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Os honorários trabalhistas e a recente decisão do STF no ARE 1.014.675

Agenda 30/05/2018 às 15:20

Interpreta-se a recente decisão exarada pelo Supremo Tribunal Federal, com um breve histórico acerca dos honorários de sucumbência na seara trabalhista.

INTRODUÇÃO

O presente artigo objetiva fazer uma análise da decisão prolatada pelo STF no ARE 1.014.675, sua amplitude no campo do direito intertemporal e nos honorários de sucumbência no processo do trabalho.

Os honorários de sucumbência na seara trabalhista passaram por alteração legislativa com a entrada em vigor da Lei 13.467/2017, conhecida como “Reforma Trabalhista”. Com efeito, essa lei incluiu o artigo 791-A da CLT, que passou a prever uma regra geral aos honorários de sucumbência, que, até então, eram amplamente limitados pela Súmula 219 do TST.

Sem o intuito de esgotar o tema, far-se-á uma breve análise da Súmula 219 do TST, do novel artigo 791-A da CLT, das correntes interpretativas do direito intertemporal acerca da Reforma Trabalhista e, por fim, da recente decisão prolatada pelo STF acerca dos honorários no processo do trabalho.


1. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA NO ÂMBITO TRABALHISTA

Os honorários de sucumbência no processo do trabalho sempre foram buscados pelos advogados militantes na área trabalhista.

O TST possui entendimento sumulado (Súmula 219) no sentido de que, na Justiça do Trabalho, a condenação aos honorários advocatícios não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte, concomitantemente: a) estar assistida por sindicato da categoria profissional; b) comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família.

Por muito tempo vigorou o entendimento consubstanciado nessa súmula. Todavia, a partir da inclusão do artigo 791-A da CLT, parece-nos que o entendimento sumulado deverá sofrer alterações. É que, pela redação desse novo dispositivo celetista, a mera sucumbência já faz surgir o direito aos honorários pela parte contrária. O artigo 791-A da CLT possui a seguinte redação:

Art. 791-A.  Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. 

§ 1o  Os honorários são devidos também nas ações contra a Fazenda Pública e nas ações em que a parte estiver assistida ou substituída pelo sindicato de sua categoria.  

§ 2o  Ao fixar os honorários, o juízo observará:

I - o grau de zelo do profissional;

II - o lugar de prestação do serviço; 

III - a natureza e a importância da causa; 

IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

§ 3o  Na hipótese de procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência recíproca, vedada a compensação entre os honorários.

§ 4o  Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

§ 5o  São devidos honorários de sucumbência na reconvenção.

Atualmente, portanto, os honorários de sucumbência passam a ser devidos de forma mais ampla no processo do trabalho.

A grande celeuma se refere ao aspecto intertemporal da verba honorária, notadamente quando se tratar de reclamação trabalhista ajuizada antes da vigência da Reforma.


2. ASPECTO INTERTEMPORAL

À demanda trabalhista ajuizada posteriormente à vigência da Reforma não resta dúvida de que os honorários sucumbenciais serão disciplinados integralmente pelo art. 791-A da CLT.

Problema surge com relação às demandas ajuizadas antes da vigência da Reforma. Nesse ponto, surgem algumas correntes interpretativas sobre o direito a ser considerado no aspecto temporal da norma. Abaixo tratar-se-á das principais correntes:

2.1. Primeira Corrente

Deve ser considerada a data do ajuizamento da reclamação trabalhista. Esse é o marco que deve ser aferido para se concluir pelo (in)deferimento dos honorários de sucumbência.

Essa primeira corrente pauta-se na segurança jurídica, boa-fé processual e legítima expectativa do jurisdicionado. Isso porque o Reclamante ou Reclamado, ao ajuizar uma demanda ou apresentar uma defesa sob os auspícios do entendimento da súmula 219 do TST, têm uma “quase certeza” de que não sofrerá com uma possível condenação aos honorários advocatícios. Deveras, no âmbito do processo do trabalho, a ausência de condenação à verba honorária era entendimento muito bem consolidado.

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Segundo essa corrente, portanto, se a reclamação foi ajuizada antes da vigência da reforma, não haverá cogitar em condenação aos honorários de sucumbência, pouco importando o momento da prolação da sentença. Ou seja, ainda que a sentença seja posterior à vigência da reforma, os honorários não serão cabíveis.

Para essa corrente, não é possível simplesmente aplicar a Teoria do Isolamento dos Atos Processuais, prevista no artigo 14 do CPC. É que o tema dos honorários de sucumbência não é inteiramente processual, guardando um aspecto material por se tratar de um direito autônomo do advogado.

Desse modo, em suma, se a demanda for ajuizada antes da vigência da Reforma, não haverá falar em honorários de sucumbência.

2.2. Segunda Corrente

Para uma segunda corrente, o momento a ser considerado é o da prolação da sentença, pois é a sentença o fato gerador dos honorários.

Bastaria, portanto, que a sentença fosse proferida após a vigência da Reforma, pouco importando a data do ajuizamento da reclamatória.


3. O STF, NO ARE 1.014.675, ADOTOU A SEGUNDA CORRENTE?

Recentemente, o STF exarou decisão consubstanciada na ementa abaixo transcrita:

"AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO PROCESSO DO TRABALHO. ART. 791-A DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO, INTRODUZIDO PELA LEI 13.467/2017. INAPLICABILIDADE A PROCESSO JÁ SENTENCIADO.

1. A parte vencedora pede a fixação de honorários advocatícios na causa com base em direito superveniente – a lei 13.467/2017, que promoveu a cognominada “Reforma Trabalhista".

2. O direito aos honorários advocatícios sucumbenciais surge no instante da prolação da sentença. Se tal crédito não era previsto no ordenamento jurídico nesse momento processual, não cabe sua estipulação com base em lei posterior, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade da lei.

3. Agravo interno a que se nega provimento.

(STF, 1ª Turma, ARE 1014675 AGR / MG, rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 23.03.2018, negaram provimento, v.u.)

Baseados em tal decisão, muitos estão defendendo a aplicabilidade imediata da Reforma Trabalhista aos processos em curso, sustentando, desse modo, que importaria para a condenação em honorários o momento da prolação da sentença. Contudo, parece-nos prematuro chegar a essa conclusão.

Primeiro, porque não era exatamente essa a temática enfrentada pelo STF. No caso concreto, a parte postulava honorários de sucumbência retroativamente à data da sentença de primeira instância.

Segundo, porque o trecho “O direito aos honorários advocatícios sucumbenciais surge no instante da prolação da sentença.” parece querer dizer apenas que o fato gerador dos honorários é a sentença, sem qualquer pretensão de determinar a tese de direito intertemporal, que deve prevalecer.

Salienta-se que a decisão, ao mencionar que “se tal crédito não era previsto no ordenamento jurídico nesse momento processual, não cabe sua estipulação com base em lei posterior, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade da lei” remete-nos apenas que, se no momento da sentença não havia embasamento legal para condenação em honorários de sucumbência, não é possível tal arbitramento.

Em momento algum, a decisão do STF deixa transparecer que se adotou a segunda corrente, sendo precipitado concluir desse modo com base em uma decisão que pouco ou quase nada abordou sobre o direito intertemporal.


4. QUAL TEORIA ADOTAR?

Ainda é cedo para dizer qual corrente será adotada por nossos Tribunais.

Todavia, com o devido respeito a todas as posições existentes sobre o tema, parece ser mais coerente a corrente que considera como marco temporal o ajuizamento da ação.

Como já dito alhures, essa é a corrente que mais prestigia a segurança jurídica, a boa-fé e a legítima expectativa da parte. Quando se ajuíza uma ação ou quando dela se defende, é comum que a parte faça um “cálculo” dos riscos de sua conduta. Mudar as regras do jogo em seu decorrer faz com que a parte seja pega de surpresa e pode acabar por gerar um privilégio injusto a uma delas.

Por esses motivos, entende-se por mais consentânea aos valores da justiça a corrente que defende a aplicação do artigo 791-A da CLT somente às ações ajuizadas posteriormente à vigência da Reforma Trabalhista.


CONCLUSÃO

A partir da Reforma Trabalhista, os honorários no processo do trabalho passam a ser devidos com a mera sucumbência. Inteligência do artigo 791-A da CLT, ficando ultrapassado o teor da Súmula 219 do TST.

Sobre o aspecto intertemporal do artigo 791-A da CLT, despontam duas correntes interpretativas: a que considera como marco o ajuizamento da ação e a que considera o momento da prolação da sentença.

A corrente que considera o ajuizamento da ação parece mais condizente com os valores da justiça, pois guarda íntima relação com a boa-fé processual, segurança jurídica e legítima expectativa da parte.

A recente decisão do STF, no ARE 1.014.675, tem levado muitos a concluir, de forma açodada, que se adotou a corrente que considera o momento da prolação da sentença. Todavia, conforme se demonstrou, a decisão do STF não tratou especificamente do direito intertemporal dos honorários de sucumbência, sendo precipitada qualquer conclusão em tal sentido.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SCHIAVI, Mauro. A reforma trabalhista e o processo do trabalho: aspectos processuais da Lei n. 13.467/17 – 2 ed. – São Paulo: LTR, 2018.

BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Planalto.gov.br. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm. Acesso em: 23 de abril de 2018.

BRASIL. Código de Processo Civil. Planalto.gov.br. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 23 de abril de 2018.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo. Relator: Min. Alexandre de Moraes.Data de Publicação DJE 12/04/2018 - Ata Nº 46/2018. DJE nº 70, divulgado em 11/04/2018 Disponível em: < http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5102061>

Sobre o autor
André Yudi Hashimoto Hirata

Graduado em Direito pelas Faculdades Integradas “Antônio Eufrásio de Toledo”, em Presidente Prudente (SP); pós-graduado em Direito Civil pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Analista Judiciário - Área Judiciária no Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HIRATA, André Yudi Hashimoto. Os honorários trabalhistas e a recente decisão do STF no ARE 1.014.675. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5446, 30 mai. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/66517. Acesso em: 22 nov. 2024.

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