Da responsabilidade extracontratual do Estado – decisões do STF.
O artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, dispõe que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos damos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.
Como é sabido, os pressupostos da responsabilidade objetiva no Estado no Brasil são: a) ação ou omissão imputável ao Estado; b) relação de causalidade; e c) dano.
O egrégio Supremo Tribunal Federal tem diversas decisões sobre o tema da responsabilidade extracontratual do Estado, onde destacamos algumas mais recentes.
Decisões do STF
1 - “Em caso de inobservância do seu dever específico de proteção previsto no art. 5º, XLIX, da CF, o Estado é responsável pela morte de detento. Essa a conclusão do Plenário, que desproveu recurso extraordinário em que discutida a responsabilidade civil objetiva do Estado por morte de preso em estabelecimento penitenciário. No caso, o falecimento ocorrera por asfixia mecânica, e o Estado-Membro alegava que, havendo indícios de suicídio, não seria possível impor-lhe o dever absoluto de guarda da integridade física de pessoa sob sua custódia. O Colegiado asseverou que a responsabilidade civil estatal, segundo a CF/1988, em seu art. 37, § 6º, subsume-se à teoria do risco administrativo, tanto para as condutas estatais comissivas quanto paras as omissivas, uma vez rejeitada a teoria do risco integral. Assim, a omissão do Estado reclama nexo de causalidade em relação ao dano sofrido pela vítima nas hipóteses em que o Poder Público ostenta o dever legal e a efetiva possibilidade de agir para impedir o resultado danoso. Além disso, é dever do Estado e direito subjetivo do preso a execução da pena de forma humanizada, garantindo-se-lhe os direitos fundamentais, e o de ter preservada a sua incolumidade física e moral.” (RE 841.526, rel min. Luiz Fux, julgamento em 30-3-2016, Plenário, Informativo 819, com repercussão geral.)
2 - “A disposição contida no art. 37, § 6º, da CF não esgota a matéria relacionada à responsabilidade civil imputável à Administração, pois, em situações especiais de grave risco para a população ou de relevante interesse público, pode o Estado ampliar a respectiva responsabilidade, por danos decorrentes de sua ação ou omissão, para além das balizas do supramencionado dispositivo constitucional, inclusive por lei ordinária, dividindo os ônus decorrentes dessa extensão com toda a sociedade. Validade do oferecimento pela União, mediante autorização legal, de garantia adicional, de natureza tipicamente securitária, em favor de vítimas de danos incertos decorrentes dos eventos patrocinados pela FIFA, excluídos os prejuízos para os quais a própria entidade organizadora ou mesmo as vítimas tiverem concorrido. Compromisso livre e soberanamente contraído pelo Brasil à época de sua candidatura para sediar a Copa do Mundo FIFA 2014.” (ADI 4.976, rel. min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 7-5-2014, Plenário, DJE de 30-10-2014.)
3 - "A omissão do Poder Público, quando lesiva aos direitos de qualquer pessoa, induz à responsabilidade civil objetiva do Estado, desde que presentes os pressupostos primários que lhe determinam a obrigação de indenizar os prejuízos que os seus agentes, nessa condição, hajam causado a terceiros." (ARE 655.277-ED, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 24-4-2012, Segunda Turma, DJE de 12-6-2012.)
4 - “Professora. Tiro de arma de fogo desferido por aluno. Ofensa à integridade física em local de trabalho. Responsabilidade objetiva. Abrangência de atos omissivos.” (ARE 663.647-AgR, rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 14-2-2012, Primeira Turma, DJE de 6-3-2012.)
5 - “O dano suportado pelos servidores, derivado do rompimento unilateral pela administração do plano de pensão, consubstancia direito à indenização, na forma do § 6º do art. 37 da CF. Com o que se faz imperioso o reconhecimento da situação jurídica subjetiva dos recorrentes ante o Poder Público, sob pena de se chancelar o enriquecimento estatal sem causa.” (RE 486.825, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 6-9-2011, Primeira Turma, DJE de 6-2-2012.)
6 - “Nos termos da jurisprudência do STF, é cabível a indenização por danos materiais nos casos de demora na nomeação de candidatos aprovados em concursos públicos, quando o óbice imposto pela administração pública é declarado inconstitucional pelo Poder Judiciário.” (RE 339.852-AgR, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 26-4-2011, Segunda Turma, DJE de 18-8-2011.) Vide: RE 724.347, rel. p/ o ac. min. Roberto Barroso, julgamento em 26-2-2015, Plenário, DJE de 13-5-2015, com repercussão geral.
7 - “O Supremo Tribunal já assentou que, salvo os casos expressamente previstos em lei, a responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos de juízes.” (RE 553.637-ED, rel. min. Ellen Gracie, julgamento em 4-8-2009, Segunda Turma, DJE de 25-9-2009.) Vide: RE 228.977, rel. min. Néri da Silveira, julgamento em 5-3-2002, Segunda Turma, DJ de 12-4-2002.
8 - “A discussão relativa à responsabilidade extracontratual do Estado, referente ao suicídio de paciente internado em hospital público, no caso, foi excluída pela culpa exclusiva da vítima, sem possibilidade de interferência do ente público” (RE 318.725-AgR, rel. min. Ellen Gracie, julgamento em 16-12-2008, Segunda Turma, DJE de 27-2-2009.)
9 - “Responsabilidade civil objetiva do Estado. Art. 37, § 6º, da Constituição. Crime praticado por policial militar durante o período de folga, usando arma da corporação. Responsabilidade civil objetiva do Estado.” (RE 418.023-AgR, rel. min. Eros Grau, julgamento em 9-9-2008, Segunda Turma, DJE de 17-10-2008.) No mesmo sentido: ARE 751.186-AgR, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 2-12-2014, Segunda Turma, DJE de 17-12-2014; RE 213.525-AgR, rel. min. Ellen Gracie, julgamento em 9-12-2008, Segunda Turma, DJE de 6-2-2009.
10 - “Latrocínio cometido por foragido. Nexo de causalidade configurado. (...) A negligência estatal na vigilância do criminoso, a inércia das autoridades policiais diante da terceira fuga e o curto espaço de tempo que se seguiu antes do crime são suficientes para caracterizar o nexo de causalidade. Ato omissivo do Estado que enseja a responsabilidade objetiva nos termos do disposto no art. 37, § 6º, da CB.” (RE 573.595-AgR, rel. min. Eros Grau, julgamento em 24-6-2008, Segunda Turma, DJE de 15-8-2008.)
11 - "A jurisprudência dos tribunais em geral tem reconhecido a responsabilidade civil objetiva do Poder Público nas hipóteses em que o eventus damni ocorra em hospitais públicos (ou mantidos pelo Estado), ou derive de tratamento médico inadequado, ministrado por funcionário público, ou, então, resulte de conduta positiva (ação) ou negativa (omissão) imputável a servidor público com atuação na área médica. Servidora pública gestante, que, no desempenho de suas atividades laborais, foi exposta à contaminação pelo citomegalovírus, em decorrência de suas funções, que consistiam, essencialmente, no transporte de material potencialmente infecto-contagioso (sangue e urina de recém-nascidos). Filho recém-nascido acometido da ‘Síndrome de West’, apresentando um quadro de paralisia cerebral, cegueira, tetraplegia, epilepsia e malformação encefálica, decorrente de infecção por citomegalovírus contraída por sua mãe, durante o período de gestação, no exercício de suas atribuições no berçário de hospital público. Configuração de todos os pressupostos primários determinadores do reconhecimento da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, o que faz emergir o dever de indenização pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido." (RE 495.740-AgR, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 15-4-2008, Segunda Turma, DJE de 14-8-2009.) Vide: AI 455.846, rel. min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 11-10-2004, DJ de 21-10-2004.
12 - "Responsabilidade civil do Estado. Morte. Vítima que exercia atividade policial irregular, desvinculada do serviço público. Nexo de causalidade não configurado." (RE 341.776, rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 17-4-2007, Segunda Turma, DJ de 3-8-2007.)
13 - "Responsabilidade do Estado. Natureza. Animais em via pública. Colisão. A responsabilidade do Estado (gênero), prevista no § 6º do artigo 37 da Constituição Federal, é objetiva. O dolo e a culpa nele previstos dizem respeito à ação de regresso. Responde o Município pelos danos causados a terceiro em virtude da insuficiência de serviço de fiscalização visando à retirada, de vias urbanas, de animais." (RE 180.602, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 15-12-1998, Segunda Turma, DJ de 16-4-1999.
* Alexandre Pontieri – Advogado com atuação nos Tribunais Superiores (STF, STJ, TST e TSE), e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ); Consultor da área tributária com foco principalmente no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF); Pós-Graduado em Direito Tributário pelo CPPG – Centro de Pesquisas e Pós-Graduação da UniFMU, em São Paulo; Pós- Graduado em Direito Penal pela ESMP-SP – Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Aluno Especial do Mestrado em Direito da UNB – Universidade de Brasília. alexandrepontieri@gmail.com