que dá o reconhecimento jurídico de outras formas de constituição de uma família como a união homoafetiva, como entidade familiar, deixando assim espaços a outras espécies de família, como a união concubinária.

A Suprema Corte deixa claro:

O caput do art. 226 confere à família, base da sociedade, especial proteção do Estado. Ênfase constitucional à instituição da família. Família em seu coloquial ou proverbial significado de núcleo doméstico, pouco importando se formal ou informalmente constituída, ou se integrada por casais heteroafetivos ou por pares homoafetivos. A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão "família", não limita sua formação a casais heteroafetivos nem a formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia religiosa. Família como instituição privada que, voluntariamente constituída entre pessoas adultas, mantém com o Estado e a sociedade civil uma necessária relação tricotômica. Núcleo familiar que é o principal lócus institucional de concreção dos direitos fundamentais que a própria Constituição designa por "intimidade e vida privada" (inciso X do art. 5º). Isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos que somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família. Família como figura central ou continente, de que tudo o mais é conteúdo. Imperiosidade da interpretação não-reducionista do conceito de família como instituição que também se forma por vias distintas do casamento civil. Avanço da CF de 1988 no plano dos costumes. Caminhada na direção do pluralismo como categoria sócio-político-cultural. Competência do STF para manter, interpretativamente, o Texto Magno na posse do seu fundamental atributo da coerência, o que passa pela eliminação de preconceito quanto à orientação sexual das pessoas. União estável. Normação constitucional referida a homem e mulher, mas apenas para especial proteção desta última. (...) A referência constitucional à dualidade básica homem/mulher, no §3º do seu art. 226, deve-se ao centrado intuito de não se perder a menor oportunidade para favorecer relações jurídicas horizontais ou sem hierarquia no âmbito das sociedades domésticas. Reforço normativo a um mais eficiente combate à renitência patriarcal dos costumes brasileiros. Impossibilidade de uso da letra da Constituição para ressuscitar o art. 175 da Carta de 1967/1969. Não há como fazer rolar a cabeça do art. 226 no patíbulo do seu parágrafo terceiro. Dispositivo que, ao utilizar da terminologia "entidade familiar", não pretendeu diferenciá-la da "família". Inexistência de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de constituição de um novo e autonomizado núcleo doméstico. Emprego do fraseado "entidade familiar" como sinônimo perfeito de família. A Constituição não interdita a formação de família por pessoas do mesmo sexo. Consagração do juízo de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um legítimo interesse de outrem, ou de toda a sociedade, o que não se dá na hipótese sub judice. Inexistência do direito dos indivíduos heteroafetivos à sua não equiparação jurídica com os indivíduos homoafetivos. Aplicabilidade do § 2º do art. 5º da Constituição Federal, a evidenciar que outros direitos e garantias, não expressamente listados na Constituição, emergem "do regime e dos princípios por ela adotados", (...). (...) Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723 do CC, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização da técnica de "interpretação conforme à Constituição". Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva.[ADI 4.277e ADPF 132, rel. min. Ayres Britto, j. 5-5-2011, P, DJE de 14-10-2011.]RE 687.432 AgR, rel. min. Luiz Fux, j. 18-9-2012, 1ª T, DJE de 2-10-2012.

3.1.A evolução da família na história

O conceito de família foi de uma entidade ampla e hierarquizada, retraindo-se hoje, fundamentalmente, para o âmbito quase exclusivo de pais e filhos menores, que vivem no mesmo lar (VENOSA, 2010, p.3).

De acordo com os estudos históricos, o homem inicialmente era um ser uno, não possuindo vínculos afetivos com outros seres humanos. A relação entre homem e mulher era apenas sexual e tal fato dava-se em razão de seus instintos. Portanto, não havia uma idéia de união, sendo qualquer homem livre para relacionar-se com qualquer mulher e vice-versa (ENGELS, 2005, p.31).

Sobre esta época, Engels (2005, p.31) afirma que era “[...] uma época primitiva em que imperava no seio da tribo, o comércio sexual promíscuo, de modo que cada mulher pertencia igualmente a todos os homens e cada homem a todas as mulheres”.

Ainda segundo Dias (2009, p.124), a configuração de família no sentido mais puro e jurídico do termo é de que família é qualquer relação de afeto, amor, carinho, solidariedade, compaixão e compreensão presentes entre os integrantes de determinado grupo, podendo assumir variadas formas e gêneros, desde que os integrantes assim se reconheçam.

De acordo com Oliveira (2002, p.228), “A compreensão da atual textura das espécies de Família previstas na Constituição Federal explica o avanço cultural, social, político e ideológico de nossa nação, que ocorreu no longo dos tempos e desaguou na Constituição de 1988”.

Todavia, como bem lembra Gomes (1998, p. 39),

A evolução jurídica da família importa, entre os povos de nossa área cultural, a partir de Roma. O direito romano deu-lhes estrutura inconfundível, tornando-a unidade jurídica, econômica e religiosa, fundada na autoridade soberana de um chefe.

            Portanto, o amor familiar é o elemento que configura a família contemporânea. Ressalta Lôbo (2011, p.12), contudo, que além da afetividade devem estar presentes outros dois elementos identificadores do núcleo familiar, que são a ostensibilidade e a estabilidade. A estes elementos, Pereira (2006, p. 181) acrescenta, ainda, outro que, na verdade, engloba todos eles. Esse elemento, ou melhor, essa noção de família sustentada pelo afeto, deve conter, em seu núcleo, uma estrutura psíquica. É a partir desses pressupostos que Lancan pôde definir a família como uma estruturação psíquica (PEREIRA, 2006, p. 181-182).

3.2.O direito de família e sua origem

Na ótica do direito, de acordo com Venosa (2004, p.23): “O Direito de Família, ramo do direito Civil com características peculiares, é integrado pelo conjunto de normas que regulam as relações jurídicas familiares”. A acrescentar Barbosa (2002, p.23): “o Direito de Família seria o ramo do Direito Civil, cujas normas, princípios e costumes regulam as relações jurídicas do Casamento, da União estável, do Concubinato e do Parentesco, previstos pelo Código Civil de 2002”.

3.3.A família moderna

A família é a mais antiga das grandes instituições e, embora não se saiba com certeza qual a sua origem, pode se afirmar que sua formação é cultural, resultando de comportamentos, hábitos e valores próprios da sociedade em determinados tempo e espaço. Assim, ela tem passado por inúmeras transformações ao longo da história, sendo que a maior delas, no Brasil, vem ocorrendo desde a década de 1960 (LOTUFO, 2008, p. 572).

Para Paulo Lôbo (2011, p. 128).

“Essa evolução proporcionou modificações sociais onde o interesse a ser tutelado não é mais o do grupo organizado como esteio do Estado, e das relações de produção existentes, mas das condições que permitam à pessoa humana realizar-se íntima e afetivamente, nesse pequeno grupo social”.

3.4.Igualdade do homem e da mulher

Na Idade Média, a família passou a ser completamente regulada pelo Direito Canônico, devido à grande influência da Igreja Católica sobre o Estado. O casamento passou a ser considerado um sacramento, sendo indissolúvel e voltado à finalidade de procriação. Mesmo após a Revolução Francesa, em 1789, que defendia a igualdade entre homens e mulheres, o Código de Napoleão reforçou o poder patriarcal, uma vez que, além de outorgar ao pai maiores direitos sobre os filhos, ressaltou que este poder se estende sobre esposa, que sob seu jugo (LOUZADA, 2013, p. 01).

Todavia, como bem assevera Silva (2000, p. 823), não é mais só pelo casamento que se constitui a entidade familiar, já que trouxe o constituinte as figuras da família monoparental e da união estável, sendo que todas merecem a proteção do Estado e em qualquer desses casos, os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher, consagrando-se o direito de igualdade entre ambos, consignado no Art. 5º, I.

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgarem a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceram a união estável para casais do mesmo sexo. As ações foram ajuizadas na Corte, respectivamente, pela Procuradoria-Geral da República e pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral.

O julgamento começou na tarde de ontem (4), quando o relator das ações, ministro Ayres Britto, votou no sentido de dar interpretação conforme a Constituição Federal para excluir qualquer significado do artigo 1.723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

O ministro Ayres Britto argumentou que o artigo 3º, inciso IV, da CF veda qualquer discriminação em virtude de sexo, raça, cor e que, nesse sentido, ninguém pode ser diminuído ou discriminado em função de sua preferência sexual. “O sexo das pessoas, salvo disposição contrária, não se presta para desigualação jurídica”, observou o ministro, para concluir que qualquer depreciação da união estável homoafetiva colide, portanto, com o inciso IV do artigo 3º da CF.

Os ministros Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cezar Peluso, bem como as ministras Cármen Lúcia Antunes Rocha e Ellen Gracie, acompanharam o entendimento do ministro Ayres Britto, pela procedência das ações e com efeito vinculante, no sentido de dar interpretação conforme a Constituição Federal para excluir qualquer significado do artigo 1.723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

Na sessão de quarta-feira, antes do relator, falaram os autores das duas ações – o procurador-geral da República e o governador do Estado do Rio de Janeiro, por meio de seu representante –, o advogado-geral da União e advogados de diversas entidades, admitidas como amicicuriae (amigos da Corte).

Ações

A ADI 4277 foi protocolada na Corte inicialmente como ADPF 178. A ação buscou a declaração de reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. Pediu, também, que os mesmos direitos e deveres dos companheiros nas uniões estáveis fossem estendidos aos companheiros nas uniões entre pessoas do mesmo sexo.

Já na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, o governo do Estado do Rio de Janeiro (RJ) alegou que o não reconhecimento da união homoafetiva contraria preceitos fundamentais como igualdade, liberdade (da qual decorre a autonomia da vontade) e o princípio da dignidade da pessoa humana, todos da Constituição Federal. Com esse argumento, pediu que o STF aplicasse o regime jurídico das uniões estáveis, previsto no artigo 1.723 do Código Civil, às uniões homoafetivas de funcionários públicos civis do Rio de Janeiro.

3.5.Legitimidade

Sendo o Supremo Tribunal Federal o guardião da constituição, ao mesmo é dado o pode de julgar quais leis serão inconstitucional ou constitucionais, como leciona o Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe,

A interpretação judicial como instrumento de mutação informal da Constituição. A questão dos processos informais de mutação constitucional e o papel do Poder Judiciário: a interpretação judicial como instrumento juridicamente idôneo de mudança informal da Constituição. A legitimidade da adequação, mediante interpretação do Poder Judiciário, da própria CR, se e quando imperioso compatibilizá-la, mediante exegese atualizadora, com as novas exigências, necessidades e transformações resultantes dos processos sociais, econômicos e políticos que caracterizam, em seus múltiplos e complexos aspectos, a sociedade contemporânea.

[HC 91.361, rel. min. Celso de Mello, j. 23-9-2008, 2ª T, DJE de 6-2-2009.]Vide ADI 3.345, rel. min. Celso de Mello, j. 25-8-2005, P, DJE de 20-8-2010

Segundo ensina com maestria Nery Júnior, mutação constitucional (Verfassungswandlung) é a modificação natural e não forçada que ocorre na Constituição, sem alteração do texto, em virtude de interpretação legislativa, administrativa e jurisdicional, bem como por práticas, usos e costumes” (NERY JÚNIOR, 2009, p. 94). Só poderá haver mutação constitucional quando ocorrer fatos novos não previstos pelo legislador. Porém, deve ser sempre um processo natural, como pode ser observado ainda no mesmo autor (NERY JÚNIOR, 2009, p. 95)

Bulos ressalta que o fenômeno da mutação constitucional é uma constante na vida dos Estados e, por isso, define mutação constitucional como “o processo informal de mudança da Constituição, por meio do qual são atribuídos novos sentidos, quer através da interpretação, em suas diversas modalidades e métodos, quer por intermédio da construção, bem como dos usos e costumes constitucionais. (BULOS, 1997, p. 57)

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