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Inconstitucionalidade da sindicância patrimonial

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Agenda 18/09/2018 às 16:20

III. DA INCONSTITUCIONALIDADE DAS QUEBRAS DE SIGILO BANCÁRIO E FISCAL DO AGENTE PÚBLICO NA SINDICÂNCIA PATRIMONIAL

Como visto, no tópico anterior, a sindicância patrimonial é inconstitucional, por ferir de forma frontal o princípio da legalidade (art. 5º, II, da CF), tendo em vista que foi gerada pelo Decreto nº 5483/2005, que não respeitou a necessidade de reserva de lei de iniciativa do Presidente da República para a sua validade formal e jurídica (art. 61, § 1º, II, c, da CF).

Não bastasse o vício de inconstitucionalidade, o Decreto nº 5483/2005 autoriza que a Receita Federal faça convênio com a Controladoria Geral da União, para que forneça, por meio eletrônico, cópia da declaração anual do agente público que houver optado pelo cumprimento da obrigação, na forma prevista no § 2º do artigo 3º, do aludido Decreto.

Aliás, essa é a dicção do art. 11, do Decreto nº 5483/2005.

“Art. 11.  Nos termos e condições a serem definidos em convênio, a Secretaria da Receita Federal poderá fornecer à Controladoria-Geral da União, em meio eletrônico, cópia da declaração anual do agente público que houver optado pelo cumprimento da obrigação, na forma prevista no § 2o do art. 3o deste Decreto.

§ 1o  Compete à Controladoria-Geral da União informar à Secretaria da Receita Federal o rol dos optantes, nos termos do § 2o do art. 3o deste Decreto, com o respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas e o exercício ao qual correspondem as mencionadas declarações.

§ 2o  Caberá à Controladoria-Geral da União adotar medidas que garantam a preservação do sigilo das informações recebidas, relativas à situação econômica ou financeira do agente público ou de terceiros e à natureza e ao estado de seus negócios ou atividades.”

Visando a regulamentar o Sistema de Correição do Poder Executivo Federal, de que trata o Decreto nº 5.480/2005, a CGU baixou a Portaria nº 335, de 30.05.2006.

Para fins da aludida Portaria nº 335/2006, o seu artigo 4º estabelece as seguintes definições dos instrumentos correicionais por ela regulamentadas:

“I - investigação preliminar: procedimento sigiloso, instaurado pelo Órgão Central e pelas unidades setoriais, com objetivo de coletar elementos para verificar o cabimento da instauração de sindicância ou processo administrativo disciplinar;

II - sindicância investigativa ou preparatória: procedimento preliminar sumário, instaurada com o fim de investigação de irregularidades funcionais, que precede ao processo administrativo disciplinar, sendo prescindível de observância dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa;

III - sindicância acusatória ou punitiva: procedimento preliminar sumário, instaurada com fim de apurar irregularidades de menor gravidade no serviço público, com caráter eminentemente punitivo, respeitados o contraditório, a oportunidade de defesa e a estrita observância do devido processo legal;

IV - processo administrativo disciplinar: instrumento destinado a apurar responsabilidade de servidor público federal por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido;

V - sindicância patrimonial: procedimento investigativo, de caráter sigiloso e não-punitivo, destinado a apurar indícios de enriquecimento ilícito por parte de agente público federal, à vista da verificação de incompatibilidade patrimonial com seus recursos e disponibilidades;

VI - inspeção: procedimento administrativo destinado a obter diretamente informações e documentos, bem como verificar o cumprimento de recomendações ou determinações de instauração de sindicância, inclusive patrimonial, e processos administrativos disciplinares, a fim de aferir a regularidade, a eficiência e a eficácia dos trabalhos.”

A investigação preliminar, criada pela aludida Portaria CGU nº 335/2006, apesar de não ser objeto do nosso estudo, também carece de reserva de lei para a sua concepção, pois cria uma fase investigatória sigilosa, realizada de ofício ou com base em denúncia ou representação recebida, que antecede a instauração de sindicância ou processo administrativo disciplinar, e poderá ser iniciada pelas Corregedorias ou outras autoridades, nominadas no art. 6º da citada Portaria.

Para não dar maior dimensão ao presente tema, deixamos de abordar alguns aspectos de ordem legal que invalidam a investigação preliminar nesta oportunidade, para não desfocar do tema central inerente à sindicância patrimonial.

O artigo 16, da Portaria CGU nº 335/2006, descreve a sindicância patrimonial como procedimento investigativo, de caráter sigiloso e não punitivo, destinada a apurar indícios de enriquecimento ilícito por parte do agente público federal, “a partir da verificação de incompatibilidade patrimonial com seus recursos e disponibilidades”, como se verifica:

“Art. 16. A sindicância patrimonial constitui procedimento investigativo, de caráter sigiloso e não punitivo, destinado a apurar indícios de enriquecimento ilícito por parte de agente público federal, a partir da verificação de incompatibilidade patrimonial com seus recursos e disponibilidades, e será iniciada mediante determinação do Ministro de Estado do Controle e da Transparência, do Secretário-Executivo da Controladoria-Geral da União, do Corregedor-Geral ou dos Corregedores-Gerais Adjuntos;

§ 1º A sindicância patrimonial será realizada de ofício ou com base em denúncia ou representação recebida.

§ 2º A autoridade instauradora da sindicância patrimonial, deverá ser de cargo ou função de nível hierárquico equivalente ou superior ao do servidor ou empregado sob julgamento. § 3º Aplica-se à denúncia ou representação o disposto nos § 1º, § 2º e

§ 3º do art. 6º desta Portaria.”

Como visto, o próprio artigo 16 da Portaria CGU 335/2006 parte de uma flagrante inconstitucionalidade, que é a verificação de incompatibilidade patrimonial do agente público federal com seus recursos e disponibilidades, sem que haja uma quebra de sigilos fiscais e bancários deferidos pela via judicial.

Isto porque, para verificar se há ou não indícios de enriquecimento ilícito por parte do agente público a partir da constatação de incompatibilidade patrimonial, em tese, a esfera correicional, obrigatoriamente, é instada a invadir o sigilo de dados do agente, verificando a priori a disponibilidade financeira e fiscal, para fins de uma busca de indícios de um pretenso enriquecimento ilícito do mesmo.

Não há como apurar indícios de enriquecimento ilícito por parte de agente público a partir da verificação de incompatibilidade patrimonial com a renda arguida pelo mesmo, sem que haja a devida pesquisa na vida financeira/fiscal/bancária do investigado.

O patrimônio do contribuinte, aí incluído o agente público, pode sofrer diminuição (decréscimo patrimonial) ou aumento (acréscimo patrimonial).

Para fins tributários, o acréscimo patrimonial somente poderá ser justificado com base no total dos rendimentos e receitas líquidas, sejam eles tributáveis, não tributáveis ou sujeitos à tributação exclusiva na fonte, acrescido de outras receitas, tais como venda de bens integrantes do patrimônio do próprio contribuinte.

Nessas circunstâncias, a soma dos rendimentos líquidos deverá, sempre, ser superior ao acréscimo patrimonial no respectivo período, caso contrário, se o aumento for superior ao total de rendimentos declarados, caracteriza-se, em tese, “acréscimo patrimonial a descoberto”, tributável pelo imposto de renda, na forma do art. 55, XIII, do RIR/99.

Cabe ressaltar que nem todo acréscimo patrimonial a descoberto resulta de sonegação fiscal ou em prática de ato ilícito, pois pode ter origem em erro de preenchimento da declaração de bens, ou de recursos recebidos de forma lícita, que por equívoco ou esquecimento não foi lançado na declaração anual de rendas do agente público.

O acréscimo patrimonial pode ser coberto pela renda líquida do contribuinte ou a descoberto, onde há o aumento do patrimônio sem uma renda declarada.

Sucede que, para se verificar se há ou não omissão de receita ou patrimônio a descoberto, a sindicância patrimonial terá que fazer consultas, requisições de informações fiscais e bancárias que, necessariamente, se não houver espontaneidade do agente público no atendimento fornecido dos documentos fiscais e bancários necessários, caracterizarão a quebra de seu sigilo pela Comissão de Sindicância[21], em total violação ao art. 5º, incs. X e XII da CF.

Aliás, sobre o afastamento de sigilo e realizações de perícias, quando dirigidas à Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda, o § 1º do art. 18, da Portaria CGU nº 335/2205, é explícita em “permitir”quebra do sigilo fiscal, fazendo apenas ressalva quanto ao afastamento do sigilo bancário, que deverá ser requerida pela Advocacia-Geral da União (§ 2º, do art. 18, da Portaria CGU nº 335/2005).

Assim, se o agente renunciar aos sigilos fiscal e bancário (§ 3º, do art. 18, da Portaria CGU nº 335/2005), o artigo 18 da citada Portaria permite o seu afastamento interno para a instrução do procedimento relativo à sindicância patrimonial:

“Art. 18. Para a instrução do procedimento, a comissão efetuará as diligências necessárias à elucidação do fato, ouvirá o sindicado e as eventuais testemunhas, carreará para os autos a prova documental existente e solicitará, se necessário, o afastamento de sigilos e a realização de perícias. § 1º As consultas, requisições de informações e documentos necessários à instrução da sindicância, quando dirigidas à Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda, deverão ser feitas por intermédio dos Corregedores-Gerais Adjuntos, observado o dever da comissão de, após a transferência, assegurar a preservação do sigilo fiscal. § 2º A solicitação de afastamento de sigilo bancário deve ser encaminhada à Advocacia-Geral da União, com as informações e documentos necessários para o exame de seu cabimento. § 3º A comissão deverá solicitar do sindicado, sempre que possível, a renúncia expressa aos sigilos fiscal e bancário, com a apresentação das informações e documentos necessários para a instrução do procedimento.”

Não havendo renúncia expressa do agente público aos sigilos fiscal e bancário, como visto, será providenciado pela Comissão de Sindicância Patrimonial a quebra do sigilo fiscal, em flagrante violação à privacidade do investigado.

Na trilha da inconstitucionalidade, o art. 25, da Portaria CGU nº 335/2006, disciplina que a quebra do sigilo fiscal do agente investigado deverá seguir os seguintes termos:

“Art. 25. No fornecimento, a órgãos, entidades e autoridades requisitantes ou solicitantes, de informações protegidas por sigilo fiscal, deverão ser observados os seguintes procedimentos, sem prejuízo dos demais previstos na legislação pertinente: I - constará, em destaque, na parte superior direita de todas as páginas da correspondência que formalizar a remessa das informações, bem assim dos documentos que a acompanharem, a expressão "INFORMAÇÃO PROTEGIDA PELO SIGILO FISCAL", impressa ou aposta por carimbo; II - as informações serão enviadas em dois envelopes lacrados: a) um externo, que conterá apenas o nome ou a função do destinatário e seu endereço, sem qualquer anotação que indique o grau de sigilo do conteúdo; b) um interno, no qual serão inscritos o nome e a função do destinatário, seu endereço, o número do documento de requisição ou solicitação, o número da correspondência que formaliza a remessa e a expressão "INFORMAÇÃO PROTEGIDA PELO SIGILO FISCAL"; III - envelope interno será lacrado e sua expedição será acompanhada de recibo; IV - o recibo destinado ao controle da custódia da informação: a) conterá, necessariamente, indicações sobre o remetente, o destinatário, o número do documento de requisição ou solicitação e o número da correspondência que formaliza a remessa; b) será arquivado na unidade remetente, após comprovação da entrega do envelope interno ao destinatário ou responsável pelo recebimento.”

Relativamente ao sigilo bancário do sindicado investigado patrimonialmente, o art. 26, da Portaria CGU nº 335/2006, estabelece que o mesmo deverá ser autorizado judicialmente:

“Art. 26. Relativamente ao sigilo bancário, quando o afastamento for autorizado judicialmente, o fornecimento de informações e documentos pelo Órgão Central ou unidades setoriais deverá ser previamente autorizado pelo Poder Judiciário.”

Contudo, a Administração Pública, mais uma vez, em total usurpação de competência legal, baixou a Ordem de Serviço nº 265/2006 do Secretário Executivo da CGU, no exercício de suas atribuições instituídas no art. 24 do Anexo ao Decreto nº 5.683/2005, onde a título de disciplinar os procedimentos de investigação patrimonial preliminar e sindicância patrimonial, “concedeu” à Comissão de Sindicância a faculdade, com base no art. 198, § 1º, inciso II, da Lei nº 5.172/66 (CTN), com a redação dada pelo artigo 1º, da Lei Complementar nº 104, de 10 de janeiro de 2001, o “direito” de solicitar informações de natureza fiscal do investigado:

“Art. 5º A Corregedoria-Geral da União, com fundamento nas informações encaminhadas pela SPCI, decidirá pela instauração de sindicância patrimonial, PAD ou pelo arquivamento.

Parágrafo Único. O procedimento de sindicância patrimonial ou PAD observará o disposto na Portaria CGU nº. 335, de 30 de maio de 2006.

Art. 6º A comissão decidirá, com fundamento no art. 198 , § 1º, inciso II, da Lei  nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), com a redação dada pelo artigo 1º da Lei Complementar n.º 104, de 10 de janeiro 2001, quanto à necessidade de solicitação de informações de natureza fiscal relativas ao investigado.

Parágrafo Único. As solicitações de informações fiscais direcionadas à Secretaria da Receita Federal e demais órgãos de Administração Tributária serão expedidas pelo Secretário-Executivo, ou autoridade por ele indicada.

Art. 7º O presidente da comissão de sindicância patrimonial ou PAD providenciará o encaminhamento das informações fiscais à SPCI para que, por intermédio da DIE, seja efetuada a análise patrimonial.

§ 1º – A DIE elaborará documento denominado “Informação de Análise Patrimonial” sobre a evolução patrimonial do investigado, que conterá, inclusive, a análise do fluxo de caixa.

Art. 8º A Comissão notificará o investigado para apresentar esclarecimentos sobre as conclusões da análise patrimonial, pessoalmente ou por procurador.

Art. 9º Da sindicância patrimonial poderá resultar a instauração de Processo Administrativo Disciplinar, quando houver indícios de enriquecimento ilícito do agente público, ou o arquivamento dos autos.

Art. 10 Aplica-se o disposto nos artigos 6º e 7º desta Ordem de Serviço às sindicâncias e aos processos administrativos disciplinares - PAD em curso, que necessitam de análise patrimonial.”

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As ilegalidades e os abusos do direito de investigar são tantos, que a sindicância patrimonial, definida no art. 9º do Decreto nº 5483/2005 como “procedimento sigiloso meramente investigatório”  que poderá ser arquivada quanto concluída, ou, se for o caso, ser convertido “em processo administrativo disciplinar” (§ 3º, do art. 9º, do Decreto nº 5483/2005), invade a competência do próprio processo administrativo, quando lhe é outorgada a condição de se valer do artigo 198, § 1º, inc. II, do CTN.

Isso mesmo, a Sindicância Patrimonial usurpa a competência do processo administrativo, por ser um procedimento investigatório preliminar, que antecede o processo disciplinar, visto que o CTN somente confere poderes investigatórios quando instaurado o regular processo administrativo.

Para chegar-se a tal conclusão, basta verificar o disposto no art. 198, II, do CTN:

“Art. 198. Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades.   

§ 1º. Excetuam-se do disposto neste artigo, além dos casos previstos no art. 199, os seguintes:

II – solicitações de autoridade administrativa no interesse da Administração Pública, desde que seja comprovada a instauração regular de processo administrativo, no órgão ou na entidade respectiva, com o objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refere a informação, por prática de infração administrativa.     

§ 2o O intercâmbio de informação sigilosa, no âmbito da Administração Pública, será realizado mediante processo regularmente instaurado, e a entrega será feita pessoalmente à autoridade solicitante, mediante recibo, que formalize a transferência e assegure a preservação do sigilo.”  

Assim sendo, como legitimar-se a solicitação de autoridade administrativa (em fase preliminar ou em sindicância patrimonial), no interesse da “Administração Pública” de obter informações fiscais e/ou bancárias se não há a “instauração regular de processo administrativo, no órgão ou na entidade respectiva, com o objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refere a informação, por prática de infração administrativa” (inc. II, art. 198 do CTN)?

O intercâmbio de informação sigilosa do agente público não pode ser utilizado em sindicância patrimonial, e nem em investigação preliminar que antecede a mesma, em face da ausência de instauração de regular processo administrativo, preconizado pelo CTN como condição mínima de procedibilidade.

Tal recomendação (de instauração de regular processo administrativo) não é nova no cenário tributário/fiscal, tornando-se conveniente anotar que a Lei nº 4.595/64, que dispõe sobre a política e as Instituições Monetárias, Bancárias e Creditícias, criando o Conselho Monetário Nacional e dando outras providências, concedeu aos agentes fiscais tributários do Ministério da Fazenda a prerrogativa de exame de documentos, livros e registro de contas de depósito, quando houver processo instaurado:

“Art. 38. As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.

(...)

§ 5º. Os agentes fiscais tributários do Ministério da Fazenda e dos Estados somente poderão proceder a exame de documentos, livros e registros de contas de depósitos quando houver processo instaurado e os mesmos forem considerados indispensáveis pela autoridade competente.

§ 6º. O disposto no parágrafo anterior se aplica igualmente à prestação de esclarecimentos e informes pelas instituições financeiras às autoridades fiscais, devendo sempre estas e os exames serem conservados em sigilo, não podendo ser utilizados se não reservadamente.

§ 7º A quebra do sigilo de que trata este artigo constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a quatro anos, aplicando-se, no que couber, o Código Penal e o Código de Processo Penal, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.”

Na aplicação do direito material pela autoridade administrativa tributária, alguns atos devem ser praticados de forma ordenada, e com observância dos direitos do contribuinte. Por isso deve existir um processo administrativo tributário capaz de legitimar a atuação fiscalizatória do Estado.

Da mesma forma, a exigência de processo administrativo disciplinar garante a regra do due process of law para o agente público, permitindo ao poder público a iniciativa de atos que somente poderão ser praticados com a sua instauração.

Inverter tal ônus, através da criação de uma investigação patrimonial com intercâmbio de informações sigilosas movimentada por sindicância patrimonial, que antecede ao processo disciplinar, é algo que não possui lastro em nosso sistema jurídico sancionador, ainda mais quando se invade a privacidade fiscal do contribuinte que exerce função pública.

Não pode haver dois sistemas de investigação patrimonial, um para agentes públicos e outro para os contribuintes que não possuem vínculo com o poder público, pois o princípio da isonomia tributária vedaria tal discriminação.

No desempenho da fiscalização, a Receita Federal realiza os seguintes procedimentos fiscais: fiscalização e diligência.

Fiscalização são as ações que objetivam a verificação do cumprimento das obrigações tributárias relativas aos tributos e contribuições administradas pela Secretaria da Receita Federal.

As diligências são as ações destinadas a coletar informações ou outros elementos de interesse da administração tributária, inclusive para atender exigência de instrução processual.

Ou seja, para exercer diligência fiscal nos contribuintes, a exemplo da ação fiscal, deve a autoridade tributária estar munida de Mandado de Procedimento Fiscal, contido nas regras instituídas pelo Decreto n ° 70235/1972, regulado pelo parágrafo único, do artigo 2°, da Portaria nº 6.087/2005 da Secretaria da Receita Federal do Brasil.

O artigo 2°, da Portaria nº 6.087/2005 estipula:

"Art 2°. Os procedimentos fiscais relativos a tributos e contrições administrados pela SRF  serão executados, em nome desta, pelos Auditores Fiscais da Receita Federal (AFRF) e instaurados mediante Mandado de Procedimento Fiscal

Parágrafo Único – Para o procedimento de fiscalização será emitido Mandado de Procedimento Fiscal – Diligência (MPF-D).” (g.n.)

No artigo 8º da Lei 8.021/90, que dispõe sobre a identificação dos contribuintes para fins fiscais, também fora prevista a solicitação de informações bancárias pela autoridade fiscal, para fins fiscalizatórios, desde que iniciado o procedimento fiscal:

"Art. 8°. Iniciado o procedimento fiscal, a autoridade fiscal poderá solicitar informações sobre operações realizadas pelo contribuinte em instituições financeiras, inclusive extratos de contas bancárias, não se aplicando, nesta hipótese, o disposto no art. 38 da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964.

Parágrafo único. As informações, que obedecerão às normas regulamentares expedidas pelo Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, deverão ser prestadas no prazo máximo de dez dias úteis contados da data da solicitação, aplicando-se, no caso de descumprimento desse prazo, a penalidade prevista no § 1 ° do art. 7°."

Da mesma forma, o art. 6º, da Lei Complementar nº 105/2001, que dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras, estabeleceu a necessidade da instauração de processo administrativo para as autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, como condição de examinarem documentos, livros e registros de instituições financeiras, contas de depósito, e etc., litteris:

“Art. 6º. As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.

Parágrafo único. O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária.”

A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça – STJ[22], fazendo uma retrospectiva da legislação tributária, tem como válida a investigação patrimonial do contribuinte, desde que instaurado o processo administrativo tributário:

“PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO.  QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. CONSTITUIÇÃO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS REFERENTES A FATOS IMPONÍVEIS ANTERIORES À VIGÊNCIA DA LEI COMPLEMENTAR 105/2001. APLICAÇÃO IMEDIATA. ARTIGO 144, § 1º, DO CTN. EXCEÇÃO AO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE.

1. A quebra do sigilo bancário sem prévia autorização judicial, para fins de constituição de crédito tributário não extinto, é autorizada pela Lei 8.021/90 e pela Lei Complementar 105/2001, normas procedimentais, cuja aplicação é imediata, à luz do disposto no artigo 144, § 1º, do CTN.

2. O § 1º, do artigo 38, da Lei 4.595/64 (revogado pela Lei Complementar 105/2001), autorizava a quebra de sigilo bancário, desde que em virtude de determinação judicial, sendo certo que o acesso às informações e esclarecimentos, prestados pelo Banco Central ou pelas instituições financeiras, restringir-se-iam às partes legítimas na causa e para os fins nela delineados.

3. A Lei 8.021/90 (que dispôs sobre a identificação dos contribuintes para fins fiscais), em seu artigo 8º, estabeleceu que, iniciado o procedimento fiscal para o lançamento tributário de ofício (nos casos em que constatado sinal exterior de riqueza, vale dizer, gastos incompatíveis com a renda disponível do contribuinte), a autoridade fiscal poderia solicitar informações sobre operações realizadas pelo contribuinte em instituições financeiras, inclusive extratos de contas bancárias, não se aplicando, nesta hipótese, o disposto no artigo 38, da Lei 4.595/64.

4. O § 3º, do artigo 11, da Lei 9.311/96, com a redação dada pela Lei 10.174, de 9 de janeiro de 2001, determinou que a Secretaria da Receita Federal era obrigada a resguardar o sigilo das informações financeiras relativas à CPMF, facultando sua utilização para instaurar procedimento administrativo tendente a verificar a existência de crédito tributário relativo a impostos e contribuições e para lançamento, no âmbito do procedimento fiscal, do crédito tributário porventura existente.

5. A Lei Complementar 105, de 10 de janeiro de 2001, revogou o artigo 38, da Lei 4.595/64, e passou a regular o sigilo das operações de instituições financeiras, preceituando que não constitui violação do dever de sigilo a prestação de informações, à Secretaria da Receita Federal, sobre as operações financeiras efetuadas pelos usuários dos serviços (artigo 1º, § 3º, inciso VI, c/c o artigo 5º, caput, da aludida lei complementar, e 1º, do Decreto 4.489/2002).

6. As informações prestadas pelas instituições financeiras (ou equiparadas) restringem-se a informes relacionados com a identificação dos titulares das operações e os montantes globais mensalmente movimentados, vedada a inserção de qualquer elemento que permita identificar a sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados (artigo 5º, § 2º, da Lei Complementar 105/2001).

7. O artigo 6º, da lei complementar em tela, determina que: "Art. 6º As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.

Parágrafo único. O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária."

12. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 facultou à Administração Tributária, nos termos da lei, a criação de instrumentos/mecanismos que lhe possibilitassem identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte, respeitados os direitos individuais, especialmente com o escopo de conferir efetividade aos princípios da pessoalidade e da capacidade contributiva (artigo 145, § 1º).

13. Destarte, o sigilo bancário, como cediço, não tem caráter absoluto, devendo ceder ao princípio da moralidade aplicável de forma absoluta às relações de direito público e privado, devendo ser mitigado nas hipóteses em que as transações bancárias são denotadoras de ilicitude, porquanto não pode o cidadão, sob o alegado manto de garantias fundamentais, cometer ilícitos. Isto porque, conquanto o sigilo bancário seja garantido pela Constituição Federal como direito fundamental, não o é para preservar a intimidade das pessoas no afã de encobrir ilícitos.

14. O suposto direito adquirido de obstar a fiscalização tributária não subsiste frente ao dever vinculativo de a autoridade fiscal proceder ao lançamento de crédito tributário não extinto.

15. In casu, a autoridade fiscal pretende utilizar-se de dados da CPMF para apuração do imposto de renda relativo ao ano de 1998, tendo sido instaurado procedimento administrativo, razão pela qual merece reforma o acórdão regional.

16. O Supremo Tribunal Federal, em 22.10.2009, reconheceu a repercussão geral do Recurso Extraordinário 601.314/SP, cujo thema iudicandum restou assim identificado: "Fornecimento de informações sobre movimentação bancária de contribuintes, pelas instituições financeiras, diretamente ao Fisco por meio de procedimento administrativo, sem a prévia autorização judicial. Art. 6º da Lei Complementar 105/2001." (...) (g.n.)

Por sua vez, o plenário do Supremo Tribunal Federal – STF, no julgamento do RE nº 601.314/SP, Rel. Min. Edson Fachin, submetido à sistemática da Repercussão Geral, considerou que o art. 6º da LC nº 105/2001, que permite ao fisco, desde que instaurado processo administrativo (um dos requisitos legais), requisitar diretamente às instituições financeiras informações bancárias, sem que com isto se considerem violados os sigilos bancários e fiscais.

Sem a instauração de processo tributário compatível não há como se requisitar informações sigilosas às instituições financeiras, e muito menos violar-se sigilo do contribuinte. Essa garantia do processo administrativo como condição de procedibilidade do fisco não pode ser relativizada, pois o contribuinte possui direitos indelegáveis, e um deles é o de não ser fiscalizado clandestinamente, sem que se respeite a regra do devido processo legal.

Utilizar-se de tais regras tributárias para compartilhar dados sigilosos na sindicância patrimonial fere o plasmado do princípio da legalidade, dentre outros, pois a sindicância em questão, nem em tese, se equipara ao processo administrativo.

Vivemos tempos difíceis sob o prisma jurídico, porquanto o presente abuso do direito de investigação é “suficiente” para devassar e afastar integralmente os sigilos de dados (fiscal e bancário) do agente público, no afã de possibilitar a sua tipificação em um pseudo enriquecimento ilícito, mesmo ausente a infração funcional.

Ou seja, o Poder Executivo, ao legislar indevidamente, criando um novo tipo persecutório, ligado à investigação patrimonial do agente público, deixou de observar que a legislação tributária somente permite a transferência de dados sigilosos para a Receita Federal quando a mesma está munida de mandado de procedimento fiscal, respaldado pelo processo de fiscalização correspondente.

A Administração tributária não pode pinçar ou quebrar o sigilo de dados do contribuinte ao seu bel prazer, visto que o princípio da isonomia tributária não permite a escolha aleatória de contribuintes que serão escolhidos para ingressarem na malha fina da fiscalização.

Existem critérios objetivos para iniciar-se a persecução tributária, sendo que um deles é a necessidade do contribuinte estar sendo submetido a um regular e competente processo de fiscalização.

 Na hipótese da sindicância patrimonial, que não é equiparado, nem em tese, ao processo administrativo disciplinar, a Administração Pública parte de uma ficção, através de devassa fiscal/bancária, sem autorização normativa ou judicial, desatrelada de irregularidade funcional, para inserir uma pseudo responsabilidade disciplinar, a ser apurada pelo processo administrativo disciplinar, em face de suposta variação patrimonial incompatível do agente.

Ou seja, a Administração Pública não toma como ponto de partida a irregularidade funcional do agente verificada através de seus atos (comissivo ou omissivo). Pelo contrário, a Administração Pública supõe a pseudo variação patrimonial incompatível, para depois processar o agente pelo fato criado pela “clandestina investigação”, levada a efeito pela sindicância patrimonial, em total inversão do postulado na cláusula do due process of law.

E para demonstrar todo o exagero persecutório, a Administração Pública se baseia em uma investigação criada por Decreto, sem a reserva de ato legislativo, e, a título de normatizar a inconstitucionalidade, cria atos normativos para tentar “legalizar” o abuso do direito de investigar, onde o agente é devassado fiscal e bancariamente no afã de encontrar um pseudo enriquecimento ilícito, tudo sem que haja a mínima autorização legal para tal.

Como visto, com base na sindicância patrimonial e na sua normatização administrativa (Ordem de Serviço CGU nº 265/2006), a Administração Pública vem requisitando da Receita Federal os dados bancários e fiscais de agentes públicos, ao argumento que os mesmos estão sendo investigados sobre um pretenso enriquecimento ilícito.

Este ato é ilegal, e fere o direito fundamental da proteção do sigilo de dados (art. 5º, X e XII, da CF) do agente público investigado.

Inobstante a inconstitucionalidade da instituição e criação da sindicância patrimonial, que não foi concebida por lei de iniciativa do Presidente da República, e sim por Decreto do Chefe do Poder Executivo, em total afronta ao princípio da “reserva de lei” (princípio da legalidade), a sindicância em questão não se equipara a um processo administrativo, por ser procedimento inquisitorial não punitivo, que contraria o CTN. Isto porque o intercâmbio de informação sigilosa, no âmbito da Administração Pública, deverá ser realizado mediante processo regularmente instaurado (§ 1º, do art. 198, do CTN), e as solicitações de autoridade administrativa no interesse da própria Administração, destacando a norma que “desde que seja comprovada a instauração regular de processo administrativo no órgão ou na entidade respectiva, com objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refer a informação por prática de infração administrativa.” (inc. II, do art. 198 do CTN).

Assim as provas obtidas pelo intercâmbio de informações sigilosas são fornecidas ilicitamente e, portanto, inadmissíveis, segundo a redação do  inc. LVI, do art. 5º, da Constituição Federal:

“LVI – são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.”

Os dados protegidos em virtude do direito de intimidade, aí incluem-se o sigilo bancário e o sigilo fiscal, não podem ser transferidos da forma como estão sendo pela Administração Tributária, a guardiã natural da compilação de todas as informações bancárias e econômicas dos contribuintes, para fins de instrução de procedimento de investigação patrimonial, que é a sindicância patrimonial.

Sequer há a instauração de processo administrativo, veículo legal necessário para capacitar as autoridades administrativas de requisitar o intercâmbio de informações legais.

Como a sindicância patrimonial é um mero procedimento inquisitorial, que busca colher provas para a instauração ou não de processo administrativo disciplinar, não resta dúvida que a coleta de provas sigilosas não possui lastro legal para ser fornecida, violando o direito do agente público investigado de não ter o seu sigilo fiscal compartilhado com a esfera correicional, somente quando existente o devido processo administrativo.

Portanto, o compartilhamento do sigilo somente poderá se dar quando instaurado o processo administrativo, condição sine qua non, como realçado pelo Min. Ricardo Lewandowski[23] quando do seu voto no RE 3601314/SP:

“Então eu penso que o sigilo não pode ser oponível ao contribuinte, ou seja, no mesmo em que se abre o processo administrativo, que é condição sine qua non para o compartilhamento do sigilo, é preciso que se tomem esses cuidados que estão previstos na própria Lei Federal, a qual fez alusão ao eminente Ministro Toffoli.”

No mesmo sentido votou o Min. Luis Roberto Barroso, concordando com o Min. Ricardo Lewandowski quando do debate travado no julgamento do RE nº 601314/SP, diz:

“O SENHOR MINISTRO LUIS BOBERTO BARROSO – Mas, veja, Vossa Excelência: se a Lei Complementar nº 105, no art. 6º, exige a instauração de processo administrativo, eu concordo plenamente com Vossa Excelência de que estas regras da lei do processo administrativo hão de se aplicar. Eu não teria dificuldade.”

O art. 6º, da Lei Complementar nº 105, diz o seguinte:

“Art. 6o As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.”

Muito bem, então o sigilo só pode ser quebrado se houver um processo administrativo em curso, inclusive o bancário e com a autorização do Poder Judiciário. A Lei Complementar citada diz isso no art. 6º transcrito.

Da maneira como está sendo precedida a investigação patrimonial do agente público, pelo Decreto nº 5.483/2005, pela Portaria CGU nº 335/2006 e pela Ordem de Serviço nº 265/2006, do Secretário Executivo da CGU, a Administração Pública está tentando fazer “justiça pelas próprias mãos”, atropelando a Constituição, as Leis e o ordenamento jurídico vigente, para perpetrar verdadeira devassa fiscal contra o agente público, sob o pálido e inconsistente argumento de que fiscaliza enriquecimento ilícito do mesmo.

Destarte, por mais relevantes que sejam os argumentos do poder público, o procedimento estatal da Administração Pública que contrarie os postulados consagrados pela Constituição Federal e pela legislação infraconstitucional revela-se inaceitável, não podendo ser corroborada em um Estado Democrático de Direito.

Os limites traçados pelas balizas jurídicas são inultrapassáveis, e restringem os poderes do Estado em suas relações com seus administrados, aí incluídos os agentes públicos, tal como advertiu o Supremo Tribunal Federal – STF[24] em expressivo julgamento, que a seguir se transcreve:

 “ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA - FISCALIZAÇÃO - PODERES - NECESSÁRIO RESPEITO AOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS DOS CONTRIBUINTES E DE TERCEIROS. - Não são absolutos os poderes de que se acham investidos os órgãos e agentes da administração tributária, pois o Estado, em tema de tributação, inclusive em matéria de fiscalização tributária, está sujeito à observância de um complexo de direitos e prerrogativas que assistem, constitucionalmente, aos contribuintes e aos cidadãos em geral. Na realidade, os poderes do Estado encontram, nos direitos e garantias individuais, limites intransponíveis, cujo desrespeito pode caracterizar ilícito constitucional. - A administração tributária, por isso mesmo, embora podendo muito, não pode tudo. É que, ao Estado, é somente lícito atuar, "respeitados os direitos individuais e nos termos da lei" (CF, art. 145, § 1º), consideradas, sobretudo, e para esse específico efeito, as limitações jurídicas decorrentes do próprio sistema instituído pela Lei Fundamental, cuja eficácia - que prepondera sobre todos os órgãos e agentes fazendários - restringe-lhes o alcance do poder de que se acham investidos, especialmente quando exercido em face do contribuinte e dos cidadãos da República, que são titulares de garantias impregnadas de estatura constitucional e que, por tal razão, não podem ser transgredidas por aqueles que exercem a autoridade em nome do Estado.”

E em 15.12.2010, o Supremo Tribunal Federal – STF declarou a inconstitucionalidade do afastamento do sigilo de dados relativo ao contribuinte, tendo em vista que a quebra do sigilo bancário é matéria sob reserva de jurisdição.

A esse respeito, transcreve-se a ementa do RE nº 389.808, da relatoria do Ministro Marco Aurélio, Pleno, DJ de 10.05.2011[25]:

“SIGILO DE DADOS – AFASTAMENTO. Conforme disposto no inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal, a regra é a privacidade quanto à correspondência, às comunicações telegráficas, aos dados e às comunicações, ficando a exceção – a quebra do sigilo – submetida ao crivo de órgão equidistante – o Judiciário – e, mesmo assim, para efeito de investigação criminal ou instrução processual penal. SIGILO DE DADOS BANCÁRIOS – RECEITA FEDERAL. Conflita com a Carta da República norma legal atribuindo à Receita Federal – parte na relação jurídico-tributária – o afastamento do sigilo de dados relativos ao contribuinte.”

Como visto, o STF condiciona o afastamento do sigilo de dados do indivíduo ao crivo de órgão equidistante, qual seja, o Poder Judiciário, e assim mesmo para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Do mesmo modo, entende o Supremo Tribunal Federal – STF[26] que o sigilo bancário se encontra submetido ao disposto no art. 5º, à luz da sua natureza de direito da personalidade:

“Mandado de Segurança. Tribunal de Contas da União. Banco Central do Brasil. Operações financeiras. Sigilo. 1. A Lei Complementar nº 105, de 10/1/01, não conferiu ao Tribunal de Contas da União poderes para determinar a quebra do sigilo bancário de dados constantes do Banco Central do Brasil. O legislador conferiu esses poderes ao Poder Judiciário (art. 3º), ao Poder Legislativo Federal (art. 4º), bem como às Comissões Parlamentares de Inquérito, após prévia aprovação do pedido pelo Plenário da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do plenário de suas respectivas comissões parlamentares de inquérito (§§ 1º e 2º do art. 4º). 2. Embora as atividades do TCU, por sua natureza, verificação de contas e até mesmo o julgamento das contas das pessoas enumeradas no artigo 71, II, da Constituição Federal, justifiquem a eventual quebra de sigilo, não houve essa determinação na lei específica que tratou do tema, não cabendo a interpretação extensiva, mormente porque há princípio constitucional que protege a intimidade e a vida privada, art. 5º, X, da Constituição Federal, no qual está inserida a garantia ao sigilo bancário. 3. Ordem concedida para afastar as determinações do acórdão nº 72/96 - TCU - 2ª Câmara (fl. 31), bem como as penalidades impostas ao impetrante no Acórdão nº 54/97 - TCU - Plenário.”

A quebra de sigilo de dados do agente público, para legitimar-se em face do sistema jurídico-constitucional, necessita se apoiar em decisão revestida de fundamentação adequada, que encontre apoio concreto em suporte normativo, sob pena de abuso de poder investigatório do ato estatal que a decrete.

Há um outro precedente muito interessante, da lavra do Min. Celso de Mello, no MS nº 23851/DF[27], e que esteve ligado à quebra do sigilo bancário por Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI, onde foi decidido que a autorização para o afastamento da inviolabilidade do sigilo de dados não pode ser concebida como a retratar uma verdadeira devassa:

“[...] - A quebra de sigilo, para legitimar-se em face do sistema jurídico-constitucional brasileiro, necessita apoiar-se em decisão revestida de fundamentação adequada, que encontre apoio concreto em suporte fático idôneo, sob pena de invalidade do ato estatal que a decreta. A ruptura da esfera de intimidade de qualquer pessoa - quando ausente a hipótese configuradora de causa provável - revela-se incompatível com o modelo consagrado na Constituição da República, pois a quebra de sigilo não pode ser manipulada, de modo arbitrário, pelo Poder Público ou por seus agentes. Não fosse assim, a quebra de sigilo converter-se-ia, ilegitimamente, em instrumento de busca generalizada, que daria, ao Estado - não obstante a ausência de quaisquer indícios concretos - o poder de vasculhar registros sigilosos alheios, em ordem a viabilizar, mediante a ilícita utilização do procedimento de devassa indiscriminada (que nem mesmo o Judiciário pode ordenar), o acesso a dado supostamente impregnado de relevo jurídico-probatório, em função dos elementos informativos que viessem a ser eventualmente descobertos. A FUNDAMENTAÇÃO DA QUEBRA DE SIGILO HÁ DE SER CONTEMPORÂNEA À PRÓPRIA DELIBERAÇÃO LEGISLATIVA QUE A DECRETA.

- A exigência de motivação - que há de ser contemporânea ao ato da Comissão Parlamentar de Inquérito que ordena a quebra de sigilo - qualifica-se como pressuposto de validade jurídica da própria deliberação emanada desse órgão de investigação legislativa, não podendo ser por este suprida, em momento ulterior, quando da prestação de informações em sede mandamental. [...]”.  

Tanto a quebra do sigilo fiscal como o bancário devem vir devidamente fundamentadas para que o Poder Judiciário possa relativizar o disposto no art. 5º, inc. XII, da CF.

A Receita Federal, como órgão fiscalizador e arrecadador de tributos, não possui prerrogativa superior à do Poder Judiciário, assegurada pela Constituição.

Por essa razão, a sindicância patrimonial e Portarias da CGU, para fins de investigação patrimonial do agente público, não podem subverter a boa ordem constitucional para instituírem devassa tributária na vida do servidor público, a título de verificar se há ou não enriquecimento ilícito.

A 1ª Turma do STF, julgando o RE nº 461.3662/DF[28], Relator Min. Marco Aurélio, apontou que não poderia haver acesso a dados bancários sem que o Banco Central antes tivesse ordem judicial:

“SIGILO DE DADOS - ATUAÇÃO FISCALIZADORA DO BANCO CENTRAL - AFASTAMENTO - INVIABILIDADE. A atuação fiscalizadora do Banco Central do Brasil não encerra a possibilidade de, no campo administrativo, alcançar dados bancários de correntistas, afastando o sigilo previsto no inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal.”

Assim dispõe a Constituição Federal sobre a inviolabilidade da intimidade e a manutenção do segredo de dados:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;  

(...)

XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;”  

Além desses, também merece especial atenção a disposição do art. 145, § 1º, da Constituição Federal, a seguir reproduzido:

“Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: (...)

§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.”

Assim, a Constituição permitiu a relativização da guarda do sigilo de dados do contribuinte com a única finalidade de fiscalização tributária para fins de verificação da capacidade econômica do contribuinte e o pagamento de imposto.

Não há previsão constitucional que permita a transferência de dados tributários do contribuinte agente público, para a esfera correicional do seu órgão público de lotação, para verificar se há enriquecimento ilícito.

Somente a investigação criminal, com a devida autorização judicial, é que estaria fora das hipóteses da fiscalização tributária, apta a requerer ao Poder Judiciário a devida autorização para fins de quebra do respectivo segredo de dados.

De modo geral se pode dizer que a orientação jurisdicional do Supremo Tribunal Federal, até hoje, apresenta duas diretrizes: 1) reconhece, na Constituição, um direito fundamental ao sigilo de dados, relativo ao direito à privacidade; 2) condiciona, de uma maneira geral, o acesso às informações financeiras do contribuinte à autorização do Poder Judiciário ou das Comissões Parlamentares de Inquérito, conforme a hipótese jurídica verificada.

A intimidade é direito fundamental do indivíduo, que pode ser relativizada se presente uma justa causa e, em todas as hipóteses, sob o crivo do Poder Judiciário.

A esse respeito, o RE nº 215301,[29] Rel. Min. Carlos Velloso, é digno de destaque:

“CONSTITUCIONAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. SIGILO BANCÁRIO: QUEBRA. C.F., art. 129, VIII. I. - A norma inscrita no inc. VIII, do art. 129, da C.F., não autoriza ao Ministério Público, sem a interferência da autoridade judiciária, quebrar o sigilo bancário de alguém. Se se tem presente que o sigilo bancário é espécie de direito à privacidade, que a C.F. consagra, art. 5º, X, somente autorização expressa da Constituição legitimaria o Ministério Público a promover, diretamente e sem a intervenção da autoridade judiciária, a quebra do sigilo bancário de qualquer pessoa. II. - R.E. não conhecido.”

A reserva de jurisdição é tida como fundamental para se evitarem abusos ou devassas do poder persecutório estatal.

Essa preocupação é permanente na Suprema Corte, visto que a Autoridade Fazendária pode ter acesso aos dados relativos às operações bancárias e fiscais dos contribuintes para promover cruzamentos, averiguações e conferências, com o objetivo de subsidiar processos de fiscalização tributária com a finalidade de exigir tributos que eventualmente tenham sido pagos a menor, se for o caso.

É fazer valer o dever legal de pagar impostos e de graduar essas exações conforme a capacidade contributiva do sujeito passivo. É esse, inclusive, o propósito dos instrumentos que a Lei Complementar nº 105/2001 e demais atos normativos conferem à Administração Tributária.

Tal hipótese legal é bem diferente da que se discute aqui, posto que a Administração Pública criou arcabouço de medidas ilegais e inconstitucionais (Decretos, Portarias, Orientações, etc.) que partem de presunções para motivar a transferência de dados sigilosos do agente público contribuinte, para promover devassa patrimonial na esfera correicional interna dos órgãos públicos federais, sem processo administrativo competente regularmente instaurado.

O procedimento estatal da Administração Tributária que compartilha os dados sigilosos colocados  na guarda dos agentes públicos para os órgãos correcionais contraria os postulados consagrados na Constituição, revelando-se inaceitável.

Mesmo não sendo absoluta a garantia constitucional da intimidade (e da privacidade), isso não significa, contudo, que o estatuto constitucional das liberdades públicas possam ser arbitrariamente desrespeitadas por qualquer órgão do Poder Público.

Por isso mesmo, a tramitação arbitrária da transferência de dados sigilosos do agente para o domínio correicional, sem comando normativo que autorize tal postura, não possui interesse público como fundamento, apesar de o mesmo ser invocado como “pano de fundo” para a tentativa de suporte. Esse ato do poder público tem significado de grave transgressão ao postulado constitucional que protege o direito à intimidade e à privacidade (Cf. Ms 23.663/DF, Rel. Min. Celso de Mello).

O eminente Professor Arnaldo Wald[30], em precisa abordagem sobre o tema, destaca:

"Se podia haver dúvidas no passado, quando as Constituições brasileiras não se referiam especificamente à proteção da intimidade, da vida privada e do sigilo referente aos dados pessoais, é evidente que, diante do texto constitucional de 1988, tais dúvidas não mais existem quanto à proteção do sigilo bancário como decorrência das normas da lei magna.

Efetivamente, as Constituições Brasileiras anteriores à de 1988, não só não asseguravam o direito à privacidade como também, quando tratavam do sigilo, Iimitavam-se a garanti-lo em relação à correspondência e às comunicações telegráficas e telefônicas, não se referindo ao sigilo em relação aos papéis de que tratam a Emenda n° IV à Constituição Americana, a Constituição Argentina e leis fundamentais de outros países. Ora, foi em virtude da referência aos papéis que tanto o direito norte-americano quanto o argentino concluíram que os documentos bancários tinham proteção constitucional.

Com a revolução tecnológica, os ‘papéis’ se transforaram em 'dados' geralmente armazenados em computadores ou fluindo através de impulsos eletrônicos, ensejando enormes conjuntos de informações a respeito das pessoas, numa época em que todos reconhecem que a informação é poder. A computadorização da sociedade exigiu uma maior proteção à privacidade, sob pena de colocar o indivíduo sob contínua fiscalização do Governo, inclusive nos assuntos que são do exclusivo interesse da pessoa. Em diversos países, leis especiais de proteção contra o uso indevido de dados foram promulgadas e, no Brasil, a inviolabilidade dos dados individuais, qualquer que seja sua origem, forma e finalidade, passou a merecer a proteção constitucional em virtude da referência expressa que a eles passou a fazer o inciso XII, do art. 5º, modificando, assim, a posição anterior da nossa legislação, na qual a indevassibilidade em relação a tais informações devia ser construída com base nos princípios gerais que asseguravam a liberdade individual, podendo até ensejar interpretações divergentes ou contraditórias.

Assim, agora em virtude dos textos expressos da Constituição e especialmente da interpretação sistemática dos incisos X e XOO do art. 5º, da CF, ficou evidente que a proteção ao sigilo bancário adquiriu nível constitucional, impondo-se ao legislador, o que no passado, podia ser menos evidente.” (grifos no original).

Como visto, para haver a quebra de sigilo bancário/fiscal na atualidade, deverá haver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso, sendo certo que tais exames deverão ser considerados imperiosos e fundamentais pela autoridade administrativa competente. Esta autorização legal não serve como um poder ilimitado para a Administração Pública, uma vez que se torna necessária a presença da justa causa e a devida razoabilidade da medida. O que temos presenciado é justamente o contrário, onde o Poder Público primeiro acusa, depois tenta reunir provas para formalizar o procedimento administrativo, solicitando autorização judicial para respaldar a já efetuada quebra de sigilos[31].

A pretexto de possibilitar uma pseudo investigação do contribuinte/agente público, o Poder Público tem vilipendiado os respectivos direitos ao sigilo de dados, da intimidade, da privacidade, através da quebra do sigilo bancário/fiscal, sob o fundamento que está verificando se houve a prática de enriquecimento ilícito presumido, sem, contudo, demonstrar um nexo de causalidade com a função pública, invertendo a presunção de inocência do agente público acusado, com a quebra de seu sigilo de dados sem ao menos demonstrar uma violação a preceito administrativo, ou a prática de um ilícito por parte do mesmo. Deveria ser demonstrado, em primeiro lugar, a prática de um ilícito, vinculada à função pública exercida pelo agente público investigado, para, após, ser apurado se houve o tão alardeado enriquecimento ilícito presumido. A inversão destes papéis é extremamente perigosa, pois a Administração Pública parte do princípio de que se houver uma movimentação bancária incompatível com os vencimentos do agente público ou variação patrimonial desproporcional, resta caracterizado o enriquecimento ilícito presumido.

A fundamentação para a transferência e a quebra do sigilo de dados do agente público investigado pela ilegal sindicância patrimonial tem consistido, pura e simplesmente, no pueril argumento de que o mesmo está sendo investigado em uma possível prática de enriquecimento ilícito, argumento insubsistente sob o prisma do plasmado constitucional.

É nula de pleno direito a quebra do sigilo fiscal e bancário quando ausente a indispensável fundamentação[32], estabelecida a partir de fatos tidos, em tese, como ilícitos ou ilegais.

A quebra dos sigilos fiscal e bancário é medida excepcional, necessitando que hajam indícios suficientes da prática de um grave delito, sendo insuficientes meras matérias jornalísticas[33], tendo em conta que a acusação deverá ter plausibilidade e verossimilhança, sob pena de se produzir prova ilícita (art. 5º, LVI, da CF).

Portanto, é inconstitucional a transferência e a quebra do sigilo de dados do agente público investigado em sindicância patrimonial, quer pela ausência de norma constitucional que lhe ampare, quer pela ausência de forma normativa hábil, e ainda, pela ausência de crime ou autorização do Poder Judiciário.

Sobre o autor
Mauro Roberto Gomes de Mattos

Advogado no Rio de Janeiro. Vice- Presidente do Instituto Ibero Americano de Direito Público – IADP. Membro da Sociedade Latino- Americana de Direito do Trabalho e Seguridade Social. Membro do IFA – Internacional Fiscal Association. Conselheiro efetivo da Sociedade Latino-Americana de Direito do Trabalho e Seguridade Social. Autor dos livros "O contrato administrativo" (2ª ed., Ed. América Jurídica), "O limite da improbidade administrativa: o direito dos administrados dentro da Lei nº 8.429/92" (5ª ed., Ed. América Jurídica) e "Tratado de Direito Administrativo Disciplinar" (2ª ed.), dentre outros.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MATTOS, Mauro Roberto Gomes. Inconstitucionalidade da sindicância patrimonial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5557, 18 set. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68470. Acesso em: 22 nov. 2024.

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