Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Conhecendo o novo Código Civil

Exibindo página 9 de 12
Agenda 07/10/2005 às 00:00

30. RELAÇÕES DE PARENTESCO

As definições básicas do parentesco natural e civil foram mantidas, com as linhas retas e colateral. Mas o código, na medida em que reconheceu a união estável, estende a afinidade aos parentes do companheiro, e não só do cônjuge, sendo que a ruptura do casamento ou união não extingue a afinidade na linha reta.

A distinção entre filhos legítimos e ilegítimos foi abolida. Mas o artigo 1.596, que trata da presunção de concepção na constância do casamento deveria ter também mencionado a união estável. Neste mesmo artigo foram inseridos três incisos que se relacionam que técnicas científicas mais recentes de concepção, de modo que também se presumem concebidos na constância do casamento (e da união estável), os filhos "havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido (e o companheiro); havidos a qualquer tempo quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga, e os havidos por inseminação heteróloga, desde que com prévia autorização do marido".

A questão da impotência foi tratada com uma redação muito mais clara do que ocorria no revogado código, estabelecendo o artigo 1.599 que a impotência para gerar ilide a presunção de paternidade se for concomitante à época provável de concepção.

A ação negatória de paternidade é imprescritível, mas o artigo não a menciona mais como privativa do marido, ainda que se refira a este como o legitimado. 115

O artigo 1.609 incorporou o texto do artigo 1º da Lei 8.560/92, a qual já tinha inovado em relação ao revogado código civil ao admitir o reconhecimento denominado oficioso de paternidade, que é o que decorre de reconhecimento perante o juiz. O reconhecimento não comporta revogação (art.1.610) 116, e tampouco termo ou condição, que são ineficazes (art. 1.613).

A adoção é matéria que encontra previsão também no ECA (Lei nº 8.069/90). As disposições do ECA foram praticamente repetidas, mas não de todo. É o caso da idade mínima do adotante que, segundo o ECA, deve ser de 21 anos (art. 42), ao passo que o Código Civil. afirma que é de dezoito (art. 1.618). Quide inde?

O mesmo questionamento surge em relação à revogabilidade do consentimento dos pais ou representante legal até a sentença. A solução mais lógica é considerar que o regime a ser aplicado, se o do Estatuto da Criança e do Adolescente ou o do Código Civil, dependerá da idade do adotado. Se menor de dezoito anos, aplica-se o ECA. Se maior, o Código Civil.

No mais, há uma repetição de disposições do ECA e do revogado Código Civil, como a diferença mínima de 16 anos, a ruptura dos vínculos com a família de origem, exceto para os fins de impedimento para o casamento, a necessidade de consentimento do adotado maior de 12 anos, a necessidade de que se os adotantes foram dois, sejam casados ou vivam em união estável, permitida a adoção por separados ou divorciados, dentre outros pontos. Insta acentuar que a adoção de pessoa maiores de idade não dispensa a intervenção ministerial e sentença.

O novo código não mais fala em pátrio poder, mas em poder familiar. O exercício deste poder sobre os filhos menores compete aos pais, sejam casados ou vivam em união estável.

É exercido em igualdade pelo pai e pela mãe, podendo-se, em caso de divergência, recorrer ao Judiciário. 117 Competirá, no entanto, o seu exercício exclusivamente à mãe (ou a tutora, na ausência desta) em caso de o filho não ser reconhecido pelo pai.

Nas hipóteses de extinção do poder familiar, foi incluída a hipótese de decisão judicial, no rol do artigo 1.638. O poder familiar também comporta suspensão nas hipóteses do artigo 1.637, dentre as quais está a condenação criminal a pena superior a dois anos de prisão. 118


31. DIREITO PATRIMONIAL

No título relativo ao direito patrimonial são tratadas quatro temáticas a saber: regime de bens entre os cônjuges, usufruto e administração dos bens de filhos menores, alimentos, e bem de família.

Primeiro aspecto que chama a atenção reside na revogabilidade do regime de bens, outrora defesa pelo artigo 230 do revogado código. De acordo com o parágrafo segundo do artigo 1.639, a modificação poderá ocorrer através de pedido judicial, devidamente comprovado, ressalvados os interesses de terceiros.

O regime padrão é a comunhão parcial, que dispensa, diversamente do que ocorre com os demais regimes, a escritura pública para sua adoção.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Os regimes são quatro. Além dos três anteriormente existentes, foi inserido o da participação final nos aqüestos.

A separação obrigatória foi mantida nos termos do artigo 1.641 para os que casarem com inobservância das causas suspensivas, os maiores de sessenta anos e os que necessitam de autorização judicial. O rol é sensivelmente diferente do elencado no artigo 258 do revogado código. Devemos considerar plenamente vigente a Súmula 377 do STF, segundo a qual "no regime da separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento". 119

Foi banida a distinção entre os direitos do homem e da mulher em relação ao patrimônio. Desta forma, as faculdades do artigo 1.642 120 e as limitações do artigo 1.647 121 incidem para ambos os cônjuges.

Especificamente no caso do artigo 1.647, em caso de recusa injustificada de um dos cônjuges, pode ser pleiteada outorga judicial para suprimento. Se for realizado o ato sem suprimento, cabe ao cônjuge (ou seus herdeiros), prejudicado ação anulatória até dois anos após terminada a sociedade conjugal.

A adoção de regime patrimonial diverso do legal é feita por pacto antenupcial, cuja validade se condiciona à escritura pública e cuja carece de posterior realização do casamento a que se refere (art. 1.653). No caso de menor, salvante a hipótese de separação obrigatória, a eficácia fica sujeita à aprovação do responsável. Sua eficácia perante terceiros depende de registro em livro especial pelo oficial do registro de imóveis do domicílio dos cônjuges.


32. DOS REGIMES EM ESPÉCIE

Na comunhão parcial, o rol dos bens adquiridos na constância da união comunicam-se, formando patrimônio do casal. As exceções, que outrora constavam de dois artigos foram declinadas em um único dispositivo, que expressamente acresce as hipóteses previstas no artigo 269 do revogado código os bens de uso pessoal, os livros e os instrumentos de profissão e rendimentos do trabalho pessoal de cada cônjuge e os montepios, pensões e outras rendas semelhantes. Os ganhos decorrentes de atos ilícitos poderão comunicar-se, caso haja proveito para o outro cônjuge.

A administração do patrimônio comum compete, em condições de igualdade, a ambos os cônjuges e não mais ao marido, como ocorria no artigo 274 do revogado código, podendo no entanto, em caso de má versação, ser a administração atribuída com exclusividade a um dos cônjuges pelo juiz. No caso de atos gratuitos que impliquem cessão do uso ou gozo de bens comuns, a anuência de ambos é necessária.

As obrigações decorrentes dos encargos familiares obrigam os bens da comunhão, que não respondem pela obrigações decorrentes da administração de bens particulares de cada um.

Na comunhão universal, o rol de situações onde não há comunicação foi alterado. Foram inseridos, por força do inciso V do artigo 1.668, os livros e os instrumentos de profissão e rendimentos do trabalho pessoal de cada cônjuge e os montepios, pensões e outras rendas semelhantes. As obrigações decorrentes de atos ilícitos não mais foram mencionadas, pelo que se entende que se comunicam.

Na separação, há agora menção à obrigação de ambos os cônjuges contribuírem para as despesas do casal (leia-se, da família). Tanto para a separação obrigatória como para a convencional vige, como já mencionado, a Súmula 377 do STF.

Foi criado o regime da participação final nos aqüestos, pelo qual cada cônjuge tem patrimônio próprio, competindo a cada um, em caso de dissolução da sociedade, participação em metade dos bens adquiridos a título oneroso na constância do casamento. Computam-se nos aqüestos, para fins de partilha, os bens doados sem a necessária autorização do outro, assim como os alienados em detrimento da meação, se não houver preferência dos prejudicados de os reivindicar. Não se incluem, porém, os bens anteriores ao casamento e os seus sub-rogados, os que forem originados de sucessão ou liberalidade e as respectivas dívidas (art. 1.674).

Os móveis presumem-se adquiridos durante o casamento (art. 1.674, parágrafo único), e em face de terceiros, presumem-se do domínio do cônjuge devedor, salvo se forem de uso pessoal do outro (art. 1.680). Os bens móveis de cada cônjuge podem ser alienados livremente (art. 1.673, parágrafo único).

O direito à meação não é alienável (renunciável, cessível ou penhorável) na vigência do regime (art. 1.682). A liqüidação do patrimônio, no tocante aos bens, vale-se das regras do condomínio.

O regime dotal foi eliminado. Já era efetivamente um instituto em completo desuso.

O usufruto e administração dos bens dos filhos menores passa a ser exercido em condições de igualdade pelos pais, ficando excluídos, porém, os bens adquiridos pelo filho havido fora do casamento, antes do reconhecimento; o patrimônio adquirido pelo filho maior de dezesseis anos através de trabalho atividade profissional; os bens doados com cláusula impeditiva de usufruto ou administração pelos pais; os bens decorrentes de herança em caso de exclusão da sucessão dos pais.


33. ALIMENTOS

A tratativa dos alimentos no código vigente é mais extensa do que recebia no revogado código. Primeiro apontamento a ser feito reside na inclusão do companheiro o rol dos que podem pedir ou são obrigados a prestar alimentos. 122

O revogado código não definia o que se deveria entender por alimentos. A definição era feita a luz de critério jurisprudencial e doutrinário, e, posteriormente, com invocação de analogia ao artigo 852, parágrafo único, do CPC.

O caput do artigo 1.694 menciona alimentos necessários à vida, compatíveis com a condição social do alimentado, salientando estar abrangido também o direito à educação. O dispositivo poderia e deveria, seguindo na linha do artigo 852 parágrafo único, do CPC, ter procedido a uma definição básica, em linhas gerais, do que se deve entender por alimentos, fossem os necessarium vitae ou necessarium personae. 123

O parágrafo primeiro deste artigo manteve o critério da necessidade-possibilidade no estabelecimento do dever de prestação e na fixação do quantum, mas o parágrafo segundo efetivamente inova ao determinar que em caso de culpa do alimentado na criação da situação que conduz a necessidade de prestação de alimentos, estes serão somente os indispensáveis à subsistência, apontando para alimentos que são uma fração dos alimentos naturais.

Concorrem os parentes consoante o grau de parentesco, e se mais de um for acionado, obrigam-se na medida de seus recursos, sendo admitido o chamamento ao processo pelos co-devedores (artigos 1.698 do Código Civil, e 77 do CPC).

A obrigação alimentar, diversamente do que determinava ao artigo 402 do Código Civil. revogado, passa aos herdeiros, observado o artigo 1.694, e, embora não o diga a lei, sempre intra vires hereditatis, ou seja, de acordo com o benefício hereditário e a proporção do quinhão.

Os artigos 1.702 a 1.704 versam sobre o direito a alimentos por parte dos cônjuges separados (não aos divorciados), que poderão ser livremente postulados pelo inocente, e postulados pelo declarado culpado apenas dentro do limite do indispensável á sobrevivência, condicionados, neste último caso, à inexistência de outros que os possam assegurar.

O dispositivo, no entanto, deve ser aplicado cum grano salis, pois a jurisprudência mais recente nega alimentos ao que pode manter-se. Com efeito, há que ser observada a necessidade concreta, não sendo os alimentos decorrência automática da separação, como outrora ocorria, quando era praxe a cônjuge virago os postular. Hoje, o dever é recíproco.

O direito aos alimentos como é cediço, é irrenunciável, mas o seu exercício não. É, também, insuscetível de cessão, penhora ou compensação, vale dizer, é personalíssimo.

Em caso de determinação de alimentos em sentença de divórcio, o novo casamento do devedor não extingue a obrigação (art. 1.709), mas a união estável, o casamento, o concubinato ou o procedimento indigno do credor sim.

As prestações comportam atualização, a qual deve ser prevista na sentença ou acordo, judicial ou extrajudicial de acordo com os índices oficiais.


34. BEM DE FAMÍLIA

O regramento do denominado bem de família também é mais completo no vigente código, podendo ser apontadas novidades.

Não somente os chefes da família, mas os cônjuges ou terceiro poderão instituir o bem de família, sendo neste último caso a eficácia do ato, seja doação ou cláusula testamentária, condicionada à aceitação dos cônjuges. Quando instituído pelos cônjuges, deverão ser observadas as regras da impenhorabilidade, não podendo o valor do bem exceder um terço do patrimônio líquido.

O bem de família poderá ser edificação, com os respectivos acessórios e pertenças, urbano ou rural, o qual será destinado à moradia familiar. Pode também corresponder a valores mobiliários destinados à conservação do imóvel ou sustento da família, e neste caso não poderão exceder ao valor do bem imóvel, facultando-se ao instituidor designar instituição para administrá-los.

Qualquer que seja a hipótese, a instituição deverá pelo registro respectivo no Cartório de Registro de Imóveis. A administração compete, salvo disposição em contrário, a ambos os cônjuges, e a dissolução da sociedade conjugal não extingue o bem de família. Sua extinção poderá se dar a requerimento dos interessados, por ordem judicial, com ou sem sub-rogação em outros em caso de impossibilidade de sua manutenção, ouvido o Ministério Público. A alienação ou destinação diversa de bens imobiliários ou mobiliários que se constituem em bem de família está condicionada ao consentimento dos interessados ou representantes legais, com oitiva do Ministério Público.

A extinção também se dará pela morte dos cônjuges ou maioridade dos filhos, competindo, no primeiro caso, a administração ao filho mais velho ou tutor. No caso de morte de um cônjuge, se o bem for o único, o remanescente poderá pedir a extinção.

A impossibilidade de execução acarretada pela instituição do bem de família não se estende aos tributos relativos ao prédio, devendo ser determinada a sub-rogação em caso de saldo.

Sobre o autor
Marcelo Colombelli Mezzomo

Ex-Juiz de Direito no Rio Grande do Sul. Professor.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MEZZOMO, Marcelo Colombelli. Conhecendo o novo Código Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 828, 7 out. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7234. Acesso em: 25 nov. 2024.

Mais informações

Fusão de série de três trabalhos do autor, com o título: "Conhecendo o novo Código Civil"

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!