11 - Desclassificação do crime na fase da pronúncia: vincula o juízo ao qual foram remetidos os autos?
Entendemos que não, haja vista que a convicção do Juízo ao qual os autos foram remetidos pode ser outra, devendo haver, sempre, decisão fundamentada a respeito.
Com efeito, até a fase de pronúncia, é possível que o Juiz, ao invés de pronunciar o réu, convença-se da existência de crime que não seja doloso contra a vida, o que desloca a competência para outra Vara que não a do Júri, exceto Comarca com Vara única.
Assim entendendo, será reaberto ao acusado prazo para defesa e indicação de testemunhas, prosseguindo-se, após encerramento da inquirição das testemunhas, de acordo com os artigos 499 e 500 do Código de Processo Penal, não podendo ser arroladas testemunhas já anteriormente ouvidas, "ex vi" do artigo 410 do Código de Processo Penal.
"Ad exemplum", se o réu for denunciado por tentativa de homicídio e, após o término da instrução probatória, na fase de pronúncia, o Juiz entende que não se trata de tentativa de homicídio, mas de lesão corporal, pois não houve prova da intenção de matar ("animus necandi"), o Juiz prolatará a sentença desclassificatória, mas não deve dizer qual é a infração penal, bastando dizer que se trata de infração penal que não dolosa contra a vida.
Caso o Juiz mencione, "apertis verbis", que a infração penal é a de lesão corporal, entendemos que o Juízo ao qual os autos forem remetidos poderá, após a oitiva de testemunhas, entender que o crime não é o de lesão corporal e sim que se trata de outra infração penal não dolosa contra a vida ("verbi gratia" artigo 132 do Código Penal).
Nesse sentido temos RT 538/387; 550/297; 550/324; 570/395; RTJ 104/589.
12 - É possível que o libelo mencione conduta distinta daquela inserta na sentença de pronúncia?
Não, sob pena de nulidade absoluta.
Com efeito, na sentença de pronúncia, que submete o réu a julgamento perante o Tribunal do Júri, o Juiz deverá constar a conduta do réu, descrevendo o "delitum" que será objeto de análise pelos jurados na Sessão de Julgamento.
E a sentença de pronúncia deve se ater aos limites da denúncia, pois o réu sempre se defende dos fatos descritos na denúncia.
Por sua vez, o libelo-crime acusatório deverá conter a exposição do fato criminoso tendo como base o conteúdo da sentença de pronúncia e esta se baseou nos fatos descritos na denúncia, pois deles é que o réu se defendeu.
Assim, "ad exemplum", se o réu foi denunciado porque atirou na vítima e a matou e se foi pronunciado pelo mesmo fato, não pode, sob pena de nulidade absoluta, o libelo-crime acusatório descrever a conduta do réu como sendo aquele que emprestou o revólver a um terceiro, a fim de que este o utilizasse para atirar e matar a mesma vítima.
Concluindo, o libelo-crime acusatório é "bitolado" pela sentença de pronúncia, jamais podendo estar em desacordo com esta, sob pena de nulidade absoluta.
É o que diz a Jurisprudência (RJTJSP 3/424; 9/588; 51/361; 90/550; RT 547/394; RTJ 97/588).
13 - Sentença de pronúncia: podem ser usados termos exagerados e com análise profunda das provas?
Não, sob pena de nulidade.
Com efeito, nos processos de competência do Júri, o Juiz Singular, após regular instrução probatória, caso se convença da existência do crime e da ocorrência de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu convencimento, "ex vi" do artigo 408, "caput", do Código de Processo Penal.
Como toda decisão judicial e em cumprimento ao determinado no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, a sentença de pronúncia deve ser fundamentada sempre, mas, sob pena de influenciar o Conselho de Sentença, não pode jamais usar termos exagerados e nem analisar profundamente as provas, sob pena de nulidade.
E assim o é, pois, caso o Juiz usasse tais termos, extravazaria de sua competência, exercendo atribuições próprias dos jurados, o que destoaria da norma Constitucional que prevê a competência para tanto do Egrégio Tribunal do Júri (artigo 5º, inciso XXXVIII, letra "d", da Constituição Federal).
Resumindo-se, a pronúncia deve ser fundamentada, mas devem ser usados termos comedidos, sem exagero e sem análise profunda das provas, sob pena de nulidade.
Nesse sentido, na Jurisprudência temos RJTJSP 16/397; 31/334; 40/300; RTJ 23/23; RT 462/407; 471/331; 521/439; 522/361; 557/369; 644/258.
14 - Conexão de homicídio com disparo de arma de fogo: é possível?
Entendemos que não, haja vista a norma expressa ("apertis verbis") do artigo 15, "in fine", do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03).
Com efeito, é possível que seja oferecida denúncia pela prática de um homicídio (artigo 121 do Código Penal) e em conexão, na mesma denúncia, com o crime do artigo 15 da Lei 10.826/03 (Estatuto do Desarmamento), interpretando-se que a existência da conexão ou não e a eventual absorção do segundo crime pelo homicídio são matérias que dizem respeito ao mérito ("meritum causae"), cabendo ao Tribunal do Júri analisar tais facetas.
Todavia, a parte "in fine" da norma do artigo 15 indigitado expressamente ("apertis verbis") considera subsidiária a infração penal de disparo de arma de fogo em via pública, quando tal conduta tenha como finalidade a prática de outro "delitum", "in casu" o homicídio.
Assim, entendemos não ser admissível a denúncia pela prática do crime de homicídio e também pela prática do crime de disparo de arma de fogo em via pública, haja vista a norma expressa indigitada, que tem redação de melhor técnica em relação ao mesmo crime que era tipificado no artigo 10, § 1º, inciso III, da Lei 9437/97, norma esta que mencionava "desde que o fato não constitua crime mais grave", não se atendo à finalidade.
E outras posições a respeito de matérias relativas ao Tribunal do Júri podemos encontrar nos nossos Livros "Júri na Jurisprudência, editora Iglu", "Juizado Especial Criminal no Júri, editora Leud" e "Direito Penal Comentado", editora Letras & Letras.
15 - Desclassificação na fase de pronúncia: sempre é possível?
Entendemos ser possível por exceção e tão somente na hipótese da existência de prova cristalina a respeito, sob pena de infringência à norma Constitucional de competência do Tribunal do Júri (artigo 5º, inciso XXXVIII, letra "d", da Constituição Federal).
Com efeito, é possível que, "ad exemplum", alguém tenha sido denunciado por uma tentativa de homicídio por ter desferido um único tiro na vítima e na perna desta, constando, na denúncia, que a vítima só não morreu, pois houve circunstâncias alheias à vontade do réu (verbi gratia" a vítima foi socorrida eficazmente).
Em alegações finais, "ex vi" do artigo 406 do Código de Processo Penal, a Defesa pede a desclassificação do "delitum" para lesão corporal.
"In casu", entendemos ser possível o acatamento da tese defensiva tão somente na hipótese de prova cristalina, sem sombra de dúvidas, de que não houve o "animus necandi" do réu na sua conduta.
E tal poderia ter ocorrido na hipótese de haver testemunhas comprovando que o réu possuía várias outras balas de revólver no tambor, era um exímio atirador e, no momento do disparo, por sua livre e espontânea vontade, somente desferiu um tiro e de perto, mirando tão somente a perna da vítima e, para arrematar, testemunhas ainda disseram que o réu, antes de tudo isso, ainda disse à vítima que era um tiro "só para assustar".
Em tais circunstâncias, o réu, "apertis verbis", não tentou matar a vítima e sim só a machucou, devendo responder pelo que fez, crime não doloso contra a vida, tendo havido prova cristalina e inconteste de tal.
Portanto, concluímos que só se opera a desclassificação, se esta vier cristalinamente provada, sem sombra de dúvidas, o que é cediço na Jurisprudência (RT 566/304; 583/422; 584/319; 587/296).
Esta e outras posições a respeito de matérias relativas ao Tribunal do Júri podemos encontrar nos nossos Livros "Júri na Jurisprudência, editora Iglu", "Juizado Especial Criminal no Júri, editora Leud" e "Direito Penal Comentado", editora Letras & Letras.
Essa é a nossa interpretação, "ad referendum" dos Doutos.
"Quid multa"?