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Novo procedimento da exceção de incompetência:

análise do Projeto de Lei nº 4.726/2004

Estamos adentrando na terceira etapa de reforma do Código de Processo Civil. A primeira, ocorrida nos idos de 1994 e 1995; a segunda, em 2001 e 2002 e a terceira já começa a se delinear com os projetos de reforma que se encontram em tramitação no Congresso Nacional. Dentre os vários projetos, destacamos algumas importantes modificações no processo de conhecimento, em especial no alusivo à resposta do réu. Nos termos do artigo 297 do CPC, o réu poderá oferecer no prazo de 15 dias, contestação, exceção e reconvenção. No gênero exceção, encontramos as espécies suspeição, impedimento e incompetência.

A exceção de incompetência territorial é a exceção mais utilizada no processo civil brasileiro, servindo para demonstrar que a ação foi aforada na localidade diversa da apontada pela Lei. Alguns problemas, principalmente econômicos, podem surgir se o réu quiser opor a referida exceção e a ação tiver sido ajuizada em local muito distante de seu domicílio, que pela regra geral do art. 94 seria o competente. Imaginemos a seguinte situação: em um contrato de compra e venda de um carro, os partes, utilizando-se do permissivo legal do art. 111 do CPC, elegem o foro da cidade de Manaus-AM para dirimir eventuais conflitos advindos daquele negócio jurídico. Um dos contratantes ajuíza a ação de rescisão contratual em São Joaquim-SC, ou seja, "no outro lado do Brasil". Se o réu quiser opor a exceção de incompetência, terá que contratar um advogado em São Joaquim-SC e remeter os documentos indispensáveis ou deslocar-se para a localidade. Somente se for julgada procedente a exceção é que os autos serão enviados para Manaus-AM. Pode ser que o réu não conheça nenhum Advogado na Região Sul do Brasil ou não tenha condições financeiras para se deslocar para o local do ajuizamento, caso atue em causa própria. Certamente o réu não poderá defender-se de forma satisfatória, como deveria, não em virtude da inexistência de meio jurídico-processual, mas em decorrência do atual procedimento a ser adotado, qual seja, a necessidade de protocolização da exceção de incompetência no juízo onde foi ajuizada a ação, mesmo que em confronto com as normas processuais atinentes à competência territorial.

Para tentar resolver este problema, mais lógico que jurídico, o projeto de Lei nº 4726/2003 propõe a inclusão de um parágrafo único no artigo 305 do CPC. Vejamos a redação atual e a que esta sendo proposta:

Art. 305 atual: "Este direito poder ser exercido em qualquer tempo, ou grau de jurisdição, cabendo à parte oferecer exceção, no prazo de 15 dias, contados do fato que ocasionou a incompetência, o impedimento ou a suspeição".

NOVO PARÁGRAFO ÚNICO: "Na exceção de incompetência (art. 112), a petição pode ser protocolizada no juízo de domicílio do réu, com requerimento de sua imediata remessa ao juízo que determinou a citação".

Trata-se de modificação de extrema utilidade para que se mantenha a isonomia processual, corolário do direito processual civil. Somente podemos assegurá-la criando a possibilidade do réu protocolar a petição de exceção de incompetência em seu domicílio, remetendo-se ao juízo que determinou a citação. No nosso caso hipotético versado linhas atrás, sendo a ação proposta em São Joaquim-SC e tendo o réu domicílio em Manaus-AM, nesta localidade seria protocolada e exceção, sendo a mesma remetida para a cidade localizada no Sul do país. Dessa forma, não haveria necessidade do réu se deslocar, criando despesas desnecessárias, ainda mais que a exceção de incompetência tem por fito eliminar um vício, que mesmo sendo de interesse apenas das partes, pode prejudicar o exercício do direito de defesa, norma esta imperativa.

Outro ponto importante a ser observado sobre o mesmo projeto de lei toca à possibilidade do juiz conhecer de ofício a nulidade em cláusula de eleição de foro nos contratos de adesão. Sabemos que nosso sistema processual divide os critérios de competência em relativos e absolutos, sendo que o vício relativo ao primeiro somente pode ser alegado pelas partes, no momento e forma legais, enquanto que um vício relacionado à incompetência absoluta pode ser conhecido de ofício pelo juiz, a qualquer tempo e grau de jurisdição. Tal divisão leva em consideração a existência de direito individual no reconhecimento da incompetência relativa (territorial e valor da causa) e direito público quanto à competência absoluta (material, pessoal, funcional, hierárquica, etc).

O aludido sistema passa a ser modificado com o advento do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90). O artigo 111 do CPC, que alude à possibilidade das partes convencionarem a modificação da competência territorial e a Súmula 33 do STJ, que afirma não poder o Juiz conhecer de ofício a incompetência relativa, passam necessariamente por um repensar.

O CDC passa a disciplinar os contratos de adesão, afirmando que pode ser reconhecida, a pedido da parte, a nulidade da cláusula de eleição de foro, sempre que a mesma causar prejuízo à parte ou criar embaraços à sua defesa. Percebemos que a competência territorial, nestes casos, passa a ter tratamento parecido com a absoluta, não sendo a escolha das partes imodificável.

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Porém, repita-se, a nulidade não poderia ser conhecida de ofício pelo juiz, e sim, somente nos casos em que a parte (consumidor) requeresse. A publicização do Direito Processual Civil teve como uma de suas conseqüências, o reconhecimento pela jurisprudência do caráter absoluto do critério de competência territorial nos casos de contrato de adesão. Esse fato levou à tentativa de inserção do parágrafo único do art. 112 do CPC, conforme se pode verificar da exposição de motivos do projeto ora analisado:

De há muito surgem propostas e sugestões, nos mais variados âmbitos e setores, de reforma do processo civil. Manifestações de entidades representativas, como o Instituto Brasileiro de Direito Processual, a Associação dos Magistrados Brasileiros, a Associação dos Juizes Federais do Brasil, de órgãos do Poder Judiciário, do Poder Legislativo e do próprio Poder Executivo são acordes em afirmar a necessidade de alteração de dispositivos do Código de Processo Civil e da lei de juizados especiais, para conferir eficiência à tramitação de feitos e evitar a morosidade que atualmente caracteriza a atividade em questão.

Especificamente acerca da modificação do art. 112, com a inclusão de seu parágrafo único, temos:

Por fim, nos parece que as modificações dos arts. 112, 114 e 305 visam apenas à consolidação legislativa da orientação dominante nos tribunais, que têm por ''absoluta'' a competência do foro do domicílio do réu, nos contratos de adesão nos quais conste cláusula de eleição de foro favorecendo a parte que elaborou os termos contratuais.

Vejamos a redação do novo parágrafo único do art. 112 do Código de Processo Civil, proposto pelo Projeto de Lei nº 4.726/2004:

"Art. 112. . .....................................................................

Parágrafo único. A nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, pode ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de competência para o juízo de domicílio do réu".

Essas não são as duas únicas modificações a serem introduzidas pelo referido Projeto de Lei, porém, são aquelas que consideramos mais importantes se pautarmos nosso pensamento à luz do princípio da economia, celeridade e isonomia processual. Economia processual pois estaremos obrigando a parte a despender menor recursos materiais para realizar sua defesa, ainda mais que a exceção de incompetência visa a corrigir um erro processual cometido pelo autor; celeridade pois o juiz já poderá, de plano, ao receber a petição inicial, declarar a nulidade de clausula de eleição de foro, remetendo os autos para o domicílio do réu.

No tocante à isonomia processual, as duas normas criam condições de equilíbrio entre os litigantes, não existentes nas regras processual atuais. A primeira análise feita no presente ensaio, acerca de possibilidade do réu protocolar a exceção em seu domicílio, contribui para que o mesmo possa exercer seu direito de defesa da mesma forma que o autor pode exercer seu direito de ação, ou seja, sem dificuldade e dispêndios financeiros exacerbados, uma vez que nas regras atuais, o autor pode escolher a localidade onde ajuizará a demanda e ao réu não cabe tal escolha. As novas regras, que devem ser aprovadas em um futuro próximo, terminam com tal desigualdade. Em relação à decretação de ofício pelo Magistrado da nulidade da cláusula de eleição de foro, tal norma vem a coadunar-se com o espírito e princípios do Código de Defesa do Consumidor, tentando ao máximo diminuir a hipossuficiência do consumidor, em especial nos contratos de adesão.

Sobre os autores
Gildazio Klippel

Advogado, Mestre em Direito e Professor da UNIVIX, FDV e UNIVILA

Bruno Avila Guedes Klippel

Advogado, Mestre em Direito pela FDV/ES, Professor da UNIVIX e UNIVILA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KLIPPEL, Gildazio; KLIPPEL, Bruno Avila Guedes. Novo procedimento da exceção de incompetência:: análise do Projeto de Lei nº 4.726/2004. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 853, 3 nov. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7548. Acesso em: 22 dez. 2024.

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