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Distinção entre fato e vício para apuração da responsabilidade do fornecedor de produtos e serviços no âmbito da relação consumerista

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Agenda 10/08/2018 às 23:07

RESPONSABILIDADE PELO FATO E RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO E DO SERVIÇO

Por ser tão frequente se falar em compra de produto que apresentou algum defeito, quando, na realidade, o problema em questão se trata de um vício - bem como a distinção envolvendo os prazos para reclamação e quem deve ser acionado para tanto - é que se tornou imperioso o esclarecimento quanto às características de cada um destes conceitos, uma vez que os institutos jurídicos defeito e vício, ao contrário do que se pensa, não se equivalem.

Distinção entre fato e vício

O Código de Defesa do Consumidor, buscando responsabilizar o fornecedor nas diferentes situações ensejadoras de sua responsabilidade, estabeleceu dois sistemas de responsabilização: Responsabilidade Civil por fato do produto ou serviço (artigos 12 a 17 do CDC) e responsabilidade pelo vício do produto ou do serviço (artigos 18 a 25 do mesmo diploma legal). A diferença entre estes institutos (sistemas) reside no dano sofrido pelo consumidor, bem como no regime jurídico a eles aplicado.

Assim, por questões de melhor compreensão do tema, passa-se a tratar do primeiro deles: o vício. Tal sistema guarda grande semelhança com outro sistema, o de vícios redibitórios estabelecido no CCB/O2, já que na Legislação Civilista fala-se em vícios que tornem a coisa imprópria ao uso a que se destina ou que lhe diminuam o seu valor, mas que com aquele não se confunde.

Isto porque, o CDC regula as relações de consumo, assim entendidas como relação jurídica bilateral, na qual o fornecedor disponibiliza um produto ou serviço ao consumidor, objetivando atender as necessidades deste, com base na dinamicidade inerente a tal relação, o que não pertine aos vícios redibitórios.

O vício oriundo da relação de consumo, este sim objeto de análise do presente estudo, está previsto, quando se tratar de vício de produto, no art. 18 do CDC, ao passo que quando o assunto for vício de serviço, o artigo da Legislação Consumerista é o 20.

O artigos falam que os fornecedores de produtos ou seviços de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

Percebe-se que seja o vício oriundo de produto, seja de serviço, ambos remetem à questão da funcionalidade, ou seja, quando o produto ou serviço não atinge a função ou finalidade esperada. O que se coíbe é a imprestabilidade do produto ou serviço que, uma vez verificada, legitima o consumidor a pleitear as alternativas taxativamente oferecidas a ele pelo CDC.

Assim, o vício é denominado de dano intrínseco (aquele que não atinge a função do produto ou serviço, sem provocar, no entanto, danos físicos ao consumidor), podendo ser tanto de qualidade quanto de quantidade.

Nessa perspectiva, cite-se, no caso de qualidade, um rádio que não emite som; e no caso de quantidade, uma caixa de chocolate que dizia conter 16 unidades, mas que só continha 12 das 16 unidades prometidas. Tais exemplos mostram que houve ruptura à boa-fé objetiva, ou seja, ao dever de lealdade, o que, não obstante, ensina Lisboa (2010, pp 77-78):

O dano patrimonial ou extrapatrimonial imposto ao consumidor é resultado, muitas vezes, da vulneração do princípio da boa-fé objetiva, como norma de conduta que se espera das partes. Constata-se a violação a esse princípio pelo simples prejuízo causado, como ofensa ao dever lateral ou acessório de abstenção ou omissão (obrigação de não fazer em sentido lato), consistente na não realização de conduta que razoavelmente se podia esperar durante o fornecimento do produto ou do serviço. E qual é essa conduta? O fornecimento de um produto ou serviço sem vício, isto é, adequado e seguro para fins que ordinariamente o consumidor poderia dele esperar. (LISBOA, 2010, pp. 77-78).

Assim, conforme disposição legal, não sendo o vício sanado no prazo decadencial de 30 dias - ou entre 7 e 180 dias – caso convencionado este último interstício pelas partes (prazos estes que mais adiante serão tratados), o consumidor terá direito a exigir, alternativamente e a sua escolha: a substituição do produto por outro da mesma espécie e em perfeitas condições (no caso de serviço, fala-se em reexecução); a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo, ainda, de eventuais perdas e danos (para a doutrina, a possibilidade de perdas e danos é válida também para as demais alternativas); e o abatimento proporcional do preço (caso queira ficar com o produto ou serviço nas condições apresentadas).

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Tal sistema visa à proteção econômica do consumidor de usufruir do bem conforme as expectativas legítimas que criou quando de sua aquisição. Por fim, a responsabilidade por vício do produto ou serviço (qualidade ou quantidade) é sempre solidária(2) entre toda a cadeia produtiva, seja o vício decorrente de produto durável ou não (art. 18, caput, do CDC).

A responsabilidade pelo fato, a seu turno, está prevista nos artigos 12 e 14 do CDC, tratando aquele de produto e este de serviço.

O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Já fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Em ambos os casos, o CDC responsabiliza o fornecedor pelo defeito do produto ou serviço, ou seja, quando um ou outro não oferece a segurança que o consumidor esperava.

Diferentemente do vício, o fato é um dano extrínseco, assim tido por trazer repercussão negativa à saúde física ou mental do consumidor, possibilitando a sua classificação como um “vício qualificado”, já que o produto ou serviço além de impróprio ao consumo/uso, também trouxe danos de ordem física ou moral ao consumidor.

Para melhor compreensão, cite-se um exemplo de fato (ou como antes dito, vício qualificado): determinado consumidor ao comprar um automóvel percebe, quando voltava da concessionária, que os freios do seu veículo não funcionavam, razão pela qual ao tentar desviar de um transeunte que ali passava, bateu em um poste e sofreu várias fraturas.

Percebe-se, portanto, que o vício no freio acarretou consequências de ordem física ao consumidor, consequências estas que ultrapassaram o caráter meramente patrimonial do dano, de modo a atingir a integridade física do hipossuficiente.

Logo, o sistema de responsabilidade pelo fato é aplicável apenas aos casos de acidente de consumo causadores de danos extrínsecos ao consumidor, em razão de defeitos que ponham em xeque a sua segurança.

Importante é destacar que, ao contrário do que ocorre com a responsabilidade pelo vício do produto (em que há solidariedade expressa entre toda a cadeia de fornecedores), na responsabilidade decorrente de defeito do produto ou serviço, o dever de reparar é, em regra, o fabricante, produtor, construtor ou importador.

O comerciante responderá, de forma subsidiária(3), apenas, se aquelas pessoas não puderem arcar com os prejuízos provocados.

No entanto, o comerciante responderá igualmente com as pessoas a pouco mencionadas se as mesmas não puderem ser identificadas; o produto for fornecido sem identificação clara delas; ou se o comerciante não conservar adequadamente os produtos.

A diferença entre a responsabilidade por fato e a responsabilidade por vício é que nesta há um problema que causa o mau funcionamento do produto ou serviço, enquanto que naquela há um defeito que causa danos mais amplos ao consumidor: de ordem física e/ou moral.

Assim sendo, vício é todo problema que obsta ao produto ou serviço de atingir sua finalidade, sem, contudo, trazer danos à segurança do consumidor, ao passo que defeito é, necessariamente, um vício agravado pela existência de dano efetivo à segurança do hipossuficiente.

Vício e prazo decadencial

Os problemas oriundos da relação de consumo só poderão ser sanados pelo fornecedor, caso o mesmo tenha sido acionado pelo consumidor dentro do prazo estabelecido em lei.

Assim sendo, no caso de vício de produto ou de serviço, o consumidor terá o prazo decadencial de 30 ou 90 dias para acionar o fornecedor, variando conforme o caso.

Logo, quando estiver o consumidor diante de vício de produto ou serviço não durável, o prazo será de 30 dias, ao passo que quando se tratar de produtos ou serviços duráveis, o prazo sofrerá uma dilação, somando 90 dias.

São duráveis os produtos que não desaparecem com o uso, como carro e geladeira; já os não duráveis tendem a se acabar logo após o uso, como é o caso dos alimentos.

Assim como os produtos, os serviços podem ser duráveis ou não duráveis. Os serviços duráveis são aqueles que custam a desaparecer após o uso, a exemplo da pintura de uma casa ou de uma prótese dentária; já os não duráveis tendem a sumir com mais facilidade, como é o caso de uma faxina ou de um serviço de lavanderia.

O termo inicial da contagem do prazo decadencial se inicia da entrega do produto, mas em se tratando de serviço, do término de sua execução, como não obstante prevê o art. art. 26, §1º da Legislação Consumerista, quando de forma implícita trata dos vícios aparentes, definidos como de fácil constatação. O vencimento do prazo de validade de produtos perecíveis é um exemplo de vício aparente.

Quando o vício for oculto, ou seja, de difícil constatação, o prazo decadencial será iniciado a partir da constatação do vício pelo hipossuficiente, como no caso de problema no sistema de freio de determinado veículo.

Os prazos para o consumidor reclamar dos vícios constatados em produtos adquiridos ou contratação de serviços são denominados de garantia legal(4), não podendo ser confundidos com os da garantia contratual4. A última é conferida mediante termo escrito e padronizado que esclarecerá de maneira adequada em que consiste a garantia, a forma, o prazo, o lugar em que poderá ser exercitada e as despesas que ficarão a cargo do consumidor. Já em relação à garantia legal, o direito de reclamar independe de certificado de garantia, bastando à apresentação de um documento que comprove a compra.

Por fim, importante é perceber que para vício, o instituto jurídico utilizado que trata da contagem de prazo é o decadencial (e não prescricional), pois o que se extingue é o próprio direito material pelo decurso do tempo.

É instituto do direito substantivo, há a perda de um direito previsto em lei. O legislador estabelece que certo ato terá que ser exercido dentro de um determinado tempo, fora do qual ele não poderá mais efetivar-se porque dele decaiu o seu titular. A decadência se consubstancia, pois, no decurso infrutífero de um termo prefixado para o exercício do direito. O tempo age em relação à decadência como um requisito do ato, pelo que a própria decadência é a sanção consequente da inobservância de um termo. (GONÇALVES, 2010, p. 532).

Assim sendo, o fornecedor possui o prazo decadencial de 30 dias para sanar o vício, o que não acontecendo, caberá ao consumidor a sua escolha e de forma alternativa: exigir a substituição do produto por outro igual e em perfeitas condições (ou se preferir, exigir a devolução do valor pago) ou, ainda, o abatimento proporcional do preço, conforme visto no capítulo antecedente.

Fato e prazo prescricional

Por outro lado, a Responsabilidade Civil pelo fato do produto ou serviço proporciona o direito da vítima de reclamar os danos sofridos em até 5 anos, a partir do evento e momento em que se tornou conhecida sua autoria, conforme prevê o art. 27 da Legislação Consumerista.

Ocorre que, diferentemente do que acontece no caso de vício, o prazo para fato é o prescricional, de modo que o consumidor poderá se valer da propositura de ação indenizatória para que seja reparado pelos danos sofridos.

O prazo prescricional leva a perda do direito de ação, não extinguindo o direito em si, como ocorre com os prazos decadenciais, mas de forma indireta, prejudicando-o, já que uma vez extinta a sua forma de proteção, o direito propriamente dito perde sua garantia de eficácia, apesar de não impedir um acordo, de forma interna, entre as partes.

A violação do direito subjetivo cria para o seu titular a pretensão, ou seja, o poder de fazer valer em juízo, por meio de uma ação (em sentido material), a prestação devida, o cumprimento da norma legal ou contratual infringida ou a reparação do mal causado, dentro de um prazo legal. (DINIZ, 2010, p. 406).

Assim sendo, o consumidor goza do prazo prescricional (e não decadencial como no caso de vício) para acionar o Poder Judiciário e pleitear reparação pelos danos sofridos.

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