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Nepotismo, democracia, cidadania

Agenda 08/05/2005 às 00:00

            Nepotismo, segundo define o Dicionário Houaiss, é o favoritismo para com parentes, especialmente pelo poder público.

            A proibição da prática do nepotismo decorre do sistema democrático. Uma boa interpretação da Constituição Federal de 1988, com recurso à exegese sistemática e teleológica, já deixaria ao desamparo, em qualquer hipótese, a contratação de parentes por parentes, no serviço público.

            Mas, nesta matéria, os vícios são arraigados. As pormenorizações, os fechamentos de atalhos passam a ser indispensáveis para coibir os abusos.

            O concurso como forma de ingresso no serviço público está expressamente consagrado no texto constitucional. Há uma única possibilidade de entrada sem concurso. A exceção socorre o ex-combatente que tenha participado efetivamente de operações bélicas durante a Segunda Guerra Mundial. Ainda que esse artigo tenha pouca eficácia hoje, uma vez que a Segunda Guerra terminou em 1945, vale pelo sentido cívico que carrega.

            A proibição de servir o servidor público sob a direção imediata de cônjuge ou parente é outra medida moralizadora.

            Providência de combate eficaz ao nepotismo está na redução do número de cargos comissionados nos poderes Legislativo, Judiciário e Executivo. Esta providência vem sendo defendida pelo coordenador executivo da organização não-governamental Transparência Brasil, Cláudio Abramo.

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            A pesquisa nas fontes históricas revela a origem popular da luta contra o nepotismo.

            A Constituinte que votou a Carta Magna de 1988 recepcionou emendas populares, isto é, emendas apresentadas por organizações da sociedade civil e subscritas por cidadãos.

            As emendas populares de número 15 e 31 advogaram a obrigatoriedade do concurso, como forma de ingresso no serviço público. Patrocinaram referidas emendas a Mitra Arquidiocesana do Rio de Janeiro, a Cáritas, a Irmandade de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, a Associação de Moradores do Alagamar, o Clube de Mães Guiomar Ramos e um Centro Sócio-Cultural do Rio Grande do Norte.

            Nos mais diversos Estados da Federação, Comitês Pró-Participação Popular na Constituinte retomaram a bandeira federal e a fizeram bandeira estadual. Como resultado da pressão popular, em alguns Estados da Federação estabeleceram-se preceitos moralizadores até mais precisos do que os previstos pela Constituição da República.

            É extremamente relevante que se lute contra o nepotismo. Porta digna para entrar no serviço público é o concurso. A janela é, de longa tradição até na literatura, a entrada dos salteadores.

            Em todos os cargos, em todos os Poderes, em todas as órbitas de governo, os critérios de ingresso e de promoção, nas diversas carreiras, devem ser baseados no mérito.

            Concursos transparentes constituem um estímulo para os jovens. Ao contrário disso, entradas oblíquas, etiquetas de família, concursos à moda da casa, cargos hereditariamente obtidos pelo critério de suposto sangue azul são formas de corrupção que atentam contra a cidadania.

Sobre o autor
João Baptista Herkenhoff

Magistrado aposentado (ES), professor, escritor, palestrante. Autor, dentre outros livros, de: Direito e Utopia (Livraria do Advogado Editora, Porto Alegre).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HERKENHOFF, João Baptista. Nepotismo, democracia, cidadania. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 672, 8 mai. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6700. Acesso em: 22 nov. 2024.

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