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A exibição

Agenda 09/12/2019 às 15:55

Estuda-se o instituto processual da exibição a partir de suas origens no processo civil romano.

Podemos ter hipóteses de exibição cautelar e de exibição satisfativa.

No direito romano, fazia-se a distinção conceitual entre a exibição com finalidade probatória, indicando-a como actio ad exhibendum, cuja natureza era predominantemente cautelar, reservando-se a denominação actio de edendo - também exibitória - para os casos em que o demandado tivesse algum dever de exibir, resultante de uma norma de direito material.

Ensinou Moacyr Amaral Santos (Prova judiciária no cível e comercial, 2ª edição, 1954, volume IV, pág. 367) que o direito comum medieval, sem perceber tão radical diferença entre as duas espécies, confundiu-se numa única ação exibitória.

Ainda no direito romano, ensinou Max Kaser (Direito privado romano, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, pág. 462), dentre os expedientes específicos do pretor, tinha-se a interdita que poderia ser prohibitoria, restitutoria e exhibitoria.

Nos interditos restituitórios (e exibitórios) concedeu-se ao autor que ganhou no processo per sponsionem(com estipulações penais) um iudicium de re restituenda (exhibienda), para pedir a restituição ou exibição (G.e, 165). Mas o demandado que  podia solicitar um arbiter antes de se iniciar o processo per sponsionem. Tinha  então lugar o processo per formulam arbitrariam, na qual (de modo semelhante a vindicação) sem as estipulações penais se decidia sobre a procedência do interdito e sobre a restituição (ou exibição) num processo arbitral, único que, em regra, proporcionava ao autor a prestação in natura.

No direito romano clássico, na actio ad exhibendum, depois estendida a outras hipóteses (Glück, Comentario alle pandette, volume X, § 742), havia interesse na exibição de coisa móvel que o requerente "repute sua", como demanda preparatória da futura ação reivindicatória, segundo o modelo da exibitória do direito romano (D.10,4,I), ou da reivindicatória ou da ação de petição da herança (D.47, I, I, pr.). Para os romanos, estudando a extensão da exibitória, a actio ad exhibendum só abrangia as coisas móveis, dado que, para os imóveis, o remédio análogo era o interdictum quem fundum, com idêntica finalidade processual, como ensinou Windscheid (Diritto delle pandette, volume segundo, § 474). No direito de Justiniano, a exibitória estendeu-se aos credores hipotecários e pignoratícios; aos usufrutuários e aos próprios possuidores, quando despojados da posse, para o exercício do interdictum utrubi, como revelou Max Kaser (Direito privado romano, tradução da quinta edição alemã, § 27, 5, a), e ainda para as chamadas ações de depósito. Mas, nem só as pretensões de natureza real possibilitavam a actio ad exhibendum, mas, igualmente, as ações pessoais.

Realmente a actio ad exhibendum prende-se à estrutura da vindicatio, no período das legis actiones e mesmo depois, pois não se podia, na actio sacramentum in rem, aderir à litiscontestatio senão com a presença in iure da coisa reinvindicada, como ensinou M. Talamanca (Actio ad exhibendum, Novissimo Digesto italiano, 1º volume, pág. 255).

No direito romano, evidenciando-se que o demandado exercia a posse que ele negara exercer, através da ação exibitória, o magistrado retirava-lhe a coisa litigiosa, imitindo nela o autor (missio in possessionem). Neste caso, a actio ad exhibendum determinava a transferência da posse da coisa litigiosa.

No que concerne à actio ad edendo, a função probatória que a exibição desempenhava na actio ad exhibendum ou desaparecia, ou tornava-se secundária e meramente ocasional. O que o requerente pretendia com a exibição era simplesmente exercer seu direito a ver o documento, a que o mesmo estivesse ligado por uma relação de direito material. Nesse caso, a exibitória era empregada para atender (satisfazer) o direito à exibição do documento, não apenas para assegurar prova destinada a servir em outra demanda, como lembrou Ovídio Baptista (Curso de processo civil, volume III, 2ª edição, pág. 254).

Mas é necessário estabelecer uma distinção entre os casos de exibição preparatória e a exibição de coisa ou documento que se faça no curso de uma ação satisfativa, como a hipótese da exibição incidental.

Há a chamada distinção entre a asseguração da prova e a produção da prova.

Toda a exibição de coisa ou documento que se faça no curso de uma demanda satisfativa é exibição produtora de prova e não asseguradora de elementos de prova, colhidos para que o autor da ação cautelar de exibição a produza em processo subsequente.

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A exibição de coisa ou documento não é cautelar, mas procedimento probatório.

As exibições que sejam cautelares serão sempre antecedentes, nunca incidentes da demanda em curso, onde o requerente da ação pretenda produzir a prova.

A doutrina (com Sergio La China, L'esibizione delle prove nel processo civile, 1960) dispunha sobre os fundamentos da ação exibitória em duas teorias: a) teoria substancial, ou civilista da exibição; b) teoria processual em sentido publicístico.

A ação de exibição autônoma tem natureza satisfativa, que se identifica com a chamada teoria substancial, ou civilista, da exibição, segundo a qual somente está legitimado a ela para o pedido de exibição do documento quem alegue ser dele proprietário ou, pelo menos, tenha, no documento, um interesse comum, decorrente de alguma relação jurídica de direito material, como acontece com o pedido de exibição do documento formulado pelo sócio contra a sociedade, ou do herdeiro contra o inventariante.

Assim se o autor da ação exibitória alega que o documento lhe é próprio ou comum, sua pretensão ao vê-lo exibido pode ser a única pretensão acionável, ou seja, o ato de ver e examinar o documento que lhe pertence, faculdade inerente ao seu direito de propriedade. A exibição é satisfativa e principal sem qualquer relação com a preparatoriedade com outra ação.

Por outro lado, há a chamada teoria processual da exibição.

Essa teoria processual supõe ser possível fundar o dever de exibir, imposto aos terceiros, no mesmo sentido que legitima o dever de depor, de modo que as partes tivessem o direito de exigir de terceiros, estranhos ao litígio, fossem compelidos a exibir em juízo os próprios documentos, assim como eles seriam obrigados a prestar os próprios depoimentos. Haveria sobre o documento uma comunidade de uso. Aliás, Calamandrei, como explicou Ovídio Baptista (obra citada, pág. 261) já havia mostrado o poder que o juiz tem de ordenar, no interesse da justiça, a exibição do documento como prova.

Mas, a própria doutrina italiana, com Calamandrei, chegou à construção de um interesse comum sobre o documento, uma teoria intermediária, formado a partir dos conceitos de comunidade sobre o documento-coisa e comunidade sobre o conteúdo do documento, algo essencial para o processo, no que concerne à exibição documental.

Esta teoria intermediária, entre a substancial pura, que somente admite a exibição em favor do proprietário do documento, e a teoria puramente processual, segundo a qual todos teriam o dever de exibir seus documentos, para servirem de prova em favor de terceiros, abandona os dois extremos: o dever de exibir, segundo ela, não deve ficar condicionado apenas à idoneidade probatória que o documento possa ter a favor de qualquer litigante que lhe seja inteiramente estranho; por outro lado, nem só o seu proprietário ou titular de alguma relação de direito material sobre o documento terão legitimidade para pedir sua exibição. O direito a exigir a exibição do documento em juízo passa a ter por fundamento a existência de um interesse comum em seu conteúdo, como ensinou Sergio La China (obra citada, pág. 129).

Ainda Sergio La China (obra citada, pág. 135) traz o seguinte exemplo: determinada pessoa contrata um seguro sobre bens que pretende dar em garantia pignoratícia ou hipotecária, de quem deverá obter um empréstimo em dinheiro. E, para facilitar a obtenção do mútuo, escreve ao mutuante informando-lhe da existência do contrato de seguro e, declarando que os bens a serem dados em garantia estão abrangidos pela apólice. Se, na futura discussão com a companhia de seguros, ele negar a existência do contrato, poderá a seguradora exigir, em procedimento cautelar, a exibição da correspondência pertencente ao terceiro prestador do mútuo, tendo em vista o interesse comum, no conteúdo do documento, para dele valer-se como prova.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. A exibição. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 6004, 9 dez. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64289. Acesso em: 7 nov. 2024.

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