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Exigências ilegais em editais de licitações

Diante da existência número considerável de editais de licitações com exigências desproporcionais e ilegais, o que inviabiliza a participação de diversas empresas, este artigo busca apontar e comentar decisões do TCU sobre cláusulas em certames.

As aquisições públicas através de licitações movimentam bilhões de reais anualmente, de modo que cada vez mais empresas direcionam suas atenções e estratégias para esse mercado.

 Trata-se de amplo campo de atuação para o setor privado, uma vez que a Administração Pública sempre necessitará obter produtos e serviços, em virtude da regra geral de obrigatoriedade de licitar, conforme art. 37, XXI, da Constituição Federal, que estabelece:

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.     

            Os princípios e dispositivos legais que regem os procedimentos licitatórios convergem no sentido de ter como objetivo proporcionar ampla concorrência, igualdade de oportunidades, impessoalidade, além de tratamento isonômico entre os participantes, para que a Administração Pública contrate, sempre, a proposta mais vantajosa.

No entanto, na prática, o que se observa é um número considerável de editais de certames com exigências desproporcionais e ilegais, o que inviabiliza a participação de diversas empresas interessadas, restringindo o caráter competitivo do certame.

            Listaremos quatro exemplos de exigências que, embora já tenham sido objeto de julgamento por parte do Tribunal de Contas da União, ainda são recorrentes em editais de licitação.

 

CERTIFICAÇÕES (ISO, INMETRO, SCORM, ETC) COMO CRITÉRIO DE HABILITAÇÃO

É de conhecimento público e notório que empresas e institutos certificadores atestam, dentro de seus respectivos critérios, a confiabilidade de produtos e serviços por eles analisados, promovendo segurança para os seus adquirentes.

Vejamos o posicionamento jurisprudencial:

É ilegal a exigência de certificação do Inmetro como requisito de habilitação, contudo não há óbice a adoção de tal certificação como critério de pontuação técnica. Tal tese, todavia, não cabe no pregão, por ser uma modalidade focada no menor preço, e não em pontuação técnica.

Acórdão 545/2014-Plenário | Relator: JOSÉ MUCIO MONTEIRO

 

É irregular a exigência de certificação ISO e outras assemelhadas para habilitação de licitantes ou como critério de desclassificação de propostas.

Acórdão 1542/2013-Plenário | Relator: JOSÉ JORGE

Dessa forma, é pacífico o entendimento de que certificados dessa natureza não podem figurar como critério de habilitação, tendo em vista que estes, por si só, não garantem à Administração Pública a certeza de contratação da proposta mais vantajosa.

 

QUITAÇÃO COM CONSELHOS E ÓRGÃOS DE CLASSE

Em que pese a importantíssima função dos conselhos de classes, que atuam regulamentando, fiscalizando e disciplinando a atuação dos profissionais, a exigência de quitação das respectivas anuidades como condição para habilitação é ilegal.

A matéria já é uníssona no TCU:

É ilegal a exigência de prova de quitação com o Crea para fins de habilitação, pois art. 30, inciso I, da Lei 8.666/1993 exige apenas o registro na entidade. O disposto no art. 69 da Lei 5.194/1966, que regulamenta o exercício dos profissionais de engenharia, não pode prevalecer diante do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, nem da própria Lei 8.666/1993 (norma geral) .

Acórdão 2472/2019-Primeira Câmara | Relator: AUGUSTO SHERMAN

 

É ilegal a exigência de quitação de anuidades do Crea para fins de habilitação, pois o art. 30, inciso I, da Lei 8.666/1993 exige apenas o registro na entidade.

Acórdão 1357/2018-Plenário | Relator: AUGUSTO NARDES

É preciso destacar, portanto, que a exigência de registro é diferente da comprovação de quitação, pois é obrigatório que o licitante ateste ter sua empresa devidamente cadastrada nos órgãos reguladores, desde que diretamente responsáveis pelo exercício da profissional abrangente no objeto da licitação.

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COMPROVAÇÃO DE PROPRIEDADE E/OU DE LOCAÇÃO PRÉVIA DE EQUIPAMENTOS A SEREM UTILIZADOS EM OBRA COMO QUALIFICAÇÃO TÉCNICO-OPERACIONAL

Ao licitar obras e serviços de engenharia, é patente o interesse da Administração Pública em contratar empresa de porte suficiente à plena e regular realização do objeto, tanto do ponto de vista técnico-profissional como em relação aos equipamentos e maquinários necessários.

No entanto, não é razoável que o ente público onere desnecessariamente a participação de empresas na licitação. É o entendimento sumulado:

SÚMULA Nº 272/2012

No edital de licitação, é vedada a inclusão de exigências de habilitação e de quesitos de pontuação técnica para cujo atendimento os licitantes tenham de incorrer em custos que não sejam necessários anteriormente à celebração do contrato.

            Assim, a comprovação de propriedade ou de locação de equipamentos e maquinário é uma exigência que só poderá ser realizada à empresa vencedora, por ocasião da assinatura do contrato, e não a todos os participantes, como condição para habilitação.

A exigência de apresentação de laudos de ensaios técnicos por parte de todos os licitantes, como requisito de habilitação técnica, não encontra amparo no rol do art. 30 da Lei 8.666/1993. As exigências de habilitação técnica devem se referir ao licitante, não ao objeto do certame, e não podem onerar o licitante em custos que não sejam necessários anteriormente à celebração do contrato (Súmula TCU 272).

Acórdão 1624/2018-Plenário | Relator: BENJAMIN ZYMLER

Dessa maneira, diante dos casos expostos, concluímos que embora perdure a máxima de que “o edital é a lei da licitação” – como consequência do princípio da vinculação ao instrumento convocatório –, tal disposição não deve ser interpretada em sua literalidade, já que um edital não pode estar acima da lei. Portanto, a existência de cláusulas abusivas enseja a devida impugnação do procedimento.

         

Sobre os autores
Med Brazão de Oliveira

Advogado. Pós-graduando em Direito Constitucional. Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/RN e da Associação Norte-riograndense dos Advogados Trabalhistas (ANATRA).

Weuder Martins Câmara

Advogado. Graduado em Direito pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Cursando pós-graduação em Direito Público e MBA em Licitações e Contratos. Ex-membro do Grupo de Pesquisa da UERN em Cidadania, Participação Popular e Políticas Públicas. Autor de artigos jurídicos.

Informações sobre o texto

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