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Relação de trabalho e relação de emprego

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Agenda 25/01/2005 às 00:00

4.Um conceito em conclusão

Trato de um conceito na conclusão de um estudo sobre a relação de trabalho e a relação de emprego, conceito este que subjaz a todas as reflexões aqui tecidas, o conceito de trabalho. O trabalho poderia ainda ser conceituado nos dias de hoje, a partir de sua manifestação mais clara na relação de trabalho? Ou o trabalho já poderia ser conceituado, porque já não teria força dinâmica alguma e em sua estaticidade seria simplesmente retratável.

É a burguesia quem elege o trabalho em valor universal, antes dele o trabalho era um demérito, uma desonra, um fardo. Os nobres e ricos antigos e medievos não trabalhavam e orgulhavam-se disso, os trabalhadores, por sua vez, envergonhavam-se. A burguesia trabalhadora erige o trabalho em valor universal, porém se desfaz dos encargos do trabalho tão logo pode. A tomada do poder político pelos burgueses na Revolução Francesa talvez tenha como ânimo fundamental exatamente essa vontade de se desincumbir do trabalho.

Fora a ideologia burguesa – o que não é pouco! – o trabalhado sempre foi associado a algo desagradável, um castigo, uma fadiga, uma dor. Dizia Marx nos Manuscritos,

"O trabalhador só se sente consigo mesmo fora do trabalho, enquanto que no trabalho se sente fora de si. Ele está em casa quando não trabalha, quando trabalha não está em casa. Seu trabalho, por isso, não é voluntário, mas constrangido, é trabalho forçado. Por isso, não é a satisfação de uma necessidade, mas apenas um meio de satisfazer necessidades exteriores a ele mesmo. A estranheza do trabalho revela sua forma pura no fato de que, desde que não exista nenhuma coerção física ou outra qualquer, foge-se dele como se fosse uma peste" (1997: 227).

Se quiser fazer um homem feliz dê a ele uma folga. Todavia, o trabalho se associa de tal modo ao sustento e perpetuação da vida, que a vagabundagem não autorizada se torna um suicídio. Isto indica que a nota distintiva da relação de emprego, a subordinação, não lhe é exclusiva. De fato, o trabalho exige subordinação, o homem tem de se subordinar ao trabalho, não ao empregador, mas ao trabalho mesmo. É uma espécie de autodisciplina. É a obra do santo, como dizia Nietzsche, exercer com toda a potência a vontade de poder contra si mesmo.

Na entrada de Auschwitz, o famoso campo de concentração nazista da Segunda Guerra Mundial, lia-se: "somente o trabalho salva!". Esta frase poderia ser encontrada sobre a por de qualquer família de respeito hoje em dia. O trabalho se afirma com toda a força. Segundo o Manifesto contra o trabalho do grupo Krisis,

Um defunto domina a sociedade – o defunto do trabalho. Todos os poderes ao redor do globo uniram-se para a defesa deste domínio: o Papa e o Banco Mundial, Tony Blair e Jörg Haider, sindicatos e empresários, ecologistas alemães e socialistas franceses. Todos eles só conhecem um lema: trabalho, trabalho, trabalho! Os que ainda não desaprenderam a pensar reconhecem facilmente que esta postura é infundada. Pois a sociedade dominada pelo trabalho não passa por uma simples crise passageira, mas alcançou seu limite absoluto. A produção da riqueza desvincula-se cada vez mais, na seqüência da revolução microeletrônica, do uso da força de trabalho humano – numa escala que há poucas décadas só poderia ser imaginada como ficção científica. Ninguém poderá afirma seriamente que este processo pode ser freado ou, até mesmo, invertido. A venda da mercadoria força de trabalho será no século XXI tão promissora quanto a venda de carruagens de correio no século XX. Quem, nesta sociedade, não consegue vender sua força de trabalho é considerado "supéfluo" e está sendo jogado no aterro sanitário social (1999: 1).

A crise que motiva esse Manifesto deriva da constatação da obsolescência do trabalho tornado supérfluo.

Qual o conceito de trabalho que seria possível assim? E mais: seria este conceito sobre algo vivo, ou sobre um defunto, uma reminiscência, um resquício do passado? Se se toma a noção de Philip Lotmar de que o trabalho é "trabalho de alguém para outrem, que o remunera", vê-se que este é o trabalho que está deixando de existe.

Porém, há ainda um trabalho não forçado, vivo em sua espontaneidade e que talvez não possa ser objetiva em um conceito jurídico, apesar de muito mais concreto. Trata-se de um trabalho análogo à brincadeira da criança, sério, leve e divertido. Trabalho que tem a força do poeta e que não pode ser vendido. E por este trabalho os homens se relacionam com o mundo e entre si desde sempre e para sempre.


Referências bibliográficas

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RUSSOMANO, Mozart Victor. (1984). O empregador e o empregado no direito brasileiro. 7.ed. Rio de Janeiro: Forense.

SÜSSEKIND, Arnaldo, MARANHÃO, Délio, VIANNA, Segadas. (1993). Instituições de direito do trabalho. Vol. I. 14.ed. São Paulo: LTr.


Notas

1 É interessante a esse respeito uma suposição de Rousseau no Contrato social : "Suponho os homens terem chegado a um ponto em que os obstáculos que atentam à sua conservação no estado natural excedem, pela sua resistência, as forças que cada indivíduo pode empregar para manter-se nesse estado. Então este estado primitivo não pode subsistir, e o gênero humano pereceria se não mudasse de modo de ser".

2 Este sentido talvez possa ser extraído da dialética do senhor e do escravo que Hegel concebe na Fenomenologia do espírito, tendo, portanto, interferências notáveis na questão da liberdade. Para Hegel, o limite da liberdade do senhor é o trabalho do escravo, donde aquele retira sua subsistência. Assim, nem o senhor é totalmente livre, nem o escravo totalmente escravizado. A liberdade somente se efetivaria quando todos fossem igualmente livres. Porém, neste caso, quem trabalharia? Todos, diria Hegel, na medida em que a liberdade consiste em assumir sinteticamente algo de senhorio e algo de escravidão. É o que de certo modo se realiza no capitalismo: as posições do capitalista e do proletário se alternam numa mesma pessoa, em função da relação de trabalho que ela firme com outrem: uma mesma pessoa, um mesmo sujeito de direitos, é empregado numa relação e empregador em outra.

3 É relevante dizer que aqui minha posição se distancia da de Marx. Para o autor do Capital, haveria sim uma evolução dos modos de produção, e das relações de trabalho, que se baseava na necessidade da dialética da luta de classes. A palavra hegeliana para dialética, aufheben, dá a noção de uma evolução, na medida em que uma síntese, é a eliminação dos aspectos negativos e conservação dos aspectos positivos de suas posições contraditórias numa posição superior e mais evoluída. A estrutura do pensamento dialético hegeliano está no fundamento do pensamento de Marx. Chegava ele a dizer: "O livro que Darwin escreveu sobre a seleção natural encerra o fundamento biológico de minha teoria sobre a luta de classes na história". Donde se vê que o evolucionista inglês contribuiu para uma noção de evolução em Marx. A sociedade comunista é, para qualquer marxista, inclusive Marx, a mais evoluída das formas de sociedade.

4 Mais que isso, houve quem dissesse que "Existem, na espécie humana, seres tão inferiores a outros quanto o corpo o é em relação à alma, ou a besta em relação ao homem; são aqueles para os quais a utilização da força física é o melhor que deles se consegue. Segundo os nossos princípios, esses indivíduos são destinados, por natureza, à escravidão; pois, para eles, não há nada mais do que obedecer. Assim é o escravo por instinto" (Aristóteles, 2001: 18).

5 A expressão direito social é tautológica porque não há direito que não seja social. Todo direito pressupõe a sociedade, não há, nesse sentido, direito individual, que tenha validade e opere efeitos sobre um indivíduo isolado apenas.

6 A despeito do círculo vicioso, do dialelo, de que o legislador não soube fugir – O que é contrato individual de trabalho? É o acordo tácito ou expresso. Mas o que é o acordo tácito ou expresso? É o que corresponde à relação de emprego. Mas o que corresponde à relação de emprego? É o contrato. –, o elemento essencial da relação de emprego, que é o vínculo entre empregador e empregado, não é esquecido.

Sobre o autor
Thiago Mota Fontenele e Silva

bacharelando em Direito pela UFC e licenciando em Filosofia pela UECE

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Thiago Mota Fontenele. Relação de trabalho e relação de emprego. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 567, 25 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6215. Acesso em: 24 nov. 2024.

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