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O poder de polícia administrativa e comentários à Lei nº 19.449/18

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Agenda 02/01/2019 às 11:47

A Lei nº 19.449/18 conferiu o poder de polícia administrativa ao Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado do Paraná, e destacou em seu art. 1º qual a finalidade da aplicação desta lei.

Resumo: O presente artigo trata de um breve estudo sobre o poder de polícia administrativa conferido ao Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado do Paraná, em decorrência da Lei 19.449/18 sendo esta regulamentada pelo Decreto 11.868 de 03 de dezembro de 2018.

Palavras-Chave: poder de polícia, bombeiros paraná, vistoria, fiscalização, prevenção e combate a incêndios.

Sumário: 1. Introdução. 2. O que é o poder de polícia administrativa?. 3. Abuso de poder. 4. O crime de prevaricação. 5. A atuação do Corpo de Bombeiros ante o poder de polícia conferida pela lei 19.449/18. 6. Do primeiro ano de exercício do poder de polícia administrativa do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Paraná. 7. Da fiscalização e da vistoria. 8. Da prescrição. 10. Conclusão. 


1)    INTRODUÇÃO:

O presente artigo pretende analisar pontos relevantes sobre o poder de polícia administrativa e da Lei 19.449/18 que entra em vigor no dia 01 de janeiro de 2019.

Para enfrentar tal análise, este artigo começará abordando sobre o tema poder de polícia, um dos poderes administrativos que o ordenamento jurídico confere à Administração Pública para a preservação dos interesses da coletividade.

Nesse passo, será analisado o abuso de poder, toda vez que a Administração usar este poder sem a finalidade do interesse coletivo o ato poderá ser anulado.

Ainda, será explorado o tema crime de prevaricação, previsto no art. 319 do Código Penal Brasileiro.

Por fim, analisaremos o poder de polícia administrativa conferida ao Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Paraná.  


2)    O QUE É O PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA?

O fundamento do poder de polícia é o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, Di Pietro (2017) informa que no conceito moderno o poder de polícia “é a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público.” O interesse público refere-se à vida, saúde, segurança, moral, meio ambiente, propriedade entre outros.

O conceito legal do poder de polícia está disposto no art. 78 do Código Tributário Nacional, vejamos:

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.  

 Destaca-se que o poder de polícia limita ou restringe o exercício de direitos individuais em prol da coletividade, desta forma deve atender ao princípio da legalidade, que está previsto no caput do art. 37 da Constituição da República Federativa de 1988, assim tal limitação ou restrição deve estar prevista em lei para que o ato seja praticado pelo Estado.

Por conseguinte, a Administração Pública ao regulamentar as leis deverá controlar a sua aplicação de maneira preventiva, fiscalizatória ou repressiva.

No controle preventivo, a Administração o faz através de ordens, notificações, licenças ou autorizações. Na fiscalizatória, através de inspeções, vistorias, entre outros. Já no controle repressivo, através do uso de medidas coercitivas tais como multas, intervenções de atividades ou interdições.

Assim, o agente público no exercício de suas atribuições legais, deve agir sempre de acordo com a lei.

O poder de polícia ainda se divide em administrativa e judiciária, contudo ambas têm por finalidade impedir que o comportamento individual interfira e prejudique a coletividade.

O poder de polícia administrativa irá incidir sobre bens, direitos e atividades, tem caráter predominantemente preventivo, podendo ser repressivo e fiscalizador, tem por objetivo prevenir ou reprimir ilícitos administrativos e é norteada pelo Direito Administrativo.

  Já o poder de polícia judiciária incide sobre pessoas, de maneira ostensiva ou investigativa, tem por objetivo evitar ou reprimir infrações penais, tem caráter repressivo, mas pode ser preventivo, é norteado pelo Direito Penal e Processual Penal.


3)    ABUSO DE PODER:

Considerando o parágrafo único do art. 78 do CTN “considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder”, entende-se que os atos praticados por agentes públicos com abuso de poder, são atos considerados ilegais.

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O abuso de poder caracteriza-se quando o agente público no exercício de suas atribuições legais atua fora dos limites de sua competência, ou seja, com excesso de poder, ou ainda quando sua atuação não observa a finalidade disciplinada em lei para a realização do ato, neste o agente desempenha o desvio de finalidade.

Os atos praticados com excesso de poder ou desvio de finalidade podem ser anulados pela própria Administração Pública quando da autotutela, ou até mesmo pelo Poder Judiciário no controle jurisdicional da legalidade do ato.

Por este motivo, mesmo nos casos em que houver discricionariedade, a Administração deve atuar nos limites da lei, sempre com a finalidade de atender ao interesse público.

 O poder da Administração pode ser discricionário ou vinculado. No que tange à discricionariedade do ato, o legislador não pode prever todas as hipóteses possíveis na atuação do agente público, desta forma algumas vezes nos casos concretos a Administração deverá atuar de acordo com o melhor momento de agir, bem como aplicar a sanção cabível, sempre dentro dos limites da lei. Contudo quando a lei prevê determinados requisitos e não oferece opção à Administração então o poder será vinculado.

Não se admite, portanto, a atuação do agente público para beneficiar ou prejudicar pessoas determinadas, se assim o fizer perderá o fundamento do principio da supremacia do interesse público sobre o particular, afastando a finalidade do poder administrativo, e ainda incidindo em desvio de poder. Neste caso o ato será anulado, observando-se todas as consequências nas esferas civil, penal e administrativa.

O objetivo do poder de polícia administrativa, não é eliminar direitos individuais, portanto existem alguns paradigmas, ou seja, um padrão a ser seguido, o Estado deve atuar com necessidade, proporcionalidade e eficácia:

a) Necessidade: a medida do poder de polícia deve ser realizado com o fim de evitar ameaças ao interesse público;

b) Proporcionalidade: deve haver equivalência entre a limitação do direito individual e a prevenção.

c) Eficácia: a medida adotada deve ser cabível para evitar o dano ao interesse coletivo.

Neste mesmo entendimento o Tribunal de Justiça do Distrito Federal:

ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. REMESSA NECESSÁRIA. PODER DE POLICIA. AUTO DE INTERDIÇÃO DA ATIVIDADE DESENVOLVIDA. PENDÊNCIA DE ANÁLISE DE REQUERIMENTO DE OBTENÇÃO DE LICENÇA DE FUNCIONAMENTO. INÉRCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. REMESSA NECESSÁRIA CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Embora inegável a presunção de legalidade e legitimidade dos atos administrativos que se destinam à fiscalização de atividades urbanas do Distrito Federal, não se pode admitir que o Poder Público perfaça ato de interdição sem antes se manifestar expressa e conclusivamente sobre o requerimento administrativo ainda pendente de análise. 2. O poder de polícia é norteado de modo fundamental pelo princípio da proporcionalidade, como toda a competência estatal de limitação de direitos. 3. Sob o enfoque do princípio da proporcionalidade, bem como sob a luz de seus subelementos, quais sejam: adequação, necessidade e compatibilidade com a Constituição e as leis; resplandece evidente que o poder de polícia administrativo exercido não se revela adequado, uma vez que existe pedido formulado pelo impetrante no intuito de manter regularizada a sua situação junto à Adminitração. 4. REMESSA NECESSÁRIA CONHECIDA E DESPROVIDA. Sentença mantida.

(TJ-DF 20160111261937 DF 0043599-07.2016.8.07.0018, Relator: ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO, Data de Julgamento: 20/09/2017, 5ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado no DJE : 04/10/2017 . Pág.: 391/394) Grifei.

Insta ressaltar, portanto, que o Estado na figura do agente público quando agir por meio de coação, deve sempre considerar este meio como última escolha, quando não exista outro meio eficaz que alcance o objetivo do bem jurídico tutelado.


4)    O CRIME DE PREVARICAÇÃO

O art. 319 do Código Penal Brasileiro dispõe:

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

Nota-se que o servidor público deve tratar todos com igualdade, não importando seus afetos e desafetos, a impessoalidade é um dos princípios previstos expressamente na Constituição Federal.

Rogério Greco, inicia o tema no livro Curso de Direito Penal (2017), destacando “o administrador ou servidor público deve atuar, sempre, com os olhos voltados para o bem comum, não podendo utilizar os poderes que lhe foram conferidos a fim de prejudicar aqueles que não lhe são muito caros, ou mesmo beneficiar os que lhe são próximos. Deve agir, portanto, de maneira impessoal, não permitindo que seus sentimentos se sobreponham aos interesses da própria Administração Pública. Todos têm o direito de ser tratados isonomicamente, não importando sejam pessoas cultas e/ou ilustres, ou mesmo ignorantes e/ou desconhecidas, tenham amizade ou conflitos pessoais com algum funcionário público”.

Para que ocorra o crime de prevaricação, o agente público deve estar no pleno exercício de suas funções e deve agir de maneira contrária à lei, devendo ainda ser caracterizado que o servidor praticou aquele ato com a finalidade de satisfazer interesse material, patrimonial ou moral. Neste mesmo entendimento o Superior Tribunal de Justiça:

PENAL. HABEAS CORPUS. ADVOGADO. CALÚNIA. AUSÊNCIA DE IMUNIDADE. DELITO NÃO CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE ANIMUS CALUNIANDI. DELITO DE PREVARICAÇÃO. DECLARAÇÕES QUE NÃO INDICAM NO QUE CONSISTIRIA A SATISFAÇÃO DO INTERESSE OU SENTIMENTO PESSOAL. ATIPICIDADE. I - A imunidade prevista no art. 142, inciso I, do Código Penal não abrange a ofensa caracterizada como calúnia (HC 84.107, Segunda Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, DJU de 18/06/2004). II - Todavia, no presente caso, não se configurou o animus caluniandi. O paciente, na condição de advogado, insurgiu-se, notoriamente com linguagem inapropriada, contra atuação de Magistrado na condução de um processo, sem conduto imputar-lhe a prática de um crime. III - Para que reste caracterizado o delito de prevaricação faz-se imprescindível a indicação, de alguma forma, de qual seria o interesse ou sentimento pessoal a ser satisfeito com a conduta do agente. Assim: "se não resta caracterizada a satisfação de interesse ou sentimento pessoal na conduta dos acusados, afasta-se a tipicidade da conduta." (Apn 471/MG, Corte Especial, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ de 10/03/2008) Ordem concedida

(STJ - HC: 63919 SP 2006/0168820-3, Relator: Ministro FELIX FISCHER, Data de Julgamento: 15/05/2008, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: --> DJe 04/08/2008). Grifei.

É importante salientar também que devem ser preenchidos os elementos do tipo penal para que seja caracterizado o crime, pois aquele que incorrer em falsa comunicação de crime também poderá responder, conforme o art. 340 do Código Penal Brasileiro, ou ainda pelo crime de calúnia, conforme art. 138 do Código Penal Brasileiro.


5)        A ATUAÇÃO DO CORPO DE BOMBEIROS ANTE O PODER DE POLÍCIA CONFERIDA PELA LEI 19.449/18:

O art. 1º da lei 19.449/18, aborda o bem jurídico tutelado, aquele que possui maior relevância dentro do ordenamento jurídico, a vida, e posteriormente indica outros bens jurídicos também tutelados tais como meio ambiente e patrimônio, vejamos:

Art. 1º Esta Lei regula o exercício do poder de polícia administrativa pelo Corpo de Bombeiros Militar no âmbito do Estado do Paraná e institui as normas gerais para a fiscalização e a execução das medidas de prevenção e combate a incêndio e a desastres nas edificações, estabelecimentos, áreas de risco e eventos temporários, com objetivo de proteger a vida das pessoas e reduzir danos ao meio ambiente e ao patrimônio em caso de sinistros.

O direito à vida está previsto no art. 5º, da Constituição da República Federativa de 1988 e, trata-se de direito e garantia fundamental, para tanto o Estado deve zelar por este direito. O direito à vida é tratado pelo constituinte como o primeiro na lista dos direitos fundamentais previstos na Constituição, é valor supremo na ordem constitucional, por este motivo o poder de polícia conferido ao Corpo de Bombeiros Militar do Paraná, tem o condão de proteger o interesse público, mesmo que limitando e restringindo direitos de particulares.  

O art. 4º da Lei 19.449/18, segue informando sobre a competência do Corpo de Bombeiros Militar do Paraná, que será “normatizar, analisar, vistoriar, licenciar e fiscalizar as medidas de prevenção e combate a incêndio e a desastres em edificações, estabelecimentos e áreas de risco”, bem como os meios a serem seguidos para o exercício do poder de polícia administrativa, quais sejam, fiscalização, requisição de análises de projeto e de documentos, emissão de documentos, aplicação de sanções administrativas e aplicação de medidas acautelatórias.

Vale frisar que no momento da vistoria o Bombeiro Militar, poderá solicitar ao proprietário, responsável pela edificação ou área de risco, o teste dos equipamentos pertinentes às medidas de segurança, conforme art. 10, §1º da referida lei, alguns exemplos disso é verificar se a iluminação de emergência está funcionando, bem como nos casos de alarme e detecção de incêndio, os hidrantes também podem ser testados, pois devem atender as exigências da normatização do Corpo de Bombeiros Militar, além de verificar a validade dos extintores e se adequados ao risco à proteger em determinado ambiente.

Ainda, constatado em vistoria que o estabelecimento atende tais exigências, o proprietário terá direito ao CVCB (Certificado de Vistoria do Corpo de Bombeiros), é o documento comprobatório que a edificação ou área de risco está em conformidade com as exigências dispostas na normatização do Corpo de Bombeiros Militar. Este CVCB autoriza o proprietário para exercício de suas atividades no período de doze meses, após este período, no segundo ano de exercício do estabelecimento, se atendidas às condições previstas em lei deverá ser emitido o CLCB (Certificado de Licenciamento do Corpo de Bombeiros), conforme previsto no art. 11, §2º da lei 19.449/18. Contudo, a renovação do CLCB, deverá ser anual (art. 11, §1º).

Sobre a autora
Julie Katlyn Antunes Schramm

Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Pós-graduanda em Direito Penal pela Faculdade Damásio.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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