4 Características do sistema prisional mineiro
Em Minas Gerais, temos como responsável direta pela manutenção dos estabelecimentos penitenciários a SEAP (Secretaria de Estado de Administração Prisional). Segundo dados oficiais disponibilizados pelo órgão, a secretaria administra, atualmente, cento e oitenta e sete unidades prisionais em todo o Estado, mantendo sob custódia a vida de mais de cinquenta e oito mil presos, conforme levantamento realizado no site da entidade em 06 de maio de 2017 (disponível em http://www.seds.mg.gov.br/prisional/2013-07-15-20-29-33).
Além das unidades acima citadas, a SEAP mantém convênio com trinta e oito APACs, conforme citado levantamento, que são Associações de Proteção e Assistência aos Condenados, responsáveis por abrigar condenados que cumprem pena no regime aberto e também aqueles a que foram impostas a pena de limitação de fim de semana, por exemplo, conforme vimos anteriormente.
Em todos os estabelecimentos, os condenados recebem alimentação, vestuário, atendimento médico, odontológico e jurídico, além de outros direitos de primeira necessidade impostos pela Lei de Execução Penal. No tocante a educação, a SEAP tem, em funcionamento, cento e quatorze escolas integradas dentro das unidades, conseguindo disponibilizar o direito de estudar a aproximadamente oito mil presos. Além disso, cerca de cento e noventa sentenciados estão matriculados em cursos superiores, nas modalidades à distância e presencial. Ainda no tocante a educação, só em Minas Gerais, são oferecidas 5.625 (cinco mil, seiscentos e vinte e cinco) vagas em cursos profissionalizantes, através do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Superior (PRONATEC), com base nos dados oferecidos pelo próprio órgão e já referenciados anteriormente.
Em relação ao trabalho, a secretaria consegue fazer com que quatorze mil detentos exerçam atividades laborativas, fazendo jus ao recebimento de três quartos do salário mínimo mensalmente, além de receber o benefício da remição, que é a diminuição de um dia de pena a cada três dias trabalhados (dados disponível no site da SEDS: http://www.seds.mg.gov.br/prisional/2013-07-15-20-29-33).
Mesmo com números inicialmente satisfatórios, com um olhar pormenorizado podemos perceber os principais pontos que necessitam de ajustes e melhorias para uma maior humanização e capacidade de ressocialização dos presos em geral.
5 Problemas e soluções para o sistema prisional mineiro
Quando se fala em problemas no sistema prisional, não só em Minas Gerais, mas a nível nacional, o primeiro grande problema é a superlotação dos presídios e penitenciárias. De fato, o Estado passa por essa situação há algum tempo, onde as vagas disponíveis são extremamente aquém do necessário para o cumprimento digno da pena por parte dos sentenciados.
A falta de espaço nas celas causam os mais diversos tipos de atrito possíveis entre os presos, desde o estresse por não conseguir se locomover dentro do limite do espaço até as discussões e agressões que chegam a acontecer em virtude dessa aproximação obrigatória.
Especialistas estimam que seria necessário que o Estado dobrasse, efetivamente, a quantidade de vagas existentes no sistema prisional em si, para atender as necessidades básicas dos presos.
Para solucionar o problema, algumas atitudes por parte do poder público podem ser colocadas em prática: a primeira delas seria a construção de novos estabelecimentos prisionais, culminando assim na transferência de sentenciados das unidades onde a situação encontra-se mais crítica, com uma superlotação latente, correndo o risco de entrar em colapso por conta, justamente, da falta de vagas para os condenados.
Sem dúvidas a construção de novas unidades teria um impacto forte na situação financeira do Estado, entretanto, pensando justamente num controle de gastos, a segunda proposta de solução seria a construção de novos pavilhões, novas celas, dentro das unidades prisionais já existentes. Obviamente, construir anexos dentro dos presídios e penitenciárias que já tem uma estrutura para isso ficaria bem mais viável, do ponto de vista financeiro, para desafogar essa situação, trazendo da mesma maneira uma maior tranquilidade para todos os integrantes do sistema, englobando nesse sentido custodiados e funcionários.
No pensamento do professor Tailson Pires Costa, a sociedade em si, mesmo aqueles que nunca foram e nem serão presidiários, sabem dessas condições ruins a qual são submetidos os presos, senão vejamos:
Não é preciso ser presidiário para saber que os estabelecimentos penitenciários no Brasil são sinônimos de locais insalubres e não atingem o mínimo de condições exigido para a preservação da dignidade da prisão do infrator. Celas superlotadas, com pouca ventilação, pouca luminosidade, péssimas condições de higiene e de alimentação, que em hipótese algumas simbolizam e atingem a finalidade da sanção penal. (COSTA, 2004, p.17)
O segundo grande problema do sistema prisional mineiro passa justamente pelo corpo de servidores. A falta de servidores suficientes e a falta de qualificação dos mesmos para atuar em situações inesperadas de risco e até mesmo em situações cotidianas faz com que as unidades prisionais se tornem vulneráveis a rebeliões e ataques externos para o resgate de presos. Entre rebeliões, princípios de rebeliões e resgates externos, inúmeras foram e serão as tentativas e atos consumados nesse sentido nas unidades penitenciárias.
A melhoria da estrutura seria um dos desafios do poder público para tentar solucionar o problema, além de, é claro, aumentar o contingente de agentes penitenciários e servidores técnicos responsáveis pelo atendimento aos sentenciados, não se esquecendo de proporcionar a todos os funcionários cursos periódicos para aperfeiçoamento e atualização no que diz respeito às suas funções dentro do sistema prisional. Para evitar gastos extras, os próprios servidores que possuem uma qualificação de nível mais elevado frente aos outros poderiam ser os responsáveis por passar esse conhecimento aos demais, bastando aí pequenos ajustes de natureza administrativa para a concretização de projetos desse tipo.
As condições ruins de tratamento com os sentenciados e a falta de itens básicos, como higiene e alimentação adequados, bem como maus tratos e a falta de trabalho para os presos, são o conjunto de reivindicações que constituem o terceiro grande problema do sistema penitenciário de Minas Gerais.
Segundo Marina Fernanda Valejo, se essa situação de tratamento com o preso não for mudada, ele carregará para sempre na sua personalidade resquícios da vida no cárcere, que não contribui efetivamente para uma vida melhor, senão vejamos:
Devido à modificação e massificação da personalidade daquele submetido ao Cárcere, esse indivíduo carregará essa herança, ou marca do cumprimento de sua pena por muito tempo, mesmo após seu retorno ao convívio social extramuros. Isso porque, acostumado e adaptado a falar, agir, praticar e sobretudo pensar como preso, após o processo de prisionalização se solidificar, muito raro os que conseguem retornar sem grandes prejuízos a sua personalidade anterior. (VALEJO, 2013, p.28)
Para a solução desses problemas, algumas opções aparecem como tentativas eficientes para tanto: a disponibilização de cursos para os agentes prisionais versando sobre direitos humanos, execução penal e direitos e deveres do preso diminuiria os relatos de maus tratos nas unidades, consequentemente melhorando a condição de tratamento entre todos. A parceria da SEAP com outras secretarias do Estado, como saúde, educação, meio ambiente e assistência social, para disponibilizar trabalho para os presos poderia reduzir as reclamações por falta de trabalho, considerando que mais vagas seriam oportunamente criadas, auxiliando diretamente no processo de ressocialização dos condenados. Parcerias nesse sentido com outros órgãos da iniciativa pública (como prefeituras, por exemplo) e até mesmo da iniciativa privada (como empresas da construção civil) também elevariam consideravelmente os quatorze mil atuais postos de trabalho existentes.
No que se refere à falta de higiene e alimentação de má qualidade, uma revisão nos contratos futuros de licitação para a prestação desses serviços seria suficiente para uma melhora substancial nos padrões básicos. Não necessariamente geraria gastos extras para o poder público, por se tratar de itens de necessidade básica que já são disponibilizados aos sentenciados, melhorando, nesse caso, apenas a qualidade dos materiais e alimentos.
O quarto problema que assola o sistema prisional mineiro é a mistura de sentenciados em alojamentos, sem a atenção de separá-los em alguns aspectos, como reincidência e primariedade, e por qual delito cada preso foi condenado ou está detido provisoriamente.
Nesse sentido, uma melhor divisão na maneira de distribuir os sentenciados seria a solução mais eficaz. Condenados, só pelo fato de estarem assim caracterizados, já deveriam ficar separados dos presos não condenados, já que, se respeitado o princípio constitucional da presunção de inocência, os presos provisórios ainda não estão cumprindo pena, e sim, apenas aguardando seu julgamento, que pode culminar em condenação ou até mesmo na absolvição. Os sentenciados que gozam da prerrogativa da primariedade deveriam ficar alojados separadamente dos demais reincidentes, pois o contato direto com essa segunda classe só aumenta a chance de aprendizagem na escola do crime, indo na contramão de um dos pilares básicos do sistema prisional, que é a ressocialização do indivíduo.
Na tentativa de amenizar ainda mais os efeitos desse problema, havendo condições, o ideal seria agrupar, na mesma cela, apenas presos que estejam sendo acusados ou que já foram sentenciados pelos mesmos crimes, por exemplo, homicidas ficarem em celas apenas com outros homicidas, traficantes em celas apenas com outros traficantes, e assim sucessivamente, evitando o contato de um preso com outros que cometeram os mais diversos tipos de crime, tornando mais eficiente a proposta ressocializadora da pena, sem perder o caráter punitivo.
O quinto problema a ser tratado no nosso trabalho é a grande quantidade de presos provisórios existentes no sistema penitenciário de Minas Gerais. Cerca de vinte e nove mil, dos cinquenta e oito mil presos no Estado, são provisórios, chegando a aproximadamente 50% de toda a população carcerária. (Dados obtidos em 15/05/2017, no endereço eletrônico: <https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2016/04/27/interna_gerais,756805/metade-dos-presos-de-minas-gerais-ainda-nao-foram-condenados.shtml>).
É certo que muitas dessas prisões provisórias são necessárias para manter a eficácia das investigações e proteção de vítimas, no entanto a regra deveria ser manter a pessoa em liberdade, e só prender em casos específicos, sendo a exceção da regra. O que acontece é justamente o contrário, prender se tornou a primeira necessidade, e só depois de algum tempo é que se verifica se é realmente passível de continuidade da pessoa atrás das grades. Isso gera um aumento considerável da população carcerária, causando também diversos outros transtornos para as autoridades policiais e prisionais.
Adotar medidas para alterar esse quadro pode ajudar a melhorar a situação do sistema, sendo que uma parte desses presos poderia ser liberada. Uma forma de atenuar o problema é a implementação da audiência de custódia, onde o preso em flagrante tem acesso a um juiz em até 24 horas após a prisão. Esse magistrado avalia o caso e decide imediatamente se a continuidade da prisão é necessária. A adoção de audiências de custódia já foi testada em outros estados brasileiros e diminuiu consideravelmente o nível de prisões provisórias após flagrante. Vale notar que a quantidade de presos provisórios em Minas Gerais é semelhante ao déficit de vagas. Evidentemente, não é possível dar liberdade a todos as pessoas nessa condição, mas a revisão desses casos poderia significar um grande alívio no problema.
Usamos as palavras do professor Juarez Cirino dos Santos, que afirma, em outras palavras, que o sistema penal precisa ser reformulado, corroborando com o nosso pensamento:
[...] os objetivos do sistema prisional de ressocialização e correção estão fracassando há 200 anos, e muito pouco está sendo feito para mudar a situação. Prisão nenhuma cumpre estes objetivos, no mundo todo. O problema se soma ao fato de que não há políticas efetivas de tratamento dos presos e dos egressos. Fora da prisão, o preso perde o emprego e os laços afetivos. Dentro da prisão, há a prisionalização, quando o sujeito, tratado como criminoso, aprende a agir como um. Ele desaprende as normas do convívio social para aprender as regras da sobrevivência na prisão, ou seja, a violência e a malandragem. Sendo assim, quando retorna para a sociedade e encontra as mesmas condições anteriores, vem à reincidência. A prisão garante a desigualdade social em uma sociedade desigual, até porque pune apenas os miseráveis. Por isso defendo o desenvolvimento de políticas que valorizem o emprego, a moradia, a saúde, a educação dos egressos. A criminologia mostra que não existe resposta para o crime sem políticas sociais capazes de construir uma democracia real, que oportunizem aos egressos condições de vida [...] (SANTOS, 2010, p.246)
De acordo com a opinião do professor, dentro da prisão só aumenta a desigualdade social e o aumento da própria criminalidade, devendo o tratamento com os presos ser realizado de maneira diferente, visando a ressocialização dos mesmos e a sua reintegração a sociedade.