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Notas
[1] O presente artigo foi escrito a partir de trabalho desenvolvido em setembro de 2003, para conclusão da disciplina Teoria dos Direitos Fundamentais, ministrada pelo Professor Dr. Ricardo Lobo Torres, no mestrado em Direito Público da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
[2] Adiante tentaremos demostrar que a classificação do pensamento de John Ralws como “liberalista individualista” não seria totalmente adequada, e que, portanto, ela talvez se dirija aos liberais libertarianistas, como por exemplo Robert Nozick.
[3] V. Ricardo Almeida R. da Silva, “A crítica comunitarista ao liberalismo”, in Ricardo Lobo Torres (org.), Teoria dos Direitos Fundamentais, Rio de Janeiro, Renovar, 1999, p. 193-195.
[4] V. Francisco Ortega, Para uma Política da Amizade – Arendt, Derrida, Foucault, Rio de Janeiro, Relume Dumará, 2000, pp. 15-ss., onde se refere às obras de Danilo Zolo: “Segundo a concepção realista da democracia proposta por Zolo, os sistemas que denominamos democráticos seriam, no fundo, ‘sistemas autocráticos diferenciados e limitados’, ou seja, oligarquias liberais; a democracia constituiria simplesmente a alternância das elites oligárquicas [nos governos da sociedade estatal]. Baseando-se nas análises dos cientistas políticos Schumpeter e Sartori, Zolo constata como a manipulação da opinião pública dos cidadãos é uma parte fundamental do processo democrático, em que a propaganda política serviria como um instrumento que impede toda argumentação fundamentada, suscetível de despertar a capacidade crítica dos eleitores e seu desejo de autonomia: ‘A essência da democracia seria, portanto, a aplicação das liberdades políticas e civis para reprimir a autonomia dos cidadãos’. Os Comícios eleitorais constituem apenas um rito que assegura a integração social dos votantes e que, somente de forma marginal, influi nos conteúdos das decisões políticas. Nesse processo social, cria-se a ilusão de participação e de contribuição para o destino político de uma nação (...).” A democracia vista como “ficção de participação e de decisão” é “conditio sine qua non da existência do principado democrático, servindo de legitimação às elites oligárquicas em concorrência pelo poder político”.
[5] V. Ricardo Almeida R. da Silva, op.cit., p. 194, onde o autor menciona diversos grupos de comunitaristas: a) o dos liberais comunitaristas, com Bruce Ackerman, Michael Walzer, Charles Taylor, Thomas A. Spragens, Cass Sustein, Amy Gutmann e Philip Selzinick, dentre outros; b) o dos comunitaristas autônomos, com Amitai Etizioni e Robert Bellah; c) o dos neorrepublicanos, com Michael Sandel, Michael Warner e J.G.A. Pocock; d) os dos tradicionalistas (ou conservadores), com Robert Nisbet, Michael OakShott, Alasdair MacIntyre, Eric Volgelim e Leo Strauss. Este último grupo, então, já não integrava o “movimento”, tendo inclusive Alasdair MacIntyre reconhecido não ser um “comunitarista”, em seu artigo “The Virtues, the Unity of a Human Life, and the Concept of the Good”, in Michael Sandel (org.), Liberalism and its Critics. New York, New York University Press, 1984.
[6] V. Ricardo Almeida R. da Silva, op. cit., p. 195.
[7] Cf. Ricardo Lobo Torres, “A Teoria da Justiça de Rawls e o pensamento de esquerda”, Revista Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, n.5, Renovar, 1997, p. 158, quando surgiu na década de 1971, a obra de John Rawls rompeu com o debate centenário sobre se “a norma emana ou dos fatos sociais ou de uma outra norma que lhe constitui a condição de validade”, e trouxe novamente para o debate político uma série de questões, em uma mudança de paradigmas da filosofia política, que ficou conhecida como a “virada kantiana”: “o direito volta a se comunicar com a ética no plano teórico, o Estado se funda na idéia de contrato, a liberdade se torna absolutamente prioritária e a justiça encontra no imperativo categórico o seu ponto de apoio”.
[8] V. ainda Robert Fowler, “Community – reflections on definition”, in Amitai Etzioni (org.), New communitarian thinking – persons, virtues, institutions and communities, Charlottesville/London, University Press of Virginia, 1995, pp. 93-95; Michael Walzer, “The communitarian critique of liberalism”, in Amitai Etzioni (org.), op. cit., pp. 54, 59-63.
[9] Cf. Thomas A. Spragens, “Communitarian Liberalism”, in Amitai Etzioni (org.), op. cit., pp. 37-38, a visão “típica e idealizada” do comunitarismo é a de que ele seria “substitutivo” do liberalismo, tentando fundar um novo tipo de sociedade. Existem, todavia, vertentes doutrinárias (nas quais se insere o Professor Spragens) que se consideram apenas “corretivas” do liberalismo individualista (em suas distorções), não sendo incompatíveis com os ideais liberais originais, cf. se verá adiante.
[10] Idem, ibidem, pp. 37-38.
[11] Idem, ibidem, p. 38. Os comunitaristas, todavia, tomam cuidado em defender o estímulo à cooperação, e não a imposição de cooperação, como veremos adiante, uma vez que também respeitam e reconhecem os direitos e liberdades individuais, bem como o princípio da dignidade da pessoa humana.
[12] Cf. Amitai Etizioni, “Old Chestnuts, new Spurs Communitarian Liberalism”, in Amitai Etzioni (org.), New communitarian thinking – persons, virtues, institutions and communities, Charlottesville/London, University Press of Virginia, 1995, pp. 19-20, Locke, Adam Smith e outros liberais clássicos deram ênfase ao individualismo pois naquela época a “comunidade” era mais poderosa, o interesse individual era sobrepujado, em prol dos interesses do Estado ou dos interesses públicos; por isso é que lutavam por direitos individuais como os de expressão, religião e proteção à propriedade privada. A sociedade americana de início deu ênfase ao individualismo pois seus fundadores fugiram de sociedades que impunham muitos encargos sobre os indivíduos, principalmente nas esferas individuais mencionadas. V. ainda, p. 16, que os tratados liberais não só previam direitos individuais, como pressupunham fundação comunitária
[13] Cf. Thomas A. Spragens, op. cit., pp. 38-39.
[14] Idem, ibidem, pp. 39-40.
[15] Idem, ibidem, p. 40.
[16] Idem, ibidem, pp. 40-41.
[17] Idem, ibidem, p. 41.
[18] Idem, ibidem, pp. 41-42.
[19] V. Marilena Chauí, “Vida e Obra de Kant”, no volume “Os pensadores”, São Paulo, Nova Cultural, 2000, p. 05. Kant também seria influenciado por Rousseau, tomando a sua teoria da “autolegislação” (de cada cidadão na sociedade) e desenvolvendo uma teoria da autonomia da vontade livre, racional e moral de cada um como geradora das “leis internas” do “agir universal” em sociedade.
[20] V. Thomas Spragens, op. cit., pp. 42-43.
[21] Cf. Thomas Spragens, op. cit., p. 43, o indivíduo em Locke, Mill, Adam Smith e Condorcet gozava sua liberdade dentro de um contexto de obrigações e responsabilidades complementares, derivadas dos laços comunais, dos limites de uma ordem moral válida e da força da compreensão humana. Para Condorcet e Adam Smith, a economia era orientada para o mercado, o que gerava maior igualdade social e econômica. A riqueza teria natural tendência para igualdade; qualquer desproporção excessiva não poderia existir ou desapareceria rapidamente se as leis civis não dispusessem de meios artificiais de perpetuar e unir fortunas, bem como se não restringissem artificialmente o comércio em outras questões.
[22] Cf. Aurélio Buarque de Holanda, Dicionário da Língua Portuguesa, Nova Fronteira, 2001, agnosticismo: 1. segundo Thomas Henry Huxley (1825-1895), naturalista inglês, posição metodológica que só admite os conhecimentos adquiridos pela razão e evita qualquer conclusão não demonstrada. 2. atitude que considera inúteis as discussões sobre questões metafísicas, já que estas tratam de realidades incognoscíveis.
[23] Cf. Thomas Spragens, op.cit., p. 43.
[24] Idem, ibidem, p. 44.
[25] Idem, ibidem, p. 44.
[26] Bruce Ackerman também foi classificado na vertente “liberal comunitarista” (nota 2). Além disso, devemos levar em conta a notícia de que o constitucionalista se filiou ao “Republicanismo”, cf. Ricardo Lobo Torres, “A Teoria da Justiça de Rawls e o pensamento de esquerda”, Revista Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, n.5, Renovar, 1997, p. 160. Isso demonstra que essas classificações não são rígidas.
Cf. Ricardo Lobo Torres, op. cit., p. 158, a obra de Rawls foi classificada de inúmeras formas: liberal contratualista, liberal individualista, neoliberal, liberal social, antiutilitarista e até neoutilitarista.
[27] V. Thomas Spragens, op.cit., pp. 44. O Professor faz referência ao “princípio da diferença”, que integra a segunda parte do segundo princípio de justiça proposto por Rawls.
Cf. John Rawls, Liberalismo Político, 2.ed.bras., São Paulo, Ática, 2000, pp. 47-49, deve haver dois “princípios de justiça” a informar a estrutura básica de uma sociedade democrática e o funcionamento de suas instituições livres: 1º) todas as pessoas têm igual direito a um projeto inteiramente satisfatório de direitos e liberdades básicas iguais para todos, projeto este compatível com todos os demais; e, nesse projeto, as liberdades políticas, e somente estas, deverão ter seu valor equitativo garantido. 2º) as desigualdades sociais e econômicas devem satisfazer a dois requisitos: primeiro, devem estar vinculadas a posições e cargos abertos a todos, em condições de igualdade equitativa de oportunidades; e, segundo, devem representar o maior benefício possível aos membros menos privilegiados da sociedade.
Cf. Bruce Ackerman, Social Justice in the Liberal State, New Haven, Yale University Press, 1980, pp. 269-271, o princípio da diferença proposto por Ralws é temerário, pois isso excluiria pessoas de outras classes (médias, por exemplo) de terem um tratamento especial que fosse devido (por ex. os negros de classe média também são prejudicados pela estrutura social); poderia ainda possibilitar que inúmeros grupos sociais reivindicassem a condição de “menos favorecidos”. Para Ackerman, o estadista liberal, ao invés de fazer uma “precisa hierarquia de degradação”, procurará soluções que reconheçam que todos os grupos têm pleitos válidos a assistência especial, induzindo-os a reconhecerem que seus pleitos estão conectados por uma forma de diálogo comum. Não acreditamos, todavia, que o pensamento de Rawls mereça tais críticas ou que não possa ser utilizado para obter o diálogo proposto por Ackerman, pois que o autor de Teoria da Justiça também reconhece o pluralismo social, especialmente quando da discussão sobre o “consenso sobreposto” sobre os valores que devem orientar as instituições básicas da sociedade, cf. veremos adiante.
[28] Idem, ibidem, p. 44. A referência é feita aos dois pensadores.
[29] Bruce Ackerman, Social Justice in the Liberal State, New Haven, Yale University Press, 1980, passim, desenvolve uma teoria política baseada no discurso dialógico (“Constrained power talk”), necessária para se discutir a posse e o uso do poder numa sociedade onde os bens são escassos. Após refutar o argumento utilitarista, traça alguns princípios do discurso: 1o) Princípio da Racionalidade: sempre que alguém questiona a legitimidade do poder de outrem, este deve responder não tentando eliminá-lo do discurso, mas dando uma razão pela qual ele tem direito ao bem questionado. Pressupõe o teste de conceivability – para ser aceito como razão, uma justificativa não pode ignorar a possibilidade de o poder ser exercido de forma ilegítima (sem justificação); 2o) Princípio da Consistência – a razão oferecida pelo detentor do bem/poder em uma ocasião não pode ser incoerente com a razões dadas para justificar seus outros bens/poderes; 3o) Princípio da Neutralidade – nenhuma razão é boa se exige do detentor do bem/poder afirmar que: a) sua concepção do bem é melhor do que a de seus concidadãos; b) a par de sua concepção do bem, ele é intrinsicamente superior a um ou mais de seus concidadãos. A consequência desses princípios é uma igualdade inicial na distribuição de bens sociais, já que cada cidadão é tão bom quanto o outro. A distribuição de bens sociais, por sua vez, obedece a algumas regras racionais: a) Harmonia – os bens a serem distribuídos não podem exceder os disponíveis; b) Completude – as regras de distribuição devem permitir que se saiba o que exatamente caberá a cada cidadão; c) Diferenciação – qualquer distribuição desigual de bens deve ser justificada em uma especial característica atribuível à pessoa/classe favorecida, que a diferencia das demais e justifica o tratamento desigual; d) Compreensividade - uma regra diferente de distribuição de bens só pode ser aceita quando tiver mérito com relação a todas as demais regras propostas para distribuição de bens. Os princípios de uma sociedade liberal deveriam ser respeitados na esfera pública não só no que tange a distribuição dos recursos escassos da sociedade, mas principalmente nos assuntos cruciais da vida humana, como a cidadania, o nascimento, o controle de natalidade, a diversidade genética, o acesso a recursos materiais, a família, a educação de primeiro e segundo graus, o mercado livre, o regime de propriedade, de herança e sucessões, os recursos não-renováveis, a ação afirmativa.
Cf. Ricardo A. Ribeiro da Silva, op.cit., p. 222-223, a teoria de Ackerman pressupõe o diálogo pluralista, e se opõe à concepção dos direitos como decorrentes de um estado de natureza (os direitos não nascem em árvores) ou de um contrato social (não se “escolhe” contratar ou não), os direitos são antes de tudo decorrentes de reivindicações em um meio (a sociedade) onde os recursos e os bens sociais são escassos. Daí vem a importância de que todas as pessoas (ou grupos) tenham a mesma oportunidade de reivindicar parcelas de bens ou recursos em seu benefício. O justo título na distribuição e/ou aquisição dos bens será resultante da ponderação com os valores, com a cultura e a história da comunidade onde se dá a distribuição. O justo título poderá ser corrigido, após ampla ponderação e diálogo, em direção ao bem-estar social detectado no indivíduo. Todavia, a teoria de Ackerman está fundada na autonomia individual como direcionadora da interação com os demais indivíduos, deixando em segundo plano a fundamentação nos valores compartilhados pela comunidade.
De fato, Bruce Ackerman, op.cit., p. 368, afirma que na medida em que é moralmente melhor respeitar a autonomia moral de cada um do que forçá-lo a atingir alguma concepção do bem, deve-se ter um compromisso com a neutralidade. Não é necessário que a autonomia seja o único bem, a ela basta que seja o maior de todos os bens. À p. 369, diz que o Estado liberal tem quatro “vias principais”: realismo sobre a corrosividade do poder; reconhecimento da dúvida como passo necessário ao conhecimento moral; respeito pela autonomia das pessoas; ceticismo com relação à realidade de sentido transcendental.
[30] Cf. Thomas Spragens, op.cit., pp. 44-45. Veremos que Rawls traça o conceito de “consenso sobreposto” para tentar superar este impasse.
[31] A referência parece invocar o conceito rawlsiano de “sociedade bem ordenada”, que veremos adiante.
[32] Cf. Thomas Spragens, op.cit., pp. 45-46.
[33] Idem, ibidem, pp. 46-47.
[34] Cf. Ricardo Lobo Torres, “A cidadania multidimensional na era dos direitos”, in “Teoria dos direitos fundamentais”, org. pelo autor, p. 241, “a noção de fraternidade (...) perdeu o vigor durante os oitocentos. Só no séc. XX é que volta a integrar a equação valorativa dos direitos fundamentais e da justiça, agora sob a expressão da solidariedade. Da mesma forma que a igualdade, a solidariedade é um princípio vazio, pois não traz conteúdos materiais específicos, podendo ser visualizada ao mesmo tempo como valor ético e jurídico, absolutamente abstrato, e como princípio positivado nas Constituições. É sobretudo uma obrigação moral ou um dever jurídico. Mas, em virtude da correspectividade entre deveres e direitos, informa e vincula a liberdade, a justiça e a igualdade. Sendo conceito extremamente complexo, porque vazio, a solidariedade encontra adequada fundamentação através do estudo sobre a cidadania.
[35] Cf. Thomas Spragens, op.cit., p. 47.
[36] À p. 48, o professor Spragens, op. cit., admite que toma emprestado o termo cunhado por Rawls. Fala ainda que em sua concepção tais “valores centrais” seriam simples e “não-contenciosos”, abrangendo alguns dos valores que aprendemos no jardim de infância.
[37] Cf. Thomas Spragens, op.cit., p. 49-50, “Libertarians would seem for all practical purposes content to have citizens be strangers as long as they are free. And egalitarians tend either to ignore the conditions of civic friendship or to conceive them in very abstract and implausible ways. Moreover, they have in recent years often championed in the name of diversity policies and ideals that, whatever their putative virtues, threaten to deepen social divisions. Communitarians can recognize that pluralism is both a fact of life and - as a derivative of autonomy and authenticity - a valid norm. But they also are aware that societies devoid of moral consensus or a sense of common purpose have numerous difficulties governing themselves, and they recognize that achieving the necessary minima in these respects cannot be taken for granted except in the most homogeneous and compact polities.”
[38] Cf. Thomas Spragens, op.cit., pp. 48, 49-50. As ideias expostas nesse parágrafo não diferem muito das de Rawls, cf. veremos adiante.
[39] Cf. Thomas Spragens, op.cit., p. 49, “Libertarian liberals have characteristically focused on the market as the central institution of their ideal society, understandably so because markets are constituted by the consensual transactions of self-interested individuals that libertarians see as the essence of legitimate social interaction. Egalitarians, on the other hand, have for equally understandable reasons concentrated on the welfare state as the engine of social equality. Without denigrating for a moment the importance of state and market, communitarian liberals insist upon the crucial role of local communities, families, neighborhoods, churches, educational institutions, and civic associations in creating a productive environment for human development and happiness. Good social policies, therefore, should seek to bolster the health of these civic institutions. Strong markets and strong governments can crowd out or undermine the role of these institutions, and a wise liberal society would take steps to mitigate this tendency. lndeed, it is the serious decline in familial and educational institutions during the past couple of decades in this country that more than anything has provided the impetus for communitarian ideas.”
[40] Rogers M. Smith, “Citizenship and National Service”, in Amitai Etzioni (org.), op.cit., p. 257, propõe diversos programas de Serviço Social Nacional, de forma a enriquecer o conhecimento cívico aproveitando os talentos/capacidades de seus participantes em novos contextos e formas sociais, estimulando atividades/serviços em que haja a integração entre diferentes setores, grupos e comunidades tradicionalmente apartados na sociedade. A proposta é claramente inclusiva e pluralista, tendente a promover a apreciação das variadas comunidades que compõem a sociedade norte-americana, bem como a construção de uma “identidade cívica” nacional
[41] Cf. Thomas Spragens, op.cit., p. 50, “(...) this is one reason that communitarians tend to like the idea of a national service program, for example. They will seek to promote institutions, such as the public schools, that bring people from different backgrounds together in common endeavor. And they will champion a public rhetoric of common identity and inclusiveness.”
[42] Cf. Thomas Spragens, op.cit., p. 59, os comunitaristas têm a mesma preocupação de Tocqueville de que a dinâmica da democracia liberal possa levar ao excesso de privatismo e ao esquecimento da esfera pública e do espírito público.
[43] Idem, ibidem, pp. 50-51. A respeito dos programas de serviço social, Rogers M. Smith, op.cit., p. 250, faz inúmeros questionamentos para orientar a direção dos programas: a) Se deveria ser uma opção voluntária para os cidadãos que sempre tem direitos a escolher seus compromissos, ou se seria uma obrigação jurídica fundada em suas identidades cívicas; b) se os programas nacionais deveriam exibir integração étnica, racial, religiosa e econômica em todos os níveis, ou se seria mais eficaz e justo encaminhar as pessoas para servirem em suas próprias comunidades de origem; c) se o serviço social nacional deveria apenas assistir as várias comunidades em suas formas correntes, ou se deveria também procurar alterá-las ou orientá-las em direções mais democráticas e inclusivas. À p. 236, o Professor reconhece que as propostas de um serviço nacional voluntário e compensado (mediante algum tipo de remuneração) sem dúvida encontram muito mais apoio do que as propostas fundadas na imposição, na obrigatoriedade.
[44] Cf. Thomas Spragens, op.cit., p. 51.
[45] V. Robert Booth Fowler, “Community – reflections on definition”, in Amitai Etzioni (org.), New communitarian thinking – persons, virtues, institutions and communities, Charlottesville/London, University Press of Virginia, 1995, p. 88.
[46] Idem, ibidem, pp. 88-89.
[47] Idem, ibidem, p. 89. Vide ainda Michael Walzer, “The communitarian critique of liberalism”, in Amitai Etzioni (org.), New communitarian thinking – persons, virtues, institutions and communities, Charlottesville/London, University Press of Virginia, 1995, pp. 67-68, onde fala do renascimento do republicanismo nos EUA, dizendo que se trata de um movimento predominantemente acadêmico, uma vez que dentre as comunidades que integram a sociedade civil raramente se veem associações tipicamente republicanas. O republicanismo seria uma doutrina integrada e unitária voltada primordialmente para a esfera política. Seria, portanto, uma doutrina adaptada às necessidades de comunidades pequenas e homogêneas, nas quais a sociedade civil é radicalmente indiferenciada. Sustenta que a doutrina republicana deve ser “estendida”, para a formação na sociedade de uma “república de repúblicas”, em uma revisão descentralizada e participativa da democracia liberal. Um fortalecimento de governos locais poderia ser promovido, de forma a encorajar o desenvolvimento das virtudes cívicas em um contexto pluralista.
[48] Idem, ibidem, pp. 89-90.
[49] Idem, ibidem, pp. 90.
[50] Idem, ibidem, pp. 91-92.
[51] Idem, ibidem, pp. 93-95.
[52] Cf. Michael Walzer, “The communitarian critique of liberalism”, in Amitai Etzioni (org.), New communitarian thinking – persons, virtues, institutions and communities, Charlottesville/London, University Press of Virginia, 1995, pp. 54-55.
[53] Cf. Catherine Audard, glossário in John Rawls, Justiça e Democracia, São Paulo, Martins Fontes, 2000, p. 380, a posição original é um procedimento figurativo que permite representar os interesses de cada um de maneira tão equitativa que as decisões daí decorrentes serão elas próprias equitativas. Rawls posteriormente modificou esse procedimento, diferenciando entre interesses racionais (de cada um na concepção e busca de seu próprio bem) e razoáveis (resultantes da interação com os interesses dos outros), estando estes últimos ligados ao senso de justiça, bem como a noções de reciprocidade e cooperação. O razoável passa a condicionar o racional, tendo em vista a prioridade do justo sobre o bem. Na posição original, os indivíduos se encontram sob um véu de ignorância, que lhes impede saber de suas capacidades e talentos pessoais, mas lhes permite ter um conhecimento geral sobre os fatos da vida humana e sobre as conclusões da ciência que não sejam controversas.
[54] Cf. Michael Walzer, op.cit, pp. 56-57.
[55] Idem, ibidem, pp. 58-59. À p. 60, todavia, o autor reconhece que ainda hoje a melhor previsão de como as pessoas votarão nas eleições se dá pela informação de como seus pais votaram, e isso é verdade inclusive se os pais são votantes independentes, nesse caso, os filhos também estarão inclinados à tal postura.
[56] Idem, ibidem, pp. 59-62. V. ainda à p. 63: “O liberalismo é distinguido menos pela liberdade de cada um de formar grupos com base em certas identidades, como as sociais, étnicas, religiosas, do que pela liberdade de deixar esses grupos e até mesmo essas identidades para trás.”
[57] Cf. Ricardo Lobo Torres, “A teoria da Justiça de Rawls e o pensamento de esquerda”, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, n.5, 1997, Renovar, pp. 161-164, em sua obra “As esferas da justiça” (1983), Walzer elabora um regime de “igualdade complexa” na distribuição dos bens sociais em suas respectivas esferas, elaborado de forma a impedir o uso tirânico de bens para favorecer o seu detentor (ou prejudicar outros indivíduos) em outras esferas. Walzer diminui a importância do Estado, que passa a controlar os monopólios e reprimir novas formas de dominação. Elabora, com isso, uma espécie de socialdemocracia descentralizada. As próprias comunidades estabeleceriam os critérios para distribuição dos bens: o poder local, o mercado, o serviço civil aberto, a escola pública independente, a partilha do trabalho árduo e do tempo livre, a proteção da vida religiosa e familiar, o controle dos trabalhadores sobre as companhias, a política de partidos, os movimentos e debates públicos. Com relação ao poder político, deve haver uma distribuição das chances de exercê-lo, sendo cada cidadão um participante político potencial. Os bens sociais devem ser distribuídos por diferentes razões e segundo vários procedimentos e diversos agentes, as diferenças devem resultar das distintas compreensões dos próprios bens sociais (análise particularista, histórica e cultural). Como princípios de distribuição elenca: merecimento, qualificação, nascimento, amizade, necessidade, livre intercâmbio, a lealdade política e a decisão democrática. É o significado social dos bens que justifica sua distribuição. A distribuição deve ser autônoma, procedendo-se de dentro de cada esfera segundo critérios específicos. Bens sociais como saúde e segurança devem estar na esfera pública e ser providos. A proposta de Walzer foi criticada, sendo chamada de formalista, relativista e utópica, pois o papel conferido ao Estado, como um mero árbitro da obediência - de todos - aos limites de cada esfera da justiça não seria capaz de assegurar por si só uma distribuição justa dos bens sociais. Para uns inclusive se tratava de uma nova teoria do Estado mínimo. Walzer posteriormente reformulou alguns de seus conceitos, e reconheceu ter “superestimado a justiça do sistema de distribuição e subestimado o Estado enquanto agente da justiça distributiva”; passa a adotar uma posição mais coerente com seus postulados sociais-democratas. Mas a intervenção direta do Estado não é necessária, cabendo-lhe em muitos casos apenas financiar e facilitar o trabalho das associações beneficentes (Igreja, sindicatos, cooperativas, associações de vizinhança, grupos de interesses).
[58] Adiante veremos o conceito de sociedade bem ordenada de Rawls.
[59] Idem, ibidem, pp. 63-64. A referência ao conceito de “consenso sobreposto” de Rawls, é clara, cf. veremos.
[60] Idem, ibidem, pp. 65-66, 68.
[61] Para uma visão ampla da cidadania, v. Ricardo Lobo Torres, “A cidadania multidimensional na era dos direitos”, in Teoria dos Direitos Fundamentais (org. pelo autor), Rio de Janeiro, Renovar, 1999, pp. 239-324, na quais defende que a cidadania abrange as dimensões temporal (direitos civis, políticos, sociais e econômicos, direitos difusos), espacial (cidadania local, nacional, mundial, comunitária/européia e virtual), bilateral (que prevê a existência de deveres e de direitos de cidadania, ainda que em relação assimétrica) e processual (que abrange participação ativa nos assuntos políticos, nos processos administrativos, legislativos e judiciais, de acordo com a Constituição e as leis).
[62] Cf. John Rawls, “A idéia de um consenso por justaposição” (1987), in Justiça e Democracia, São Paulo, Martins Fontes, 2000, p. 272.
[63] Idem, ibidem, pp. 274-275
[64] Idem, ibidem, p. 275. A respeito da eliminação da pauta política dos pontos inconciliáveis entre diferentes concepções sobre a vida boa, David Hollenbach, “Virtue, the common good and Democracy”, in Amitai Etzioni, (org.), op.cit., p. 145, alerta que, se por um lado essa postura visa a evitar conflitos e a promover a harmonia social, por outro pode ameaçar a democracia ao estimular a alienação e a anomia. Entende, p. 147, que Rawls teme uma teoria compreensiva da vida boa na esfera pública em face da imagem de tal esfera com o domínio exercido pelo poder coercitivo do Estado.
[65] Cf. John Rawls, “A idéia de um consenso por justaposição”, (1987), op.cit., p. 275.
[66] Idem, ibidem, p. 276.
[67] Cf. John Rawls, Liberalismo Político, 2.ed. bras., São Paulo, Ática, 2000, pp. 47-49. Às pp. 345 e 352, Rawls enumera as liberdades fundamentais dos cidadãos: a liberdade de pensamento e de consciência; as liberdades políticas e a liberdade de associação, as liberdades especificadas pela liberdade e integridade da pessoa; e os demais direitos e liberdades abarcados pelo império da lei, inclusive o direito de propriedade e a liberdade contratual.
[68] John Rawls, Liberalismo político, cit., p. 49. V. ainda John Rawls, “A prioridade do justo sobre as concepções do bem” (1988), in Justiça e Democracia, São Paulo, Martins Fontes, 2000, p. 302, em que a lista básica de bens primários citada por Rawls abrange, além dos direitos e liberdades básicos, a liberdade de circulação e de escolha da ocupação, os poderes e as prerrogativas pertinentes de certos empregos e posições de responsabilidade nas instituições políticas e econômicas da estrutura básica; as rendas e a riqueza; as bases sociais do respeito próprio.
[69] Cf. John Rawls, Liberalismo político, pp. 51, 56, 57 e 58.
[70] Idem, ibidem, p. 355.
[71] V. Amitai Etizioni, “Old Chestnuts, new Spurs Communitarian Liberalism”, in Amitai Etzioni (org.), New communitarian thinking – persons, virtues, institutions and communities, Charlottesville/London, University Press of Virginia, 1995, p. 16. Concordamos com o professor, por entendermos que o indivíduo construído modernamente como “ser” pensante, autônomo, racional, moral, controlador de suas paixões em prol do bem comum, não se trata de uma definição do que o homem é em qualquer caso, mas a definição de um projeto de ser humano desejável, que todavia depende da existência de determinadas condições de desenvolvimento e sociabilidade no meio em que cada pessoa nasce, cresce e se desenvolve. O “homem moderno”, guardadas as devidas correções teóricas contemporâneas, trata-se no máximo de algo que pode vir a ser. Adiante falaremos um pouco mais sobre o assunto.
[72] Idem, ibidem, pp. 16-17.
[73] Idem, ibidem, p. 17.
[74] Idem, ibidem, p. 17.
[75] Idem, ibidem, p. 17. Nesse ponto fica clara a remissão aos direitos humanos, que serão discutidos adiante.
[76] Idem, ibidem, pp. 17-18.
[77] Idem, ibidem, p. 18.
[78] Idem, ibidem, pp. 18-19. De se lembrar que Michael Walzer, “The communitariam critique of liberalism”, in Amitai Etzioni (org.), “New Communitarian Thinking...” (op. cit.), p. 70, reconhece que a crítica comunitarista do liberalismo tende a ressurgir de tempos em tempos, em sociedades liberais como a norte-americana, sempre que as suas tendências dissociativas superarem excessivamente as tendências associativas dos indivíduos, na sociedade. À p. 54, reconhece nos escritos de Marx dos anos 1840 uma das primeiras críticas comunitaristas ao liberalismo na História.
[79] Idem, ibidem, p. 19. V. ainda o artigo de Putnam, “Bowling Alone: America’s Declining Social Capital”, Journal of Democracy, vol.6, n.1., Baltimore, John Hopkins University Press, 1995. Nele Putnam analisa o declínio, na sociedade norte-americana das últimas décadas do séc. XX, do “capital social”, isto é, aquelas características de uma dada organização social, como a participação em entidades civis, a existência de normas e redes de cooperação social e confiança mútua, essenciais para o bem-estar social.
[80] Cf. Amitai Etzioni, op.cit., p. 19.
[81] Idem, ibidem, p. 19
[82] V. a esse respeito, Ricardo Almeida R. da Silva, op. cit., p. 205.
[83] V. Aristóteles, Ética a Nicômacos, Brasília, UnB, 1992, p. 95: “(...) E já que o igual é o meio termo, o justo será um meio termo. Ora: a igualdade pressupõe no mínimo dois elementos; o justo, então, deve ser um meio termo, igual e relativo (por exemplo, justo para certas pessoas), e na qualidade de meio termo ele deve estar entre determinados extremos (respectivamente ‘maior’ e ‘menor’); na qualidade de igual ele pressupõe duas participações iguais; na qualidade de justo ele o é para certas pessoas. (...) O justo, então, é uma das espécies do gênero ‘proporcional’ (a proporcionalidade não é uma propriedade apenas das quantidades numéricas, e sim da quantidade em geral).” Nessa época, todavia, as considerações de proporcionalidade na distribuição dos cargos de governo, de dinheiro ou de outras coisas permitidas pela constituição da cidade, estavam inseridas em um sistema que excluía da cidadania (enquanto participação na esfera pública/política) inúmeros grupos sociais, como o dos escravos, o dos estrangeiros e o das mulheres, que dessa forma tinham um “tratamento proporcional” (isto é, diferenciado/desigual), conforme à posição social (decorrente da visão preconceituosa) que ocupavam.
[84] Cf. Etzioni, op. cit., p. 20, início, p. 19, in fine. Às pp. 20 e 21, o autor, a título de exemplo, fala que o direito de ser julgado por seus pares só se torna viável se houver o dever de servir como jurado. Lembra que muitas vezes o indivíduo quer se beneficiar de serviços e instituições sociais e/ou comunitários mas não quer contribuir para eles, como nos casos do pagamento de impostos ou da prestação de serviços sociais voluntários. Essa exigência só de direitos e não de responsabilidades (especialmente na organização quotidiana das comunidades que integram – e/ou extrapolam - uma sociedade estatal) seria “moralmente indefensável” sempre que os dois elementos fossem interdependentes, caso em que o não respeito das responsabilidades inviabilizaria o funcionamento dos serviços e instituições que são essenciais para o respeito aos direitos.
[85] Idem, ibidem, p. 21. O autor exemplifica (mas sem tomar partido), falando da hipótese de os motoristas de ônibus escolares serem submetidos a exames para detectar o consumo de substâncias ilícitas.
[86] Idem, ibidem, p. 22.
[87] Idem, ibidem, pp. 22-23.
[88] Idem, ibidem, pp. 24-25.
[89] Idem, ibidem, p. 25.
[90] Idem, ibidem, p. 25.
[91] Idem, ibidem, p. 25.
[92] Idem, ibidem, p. 26.
[93] Idem, ibidem, p. 27.
[94] Idem, ibidem, p. 28.
[95] Idem, ibidem, pp. 29-30.
[96] Idem, ibidem, p. 33.
[97] Idem, ibidem, p. 34.
[98] Idem, ibidem, p. 34.
[99] Ressalte-se que a utilização do termo “comunidade” no presente estudo não apresenta o mesmo significado que o termo assume para Rawls, pois para este, seria uma determinada “sociedade governada por uma doutrina religiosa, filosófica ou moral abrangente e compartilhada.” V. Rawls, Liberalismo político, pp. 84-86.
[100] David Hollenbach, op. cit., pp. 150-153, fala da virtude da “solidariedade expandida”, que se divide nas áreas intelectual, religiosa, artística e social. Ela pressupõe que as partes pertencentes a diferentes grupos e comunidades estejam dispostas a levar a sério os outros grupos e pessoas, de forma a viabilizar um diálogo sobre como o mundo interdependente (tecnologicamente, economicamente, politicamente, socialmente) que dividimos deveria ser moldado e estruturado. Há a esperança de que a compreensão substitua a incompreensão e que até alguns acordos sejam estabelecidos. Essas discussões, todavia, devem ocorrer não na esfera política governamental, mas na sociedade civil pluralista, composta pelas comunidades que são os detentores primários dos significados e valores culturais. As discussões pressupõem também uma educação questionadora do sentido da vida boa. Defende que as Universidades deveriam ser alguns dos locais onde discussões reais sobre a adequação ou veracidade de certas concepções do bem comum deveriam estar ocorrendo. Pressupõem ainda a promoção de experiências entre setores mais ricos e outros, menos favorecidos. Ressalta o Professor que o processo de expansão e aprofundamento do consenso deve continuar se queremos lidar com as novas formas de interdependência social de fins do séc. XX. As virtudes de solidariedade e responsabilidade mútua entre cidadãos são pré-requisitos para que essa interdependência seja reconhecida e orientada para o bem comum em uma democracia pluralista.
[101] Para Rawls, “A prioridade do justo e as concepções do bem”, in Justiça e Democracia, 2000, pp. 317-318, a educação das crianças deverá comportar o estudo de seus direitos cívicos e constitucionais, a fim de que elas saibam que a liberdade de consciência existe em sua sociedade de forma que possam optar ao ser tornarem adultos, entre seguir ou não uma determinada concepção religiosa ou filosófica; além disso, a educação deve prepará-las para serem membros integrais da sociedade e capazes de autonomia; deve também encorajar as virtudes políticas a fim de que elas desejem respeitar os termos equitativos da cooperação social nas suas relações com o resto da sociedade.
[102] Cf. John Rawls, Liberalismo político, cit., p. 49., que na época fez um aperfeiçoamento em sua Teoria da Justiça, “o primeiro princípio, que trata dos direitos e liberdades básicos e iguais, pode ser facilmente precedido de um princípio lexicamente anterior, que prescreva a satisfação das necessidades básicas dos cidadãos, ao menos à medida que a satisfação dessas necessidades seja necessária para que os cidadãos entendam e tenham condições de exercer de forma fecunda esses direitos e liberdades”. Ou seja, seria como se Rawls reconhecesse a existência de um “princípio zero”, onde a dignidade humana nasceria. Sem acesso a educação, saúde, cultura, lazer, saneamento básico etc. (e aqui insiro a convivência comunitária), o ser humano não tem condição de se desenvolver com dignidade para exercer seus direitos civis e políticos. Afinal, se não possui saúde, sua liberdade de ir e vir fica prejudicada, se não possui boa instrução, não conseguirá um bom trabalho nem boa renda, o que também lhe tolherá a liberdade de ir para outros lugares; se não possui uma instrução de qualidade e uma cultura razoável em termos de conhecimentos sociais e políticos, poderá facilmente ser manipulado quando do exercício de seus direitos políticos. Veja-se, portanto, que todos os direitos estão relacionados, são interdependentes, mas uns – os direitos sociais, econômicos e culturais – são condicionantes para o bom exercício dos direitos civis e políticos.
[103] Entendemos dessa forma, pois mesmo nas cidades onde não há orçamento participativo, é competência privativa do Chefe do Executivo propor iniciativa de projeto de lei sobre orçamento, e cabe à Câmara, especialmente por seu presidente, encaminhar o projeto e proceder às votações das leis orçamentárias. E uma vez que, a partir do Estatuto da Cidade, a implantação do orçamento participativo passou a ser obrigatória, passou a também integrar uma fase procedimental necessária do processo orçamentário municipal, que, como visto, depende de atuação - mediante ato de ofício - dos chefes do Executivo e do Legislativo para que seja implementada.