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Novos desafios da criogenia no Brasil

Agenda 03/12/2017 às 15:46

A criogenia vem sendo, aos poucos, utilizada por pessoas com esperança de um dia voltar a vida. Trata-se de congelamento do corpo, com um custo alto, para que futuramente e supostamente a pessoa congelada possa restaurar-se a vida.

Defendo, em minha concepção, que a criogenia não pode, juridicamente, considerar que a pessoa que se submeteu ao feito seja pessoa viva, fundamentando no artigo 6º do Código Civil, que aduz que “a existência da pessoa natural termina com a morte”.

A morte da pessoa natural pode ser, real ou presumida. A lei nº 9434/97 em seu artigo 2º, enuncia a tanatognose, ou seja, por meio deste processo que ficará constatado a morte da pessoa natural, ocasionando com a morte encefálica, melhor dizendo, a morte cerebral. Ainda discorro, que o cadáver não possui direitos e obrigações como pessoa natural, ficando a cargo dos familiares a preservação e defesa de sua dignidade e honra.

Assim diz, Washington de Barros Monteiro apud Joabson Carlos Pereira Silva,

até esse termo final inexorável, conserva o ente humano a personalidade adquirida ao nascer. Só com a morte perde tal apanágio. Os mortos não são mais pessoas. Não são mais sujeitos de direitos e obrigações. Não são mais ninguém. Mors omnia solvit. [1]

 

Tratando-se da possibilidade de sucesso e ocorrência da criogenia, questão nada fácil será dissertar sobre como ficará os direitos do ressuscitado em relação ao patrimônio para sua subsistência. Não posso estar de acordo com os argumentos levantados dos que apoiam uma prestação de alimentos para com o ressuscitado. A divisão da herança já se deu, e agora seria justo devolvê-la em forma de alimentos de uma pessoa que é considerada morta?

Devemos sempre levar em conta que as pessoas fazem compromisso, têm suas responsabilidades, sua vida pessoal, já fazem planos com os bens que lhe pertenciam na herança. Sejamos francos, na sociedade atualmente não é comum ouvirmos que tal pessoa ressuscitou e voltou a vida, o famoso, “morreu mas passa bem”. É uma questão polêmica que não é fácil denotar, mas como já é de praxe, no mundo jurídico ficamos a cargo de tratar de qualquer assunto. Minha concepção sobre esta questão, é no sentido que se uma pessoa decidir previamente em realizar este procedimento, deve-se planejar com antecedência, que tenha condições mínimas de discernimento para decidir por si mesmo. Com isso, a criação de um plano de capitalização seria o mais adequado para o caso. Os herdeiros não seriam afetados pois haveria reserva de capital para que o ressuscitado consiga a sua sobrevivência após este tempo.

Esta reserva de recurso pode se dar mediante o pagamento de uma mensalidade para o devido depósito com expressa e inequívoca finalidade ou destinando bens mediante testamento de acordo com os preceitos legais, sempre observando os direitos dos herdeiros necessários.

Evidente, que como este assunto ainda não é comum no nosso país e o avanço da sociedade se dá a cada dia, o legislador precisa avançar e definir através do devido processo legislativo como se realizará, quem será o administrador e a criação de mecanismos como realização de fiscalizações para evitar possíveis fraudes nesta capitalização de recursos. Seria interessante também, a fixação na lei de um prazo razoável para a descoberta da cura da doença em que se submete a pessoa, após o mesmo, os bens desta capitalização se converteriam em herança, sendo distribuídos aos herdeiros vivos à época do congelamento, em caso de falecimento de um deles, passariam aos seus respectivos herdeiros.

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A criogenia ao meu ver, não poderia ser escolhida por qualquer pessoa, há necessidade de imposição de limites para a sua realização, seja por incapacidade por idade ou discernimento. Por isso, àqueles que possuem capacidade civil plena, em regra, podem decidir sobre o procedimento, seguindo as regras gerais do Código Civil. Já os que necessitam de assistência, precisam de aprovação dos seus responsáveis e os absolutamente incapazes não estão sujeitos a tal procedimento. Logo, somente podem decidir sobre, os maiores de 16 anos.

A abertura da sucessão, deve ocorrer no momento de qualquer outra morte, em se tratando da criogenia, na data do congelamento, no qual se segue a regra do artigo 1784 do Código Civil, em que enuncia que “aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”. Isso faz com que os herdeiros recebem a herança de forma automática e a utilização plena dos bens herdados.

Por fim, para efetivar o que foi disposto, será necessária emissão de certidão de óbito, também para quem optar a realizar a criogenia, todavia, deve-se ter uma definição de que o falecido está sujeito à crio-preservação, deixando claro, que este tem direito a reserva patrimonial e não restando dúvidas aos parentes e aos futuros profissionais que trabalharão nesta técnica, facilitando a aplicação ao caso concreto da cura da doença da pessoa. Este direito à certidão para a pessoa que claramente optou por fazer a criogenia se encontra na lei n° 6015/73 em seu artigo 29, inciso III, garantindo a realização da certidão de óbito no cartório de registro civil de pessoas naturais, com registro no respectivo livro, segundo o seu artigo 33, inciso IV da mesma lei. Deve-se utilizar o que fomenta o disposto no artigo 4º da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro no que diz: “o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. Por isso aplica-se a criogenia o disposto no artigo 77, da lei n° 6015/73 com suas peculiaridades e a Constituição Federal, o seu artigo 5°, inciso LXXVI, alínea b, que garante ao pobre o direito a certidão de forma gratuita.

É um assunto que ainda não está consagrado no Brasil e que com o avanço ainda mais da sociedade, o legislador não terá outra escolha, a não ser, consagrar e definir as regras referentes a regulamentação da criogenia no país. Pacificando este tema, será melhor tratado pela sociedade e quem sabe, romper com o tradicional sepultamento que presenciamos atualmente.

 

Referência bibliográfica

 

SILVA, Joabson Carlos Pereira. Natureza jurídica do cadáver: sua conservação por meio da técnica da criogenia em face da manifestação de última vontade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3281, 25 jun. 2012. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/22073>. Acesso em: 22 set. 2017.

 

[1] MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, v. 1: parte geral. – 41. Ed.. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 78.

Sobre o autor
Matheus Pedrosa

Procure ser justo para se fazer justiça, já que a injustiça é uma das formas de acabar com a paz entre as pessoas.

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