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Responsabilidade dos sócios na execução trabalhista

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Agenda 05/09/2019 às 09:11

O presente trabalho tem como tema a responsabilidade dos sócios na execução trabalhista. Sua finalidade é discorrer sobre A responsabilidade quando esgotada a localização de bens em nome da PJ, bem bem como as consequências advinda dessa responsabilidade.

1. INTRODUÇÃO

O tema a ser tratado neste trabalho diz respeito à responsabilidade dos sócios na execução trabalhista.

No Brasil, uma das modalidades societária mais utilizada é a sociedade de responsabilidade limitada. Esse fato ocorre em virtude da autonomia existente entre o patrimônio da sociedade e o dos seus sócios, ou seja, as obrigações assumidas pela empresa respondem, em princípio, somente os bens que fazem parte do seu patrimônio.

A pessoa jurídica goza de personalidade própria, que se não confunde com a dos seus cotistas e acionistas. As empresas civis ou comerciais, desde que constituídas, investem-se de qualidade de “pessoas” que as torna suscetíveis de direitos e obrigações a com direito a uma existência própria, estribada em lei.

Porém, deve se levar em consideração que a lei é uma construção cultural cujo objetivo principal é o de proteger uma realidade social e não o de referendar falcatruas, manobras e artimanhas, daqueles que usam a pessoa jurídica para enriquecer o seu patrimônio particular em detrimento e prejuízo daquela e de seus credores, ou de prestigiar atos de irresponsabilidade de pessoas que não enfeixam as mínimas condições para estabelecer o comércio ou ainda que administram da maneira falha, deteriorando os bens sociais.

A importância do tema se dá em razão da ineficácia da execução trabalhista, ao ser constatada a inexistência de bens e valores, da pessoa jurídica, ora reclamada, a serem penhorados para a garantia do sucesso da demanda.

Alguns empresários, utilizando-se de má-fé, tentam aproveitar-se de brechas jurídicas, a fim de beneficiarem-se retirando os bens passíveis de penhoras do nome da empresa em razão de uma possível execução trabalhista.

Dessa forma, alegando a responsabilidade limitada às cotas da empresa, buscam esquivar-se do pagamento de débitos trabalhistas.

As pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros como uma consequência imediata da personificação da sociedade, que passa a ser unidade, não obstante a pluralidade de membros, acarretando uma independência patrimonial. Essa independência patrimonial fez com que surgissem sociedades com a intenção de acobertar manobras fraudulentas de seus sócios, os quais enriquecem ilicitamente, sem que o seu patrimônio particular se exponha a riscos. Desse modo, os sócios praticam atos que acarretam a impossibilidade de o patrimônio da sociedade ser suficiente para pagar as dívidas contraídas.

Nesse contexto, a satisfação do crédito trabalhista torna-se prejudicada e o empregado, embora tenha o seu direito reconhecido pelo Estado, não consegue executá-lo.

Assim, os sócios auferem os lucros da atividade empresarial, porém, sob a premissa de que sua responsabilidade é limitada, tentam eximir-se do pagamento dos créditos trabalhistas.

Diante dessa situação, surgem algumas indagações:

É possível recair a penhora sobre bens dos sócios quando constatada a inexistência ou a insuficiência de bens em nome da pessoa jurídica, devedora no processo de execução, a fim assegurar o crédito do empregado?

Sendo possível a execução dos sócios, qual o prazo para que o sócio retirante possa compor o polo passivo da execução?

Qual o limite da responsabilidade do sócio minoritário?

Assim, o presente trabalho visa demonstrar a possibilidade da responsabilização dos sócios, majoritários, minoritários, bem como dos retirantes, na execução trabalhista, não tendo a pessoa jurídica patrimônio suficiente para quitar o débito judicial.

Essa possibilidade é demonstrada através de doutrinas e jurisprudências dos Tribunais Regionais do Trabalho bem como do Tribunal Superior do Trabalho.

Para um melhor desenvolvimento dos estudos, a presente monografia foi estruturada em cinco capítulos e alguns destes em sub capítulos, de modo a permitir a sequência lógica da exposição e a abordagem da temática proposta.

Dessa forma, no primeiro capítulo foram abordados os aspectos conceituais sobre o incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Em suma, buscou-se investigar as origens de tal incidente processual, bem como as teorias predominantes a seu respeito, juntamente com os requisitos mínimos para a sua utilização. O incidente da desconsideração da personalidade jurídica na esfera trabalhista foi analisado no segundo capítulo, sendo apresentado as fundamentações da jurisprudência para a sua aplicação ou não.

Nos capítulos seguintes foi feita uma análise a respeito da responsabilidade dos sócios na execução trabalhista, verificando-se a possibilidade dessa responsabilidade ser solidária ou subsidiária, em razão do mesmo ser sócio majoritário, minoritário ou retirante. Analisou-se ainda, a responsabilidade da empresa terceirizada.

Finalmente, no último tópico, foi realizada analise a respeito da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, e sua relação com o processo do trabalho, no que concerne ao incidente.

2. A TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA

A pessoa jurídica surgiu em meio à crescente exploração das atividades produtivas e dos negócios, quando o homem percebeu que a aglutinação de esforços com outros indivíduos facilitaria, sobremaneira, a criação e o controle das organizações de grande porte econômico e administrativo. Contudo, para que a pessoa jurídica[1] pudesse subsistir e desenvolver-se no mundo jurídico sem depender das pessoas que as constituem, foi-lhe concedida, por meio da lei, a personalidade[2].[3]

Nas palavras de Fábio Ulhoa Coelho, “Da definição da sociedade empresária como pessoa jurídica derivam consequências precisas, relacionadas com a atribuição de direitos e obrigações ao sujeito de direito nela encerrado. Em outros termos, na medida em que a lei estabelece a separação entre a pessoa jurídica e os membros que a compõem, consagrando o princípio da autonomia patrimonial, os sócios não podem ser considerados os titulares dos direitos ou os devedores das prestações relacionados ao exercício da atividade econômica, explorada em conjunto. Será a própria pessoa jurídica da sociedade a titular de tais direitos e a devedora dessas obrigações. Três exemplos ilustram as consequências da personalização da sociedade empresária: a titularidade obrigacional, a titularidade processual e a responsabilidade patrimonial”[4]

A pessoa jurídica não se confunde com a pessoa de seus sócios. São distintas, com conjuntos patrimoniais (bens, direitos e deveres) igualmente distintos. Não obstante, diante do cuidado que deve cercar a utilização do instituto abstrato da pessoa jurídica é que teve lugar a figura da desconsideração da personalidade jurídica, por meio da qual a barreira distintiva entre a pessoa jurídica e seus sócios é superada para que os últimos respondam, com seu patrimônio, pelas obrigações daquela.

Da personalização da sociedade empresária, portanto, decorre importante consequência, que é o princípio da autonomia patrimonial, segundo o qual os sócios não respondem, em regra, pelas obrigações da sociedade[5].

Ocorre que essa autonomia é relativa e, conforme Fábio Ulhoa Coelho “O princípio da autonomia patrimonial tem sua aplicação limitada, atualmente, às obrigações da sociedade perante outros empresários. Se o credor é empregado, consumidor ou o estado, o princípio não tem sido prestigiado pela lei ou pelo juiz”[6]

Todavia, essa independência patrimonial tornou frequente a realização de atos abusivos ou ilícitos, pelos integrantes das sociedades, com o intuito de obter proveito próprio em detrimento dos direitos de terceiros. Em virtude disso, verificou-se a necessidade de criar alguma proposição jurídica para impedir essa prática, ou seja, que permitisse a desconsideração dos efeitos da personalidade, a fim de atingir a responsabilidade dos sócios.[7]

Nesse contexto, foi concebida a teoria da desconsideração da pessoa jurídica, a qual possui várias denominações, a saber: disregard doctrine, disregard of legal entity, lifting the corporate veil que significam, respectivamente, doutrina da desconsideração, desconsideração da personalidade jurídica e levantamento do véu corporativo, bem como desestimação da personalidade jurídica, doutrina da penetração e descerramento do véu corporativo.[8]

Dallegrave Neto[9] conceitua o instituto da teoria da desconsideração da pessoa jurídica como:

[...] a desconsideração, episódica e relativa, da personalidade jurídica da sociedade devedora como forma de executar diretamente os bens dos sócios que a compõe, sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo à satisfação de créditos de terceiros.

O surgimento da teoria da desconsideração da pessoa jurídica ocorreu com a construção jurisprudencial dos países do sistema common law, sendo posteriormente aperfeiçoada pela doutrina e, por fim, respaldada na norma legal. No entanto, existe divergência a respeito do primeiro julgado que originou essa teoria.[10]

Para Sitta,[11] a primeira indicação sobre a superação da personalidade jurídica foi com a jurisprudência norte-americana em 1809 no caso envolvendo o Bank United States em face de Deveaux. O juiz Marshall manteve a jurisdição das cortes federais sobre as corporations, visto que a Constituição Federal americana, no art. 3°, seção 2ª, reserva a tais órgãos judiciais as lides entre cidadãos de diferentes Estados. Ao estabelecer a competência desconsiderou a personalidade jurídica, sob o fundamento de que não se tratava de sociedade, e sim de sócios daquelas corporações.

Desse modo, a figura do sócio prevaleceu perante a personalidade jurídica, como justificativa para o conhecimento da causa pela corte federal, pois sua jurisdição, conforme o referido texto constitucional norte-americano, seria apenas para conhecer e julgar as lides entre cidadão de Estados diversos.[12]

No entanto, Dallegrave Neto considera o caso inglês Salomon versus Salomon, julgado em Londres no ano de 1897, o que efetivamente consagrou a teoria da desconsideração da pessoa jurídica, a qual ocorreu da seguinte forma:

O comerciante Aaron Salomon constituiu uma empresa, colocando como sócios minoritários sua esposa e seus cinco filhos. As cotas foram assim distribuídas: 20.000 para Aaron e 1.000 para cada um dos demais integrantes. Em pouco mais de um ano a companhia encontrava-se endividada e sem patrimônio suficiente para saldar as obrigações. O liquidante dos credores quirografários, ao perceber que a empresa não tinha bens para honrar suas dívidas, alegou que a atividade da empresa  se confundia com a atividade pessoal de Aaron, postulando a execução dos bens do sócio majoritário. Foi verificado, contudo, que no momento da integralização do capital, o preço da transferência do fundo de comércio da pessoa física de Aaron Salomon era superior ao valor das ações da company. Logo, pela diferença, Aaron Salomon permanecia como principal e privilegiado credor da Salomon & Co. Ltd., estabelecendo-se um inusitado litígio entre Aaron Salomon vs Salomon & Co. Ltd. com o objetivo de frustrar os créditos de terceiros[13].

A primeira e a segunda instância condenaram Aaron a pagar aos credores da Salomon & Co. Ltd., desconsiderando a separação do patrimônio da pessoa física e jurídica, em virtude da constatação da manobra fraudulenta. A terceira instância, a House of Lords, por sua vez, reformou essas decisões e reafirmou a distinção da personalidade dos sócios e da companhia, desprezando a fraude cometida por Aaron. Apesar disso, as decisões de grau inferior serviram de precedente jurisprudencial para a teoria da desconsideração da pessoa jurídica[14].

No Brasil, o pioneiro a tratar da matéria foi Rubens Requião, em conferência proferida na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná, no fim da década de 60, intitulada “Abuso de Direito e Fraude Através da Personalidade Jurídica: Disregard Doctrine”. Relevante apontar, aqui, as palavras do eminente doutrinador sobre o tema:

A doutrina desenvolvida pelos tribunais norte-americanos, da qual partiu o Prof. Rolf Serick para compará-la com a moderna jurisprudência dos tribunais alemães, visa impedir a fraude ou abuso através do uso da personalidade jurídica, e é conhecida pela designação disregard of legal entity ou também pela lifting the corporate veil. [...] Ora, diante do abuso de direito e da fraude no uso da personalidade jurídica, o juiz brasileiro tem o direito de indagar, em seu livre convencimento, se há de consagrar a fraude ou o abuso de direito, ou se deva desprezar a personalidade, para, penetrando em seu âmago, alcançar as pessoas e bens que dentro dela se escondem para fins ilícitos ou abusivos.[15]

Segundo Requião[16], o dispositivo aludido pretendia apenas [...] a radical medida de dissolução da pessoa jurídica, quando for ela desviada dos fins que determinaram a sua constituição, enquanto a doutrina exposta objetiva somente que o juiz desconsidere episodicamente a personalidade jurídica, para coartar a fraude ou o abuso do sócio que dela se valeu como escudo, sem importar essa medida dissolução da entidade.

Nessa esteira, a teoria da desconsideração da pessoa jurídica desenvolveu-se não no sentido de desprestigiar a pessoa jurídica, bem como sua autonomia patrimonial, mas sim na intenção de preservá-la. Com efeito, a teoria impossibilita que haja o desvio do rumo para qual a entidade foi criada e o abuso de direito praticado pelos seus sócios, porquanto acarreta a desproteção dos bens destes, que tinham como amparo a sociedade limitada da pessoa jurídica para a realização do próprio enriquecimento ilícito.[17]

Assim, não se pode perder de vista que a pessoa jurídica continua existindo, pois não se trata de anulá-la ou de reconhecer-lhe a ineficácia, e sim de buscar a efetividade do crédito judicial, ignorando, mesmo que momentaneamente, a regra da separação patrimonial, penetrando sobre o véu da pessoa jurídica para executar os bens de seus sócios[18].

Portanto, é equivocado o uso das expressões “despersonalização da empresa” ou “desconstituição da pessoa jurídica”, já que o principal benefício decorrente da aplicação da teoria da desconsideração da pessoa jurídica constitui a não extinção ou dissolução da pessoa jurídica quando prejudicada por um ou mais de seus sócios. Estes responderão pessoalmente pelos danos causados à sociedade e terceiros, preservando a entidade em pleno funcionamento com o objetivo de evitar a dispensa em massa dos empregados e não piorar a economia de mercado.[19]

Deve-se levar em conta que a mistura de patrimônios sozinha não pode justificar a penetração: esse só será justificada quando conduzir ao esvaziamento do patrimônio da sociedade, diminuindo com isso as garantias dos credores da sociedade.

A teoria da desconsideração não cuida de extinção ou dissolução da pessoa jurídica, nem se confunde com a anulação ou declaração de nulidade da personalidade jurídica[20]. Esta é apenas desconsiderada no caso em concreto, deixando de produzir certos efeitos, como forma de se evitar seu uso abusivo. A ineficácia fica restrita ao ato em questão, permanecendo a autonomia da pessoa jurídica para os demais aspectos, sem atingir sua constituição, estrutura e existência[21], e sem implicar na extinção da entidade

Se a personalidade jurídica constitui criação da lei, como concessão do Estado, objetivando a realização de um fim, nada mais correto do que se reconhecer ao Estado, através de sua Justiça. A faculdade de verificar se o direito concedido está sendo adequadamente usado. A personalidade jurídica passa a ser considerada doutrinariamente um direito relativo, permitindo ao juiz penetrar o véu da personalidade para coibir os abusos ou condenar a fraude, através de seu uso.

Cumpre salientar que a teoria da desconsideração só possui relevância quando, além de haver uma sociedade personificada, a responsabilidade de seus integrantes seja limitada. Nessa vereda, pode-se restringir a aplicação da teoria a somente dois tipos societários: as sociedades anônimas e as sociedades limitadas. Para os demais tipos societários, a doutrina não desperta maior interesse, pois, de qualquer forma, os sócios ou dirigentes responderão ilimitadamente.[22]

Após as noções acerca do instituto da desconsideração da pessoa jurídica, necessário se faz o estudo de suas teorias, a fim de averiguar a tendência de sua aplicação na execução trabalhista.

2.1. Teoria maior e teoria menor

Atualmente, existem duas teorias de desconsideração da personalidade jurídica, a maior e a menor. Fábio Ulhoa Coelho as denomina de teoria correta, que é subdividido em formulação subjetiva e objetiva: Pela formulação subjetiva, os elementos autorizadores da desconsi­deração são a fraude e o abuso de direito; pela objetiva, a confusão patrimonial. A importância dessa diferença está ligada à facilitação da prova em juízo[23]  e incorreta: Nela, adota-se o pressuposto de que o simples desatendimento de crédito titularizado perante uma sociedade, em razão da insolvabilidade ou falência desta, seria suficiente para a imputação de responsabilidade aos sócios ou acionistas. De acordo com esta distorção, se a sociedade não possui patrimônio, mas o sócio é solvente, isso basta para responsabilizá-lo por obrigações daquela.[24]

Efetivamente, a Disregard Doctrine, com o intuito de garantir as relações empresariais, busca evitar o desvio de finalidade do instituto da pessoa jurídica, quando esta for utilizada flagrantemente para fins estranhos às suas atividades empresariais, responsabilizando-se, consequentemente, os sócios, sempre que esses, para o seu locupletamento pessoal, utilizarem da autonomia patrimonial da sociedade para praticar atos ilícitos:

Em primeiro lugar, como parece óbvio, o afastamento da forma externa da pessoa moral permite que se busque no patrimônio pessoal dos sócios a satisfação dos créditos frustrados. Dessa forma, todos aqueles que, valendo-se do manto societário, agiram de modo fraudulento ou abusivo, burlando a lei, violando obrigações contratuais ou prejudicando terceiros, responderão pelos créditos insatisfeitos dos credores sociais.[25]

Entretanto, a teoria da desconsideração, conforme destaca André Pagani de Souza, “somente deve ser aplicada nas hipóteses em que a autonomia da pessoa jurídica se apresenta como um obstáculo para a composição dos diversos interesses envolvidos no caso concreto, ou melhor, para a realização da justiça”.31 Em outros termos, justifica-se o superamento da autonomia patrimonial da sociedade somente quando houver ilicitude praticada através dela, “exatamente para revelar o oculto por trás do véu da pessoa jurídica”.32 Observação semelhante é feita por Suzy Elizabeth Cavalcante Koury:

Uma vez personificado, o ente passa a ter existência jurídica, adquire personalidade e atua no mundo jurídico da mesma forma que as demais pessoas jurídicas, não podendo o ordenamento que o personificou ignorar esta nova realidade ou afastar arbitrariamente os seus efeitos. Daí decorre a necessidade de uma doutrina como a da desconsideração da personalidade jurídica para a fixação dos limites de utilização da personalidade jurídica, criada por lei, de acordo com o interesse social, o que seria totalmente desnecessário se as entidades personalizadas não fossem reais para o direito e se a personalidade se reduzisse a mera expressão vocabular.[26]

Neste diapasão, devido à aplicação predominante da corrente subjetiva no direito pátrio, também conhecida como teoria maior, para que se possa desconsiderar a personalidade jurídica da empresa distinta da pessoa de seus sócios, imprescindível que reste comprovado o desvio de função da sociedade, através da fraude ou do abuso de direito. Assim, o elemento subjetivo, qual seja, a prova da intenção do agente de prejudicar terceiros ou de buscar o benefício indevido, ou, pelo menos, de sua conduta culposa é indispensável para a aplicação da desconsideração, sendo este ponto crucial e determinante que deve restar cabalmente comprovado. Portanto, a aplicação episódica da desconsideração da personalidade jurídica fica adstrita à demonstração, no caso concreto, da conduta culposa do sócio ou da sua intenção abusiva ou fraudulenta na utilização do instituto para fins ilícitos.

A teoria maior somente reconhece o afastamento da desconsideração da personalidade quando ocorrer a manipulação fraudulenta ou abusiva do instituto, diferenciando assim, dos demais institutos que atingem o patrimônio particular dos sócios por obrigações da sociedade.

Nesse sentido, Ana Caroline Santos Ceolin, assevera que:

Para que o juiz possa desconsiderar a personalidade jurídica de determinada sociedade, é preciso, antes de mais nada, que o credor social produza provas cabais e incontestes do uso abusivo da sua estrutura formal pelos seus sócios. Inexistindo elementos probatórios que revelem o abuso perpetrado através da pessoa jurídica, improcedente será a pretensão de aplicar-se a teoria da desconsideração.[27]

Justamente pela viabilidade de controle do excesso, a Teoria Maior oferece (maior) segurança ao sistema, permitindo a regular utilização da pessoa jurídica e, simultaneamente, meios coercitivos de prospecção sobre o acervo patrimonial dos sócios do ente moral.

Em que pese a diminuta – mas não menos relevante – aplicação no Direito brasileiro, mister referir também a construção da Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, cuja incidência, por mais restritiva que seja, pode ser observada em situações de conflito em que os bens jurídicos envolvidos representam interesses porventura incomensuráveis (matéria ambiental, exemplificativamente).

E de outro lado à teoria menos elaborada, ou seja, a teoria menor, que trata da desconsideração em qualquer hipótese de execução de patrimônio de sócio por obrigação social, afastando o princípio da autonomia patrimonial sempre que ocorrer a insatisfação do crédito.

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 Para aplicação da teoria menor não se necessita de qualquer requisito para o afastamento da personalidade jurídica; basta apenas o não cumprimento da obrigação perante os credores, seja por estado de insolvência ou falência da sociedade.  Como leciona Fábio Ulhoa Coelho, “Nela, adota-se o pressuposto de que o simples desatendimento de crédito titularizado perante uma sociedade, em razão da insolvabilidade ou falência desta, seria suficiente para a imputação de responsabilidade aos sócios ou acionistas. De acordo com esta distorção, se a sociedade não possui patrimônio, mas o sócio é solvente, isso basta para responsabilizá-lo por obrigações daquela. A aplicação apressada da teoria não se preocupa em distinguir a utilização fraudulenta da regular do instituto, nem indaga se houve ou não abuso de forma. Por outro lado, parece ser de todo irrelevante, nesse caso, a natureza negocial do direito creditício oponível à sociedade. A aplicação incorreta da teoria da desconsideração equivale, em outros termos, à simples eliminação do princípio da separação entre pessoa jurídica e seus integrantes”[28]

 Doutro modo a essência na teoria maior é não vulgarizar o instituto do afastamento da personalidade jurídica, assegurando que ela deva ocorrer em casos específicos (excesso de poder, infração de lei, abuso de direito, violação do contrato ou estatuto social ou fato ou ato ilícito).

Sobre as duas teorias (maior e menor) discorre Coelho: “Se a formulação correta da teoria pode ser considerada um aprimoramento da pessoa jurídica, a aplicação incorreta deve ser vista como o questionamento de sua pertinência, enquanto instituto jurídico”.[29]

Convém ainda ressaltar entendimento recente de Fábio Ulhoa Coelho “Em 1999, quando era significativa a quantidade de decisões judiciais desvirtuando a teoria da desconsideração, cheguei a chamar sua aplicação incorreta de “teoria menor”, reservando à correta a expressão “teoria maior”. Mas a evolução do tema na jurisprudência brasileira não permite mais falar-se em duas teorias distintas, razão pela qual esses conceitos de “maior” e “menor” mostram-se, agora, felizmente, ultrapassados.”[30]

3. A APLICAÇÃO DA DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA NA EXECUÇÃO TRABALHISTA

O ordenamento jurídico possui a característica de ser polissistemático, pois as normas são agrupadas e ordenadas de acordo com uma pluralidade de sistemas. Dentre eles, destaca-se o direito societário, o direito do trabalho e o direito do consumidor, os quais têm regras e princípios próprios, formando cada ramo um microssistema. Em se tratando de desconsideração da personalidade jurídica, as regras do direito societário conflitam com as regras e os princípios dos microssistemas trabalhista e do consumidor, porquanto são inspirados em valores diferentes.[31]

A desconsideração da personalidade jurídica na execução trabalhista tende à teoria menor, na medida em que o entendimento dominante é no sentido de que independente de fraude, abuso de poder ou ato ilícito, basta o inadimplemento e que a sociedade empregadora não disponha de patrimônio para suportar a execução. O fundamento é o de que o crédito trabalhista é superprivilegiado, por ter natureza alimentar, de forma que a desconsideração é amplamente admitida, quando for a última alternativa para a execução do crédito trabalhista.

No direito societário predomina o princípio da autonomia patrimonial, decorrente da personalização das sociedades empresárias, segundo o qual os sócios não respondem, em geral, pelas obrigações da sociedade. Por outro lado, no direito trabalhista prevalece o princípio da proteção do trabalhador, em que as normas devem ser interpretadas e aplicadas no intuito de tutelar o trabalhador, por causa de sua sujeição e dependência econômica em relação ao empregador. No direito do consumidor se sobressai o princípio da proteção ao consumidor.[32]

Como se pode notar, a desconsideração da pessoa jurídica representa uma questão polissistêmica, visto que envolve, ao mesmo tempo, interesses societários, consumeristas e trabalhistas, apresentando em cada um desses microssistemas características diferentes, conforme os respectivos princípios. Como no microssistema trabalhista não existe lei expressa autorizando a desconsideração da pessoa jurídica, deve-se fundamentar a sua utilização nos outros microssistemas, em razão do disposto no art. 8°, parágrafo único, da Consolidação das Leis do Trabalho[33], naquilo em que não for incompatível com seus princípios[34].

Nessa direção, aplica-se o art. 28 do Código de Defesa do Consumidor ao processo trabalhista, pois ambas as legislações são tuitivas, consequentemente, compatíveis.

Segundo BARACAT “O artigo 28 do CDC, embasa, por força de aplicação analógica, a responsabilização do sócio e o comprometimento de seu patrimônio, independentemente da existência de fraude, abuso de direito ou qualquer ato ilícito.”[35]

A compatibilidade entre o direito trabalhista e o direito do consumidor acontece em virtude do princípio de tutela ao demandante hipossuficiente, amplamente utilizado nesses dois ramos do direito.[36]

Ressalta-se que o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 28, foi a primeira lei brasileira a prever a teoria desconsideração da pessoa jurídica. A normatização expressa dessa teoria representou um significativo avanço, especialmente quanto ao disposto no § 5° do referido artigo, ao autorizar sua utilização sempre que o uso da pessoa jurídica impedir a satisfação do crédito do consumidor prejudicado[37]. O art. 28, § 5° do Código de Defesa do Consumidor estabelece:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. [...]

§ 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores (BRASIL, 1990).

No entanto, Dallegrave Neto (grifo do autor)[38] adverte que a enumeração contida no caput do art. 28 do Código de Defesa do Consumidor recebe crítica da doutrina, visto que alguns institutos não poderiam estar inseridos como causas de aplicação da desconsideração da pessoa jurídica, porquanto dizem respeito à categoria da responsabilidade civil. É o caso do excesso de poder, infração da lei e violação dos estatutos ou do contrato social, os quais ensejam a responsabilização específica do agente causador, e não desconsideração momentânea da sociedade, como ocorre na disregard doctrine. Além disso, Silva[39] e Martins[40] lecionam que o art. 28, § 5° do Código de Defesa do Consumidor reporta-se exclusivamente às relações de consumo, portanto, não há como aplicar analogicamente e extensivamente às relações de emprego. Assim, segundo os autores, a utilização do artigo na execução trabalhista é arbitrária e contrária ao sistema jurídico.

A regra que se poderia aplicar, por analogia, ao processo do trabalho é a Lei 12529/2011, que revogou a Lei antitruste. Esta, em seu art. 34[41], autoriza a desconsideração da pessoa jurídica no caso de infração à ordem econômica, desde que caracterizado o abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato, ou ato ilícito, ou violação dos estatutos ou contrato social.

A referida lei objetiva compatibilizar os ditames constitucionais sobre a ordem econômica, previstos no art. 170 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, entre eles, a repressão ao abuso do poder econômico, a valorização do trabalho humano, a livre iniciativa e a defesa dos consumidores. Contudo, para tutelar os interesses envolvidos, precisa utilizar mecanismos eficazes, que possibilitem a efetiva responsabilização dos autores de infrações à ordem econômica[42].

Nesse sentido, um mecanismo importante, uma vez configurada a infração, é a desconsideração da personalidade jurídica, quando não se conseguir responsabilizar diretamente o sócio ou o administrador, pois, do contrário, não haverá necessidade para o afastamento da autonomia patrimonial da pessoa jurídica. Para todos os efeitos, a atribuição da responsabilidade será ao efetivo agente da conduta, o qual não poderá usar a pessoa jurídica a fim de se abster das consequências do seu ato ilícito[43].

A teoria da desconsideração da pessoa jurídica consolidou-se com o advento do art. 50 do Código Civil, porém mais restrito que a norma referente ao direito do consumidor, pois se baseia na igualdade entre as partes envolvidas no direito das obrigações e no princípio da autonomia privada[44]. O art. 50 do Código Civil determina:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica

Como se depreende, o supracitado artigo adotou a teoria maior subjetiva e objetiva da desconsideração da pessoa jurídica, já que estabeleceu o abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, como requisito para desconsiderar a personalidade jurídica.[45]

Em virtude disso, Baracat[46] alega que o art. 50 do Código Civil não pode ser aplicado no direito trabalhista, pois permitiria a desconsideração somente nas hipóteses de desvio de finalidade e confusão patrimonial, esquecendo, contudo, das situações corriqueiras como, por exemplo, a falência da sociedade ou, simplesmente, o encerramento da atividade empresarial. Dessa maneira, o artigo mostra-se restritivo, não satisfazendo plenamente os direitos do trabalhador.

Não se pode olvidar que no direito do trabalho, um de seus princípios fundamentais é o da proteção, o qual visa proteger o trabalhador hipossuficiente, considerado a parte mais fraca na relação. Por conseguinte, esse princípio procura atingir a condição de igualdade entre as partes no processo, compensando a inferioridade econômica do trabalhador com a superioridade jurídica[47].

Nesse diapasão, Almeida[48] afirma que o direito do trabalho é o ramo que se mostra mais compatível com a teoria da desconsideração “[...] até porque os riscos da atividade econômica, na forma da lei, são exclusivos do empregador”. É o que estabelece o caput do art. 2° da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)[49].

Ademais, cumpre salientar que a Consolidação das Leis do Trabalho, em seu art. 2°, § 2°[50] foi a pioneira a adotar a teoria da desconsideração da pessoa jurídica em se tratando de grupo de empresas, reputando-as solidariamente responsáveis pelo adimplemento das verbas decorrentes do contrato de trabalho[51].

Entretanto, Nahas[52] entende que o art. 2°, § 2° da Consolidação das Leis do Trabalho diz respeito apenas à hipótese de obrigação solidária entre empresas do grupo, não sendo necessária a desconsideração da pessoa jurídica a fim de alcançar a obrigação solidária daquelas empresas. Com isso, a autora menciona que a desconsideração só é cabível caso a responsabilidade do ato não puder ser imputada diretamente ao sócio, administrador ou qualquer pessoa jurídica.

Nessa mesma linha, não está correto afirmar que as transformações, fusões, incorporações ou cisões de pessoas jurídicas, hipóteses dos arts. 10[53] e 448[54] da Consolidação das Leis do Trabalho, são casos de desconsideração. Em todas essas situações ocorre a preservação da responsabilidade, de maneira que se faz absolutamente desnecessário o uso do instituto da desconsideração[55].

Por derradeiro, cabe frisar que um dos princípios basilares da execução trabalhista consiste na superioridade do exequente trabalhista[56] extraído do art. 797 do Código de Processo Civil[57]. Este dispositivo aduz que a execução deve se realizar no interesse do credor. Logo, como a teoria da desconsideração da pessoa jurídica objetiva o proveito do exequente, em relação à satisfação de seu crédito judicial, não há dúvida de que na execução trabalhista é possível aplicar a disregard doctrine[58].

É inadmissível aceitar apenas a aplicação da teoria maior no processo do trabalho, pois permitiria o desprezo dos princípios vetores do ordenamento jurídico brasileiro, em especial o da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

Ao ensejo da conclusão deste item, constatou-se que a teoria da desconsideração da pessoa jurídica na execução trabalhista deve ser aplicada em consonância, principalmente, com os princípios que visam a proteção do trabalhador. Com efeito, a premissa de que os sócios não respondem pelas obrigações da sociedade não pode ser absoluta no direito do trabalho, pois além do risco da atividade econômica pertencer ao empregador, se está diante de créditos de natureza alimentar. Por tais razões, se faz necessário, no próximo tópico, discorrer acerca da responsabilidade dos sócios para compreender como ela ocorre no âmbito da justiça do trabalho.

4. A RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS NA EXECUÇÃO TRABALHISTA SOB O PRISMA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

No tópico anterior verificou-se que a pessoa jurídica, uma vez constituída regularmente, adquire a personalidade, tornando-se ente de direitos e obrigações nas relações jurídicas que participa. Por conseguinte, a responsabilidade[59] pelas obrigações sociais recai, em princípio, sobre o patrimônio da pessoa jurídica, gerando para os indivíduos que a compõem a irresponsabilidade pelos negócios por ela praticada.[60]

No entanto, essa autonomia patrimonial da pessoa jurídica só possui aplicação ampla nas sociedades em que a responsabilidade dos seus integrantes for limitada, pois nas outras sociedades os sócios respondem de forma ilimitada com o seu patrimônio. Desse modo, para o presente trabalho, interessa examinar a responsabilidade dos sócios na sociedade limitada, porquanto, nas demais formas societárias é indubitável que os sócios respondam pelas obrigações sociais[61].

A importância da análise da responsabilidade dos sócios consiste, principalmente, no fato de a sociedade de responsabilidade limitada ser a modalidade societária mais utilizada no Brasil. Nesse sentido, deve-se frisar que a limitação da responsabilidade foi uma maneira de estimular a exploração da atividade econômica, porque poucas pessoas, ou nenhuma, dedicar-se-iam a organizar novas empresas se o insucesso da iniciativa pudesse redundar a perda de todo o patrimônio, amealhando ao longo de anos de trabalho e investimento, de uma ou mais gerações[62].

Como salienta Silva[63], resguardar os bens do empreendedor não constitui o único fundamento da limitação da responsabilidade. O outro argumento é a incapacidade do Estado em absorver toda a mão-de-obra disponível no mercado de trabalho, logo, as empresa são as responsáveis pela maioria dos empregos. Diante dessa incapacidade do Estado, lhe resta incentivar a criação e o crescimento das empresas como forma de promover o emprego e a justiça social.

 Assim, o legislador consignou expressamente no art. 1.052[64] do Código Civil a limitação da responsabilidade do sócio ao montante do capital social subscrito e não integralizado. Com isso, quando o sócio declarar, em contrato social, ter integralizado a quota social subscrita sem que tenha efetuado a subscrição, ele responderá pessoalmente pela diferença não integralizada[65]

Nestes termos, se o capital social não estiver totalmente integralizado, a responsabilidade do sócio será subsidiária[66] em relação a terceiros, inclusive no que concerne ao cumprimento das dívidas de natureza trabalhista, ou seja, somente será atingido se a sociedade não saldar as obrigações assumidas. Entretanto, entre os sócios da sociedade limitada, a responsabilidade pela integralização do capital social será solidária[67], já que todos concorrem individualmente pela integralização do restante que falta para completar o capital social[68].

Todavia, ocorre situação peculiar quando, mesmo integralizado totalmente o capital social, o patrimônio da empresa não é suficiente para pagar os créditos trabalhistas. A Consolidação das Leis do Trabalho não possui enunciado que resolva essa problemática, consequentemente, resta aplicar a desconsideração da pessoa jurídica[69].

Nesse sentido é a decisão do Tribunal Superior do Trabalho:

RECURSO DE REVISTA. PROCESSO DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA. PENHORA SOBRE BEM DE SÓCIO. TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. Partindo da premissa de que os créditos trabalhistas, ante a natureza alimentar de que são revestidos, são privilegiados e devem ser assegurados, a moderna doutrina e a jurisprudência estão excepcionando o princípio da responsabilidade limitada do sócio, com fulcro na teoria da desconsideração da personalidade jurídica de forma que o empregado possa, verificada a insuficiência do patrimônio societário, sujeitar à execução os bens dos sócios individualmente considerados. Incorrida afronta à norma constitucional.

(TST – Recurso de Revista – 02549-2000-012-05-00 – Data de Publicação: 19/02/2002 – Relator: Helena Sobral Albuquerque)

No presente julgado, os bens dos sócios foram penhorados em virtude da desconsideração da pessoa jurídica, devedora principal. Isso ocorreu devido a prioridade dos créditos trabalhistas que não podem ficar sem proteção, abrindo, com isso, uma exceção ao princípio da responsabilidade limitada do sócio.

Continuando, Nas razões de revista, o Recorrente apresenta arestos a confronto e aponta ofensa ao artigo 5º, LIV[70] e LV[71] da Constituição Federal.

No acórdão recorrido, aplicou-se os arts. 596 do CPC/73[72], atualmente artigos 795, §§ 1º e 2º, c/c o art. 889[73] do CPC/73, da CLT, e 4º, da Lei 6.830/80[74], como razão de decidir.

Dessa forma foi penhorado um imóvel do recorrente, mesmo esse já se retirado da sociedade.

A jurisprudência do TST, consagra que, conforme demonstrado na demanda, se a retirada do sócio da sociedade comercial verificou-se após o ajuizamento da ação, pode ser ele responsabilizado pela dívida, utilizando-se para isso seus bens, quando a empresa de que era sócio não possui patrimônio suficiente para fazer em face da execução sofrida.

Em sede de Direito do Trabalho, em que os créditos trabalhistas não podem ficar a descoberto, vem-se abrindo uma exceção ao princípio da responsabilidade limitada do sócio, ao se aplicar a teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard of legal entity) para que o empregado possa, verificando a insuficiência do patrimônio societário, sujeitar à execução os bens dos sócios individualmente considerados.

Convém ressaltar que, ao assumir uma obrigação, o devedor responde com seus bens presentes e futuros (art. 789 do CPC/15), ou seja, os bens que estão em seu patrimônio no momento da negociação, bem como aqueles adquiridos posteriormente, salvo as exceções legais[75]. Dessa forma, o devedor, que é o titular da obrigação de prestar, torna-se responsável primário pela obrigação assumida, a qual deverá ser cumprida espontaneamente[76].

Contudo, se a obrigação não é cumprida espontaneamente, o credor tem a prerrogativa de pedir ao Estado que retire do patrimônio do devedor o montante suficiente para satisfazer a obrigação ajustada e frustrada. Entretanto, caso não haja bens suficientes, a execução poderá recair sobre pessoas que conservam a responsabilidade dos atos praticados pelo devedor. Nessa direção, se a pessoa jurídica, devedora principal, não possuir patrimônio necessário para adimplir suas dívidas, os sócios serão responsabilizados, ficando os seus bens sujeitos à execução, conforme estabelece o art. 592, inc. II[77], do Código de Processo Civil.[78]

Segundo Nahas (2007, p. 87), essa situação em que os sócios respondem por obrigações, as quais, em princípio, seriam das pessoas jurídicas, refere-se à responsabilidade secundária[79] ou subsidiária (art. 596 do Código de Processo Civil).

Nessa linha é o posicionamento do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região:

RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DEVEDORES PRINCIPAL E SUBSIDIÁRIO. BENEFÍCIO DE ORDEM. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO EM FACE DOS SÓCIOS. Esta Seção Especializada firmou entendimento no sentido de que cabe ao devedor subsidiário o ônus de apontar a existência de bens passíveis de penhora, pertencentes ao devedor principal, quando alega o benefício de ordem, e que somente após inviabilizada a execução em face das pessoas jurídicas (devedores principal e subsidiário) é que poderão ser autorizados a desconsideração da personalidade jurídica e o redirecionamento da execução em face do patrimônio dos sócios (item III da OJ EX SE 40). No caso, além várias as tentativas de cobrança da dívida da devedora principal e dos sócios desta, sem êxito, não indica a recorrente bens livres e desembaraçados da devedora principal. Agravo de petição não provido.

(TRT-9 - AP: 02596201386309004 PR 02596-2013-863-09-00-4, Relator: CÉLIO HORST WALDRAFF, Data de Julgamento: 20/10/2015,  SEÇÃO ESPECIALIZADA, Data de Publicação: DEJT em 03-11-2015).

No presente caso, foi requerido a substituição da penhora de uma sociedade de economia mista, sendo que a maioria do capital social pertencia a uma prefeitura.

Após a determinação da substituição da penhora, a agravante alegando que seu objetivo limitava-se à prestação de serviços públicos, requereu a liberação dos valores, o que foi negado.

Na supramencionada, entendeu-se que os sócios respondem subsidiária e ilimitadamente, em decorrência da desconsideração da pessoa jurídica. Assim, primeiro deve-se executar os bens da empresa e, se estes não forem suficientes, o patrimônio dos sócios é penhorado, porquanto se beneficiaram da força de trabalho do empregado, como também do sucesso do empreendimento.

Portanto, o sócio pode pedir que sejam excutidos primeiramente os bens da empresa executada, bastando para isso o preenchimento do requisito do art. 596, §1°, do Código de Processo Civil[80], o qual dispõe que cabe ao sócio nomear bens da empresa livres e desembaraçados para a satisfação do débito. No entanto, se a pessoa jurídica não possuir bens livres e desembaraçados, a responsabilidade pelos créditos trabalhistas é dos sócios[81].

Nessa direção, transcreve o agravo de petição do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região:

DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL DO SÓCIO. A teoria da desconsideração da pessoa jurídica, introduzida em nosso ordenamento jurídico no artigo 28 da Lei n.º 8.078-1990, permite que seja desconsiderada a personalidade jurídica das sociedades de capitais, para buscar a responsabilidade patrimonial de seus sócios, sempre que esta personalidade for, de alguma forma, obstáculo à satisfação de créditos de terceiros.

Por conseguinte, a ausência de bens livres e desembaraçados pertencentes à sociedade sujeita os sócios a responderem com seu patrimônio pelo débito em execução, a teor do disposto nos artigos 592, inciso I, e 596 do Código de Processo Civil. Agravo de petição conhecido e desprovido (TRT da 9ª Região, 2007, p.1, AP 03634-2001-021-09-00-5-ACO-10077-2007).

No caso em tela aplicou-se a desconsideração da personalidade jurídica, em razão da ausência de bens livres e desembaraçados da sociedade. Como se pode notar, a responsabilidade dos seus sócios decorreu da simples insuficiência de patrimônio da pessoa jurídica, o que causou um obstáculo à satisfação dos créditos trabalhistas. Nesse diapasão, adotou-se a teoria menor da desconsideração da pessoa jurídica, pois, para afastar a autonomia patrimonial, bastou o inadimplemento da sociedade empregadora, a qual não dispôs de patrimônio suficiente para suportar a execução.

O agravo de petição da 10ª Região corrobora com esse entendimento:

EXECUÇÃO. TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. BENS DO SÓCIO. APLICABILIDADE. A teoria da desconsideração da personalidade jurídica autoriza o juiz a responsabilizar os sócios pelo pagamento da dívida, à mingua de apresentação de bens pela executada passíveis de constrição e suficientes à satisfação do crédito obreiro (TRT da 10ª Região, 2008, p.1, AP 00800-1999-016-10-00-5).

No presente caso, a juíza de 1º grau indeferiu o pedido do exequente de prosseguir a execução contra a sócia minoritária. Inconformado, o exequente interpôs agravo de petição, obtendo a reforma da decisão.

Oportuno se torna dizer que nas sociedades de responsabilidade limitada é comum a existência de sócios majoritários, os quais interferem na gestão da empresa, e de sócios minoritários, que integralizam pequeno capital e, em tese, não possuem qualquer influência sobre o destino da atividade econômica. Por esta razão, o sócio minoritário deveria responder somente no limite da quota integralizada[82].

A despeito disso, para a Justiça do Trabalho é irrelevante a participação societária, como pode ser verificado na decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região:

EXECUÇÃO. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO MINORITÁRIO. Não deve ser limitada a responsabilidade do sócio, ainda que minoritário, à sua participação societária quando verificada a insuficiência do patrimônio da sociedade e aplicada a teoria da desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada (TRT da 12ª Região, 2007, p. 1, AP 01929-2005-046-12-00-0).

Nesse julgado foi dado provimento ao agravo de petição para executar os bens do sócio minoritário de forma ilimitada, até o pagamento integral dos créditos executados. Com isso, o entendimento jurisprudencial dominante na Justiça do Trabalho é o de que a desconsideração deve atingir não só os bens do sócio majoritário, mas também do sócio minoritário, indiscriminadamente, bastando apenas o inadimplemento de dívidas trabalhistas.

Com relação ao ex-sócio, é mister destacar que o Código Civil estipulou uma limitação à responsabilidade, só podendo ser invocada até dois anos após a averbação da saída do sócio. Assim, passados dois anos de sua saída, o sócio não pode mais ser cobrado pelas obrigações referentes ao período em que integrava a sociedade (art. 1.032 do Código Civil) [83].

Mesmo que o sócio somente transfira parte de suas quotas a terceiro, sem se retirar da sociedade, continua responsável pelas obrigações anteriores à cessão, segundo o art. 1.003, parágrafo único[84] do Código Civil[85].

A responsabilidade dos sócios retirantes, portanto, precisa observar dois requisitos, quais sejam:

a) que a prestação do serviço tenha ocorrido antes da saída do sócio; b) que o ajuizamento da ação ocorra dentro de dois anos após o desligamento, considerada a data da averbação, mesmo que proposta aquela apenas em face da sociedade. O que deve ser levado em conta, pois, para a aferição da responsabilidade dos sócios retirantes, é a composição societária ao tempo em que se originou o crédito, não o tempo em que este foi reconhecido pela justiça[86]. Impende salientar que, se os sócios, retirantes ou não, ingressaram na sociedade depois do serviço ser prestado por determinado empregado, ainda assim são responsabilizados pelos créditos trabalhistas. Nesse caso, a responsabilidade do sócio retirante decorre do benefício auferido dos frutos de um esforço que não foi devidamente remunerado. Com relação aos novos sócios, respondem, pois, ao ingressarem na sociedade, parte do esforço do trabalhador já estava incorporada ao patrimônio social[87].

Na opinião de Lorenzetti[88], se a constituição do crédito dos trabalhadores aconteceu antes do ingresso do sócio, significa que este não avaliou bem o que o que pagou pelas quotas, porquanto a sociedade possuía dívidas trabalhistas. Por conseguinte, qualquer benefício ou lucro obtido após a constituição do crédito ocorreu em detrimento da satisfação do trabalhador.

Ademais, se não houve o lucro, o prejuízo não pode ser transferido ao trabalhador, uma vez que, se os resultados fossem positivos, a ele não seriam acarreados. Embora o empregador seja a pessoa jurídica, ela consiste na extensão dos sócios, efetivos beneficiários dos lucros resultantes da atividade empresarial. Portanto, o sócio não pode eximir-se da responsabilidade porque, para conseguir o lucro, foi necessária a força de trabalho[89].

Concordando com esse entendimento, Almeida[90] explica que os riscos do empreendimento econômico não podem ser transmitidos para os trabalhadores.

Assim, cumpre aos sócios responder, com seu patrimônio, pelo ônus do fracasso da empresa e, consequentemente, pela satisfação dos créditos trabalhistas.

Para Almeida[91], a segurança do investimento em uma sociedade de responsabilidade limitada não se sobrepõe à segurança do trabalhador, que tem no seu trabalho a única fonte de sobrevivência. Nesse sentido, a desconsideração da pessoa jurídica, a fim de penhorar os bens do sócio para satisfazer o crédito oriundo da relação de emprego, não depende de fraude ou abuso de direito (como determinam os arts. 50 do Código Civil e o 28 do Código de Defesa do Consumidor). A insuficiência de bens da sociedade executada para saldar o crédito trabalhista é o bastante para a penhora recair sobre os bens dos sócios, caracterizando a responsabilidade objetiva[92] destes.

Nessa direção Cravo e Correia[93] afirmam que, no direito do trabalho, a fraude ou o abuso de direito não precisam ser provados pelo credor, restando presumidos sempre que a ausência de patrimônio da pessoa jurídica acarretar na inadimplência de crédito trabalhista, gerando um obstáculo à satisfação de crédito privilegiado. Desse modo, o desvio de finalidade da pessoa jurídica se revela quando a autonomia patrimonial é utilizada para não cumprir com as obrigações junto a seus empregados, não havendo patrimônio suficiente para o pagamento da dívida.

Inadequado seria esquecer que o princípio da proteção do empregado também possibilita responsabilizar os sócios pelos créditos trabalhistas para além das limitações impostas pelos artigos 790, II do Código de Processo Civil de 2015, artigo 50 do Código Civil e artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor. A propósito, o juiz deve tornar efetivo o direito reconhecido ao trabalhador no título executivo. Com isso, concedido um direito ao trabalhador, o juiz precisa praticar atos necessários à sua realização concreta, atribuindo a responsabilidade, por meio da desconsideração da pessoa jurídica, pelos créditos trabalhistas a todos os que se beneficiaram da sua força de trabalho[94].

Como adverte Nahas[95], é necessária a citação do sócio para o processo executivo, caso ele vier a ser responsabilizado. A sua inclusão na relação processual mostra-se indispensável, visto que ele pode indicar bens da sociedade e defender o seu patrimônio.

Assim entende o TST:

NULIDADE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Não se reconhece violação do artigo 93, IX, da Constituição da República em face de julgado cujas razões de decidir são fundamentadamente reveladas, abarcando a totalidade dos temas controvertidos. Uma vez consubstanciada a entrega completa da prestação jurisdicional, afasta-se a arguição de nulidade. Agravo de Instrumento a que se nega provimento. MULTA PELA INTERPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROTELATÓRIOS. Não procede a alegação de afronta, sobretudo direta e literal, do artigo 5º, II, e XXXV, da Constituição da República, como exige o artigo 896, c, da CLT, porquanto a matéria possui regulação específica na legislação infraconstitucional. Agravo de Instrumento a que se nega provimento. FALÊNCIA DA EMPRESA EXECUTADA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. Não há falar em violação do artigo 5º, LIII, da Constituição da República, porque inequívoca a competência desta Justiça Especializada para processar e julgar a presente demanda, por se controverter apenas sobre bem de propriedade de ex-sócio da empresa, responsável pelo pagamento dos débitos trabalhistas em decorrência da desconsideração da personalidade jurídica da empresa e não sobre a penhora de bens da massa falida. Agravo de Instrumento a que se nega provimento. EXECUÇÃO. INCLUSÃO DE EX-SÓCIO NO POLO PASSIVO NA FASE EXECUTIVA. TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DO DEVEDOR. Justifica-se a incidência da teoria da desconsideração da personalidade jurídica do devedor quando caracterizado o descumprimento das obrigações decorrentes do contrato de trabalho e a falta de bens suficientes da empresa executada para satisfação das obrigações trabalhistas. A decretação da desconsideração da personalidade jurídica na fase de execução e a consequente inclusão do ex-sócio exige a sua regular citação para que seus bens possam ser alcançados pela penhora. A sujeição do sócio - responsável econômico - não depende de sua participação no processo na fase de conhecimento. Registrado pela Corte de origem que, na presente hipótese, fora realizada a devida e regular citação do executado - ex-sócio da reclamada-, para a ciência de sua inclusão na execução e a defesa de seus bens , não há cogitar em prejuízo à parte nem ao exercício do direito de defesa, tampouco em afronta à coisa julgada. Agravo de Instrumento a que se nega provimento. (grifo nosso).

(TST - AIRR: 279402719965030080, Data de Julgamento: 28/10/2015,  Data de Publicação: DEJT 03/11/2015).

Na concepção de Lorenzetti[96], incluir o sócio no pólo passivo significa não só uma questão de celeridade, mas também permite o reconhecimento da fraude à execução[97]. A jurisprudência majoritária tem entendimento no sentido de que para caracterizar a fraude à execução não basta o ajuizamento da ação, sendo necessária a citação do sócio, pois é a partir do momento da sua inclusão no pólo passivo da relação jurídica que o terceiro adquirente do bem possui condições de averiguar se existe alguma demanda contra o sócio.

Destarte, citada a pessoa jurídica para pagar a dívida ou garantir a execução, passado o prazo legal sem nenhuma providencia de sua parte, será realizada a penhora de acordo com o artigo 880 da CLT[98]. Não encontrando bens da executada, nem indicando esta onde possam ser encontrados, nada impede que o juiz, de oficio[99], inclua os sócios no pólo passivo da execução, citando-os para que efetue o pagamento, sob pena de prosseguir a execução em face deles[100].

Com efeito, o não cumprimento da obrigação com o empregado e a ausência ou a insuficiência de patrimônio da pessoa jurídica para adimplir os créditos trabalhistas apresenta-se como fundamentos suficientes para responsabilizar os sócios e direcionar a execução trabalhista contra os seus bens. Nesse diapasão, a responsabilidade dos sócios na execução trabalhista, sob o prisma da Justiça do Trabalho, é objetiva, pois não precisa demonstrar a presença da fraude e do abuso de direito.

Ademais, a responsabilidade dos sócios é subsidiária, porquanto a execução deverá recair primeiramente sobre os bens da empresa para, em seguida, nos dos sócios, independentemente se estes forem majoritário, minoritário ou retirante.

Portanto, apesar de a sociedade ser de responsabilidade limitada e possuir autonomia patrimonial, os sócios respondem pelo crédito trabalhista, por este ter natureza alimentar e também porque o direito do trabalho tem como princípio basilar a proteção do empregado.

Porém importante ressaltar que Impõe-se a citação do sócio nos casos em que seus bens sejam objeto de penhora por débito da sociedade executada que teve a sua personalidade jurídica desconsiderada.

5. A RESPONSABILIDADE DO SÓCIO RETIRANTE E SÓCIO MINORITÁRIO

Uma das celeumas jurídicas existente é com relação à responsabilidade trabalhista do sócio retirante, ou seja, daquele que não pertence mais ao quadro societário da empresa quando os bens da sociedade e dos sócios atuais são insuficientes para a garantia da execução e, via de consequência, para a satisfação do crédito do exequendo.

A legislação trabalhista é omissa quanto ao limite temporal da responsabilidade do sócio que se retira da sociedade e, nessa seara, surgem algumas correntes.

Os artigos 1003[101] e 1032[102] do Código Civil dispõem sobre a responsabilidade dos sócios retirantes perante as obrigações de natureza civil.

De acordo com o disposto, o sócio retirante permanece responsável pela dívida trabalhista por 02 (dois) anos após a sua retirada, ou seja, por 02 (dois) anos após averbada a resolução da sociedade. Para os seguidores dessa corrente, ultrapassado esse prazo, não responde o ex-sócio pelos débitos trabalhistas da empresa executada, sendo irrelevante o momento de interposição da ação ou o período trabalhado pelo empregado.

Outros, também aplicando os artigos civilistas em comento, entendem que a responsabilidade do sócio retirante permanece quando a reclamação trabalhista for ajuizada no prazo de até 02 (dois) anos da sua saída da sociedade. Para os seguidores dessa corrente, deve-se levar em conta o fato de a ação ter sido distribuída nos 02 (dois) anos seguintes à sua retirada da sociedade, pouco importando ter se beneficiado ou não do trabalho do empregado.

No entanto, quanto aos débitos trabalhistas, apesar do disposto nos artigos supracitados do Código Civil, a corrente majoritária é no sentido de que a responsabilidade do sócio retirante não se esgota após 02 (dois) anos de sua saída da sociedade, tendo em vista as peculiaridades da ação trabalhista que visa resguardar direitos de natureza alimentar, não havendo que se falar na aplicação dos artigos 1003 e 1032 do Código Civil, uma vez que estes dispõem apenas sobre créditos de natureza civil.

Para Celso Schiavi, o artigo 1003 do Código Civil se aplica ao processo do trabalho, por conter um critério objetivo e razoável de delimitação da responsabilidade do sócio retirante. Não obstante, em casos de fraude ou de notória insolvência da empresa ao mesmo tempo da retirada, a responsabilidade do sócio retirante deve persistir por prazo superior a dois anos.[103]

Fundamentam os adeptos dessa corrente que a questão da responsabilidade decorrente da retirada do sócio, ou seja, o biênio a que alude o artigo 1003, parágrafo único, do Código Civil, é incompatível com os princípios que regem o Direito do Trabalho, mormente com o princípio da proteção do hipossuficiente, bem como que os direitos de natureza trabalhista subsistem até mesmo à dissolução da empresa, nos termos do artigo 449 da CLT, sendo inequívoca a responsabilidade dos ex-integrantes do quadro societário da empresa executada pelas obrigações trabalhistas inadimplidas, inexistindo qualquer limite temporal.

Para os seguidores dessa corrente, se o sócio retirante se beneficiou do resultado da prestação de serviços do trabalhador, não há como se admitir que tal ex-sócio seja responsável por atos praticados apenas por 02 (dois) anos após sua saída, principalmente se referido ato foi uma contratação laboral pactuada enquanto tal sócio integrava o quadro social e/ou os serviços prestados pelo empregado se deram enquanto tal sócio integrava o quadro societário da empresa executada.

Assim, o patrimônio pessoal do ex-sócio que integrava a sociedade à época da vigência do contrato de trabalho pode ser objeto de constrição judicial na execução promovida em face da empresa, quando os bens desta se revelam insuficientes para a quitação do débito trabalhista.

Para que seja possível a responsabilização do sócio que se retira da sociedade por créditos trabalhistas, imprescindível o preenchimento de três requisitos básicos: 1) estejam esgotadas por completo as possibilidades de satisfação da dívida em face da pessoa jurídica e de seus membros atuais; 2) a ação trabalhista deve ter sido ajuizada até dois anos após a averbação da saída do sócio na respectiva Junta Comercial; e 3) os créditos trabalhistas devem se referir, no mínimo em parte, a período no qual o sócio ainda integrava o quadro social da pessoa jurídica. Uma vez satisfeitos os três pressupostos, a responsabilidade pela dívida deverá recair apenas sobre as parcelas cujo fato gerador tenha ocorrido dentro do lapso temporal em houve atuação do sócio na sociedade, não por ter ele sido beneficiário da força de trabalho do empregado, mas porque concorreu para a existência do crédito.

A experiência nos tem demonstrado que muitos sócios deixam a sociedade quando ela tem dívidas trabalhistas ou está prestes a sofrer execuções trabalhistas que possam leva-la à insolvência. Em razão disso, pensamos que o sócio retirante, pelo princípio da boa-fé objetiva que deve nortear os negócios jurídicos, ao sair da sociedade, deve retirar certidões que comprovem a inexistência de dívidas trabalhistas à época da saída, ou que, mesmo elas existentes, a sociedade tem patrimônio suficiente para quitá-las. Caso contrário, a responsabilidade do sócio retirante persistirá mesmo após dois anos contados da data da saída.[104]

Segundo Sergio Pinto Martins, não se pode admitir que uma vez sócio, sempre sócio, sendo essa pessoa eternamente responsável pelas obrigações trabalhistas, salvo em hipótese de fraude.[105]

Não é esse, todavia, o entendimento que vem prevalecendo na Justiça do Trabalho. Atualmente, a jurisprudência majoritária sobre o assunto tem adotado como única justificativa para responsabilização do sócio retirante o fato deste ter se beneficiado dos serviços prestados pelo empregado.[106]

A tese majoritariamente utilizada pelos tribunais, ao afastar a aplicação dos limites temporais previstos no Código Civil, consagra situação de forte insegurança jurídica, pois a qualquer momento o ex-sócio poderá ser acionado, bastando que empregado com contrato de trabalho vigente na sua época de participação na empresa não tenha obtido êxito em assegurar a quitação da dívida trabalhista por meio dos bens da sociedade e de seus atuais membros.[107] Sendo assim, o membro que se retira regularmente da pessoa jurídica jamais saberá quando parar de se preocupar com a sociedade da qual se desvinculou.

Em relação ao sócio minoritário, em que pese a sua participação mínima na sociedade, o entendimento é de que ele responde igualmente em caso de falta de bens para garantir a integralidade da execução.

Na justiça do trabalho, é irrelevante o fato de o sócio ser majoritário ou minoritário, bem como possuir, ou não, poderes de gerência. Basta a condição de sócio para que seu patrimônio, inexistindo bens da sociedade, seja penhorado para pagamento das dívidas da pessoa jurídica.

Isso ocorre porque a responsabilidade dos sócios entre si é solidária, ou seja, cada sócio responde “pela integralidade da dívida, independentemente do montante das cotas de cada um na participação societária. Aquele que pagou a dívida integralmente, pode se voltar regressivamente em face dos demais sócios.”[108]

Desta forma, a responsabilidade do sócio pelas dívidas sociais trabalhistas não é solidária e sim subsidiária, sendo imprescindível a frustração do procedimento executado contra a sociedade para que seja autorizada a desconsideração da personalidade jurídica.[109]

Ocorre que esporadicamente, o entendimento está mudando, no sentido de que o sócio minoritário que não contribuiu diretamente para o dano aos credores não pode responder integralmente pela execução com seu patrimônio.

Em casos que a participação do sócio minoritário é realmente mínima, inferiores a 1%, e sem que haja sua contribuição na administração do negócio, a sua responsabilidade fica restrita à participação societária.

Porém, tratam-se de casos extremos, haja vista a característica de verba alimentar do crédito trabalhista.

No que concerne ao sócio que ingressa na sociedade após o ajuizamento da ação trabalhista, pacífica é a incidência do disposto no art. 1.025 do Código Civil: “O sócio, admitido em sociedade já constituída, não se exime das dívidas sociais anteriores à admissão”. Portanto, à pessoa que ingressa em sociedade já formada incumbe ponderar sobre as vantagens e riscos do ato que vai realizar. Se, por um lado, gozará dos benefícios e reflexos financeiros dos negócios firmados antes de sua entrada, é justo que se sujeite às obrigações anteriores.

6. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA TERCEIRIZADA


Com a finalidade de corrigir as distorções na utilização da terceirização,
foram surgindo teorias para fundamentar a responsabilização da empresa
cliente ou tomadora, mesmo que não seja ela a contratante ou empregadora
dos trabalhadores. São muitos os fundamentos que justificam essa responsabilização, inclusive os metajurídicos, como os sociais.[110]

O exame da responsabilidade civil do empregador depende da adoção do paradigma da solidariedade social que a Constituição assumiu como novo fator axiológico para a interpretação e aplicação do ordenamento. É a partir desse novo paradigma, que as relações privadas devem ser examinadas. [111]

O novo paradigma solidarista implica o reconhecimento do dano ao empregado causado pelo inadimplemento da empresa interveniente, por meio do contrato de prestação de serviços que firmou com a empresa tomadora, precisa ser reparado.[112]

O art. 10 e o art. 448 da CLT trouxeram a ideia de que a empresa é o
empregador e de que as mudanças estruturais ou de propriedade não acarretam mudanças ao obreiro, que continua com direito à manutenção de suas
condições laborais e tem seus direitos adquiridos respeitados.

Explica Luciano Martinez: “Observe-se que, com base em qualquer dos citados dispositivos, as transformações operadas não afetam a existência do empreendimento, tampouco os direitos de seus contratados. Nesse sentido há clara despersonalização empresarial, sendo minimamente relevantes para o contrato de emprego as alterações estruturais (mudança de sócios, conversão de sociedade por cotas de responsabilidade limitada em uma sociedade empresária etc.) ou as mudanças na propriedade (alienação, cessão, fusão, cisão, incorporação etc.). Essas modificações podem ser praticadas em atendimento às conveniências do mercado, sem que em nada afetem os contratos de emprego em curso ou os direitos adquiridos pelos empregados.”[113]

No Direito do Trabalho a proteção ao empregado, hipossuficiente da relação jurídico-trabalhista, não reside apenas na faceta principiológica. O art. 2º da CLT reforça a ideia de despersonalização da empresa. Esta preconiza que a empresa ou atividade econômica desenvolvida é o empregador. Desta forma, a empresa tomadora ou contratante que assume em suas dependências físicas o corpo de empregados de outra empresa (a empresa prestadora de serviços) atrai para si a condição jurídica de empregador.

As empresas unidas (tomadora e prestadora) propiciam o alcance dos mesmos objetivos em parceria, por meio de um vínculo de cooperação ou coordenação[114]. Por este fundamento, a empresa cliente ou tomadora também seria responsável nas obrigações trabalhistas dos empregados da empresa intermediadora, pois ambas locupletam-se da força de trabalho dos obreiros envolvidos, conforme art. 2º, §2º da Consolidação das Leis do Trabalho, in verbis:

Art. 2º (...)

Sempre que uma ou mais empresas, tendo embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.

O conceito de grupo econômico foi alargado pela incidência do art. 3º, §2º da Lei nº 5.889/73[115]. Consoante a literalidade do citado dispositivo, basta um vínculo de cooperação ou colaboração para formar o grupo econômico, ante a possibilidade de preservação da autonomia das empresas. Na terceirização, justamente, há autonomia entre a tomadora e a interveniente, ligadas pelo liame colaborativo ou de cooperação. Portanto, poder-se-ia aplicar tal dispositivo diante da lacuna normativa existente e fazer incidir a responsabilidade solidária na relação terceirizada.

A terceirização não é meio fácil de eximir o beneficiário da força de trabalho dos encargos trabalhistas que, incautos, apressam-se em apregoar. Ao contrário, tem a desvantagem de retirar do empresário o poder de comandar diretamente as atividades de apoio de sua empresa e obrigá-lo a responder pela eventual inadimplência do terceiro contratado[116]. A terceirização não pode ser, por si só, um argumento para que não seja reconhecida a condição de grupo econômico.

Portanto, o tomador de serviços, no caso da terceirização, somente se exonerará da responsabilidade em relação aos trabalhadores terceirizados se provar caso fortuito ou força maior ou que o evento se deu sem nexo de causalidade com relação a ele, ou seja, que a conduta foi praticada fora dos limites da preposição.[117]

A posição jurisprudencial do TST, explicitada pela súmula 331[118], é de que a responsabilidade da empresa tomadora de serviços será subsidiária. A responsabilidade solidária seria possível, somente, se houvesse terceirização ilícita. Consoante dito, a terceirização lícita, havendo inadimplemento por parte da empresa de intermediação, ocorrerá a responsabilidade subsidiária[119] da tomadora de serviços e da prestadora. Na terceirização ilícita, forma-se o vínculo empregatício com o tomador de serviços, gerando responsabilidade solidária[120] entre este e a empresa intermediadora.

7. O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - ARTIGOS 133 A 137

O novo Código de Processo Civil regulamentou o procedimento do incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

A uniformização do procedimento da desconsideração da personalidade jurídica, é medida que se impõe para garantir o respeito ao princípio constitucional do devido processo legal, contraditório e, ainda, garantir maior segurança jurídica às partes envolvidas.

Era comum que, para evitar o desvio dos bens particulares e a consequente frustração da execução, alguns juízes simplesmente determinassem a penhora dos bens do sócio e a posterior intimação para apresentar manifestação, o que em afronta o princípio do contraditório e do devido processo legal.

Sob o ponto de vista dos atos processuais, a aplicação da desconsideração da personalidade à execução trabalhista, até a entrada em vigor da Lei nº 13.105/2015, novo código de processo civil, vinha sendo regulamentada pelos próprios tribunais. De um modo geral, em fase de execução de sentença, a utilização do instituto era efetivada por meio de decisão interlocutória fundamentada, da qual não cabia recurso, que determinava a citação dos sócios para responder pelo crédito trabalhista pendente e dava início à prática de atos executórios em face destes. Ao sócio alcançado pela medida, restavam três remédios jurídicos aptos a questionar a decisão que autorizou a desconsideração da personalidade jurídica: 1) embargos à execução, mediante garantia integral da dívida executada (art. 884 da CLT), sendo que da sentença proferida cabia recurso de agravo de petição (art. 897, alínea “a”, CLT); 2) exceção de pré-executividade, sem necessidade de garantia do juízo, na qual se discutia a legitimidade do sócio para figurar no polo passivo da demanda. Interessante mencionar não ser pacífico o cabimento do recurso de agravo de petição contra decisão que julga improcedente a exceção de pré- executividade; 3) embargos de terceiro, sem necessidade de garantia do juízo, quando já ocorrida a constrição judicial sobre bens do sócio, em que pese haver seguimento jurisprudencial que sustente não ser possível a oposição de embargos nessas ocasiões. Assim, o abuso da personalidade deverá ser caracterizado na forma da lei, de acordo com a espécie de obrigação, e poderá ser suscitado em qualquer fase do processo, sendo citados os sócios e a sociedade para se manifestarem e requerer as provas cabíveis no prazo comum de 15 dias, antes da constrição de seus bens.

Destarte a concessão de prazo para defesa e produção de provas, não prejudica os direitos do credor, visto que o juiz pode, nos termos do artigo 798 do Código de Processo Civil, determinar medidas acautelatórias quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause lesão grave e de difícil reparação ao direito da outra e, além disso, a oneração de bens em fraude a execução será considerada ineficaz, na forma do artigo 137 acima descrito.

Como se vê, o procedimento estipulado pelo Código de Processo Civil de 2015 corresponde às exigências de maior cautela na utilização da disregard doctrine pela Justiça do Trabalho, bem como confere maior ênfase ao contraditório e à ampla defesa daqueles que são alcançados pela medida, fatores que representam importante avanço quando em comparação com a prática anteriormente adotada pelos tribunais.

Outrossim, sabe-se que o direito processual comum constitui fonte subsidiária do direito processual do trabalho nos casos em que este se revele omisso, salvo quando aquele for incompatível com os alicerces fundamentais deste (art. 769 da CLT)[121]. Dessa maneira, por certo que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica criado pelo Código de Processo Civil em vigor merece, em alguns pontos, ser adequado a regras processuais trabalhistas específicas, não sendo viável a exigência de aplicação tal qual ocorrerá na esfera processual civil, o que não significa, porém, que o incidente deva ser considerado totalmente incompatível com o Processo do Trabalho.

Nesse sentido, o Tribunal Superior do Trabalho, ao editar a Instrução Normativa nº 39, dispôs justamente sobre a aplicabilidade, de forma subsidiária, das regras do Código de Processo Civil de 2015 ao Processo do Trabalho. Conforme se observa do texto da IN nº 39 do TST, o juiz do trabalho, em fase de execução de sentença, conservará a prerrogativa de instauração de ofício do incidente processual em questão, tendo em vista a incidência do princípio do inquisitivo neste particular[122].

De igual forma, a suspensão do processo imposta pelo novo regramento não prejudicará a concessão de medidas cautelares de urgência que tenham como objetivo resguardar o resultado útil do processo, tais como o arresto, sequestro, arrolamento de bens, ou qualquer outra medida idônea para a proteção do direito de crédito. Esta ressalva encontra justificativa no fato de que, com a exigência de contraditório prévio à desconsideração, estaria aberta a possibilidade do sócio esvaziar por completo de seu patrimônio os bens sujeitos à expropriação, sobretudo eventuais quantias depositadas em contas e aplicações financeiras[123]

Conclui-se, portanto, que o Projeto do novo Código de Processo Civil, no que tange a desconsideração da personalidade jurídica, irá trazer maior segurança nas relações jurídicas, principalmente com relação aos sócios que terão oportunidade de apresentar defesa antes que seus bens sejam penhorados.

8. CONCLUSÃO

O objetivo principal deste trabalho foi discorrer acerca da responsabilidade dos sócios na execução trabalhista, quando esgotada a localização de bens em nome da pessoa jurídica devedora.

A pessoa jurídica surgiu com a finalidade de facilitar a criação e o controle dos grandes empreendimentos. No entanto, em virtude da autonomia patrimonial existente entre o patrimônio da sociedade e dos seus sócios, estes começaram a usar a pessoa jurídica para praticar atos abusivos ou ilícitos com o intuito de obter proveito próprio em detrimento dos direitos de terceiros. Nesse contexto, foi concebida a teoria da desconsideração da personalidade jurídica a fim de afastar essa autonomia patrimonial e responsabilizar diretamente os bens dos sócios, pois a personalidade jurídica é um direito relativo, permitindo ao juiz penetrar o véu da personalidade para coibir os abusos e neutralizar fraudes.

Destacou-se que no direito brasileiro há duas teorias da desconsideração, quais sejam: a maior e a menor, ou correta e incorreta. Todavia, no âmbito da Justiça do Trabalho, as decisões são no sentido de aplicar a teoria menor (incorreta), porquanto o simples prejuízo ocasionado ao trabalhador possibilita a responsabilização dos sócios, sem ser necessária a presença da fraude e do abuso do direito. Portanto, verificou-se que, para aplicar a teoria da desconsideração, são necessários apenas dois requisitos: a ausência ou a insuficiência de bens da pessoa jurídica e a existência de débitos trabalhistas. Com efeito, a despeito de a sociedade possuir responsabilidade limitada, é possível a penhora recair sobre os bens dos sócios, quando constatadas a ausência ou a insuficiência de patrimônio da pessoa jurídica para adimplir os créditos trabalhistas. Nessa direção, observou-se, com base nas decisões apresentadas na pesquisa, que a responsabilidade dos sócios na execução trabalhista é objetiva, pois prescinde da demonstração da fraude e do abuso de direito, e também subsidiária, visto que a execução deverá recair primeiramente sobre os bens da empresa para, em seguida, nos dos sócios, independentemente se estes forem majoritário, minoritário ou retirante.

Dessa forma, a falta de bens em nome da empresa não pode ser um obstáculo ao direito do empregado, que contribui com o seu esforço para a construção do patrimônio da pessoa jurídica e, consequentemente, dos seus sócios. Diante disso, a Justiça do Trabalho tem aplicado frequentemente a teoria da desconsideração da pessoa jurídica para responsabilizar os sócios pelo pagamento dos créditos trabalhistas, devido à natureza de caráter alimentar dessa verba, ao princípio do trabalhador hipossuficiente e ao fato dos riscos da atividade econômica pertencerem ao empregador.

Finalmente, a responsabilidade do sócio retirante é verificada de acordo com as normas do Código Civil, e a responsabilidade do sócio minoritário, somente em casos extremos, é limitada a seu capital social.

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