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A eficácia das penas como instrumento de combate ao tráfico de animais

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O presente trabalho foi desenvolvido com o objetivo de promover um alerta sobre as consequências devastadoras provocadas pelo tráfico de animas em nosso ecossistema, demonstrado, ao final da pesquisa, a insuficiência das penas aplicadas a este ilícito.

RESUMO: Com base nas informações obtidas e divulgadas pela Organização das Nações Unidas (ONU), o tráfico de animais silvestres demonstra ser a terceira atividade ilícita que mais promove lucro em todo o planeta, perdendo apenas para o tráfico de drogas e armas. No Brasil, o tráfico de animais é responsável pela retirada de cerca de 38 milhões de animais por ano do habitat natural, sendo que 90% permanecem no território nacional e 10% são enviados para o exterior a fim de atender as necessidades de colecionadores e, até mesmo, para fins científicos (biopirataria), movimentando um capital considerável.

O país busca combater esta modalidade de tráfico a fim de preservar e conservar seu patrimônio natural, que vem sendo ilegalmente explorado por indivíduos que não se intimidam com a possibilidade de ter a sua liberdade cerceada. O objetivo deste trabalho é apresentar dados referentes ao tráfico de animais no Brasil, discutindo as suas formas de prevenção e punição, bem como suas consequências em nossa biodiversidade.

O método de pesquisa usada para o desenvolvimento deste artigo é a pesquisa bibliográfica do tema em questão, levantamentos em revistas, jornais e relatórios.

Palavras-chave: Comercialização de animais, mercado de compra de animais, meio ambiente, extinção de espécies.


Introdução

       A preocupação científica com o desrespeito à fauna e à flora brasileiras nos faz perceber a importância do tema em questão, tema este que vem sendo amplamente divulgado nos meios de comunicação todos os dias. O tráfico de animais silvestres é uma apropriação indevida de um patrimônio que pertence ao Poder Público e à sociedade. A fauna silvestre é um bem de uso comum de todos e de fundamental importância à manutenção de todo o nosso ecossistema.

       Os Estados lutam de forma contínua para preservar e conservar o patrimônio natural, que vem sendo explorado e degradado de forma ilegal. De fato, o Brasil comporta um “berço” de animais das mais variadas espécies, o que o torna um dos principais alvos dessa prática. Em 1992, com a Convenção da Organização das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (CDB), promulgada pelo Decreto nº 2.519, de 16.03.1998, surgiu o conceito de biopirataria, referindo-se à toda e qualquer exploração, manipulação, exportação de recursos biológicos, com fins comerciais, além da utilização de espécies da fauna e da flora pela população sem que haja um trâmite legal. Pode-se perceber que as políticas existentes hoje e colocadas em prática contra o tráfico de animais ainda estão longe de alçar os resultados esperados a fim de extinguir tais delituos.

       O objetivo deste trabalho é apresentar informações relacionadas ao tráfico de animais no Brasil e permitir a discussão acerca de suas consequências para a biodiversidade, bem como os seus reflexos em todo o planeta. A metodologia utilizada é baseada na pesquisa bibliográfica, por meio de informações obtidas em trabalhos literários, monografias, bem como teses já existentes, e na retirada de dados oficiais disponibilizados no IBGE e em ONGs.

.      Muito embora haja um rigor em nossa legislação, a prática do tráfico de animais avança sem dar trégua, pois existe uma grande dificuldade de fiscalizações efetivas a fim de promover o combate desse ilícito. Com isso, a existência do tráfico de animais silvestres evidencia a real necessidade de se promover ações intensas que venham acompanhar a rota do tráfico de animais, bem como melhorar os instrumentos operacionais, para que se possa desenvolver de forma efetiva uma fiscalização mais eficiente no combate e prevenção contra o tráfico de animais silvestres, levando em consideração a importância da educação ambiental, como forma de conscientização.


 A gênese do tráfico de animais no Brasil. 

                   O Brasil, desde o seu descobrimento, por apresentar uma enorme riqueza e uma ampla biodiversidade em relação à fauna e à flora, tornou-se um alvo extremamente cobiçado de exploradores e comerciantes que desembarcavam em nossa vasta terra. O contato dos portugueses como as civilizações indígenas proporcionou a descoberta de novos hábitos, gerando grande interesse por essa nova cultura, com a domesticação de mamíferos e aves, transformando-os em animais de estimação, bem como a utilização das penas de aves para enfeites de chapéus e outras peças.

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                   Já está incrustada em nossa cultura uma íntima relação entre os indivíduos e a biodiversidade que os cercam, sendo perceptível desde o início de nossa colonização a presença de povos indígenas e seus estreitos laços com as mais variadas formas de vida aqui existentes.

                   Tais hábitos se perpetuam até hoje de forma desenfreada, levando até mesmo a fomentar o tráfico de animais, acarretando o aumento do risco de extinção de várias espécies. A manutenção da domesticação e da própria utilização de animais silvestre como uma forma de ornamentação continua sendo um hábito cultural que traz enormes riscos ao nosso ecossistema, como o desequilíbrio das cadeias alimentares. O desaparecimento de uma espécie também contribui de forma indireta para o desaparecimento de outras por conta da interligação entre elas dentro das cadeias alimentares e da própria seleção natural, ou seja, a extinção que ocorre atualmente causa impacto em todo o planeta.

Configurado pela retirada de animais de seus habitats naturais, a fim de destina-los à comercialização, o tráfico de animais tornou-se hoje um dos mais lucrativos comércios ilegais do mundo, movimentando cerca de 19 milhões de dólares por ano. Estamos diante da terceira atividade ilegal que mais gera dinheiro, estando atrás somente do tráfico de drogas e do tráfico de armas.

O tráfico de animais silvestres trata-se de uma forma de se apoderar, de forma clandestina, de um patrimônio que pertencente ao Poder Público e à própria coletividade, uma vez que o caput do art. 1º da Lei nº. 5.197/67 determina:

Art. 1º. Os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase do seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais são propriedades do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha.

§ 1º Se peculiaridades regionais comportarem o exercício da caça, a permissão será estabelecida em ato regulamentador do Poder Público Federal.

        § 2º A utilização, perseguição, caça ou apanha de espécies da fauna silvestre em terras de domínio privado, mesmo quando permitidas na forma do parágrafo anterior, poderão ser igualmente proibidas pelos respectivos proprietários, assumindo estes a responsabilidade de fiscalização de seus domínios. Nestas áreas, para a prática do ato de caça é necessário o consentimento expresso ou tácito dos proprietários, nos termos dos arts. 594, 595, 596, 597 e 598 do Código Civil.

Dener Giovanini{C}[5] afirma que: “o tráfico tem seu início com indivíduos que residem junto ao ambiente natural, capturando animais para vendê-los aos criadores ou a atravessadores que os transportam para os centros de venda”.

A precariedade e a necessidade de aferir renda para a manutenção familiar faz com que essas pessoas se submetam a prática do tráfico de animais como uma forma de obtenção de renda para garantir o sustento e a paz familiar.

Essa prática ilícita não se restringe apenas aos grupos familiares citados anteriormente, mas também a uma universalidade de pessoas com idade, sexo (na maioria das vezes são homens) e grau de escolaridades dos mais variados possíveis. A Universidade Estadual de Campina Grande promoveu uma pesquisa que demonstra o perfil da maioria dos entrevistados na prática ilícita da comercialização dos animais: “Dos entrevistados, todos foram homens entre 13 e 55 anos, sendo a metade de 25 a 35 anos. A maioria disse ser natural de Campina Grande (41,6%), sendo o restante natural de cidades do Brejo (16,7%), Curimataú (16,7%) e do Sertão (25%). Dentre eles não havia analfabetos, porém poucos haviam concluído o ensino fundamental, tendo cursado apenas até a 4ª série. Quanto à composição familiar a maioria é casada e com filhos (66,6%), sendo que os sem filhos são menores de 20 anos[6]”.

Tabela: Espécies brasileiras mais afetadas pelo tráfico

Nome Comum / Inglês

Nome Científico

Valor em US$

por Unidade

arara-azul-de-lear / lear´s macaw

Anodorhynchus leari

60,000

arara-azul / hyacinthine macaw

A n o d o r h y n c h u s

hyacinthinus

25,000

arara-canindé / blue and yellow macaw

Ara ararauna

4,000

papagaio-de-cara-roxa / blue cheeked

parrot

Amazona brasiliensis

6,000

flamingo / american flamingo

Phoenicopterus ruber

5,000

Fonte: Renctas, op.cit., p.17.


Os prejuízos à biodiversidade 

                   Tal atividade traz consequências terríveis ao meio ambiente, promovendo de forma acelerada o processo de extinção dos animais, provocando danos às cadeias ecológicas e, ao mesmo tempo, dissipando a herança genética presente na biodiversidade existente.

                   Os danos gerados pelo tráfico de animais sem dúvida alguma trazem consigo o desequilíbrio do nosso ecossistema maior, a terra. O desaparecimento de espécies torna o ecossistema mais vulnerável aos distúrbios ecológicos, causando a interrupção da oferta de serviços ambientais que são de fundamental importância para a sobrevivência das demais espécies, incluindo a nossa (Homo sapiens).

                   Apesar de nem todas as espécies individualmente serem essenciais para o homem, a retirada de uma ou mais espécies desequilibra toda a dinâmica do ecossistema,  podendo afetar de forma considerável a oferta de serviços ambientais fundamentais para a sobrevivência do homem e de outras espécies dentro de uma cadeia. É nossa obrigação, preservar toda a nossa fauna e flora, com o intuito de preservar o nosso próprio bem-estar, bem como a sobrevivência das futuras gerações.


Legislação contra o tráfico de animais

                   As leis 5.197/67 e 9.605/98, junto ao Decreto n° 3.179/99 regulam a prática do crime ambiental de tráfico de animais, trazendo a definição de tipos penais que configuram a prática ilícita e de seus institutos.

Lei 9.605/98:

Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:

Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.

§ 1º Incorre nas mesmas penas:

I - quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida;

II - quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural;

III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.

                   O parágrafo 3° do art. 29 do mesmo diploma indica a definição de animais silvestres

§ 3° São espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras.

                   A competência para processar e julgar os crimes contra a fauna era determinada pela sumula 91 do STJ, que trazia a seguinte redação: “Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra a fauna.” Diante do surgimento da Lei nº 9.605 de 1998, a Súmula 91 do Superior Tribunal de Justiça, foi cancelada, prevalecendo o entendimento de que “inexistindo, quanto aos crimes ambientais, dispositivo constitucional ou legal expresso sobre qual a justiça competente para o seu julgamento, tem-se que, em regra, o processo e o julgamento dos crimes ambientais é de competência da Justiça Comum Estadual” (CC nº 27.848-SP, 3ª Sec/ 46 BRITO, Juliana. PB tem 22 espécies de aves ameaçadas. In: Jornal da Paraíba, 09 de fevereiro de 2006. 47 STJ.)[7]

                   Novas propostas de lei estão presentes na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), como o projeto de lei (PLS 507/2015) do senador Wellington Fagundes (PR-MT), que inclui na lei de crimes ambientais o tráfico de animais silvestres. Também está presente em sua proposta o estabelecimento de penas mais severas (dois a quatro anos de prisão) para quem cometer o crime.

                   Não se pode esquecer a importância das ONGs – como o Fundo Mundial para a Natureza (WWF), uma das maiores organizações não governamentais ambientais do planeta – no combate ao tráfico de animais, uma vez que essas organizações estão diretamente vinculadas às demandas populares, atuando como um forte instrumento de combate à exclusão social e ao elitismo político, tornando a esfera da atuação pública mais ampla do que a de atuação dos governos, integrando direitos e políticas públicas, dando destaque às políticas sociais.

                   Nessa mesma linha de raciocínio, Vera Pereira de Andrade[8] afirma: Grupos e classes tornam-se cada vez mais protagonistas da ação social e política, indicando que os conflitos extrapolam sua dimensão interindividual para alcançar uma dimensão interclassista e intergrupal: o impasse entre o individual e o coletivo (social) inscreve-se no horizonte de possibilidade da cidadania.

                   Além do amparo da legislação, também é necessário que exista uma conscientização – adquirida por meio de uma educação ambiental – da importância de um meio ambiente equilibrado e de como protegê-lo. Segundo Leonardo Boff[9], “a educação ambiental é indispensável para erradicar um certo analfabetismo com os valores da natureza, afirmando: para cuidar do planeta precisamos todos passar por uma alfabetização ecológica e rever nossos hábitos de consumo. Importa desenvolver uma ética do cuidado”.                  

                   Ressalta-se a relevância da Lei de Educação Ambiental (lei n. 9.795/99), a qual nos traz a definição e a importância da educação ambiental.

Art. 1o Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.

Art. 2o A educação ambiental é um componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não formal.

Nalini[10] afirma que: “promover a educação ambiental é tarefa de todas as pessoas lúcidas, responsáveis e de boa vontade”. E complementa da seguinte forma: “O desafio é sensibilizar as consciências de seus atos”. Portanto, pode se perceber que torna-se vital a existência de uma legislação eficaz associada a uma conscientização acerca da gravidade dos impactos causados pelo tráfico de animais.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

   A temática será desenvolvida através da técnica de documentação indireta, envolvendo pesquisa bibliográfica e pesquisa documental. Como instrumento de coleta de dados será utilizado o estudo de caso. Realizaram-se buscas através do banco de indexação no SCIELO (Sientific Library Online), assim como decisões de tribunais nacionais sobre a questão.

Sobre os autores
Francisco Wellyson Uchôa Moura

Advogado na área criminal, especialista em Ciências Criminais.

Paulo Ricardo Carvalho Linhares

Graduando em direito na Faculdade Luciano Feijão- FLF.

Luis Carlos Oliveira Linhares

Graduando em direito na Faculdade Luciano Feijão- FLF.

João Paulo Barbosa de Freitas

Graduando em direito na Faculdade Luciano Feijão- FLF.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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