4) Auxiliares da Justiça
Em regra as unidades jurisdicionais apresentam uma partição em cartório ou secretaria e gabinete. Ambas são responsabilidade do magistrado embora isso por vezes não seja bem compreendido, nem externa nem internamente.
Não é raro ver magistrado que se tornam totalmente alheios ao andamento do expediente cartório, olvidando que a presença de um responsável naquela competência administrativa não lhe subtrai a chefia geral e a responsabilidade.
Também não é incomum magistrados que se preocupam com o número de feitos conclusos exclusivamente, buscando ter número baixo de feitos aguardando despacho ou decisão e que acabam gerando represamento dos processos no cartório ou secretaria como já referi acima.
Ora, à parte pouco importa onde o feito estará parado, o fato que importa é que ele estará represado. Trata-se de um subterfúgio inútil, pois embora pareça que o gabinete está “em dia” a percepção da jurisdição daquele órgão como um todo certamente não será das melhores na perspectiva do consumidor da jurisdição.[31]
A secretária ou cartório é onde é feita a parte administrativa da tramitação processual após o feito voltar da conclusão ao gabinete, com o fito de se dar cumprimento a despachos ou decisões. É chefiada por um escrivão ou chefe de secretaria que gerencia o pessoal e as atividades mas sob responsabilidade geral do magsitrado.
O novo CPC introduz importante competência (rectius: atribuição) na esfera do escrivão ou chefe da secretaria, qual seja, a de praticar atos ordinatórios mediante delegação do juiz.
Entre tais atos, compreendem-se aqueles de mero impulso processual em cumprimento à sequência legal de atos processuais, e que não demandam decisão em seu conteúdo ou podem ser decididos de uma só vez.
Trata-se de uma fórmula bastante útil, pois um despacho inicial pode conter vários comandos relativos a etapas seguintes que poderão ser executados sem nova conclusão. O julgador, porém, deve estar atento para o fato de que nas contestações podem haver preliminares que demandem solução imediata.
Tendo em vista a ordem de precedência de processos, igualmente cabe a este servidor organizar a lista de recebimento cronológico.
5) O Ministério Público
No anterior CPC, a disciplina de atuação do Ministério Público estava nos artigo 81 a 85. Hoje nos artigos 176 a 181.
Antes de se ingressar na tratativa das mudanças na atuação do MP, é preciso destacar que, desde antes da vigência do novo CPC, já vinha se avolumando um movimento interno pela redução da atividade interventiva do MP no processo cível enquanto custus legis.
Afiançava-se, então, que a instituição havia se tornado em uma espécie de “assessoria de luxo” do juiz, e que isso estaria tirando o foco da atuação institucional em vista de outras searas mais relevantes e próprias das funções típicas do órgão.
O sinal mais saliente desta postura principiou pelos feitos fazendários, onde paulatinamente o órgão passou a declinar de intervir. Na sequência, foi a atuação em ações alimentares como substituto processual[32].
Neste mesmo ínterim, ganhavam estruturação crescente as Defensorias Públicas que foram preenchendo o vácuo deixado.
O fato que hoje se constata é que a motivação declinada para este posicionamento não-intervencionista, que era ter mais tempo para a atuação típica da instituição, acabou não se confirmando, e o MP acabou perdendo, com isso, grande parte da projeção e importância que tinha, tanto mais quando Defensoria Pública também passou a propor ações civis públicas[33].
No CPC de 1973, a atuação do MP como custus legis (cuja participação mais saliente é a emissão de parecer prévio à decisão), se fazia presente em casos de incapazes, ações de estado, de ultima vontade, litígios coletivos de posse de terra e causas em que a natureza ou condição da parte evidenciassem interesse público.
Na disciplina do novo CPC, as hipóteses de intervenção foram visivelmente diminuídas tendo sido suprimidas aquelas do inciso II do artigo 82 do revogado CPC. Mantido o interesse de incapaz, os incisos I e III do artigo 178 do CPC contemplam litígios coletivos pela posse de terras, sejam urbanas ou rurais, e casos de interesse público ou social[34]. Porém, o parágrafo único do mesmo artigo informa que o simples fato de a Fazenda Pública participar do feito não implica por si só caso de intervenção.
A disposição legal galvaniza o posicionamento acima mencionado que já vinha se cristalizando de longa data por conta de declinação levada a efeito pela própria instituição.
A fórmula ainda é aberta e imprecisa. Pode se afirmar que demandas exclusivamente pecuniárias, como sejam ações de cobrança de diferenças, tributárias ou execuções fiscais e seus incidentes certamente enquadram-se na hipótese de exclusão do parágrafo único.
Porém, demandas indenizatórias decorrentes, por exemplo, de anulação de atos administrativos, decorrentes de casos de assédio ou que possam ter alguma repercussão na seara da improbidade administrativa, já caracterizam casos onde a certeza da exclusão não é uma conclusão indene de sérias dúvidas.
Na dúvida, deve ser intimado o órgão ministerial para que ele, com exclusividade, diga de sua intervenção, descabendo ao magistrado juízos apriorísticos quando a dúvida é razoável, pois a conseqüência da falta de intimação é uma nulidade absoluta e imprecruível, na forma do artigo 279 do CPC.
O novo CPC estabelece expressamente o prazo em dobro para o MP (salvo quando houver prazo próprio previsto em lei) sendo sua intimação pessoal. Não apresentando tempestivamente manifestação os autos são requisitados pelo juízo a fim de impedir postergação da decisão que será proferida mesmo sem presença do parecer.
6) Advocacia Pública
Na advocacia pública está incluída a defesa dos interesses do Estado (lato sensu), ai incluída a Administração Direta e Indireta.
Ai se inserem a AGU, as Procuradorias Estaduais, Municipais e autárquicas agora sendo contempladas com disposições específicas, dentre elas figurando o prazo em dobro, salvo quando houve prazo próprio previsto em lei.
A advocacia pública poderá ser intimada por carga, remessa ou meio eletrônico, assim como o MP.
7) A Defensoria Pública
Se há uma instituição que hoje se convolou no verdadeiro bastião maior de defesa da cidadania esta é, sem dúvida, a Defensoria Pública.
Desde a CF/88, a Defensoria vem granjeando espaço, estruturando-se e tomando para si as tarefas e atribuições indesejadas e que não dão holofotes e prestígio midiático, mas imprescindíveis ao objetivo de uma ordem jurídica justa e igualitária, com efetiva aplicação do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional.
Mais recentemente, com a modificação do inciso II do artigo 5º da Lei nº 7.347/85 pela Lei nº 11.448/07, as Defensorias tiveram suas atribuições ampliadas e foram munidas de instrumentação eficaz para dar cumprimento as suas demandas institucionais, podendo propor ações civis públicas.[35]
A exata compleição desta faculdade da Defensoria ainda pende de definição, dado o atrelamento das suas atividades à condição de hipossuficiência dos assistidos.
A Defensoria contará com a prerrogativa dos prazos em dobro, salvo quando houver prazo próprio legalmente estabelecido em lei, e sua intimação se faz nos moldes daquela da advocacia pública.
O prazo em dobro foi estendido também para os escritórios de prática de universidades que se destinem a prestação de serviços aos necessitados.
Notas
[1] Embora quase sempre o ingresso da seguradora se dê por denunciação à lide pelo réu, por vezes ela já figura como ré desde a propositura da demanda. Sempre que a seguradora ingressa no feito, pode ocorrer de ser reconhecida responsabilidade civil do segurado/tomador sem que isso necessariamente implique condenação da seguradora. Isso pode ocorrer quando o contrato de seguro não cobre a hipótese ou houve sonegação de risco pelo segurado ou tomador.
[2] As hipóteses de obrigações divisíveis e sem solidariedade são menos comuns. Ordinariamente decorrem de contratos com fracionamento de objeto. A massa de contratos hoje já vem com a solidariedade como regra.
[3] Condenatório, declaratória, mandamental, constitutiva e executiva. A respeito, ver de minha autoria: “A Antecipação de Tutela e as Eficácias das Sentenças”, disponível na internet.
[4] O prejuízo à celeridade do processo se torna especialmente presente no caso de execuções conjuntas com valores de cada exeqüente podendo ensejar impugnações. Em execuções raramente o litisconsórcio é vantajoso.
[5] Ambas as hipóteses implicam no plano concreto, na inexigibilidade do título judicial, que pode ser alegada em impugnação, porém no segundo caso não haverá espaço, por exemplo, para se cogitar de ação anulatória por parte do prejudicado.
[6] Ad exemplum, STJ - AgRg nos EREsp: 1262401 BA 2012/0197241-8, Relator: Ministro Humberto Martins, Data de Julgamento: 25/04/2013, CE - Corte Especial, Data de Publicação: DJe 10/05/201
[7] “Para que se configure a assistência, na modalidade litisconsorcial, aquele que pretende ingressar no feito deve manter relação jurídica com a parte a que pretende prestar assistência, o que não ocorre na hipótese” (STJ - REsp: 1181118 RJ 2009/0188401-4, Relator: Ministro Mauro Campbell Marques, Data de Julgamento: 14/09/2010, T2 - Segunda Turma, Data de Publicação: DJe 06/10/2010).
[8] STJ - AgRg na RCDESP no REsp: 735314 RS 2005/0046304-1, Relator: Ministro Luiz Fux, Data de Julgamento: 15/12/2009, T1 - Primeira Turma, Data de Publicação: DJe 02/03/2010, reportando-se à doutrina de Nelson Nery Júnior.
[9] A tanto concluir basta verificar o Código Civil, o mais extenso dos códigos. Salvante os direitos de personalidade e alguma parte do direito de família, o restante de seu conteúdo se reporta à relações jurídicas de conteúdo eminentemente econômico. Além dele, há inúmeras leis na mesma condição. Nossa sociedade tem a tutela do interesse jurídico como objeto preponderante da tutela jurídica, e nossas relações tem como base o interesse econômico. Acabam sendo coisas indissociáveis.
[10] É pertinente não olvidarmos que o processo, além de um mecanismo de resolução de um conflito entre partes, representa, também, um serviço de interesse público e que atende a interesses desta mesma ordem. O processo não está totalmente à disposição integral das partes. O Estado também tem interesses nele, e, enquanto serviço público, ele também se sujeita ao princípio da eficiência. Desta forma, a interpretação que deve ser dada ao ordenamento processual deve ser aquela que produza os melhores resultados levando também em conta a perspectiva estatal ou pública.
[11] A figura do gestor de negócios está prevista nos artigos 861-875 do CC, e este atua de acordo com a vontade presumível do beneficiário, estando sujeito a responsabilidade perante este, inclusive respondendo até pelo caso fortuito em algumas hipóteses. O substituto processual não está sujeito a disciplina tão rígida, e atua com total independência, só respondendo por dolo.
[12] O revogado CPC usava o termo “é obrigatória” o que induzia concluir-se que não formalizada a denunciação, restaria prejudicado o regresso. Formou-se, contudo, posição de que a denunciação não era obrigatória nos casos do artigo 70, inciso III, do revogado CPC. Exemplificativamente STJ - AgRg no AREsp: 55131 GO 2011/0158549-5, Relator: Ministro Luis Felipe Salomão, Data de Julgamento: 21/05/2013, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 27/05/2013; STJ - AgRg no AREsp: 664462 PR 2015/0037457-3, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 26/05/2015, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/06/2015.
[13] O artigo 73 do revogado CPC não previa limites e possibilitava sucessivas denunciações da lide. A quantidade seria limitada pelo bom senso do juiz na medida em que interferisse com a celeridade do processo. Um critério totalmente subjetivo.
[14] O prazo é para a parte promover os atos a seu cargo a fim de citar o chamado, não podendo a mora do judiciário (vergonhosa em muitos casos) lhe render consequências negativas.
[15] A manifestação ordinária do desvio de finalidade são as “empresas laranjas”, constituída com adrede finalidade de fraude, ocultação de bens e dissipação de patrimônio. Os indícios são no mais das vezes bem evidentes. São empresas com número incompatível de funcionários em vista de sua movimentação financeira, sem sede real, sem bens de raiz, e que por isso são facilmente abandonáveis. Não é incomum a utilização de interpostas pessoas como sócios fictícios. O desvio não precisa ser o escopo único da empresa. Ela pode mesmo até ter parte substancial das atividades lícitas. Mas desde que seja utilizada com finalidade ilícita, pode haver a desconsideração.
[16] Os casos de confusão patrimonial marcam-se por aquilo que poderíamos chamar de “promiscuidade patrimonial” situação onde bens e valores da pessoa jurídica são desviados para utilização pelos sócios sem a devida contabilização e em detrimento do cumprimento de obrigações. Exemplo disso dos mais comuns reside na aquisição de veículos pela pessoa jurídica que na verdade são utilizados pelo sócio. Na mesma linha, o pagamento de contas pessoais diretamente pela pessoa jurídica e sem ressalva contábil. A linha de separação é rompida em prejuízo dos credores e com ocultação ou desvio patrimonial.
[17] A hipótese é de casos onde o devedor pessoa física transfere patrimônio para pessoa jurídica visando afastar sua responsabilidade patrimonial neles. Também se verifica quando a pessoa física atua se valendo de uma empresa para lhe dar respaldo ou em atividade típica desta pessoa jurídica a qual ligada a pessoa física. Ai tem cabimento a desconsideração inversa da personalidade jurídica que é menos comum.
[18] O negócio existe, vale e é eficaz perante terceiros, mas ineficaz perante o suscitador da desconsideração, e por conta disso poderá ele se valer da responsabilidade patrimonial para saldar créditos que ele tenha contra o suscitado. A decisão “decreta” a ineficácia em relação ao suscitador. Terceiros não podem dela se beneficiar embora se prejudiquem e posam se valer dos embargos de terceiro.
[19] Ver o meu “Introdução ao Controle de Constitucionalidade, Difuso e Concentrado”.
[20] Como as Corregedorias apresentam, regra geral, forte corporativismo, e o controle da atividade jurisdicional não é feito com afinco e profundidade, a verificação dos processos conclusos aguardando despachos ou decisões apontará poucos processos em mãos do magistrado gerando aparência de jurisdição célere. Na verdade os processos acabam ficando represados no cartório ou secretaria e a morosidade é percebida pelas partes. Os cartórios e secretarias acabam se valendo da desculpa da falta de pessoal, real ou não, e na prática o prejuízo para a parte se consolida sem consequências.
[21] O julgador não fica de mãos amarradas para, observando caso a caso, regular este aspecto. O que não se admite é que o magistrado se sobreponha ao legislador ao seu talante e sem critérios minimamente objetivos. A regra é a isonomia, a paridade. A exceção é a quebra deste princípio, e como tal demanda aplicação estrita dentro dos lindes da lei, ou caso ela seja omissa, mediante substancial justificativa por decisão judicial onde restem cabalmente comprovados os pressupostos e limites da diferenciação de tratamento.
[22] Assim como o destinatário das peças processuais é o juiz e não as partes ou o próprio ego (coisa que muitos patronos esquecem) o destinatário da jurisdição é a parte. Ela se vale do Judiciário na esperança de uma solução justa e razoavelmente rápida. Cada vez que ao menos uma destas duas condições se materializa, a crença e a institucionalização em vista da Jurisdição se reforçam. O inverso também é verdadeiro e conduz ao descrédito e a um quadro onde ou há a cristalização do conflito na sociedade ou a parte passa a conceber a justiça de mão própria. ambos os casos significando a derrocada do Estado de Direito.
[23] Fica a sugestão salutar de que as Corregedorias do Judiciário tenham em sua composição deliberativa pessoas oriundas de estames externos, como advogados, representantes dos servidores, do MP, da Defensoria e (por que não?) indicados dos demais poderes da União ou do Estado Federado. Isso, aliás, é válido para as Corregedorias de outras instituições e assegura que o corporativismo não viceje.
[24] Quando magistrado, por diversas vezes, tive oportunidade de sancionar atos de litigância de má-fé escancarada, decisões que eram, em regra, reformadas pelo TJRS. Cada vez que isso ocorre é um verdadeiro alento à protelação, praticada especialmente por grandes empresas em detrimento dos consumidores.
[25] “A Litigância de Má-Fé e a Efetividade da Tutela Jurisdicional”, disponível in “https://jus.com.br/artigos/7481/a-litigancia-de-ma-fe-e-a-efetividade-da-tutela-jurisdicional”
[26] A tanto concluir, se observe o resultado da reforma trabalhista em vista do número de ações ajuizadas. Bastou se criar alguma responsabilidade para o litigante e as postulações reduziram em quantidade e extensão, demonstrando que muito do que se pedia em juízo era verdadeira “aposta sem risco”, vertida em demandas temerárias que eram tratadas de forma leniente.
[27] Aproveito o ensejo aqui para criticar a malsã e vergonhosa jurisprudência que nega a presença de dano moral no caso de consumidores lesados com cobranças indevidas e premiados com a via crucis dos call centers. Repetida como um mantra nos pretórios a pretexto de evitar a chamada indústria do dano moral, a tese segundo a qual as cobranças indevidas não geram dano moral, mas somente material, premia com a impunidade a atitude predatória de grandes empresas, muitas vezes monopolistas, que violam sistematicamente os direitos dos consumidores e se locupletam com comportamentos de dolosa fraude. Apenas um pequeno percentual de consumidores lesados se sujeita a ir ao Judiciário, e, quando logram êxito, no mais das vezes a condenação e à mera devolução de valores. Ora, isso faz da violação sistemática dos direitos do consumidor um negócio de lucro certo. A falta de sancionamento por dano moral estimula tais comportamentos e constitui uma jurisprudência covarde e vergonhosa que precisa ser revista. Mais nociva do que a indústria do dano moral é a indústria da falcatrua nas contas, com valores indevidos. Aliás, não haverá dano moral sem ilícito, e o dano moral tem, o que parece que muitos esqueceram, um caráter de repressão e sancionamento e não somente de reparação.
[28] É antes o caráter e condição de serviço estatal que marca o processo e não o seu conteúdo em si. Paralelamente aos interesses privados que possam estar em voga, há interesses públicos imanentes e inafastáveis. O processo exerce funções de caráter público, com imbricações, inclusive, com o estado de direito e a promoção de objetivos e valores constitucionais.
[29] Inclusive nem dediquei tratativa mais aprofundada ao tema da conciliação e mediação, pois me parece uma iniciativa fadada a ter pouco resultado prático, se não o de retardar ainda mais o processo. Mecanismos como este sem uma mudança de mentalidade nos agentes processuais e na população em geral não funcionam. Há uma cultura de litigância em nossa cultura. Tanto assim o é que as câmaras arbitrais (caríssimas, aliás) acabem sendo usadas na maioria dos casos por grandes empresas. A litigância comum continua se valendo da justiça comum. O brasileiro quer a palavra de um juiz em uma sentença. A figura do mediador e do conciliador não e vista com mesmo prestígio aos olhos da parte. É inegável que as partes tem severas restrições a ter alguém conduzindo a negociação que não seja o juiz togado. Isso já ocorre em certa medida, e de forma bem visível, no caso dos juízes leigos. Na prática, será uma fase a mais para retardar o processo, criando movimentação processual e burocracia.
[30] Obviamente que o magistrado deveria ter se dado por suspeito de atuar a bem da sua imagem e da Justiça, evitando que se gerasse uma suspeita de parcialidade. O pior é que o TJRS manteve o juiz na demanda. É obvio que existe reserva e animosidade com o advogado que consta como agente de crime contra o magistrado.
[31] Em comarcas onde substitui férias quando era magistrado, cheguei a ver caso de juízes que limitavam o número de conclusões por mês, gerando represamento no cartório. Qual motivo disso? Parecer à Corregedoria que está em dia? E a jurisdição como um todo, como fica? O processo irá atrasar igual. Outro expediente comum consiste em limitar as conclusões apenas a feitos urgentes durante substituições em outro juízo. Seriam peias de interferir em feitos conduzidos por outro magistrado que levam a esta limitação? Mas a decisão não é do juízo, seja quem for o responsável no momento? O signatário jamais fez qualquer limitação de volume em processamento de feitos em substituição e chegou a proferir mais de 4300 despachos e decisões em um mês substituindo a vários órgãos jurisdicionais ao mesmo tempo (janeiro de 2009 em Erechim-RS). Desculpas de excesso de serviço são bengalas fáceis e injustificadas.
[32] O signatário foi servidor do Ministério Publico do RS por cinco anos, tendo atuado maior parte deles como assessor jurídico até 2007, e acompanhou de perto a evolução deste quadro que começava a ganhar projeção exatamente naquele momento.
[33] A propósito, ver a ADI nº 3943/DF, recentemente julgada. A ação foi ajuizada pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público em atitude assaz corporativista e voltada a interesses institucionais que não se coadunam com o interesse público. Teve o merecido julgamento de improcedência. Também o RE 733.433 com repercussão geral.
[34] O interesse social é um conceito efetivamente aberto. A rigor, ele em regra está abarcado pela menção ao interesse público. Mas a menção expressa não traz prejuízo e pode dar margem de atuação aonde não existe necessário coincidência entre a dimensão do publico e do social. O interesse social estará ligado a situações onde a dimensão do direito seja transcendente do individual, e apresente repercussões coletivas, diretas ou indiretas. Exemplo claro desta hipótese (e que não se enquadra na “posse de terras’), temos nas ocupações irregulares de edificações urbanas. Um somatório de situações individualizadas, onde vertidos direitos de natureza privada e até disponível (portanto não essencialmente de natureza pública), pode gerar repercussão social a ponto de justificar atuação.
[35] A questão do Inquérito Civil ser instaurado pela Defensoria Pública ainda resta duvidosa com tendência à resposta negativa. Embora a redação atual da lei de ACP preveja a possibilidade de ação civil pública pela Defensoria Pública, não foi alterado o dispositivo que trata do inquérito civil, onde previsto somente o MP. Porém, em sendo instrumento fundamental para viabilizar a atribuição da ACP, a melhor interpretação conduz à resposta positiva acerca da possibilidade de instauração pela Defensoria que é um órgão estatal de igual envergadura e até mais importância no contexto atual. O legislador desatentou para uma disciplina cuja necessidade era óbvia.