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Uma análise sobre a promessa de prêmio com prazo determinado em título de capitalização e o Código de Defesa do Consumidor

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Resumo

            O objeto de estudo deste artigo é o contrato de adesão de venda de título de capitalização e os problemas da relação de consumo decorrente. Este estudo tem como seu primeiro objetivo oferecer informações que possam subsidiar o consumidor brasileiro quanto aos seus direitos e deveres, assim como esclarecer o que está por trás de uma relação de consumo no que se refere à compra de um título de capitalização, quem são os seus fornecedores, como se dá o processo da compra e venda e quais as conseqüências resultantes disto. O artigo busca, outrossim, apontar os problemas existentes no momento da compra de um título de capitalização e com relação à propaganda veiculada sobre o produto. São dois os questionamentos principais feitos no início da pesquisa e respondidos oportunamente. A propaganda contendo promessa de prêmio responsabiliza o fornecedor? Quais os direitos do consumidor prejudicado em uma relação de consumo ao comprar um título de capitalização?

            Palavras-chave: título de capitalização, contrato de adesão e consumidor.


Summary

            The object studied in this article is the contract of adhesion to sell "título de capitalização" and the problems of the consumption relation decurrent. This study has as his first objective to offer information that can subsidize the Brazilian consumer over wich are their rights and duties, as well as clarifying what is behind of a consumption relation related to the purchase of "título de capitalização", who are its suppliers, how works the process of the purchase and sell and which consequences result of this. The article also searchs to point the existing problems at the moment of the purchase of "título de capitalização" and the relation to the propaganda propagated over the product. There are two main questionings made in the beginning of the research and answered opportunely. The propaganda that contains a promise of prize makes responsible the supplier? Which are the rights of the damaged consumer in a relation of consumption when buying a "título de capitalização"?

            Word-key: "título de capitalização", contract of adhesion and consumer.


Resumen

            El objeto estudiado en este artículo es el contrato de la adherencia para vender lo "título de capitalização" y los problemas de la relación de la consumición decurrent. Este estudio tiene como su primer objetivo ofrecer la información que puede subvencionar al consumidor brasileño sobre cuais sus correcto y deberes, así como clarificar que está detrás de una relación de la consumición relacionada con la compra de "título de capitalização", que es sus surtidores, va cómo el proceso de la compra y de la venta y que consecuencias resultan de esto. Del artículo desea también señalar los problemas existentes en el momento de la compra de "título de capitalização" y la relación a la propaganda propagaron sobre el producto. Hay dos preguntas principales hechos en el principio de la investigación y contestados oportunamente. ¿La propaganda que contiene una promesa de las marcas premiadas hace responsable el surtidor? ¿Cuáles los correcto del consumidor agraviado en una relación de la consumición al comprar un "título de capitalização"?

            Palabra-llave: "título de capitalização", contrato de la adherencia y consumidor.


1. Conceituação do Título de Capitalização

            O tema deste artigo foi escolhido em virtude de um caso concreto ocorrido em outubro de 2003 no Escritório de Prática Jurídica da Universidade de Fortaleza. Naquele caso, em que um consumidor reclamava acerca de um título de capitalização, professores e alunos divergiram acerca da existência ou não do direito do cliente. Por se tratar de uma situação freqüente, objetiva-se esclarecer os direitos pertinentes.

            Conceituando título de capitalização, entende Fiúza [01] que é aquele em que o consumidor compra um título se comprometendo a pagar mensalidades enquanto o fornecedor (a empresa capitalizadora) se compromete a entregar um valor determinado ou bem móvel, denominado prêmio, mediante sorteio a ser realizado com base nos números da Loteria Federal ou quando se encerrar o contrato, sendo o título de capitalização o documento que fica em poder do consumidor.

            A empresa que vende os títulos de capitalização é considerada fornecedora porque segundo o art. 3º do Código de Defesa do Consumidor é também considerada fornecedora a pessoa jurídica, pública ou privada, nacional, que presta serviço, sendo este definido como a atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária. Com o objetivo de dar uma maior segurança ao consumidor, temos a súmula 297 do STJ, que segue: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

            O parágrafo único do artigo 1º do Decreto-Lei 261/67 define as sociedades de capitalização como as que objetivam fornecer ao público, de acordo com os planos do Governo Federal, a constituição de um capital mínimo determinado em cada plano e pago em moeda corrente em um prazo determinado no título. O artigo 74 do Decreto-Lei nº 73/66 determina que a autorização para funcionamento será concedida através de Portaria do Ministro da Indústria e Comércio e, com o intuito de conferir uma maior segurança jurídica em suas relações comerciais, as sociedades capitalizadoras são obrigadas a constituir reservas técnicas, fundos especiais e provisões (artigo 84 do Decreto-Lei nº 73/66), ressaltando ainda que a não constituição ou insuficiência dessas reservas constitui crime contra a economia popular. Determina ainda o artigo 113 do Decreto-Lei nº 73/66 que as pessoas que realizarem esse tipo de operação sem a devida autorização, no País ou no exterior, terão que pagar multa no mesmo valor da importância investida pelo aderente ou consumidor.

            Passa-se agora à análise do contrato objeto deste estudo. Afirma Fiúza [02] que são duas as naturezas jurídicas do contrato de capitalização. Primeiro, consiste em contrato pré-estimado em razão do pagamento das parcelas já conhecidas e acordadas pelas partes, outrossim, é aleatório, tendo em vista estar sujeito a sorteios periódicos.

            São características intrínsecas ao contrato de capitalização:

            - O contrato é impessoal porque qualquer pessoa pode ser um consumidor em potencial;

            - É oneroso porque existem as prestações e contraprestações;

            - É individual porque somente as pessoas envolvidas no contrato, as partes, é que se obrigam;

            - É bilateral;

            - É de execução futura;

            - Trata-se de um contrato de adesão;

            - É formal porque a lei exige a sua forma escrita e a emissão do título de capitalização e;

            - É típico porque está devidamente tipificado em lei.

            O contrato de adesão de venda de título de capitalização é incompatível com o instituto da "exceptio non adimpleti contractus" tendo em vista que, para que esta ocorra, se faz necessário que as prestações sejam não somente recíprocas mas também simultâneas. No caso em estudo verificamos que o momento de exigibilidade das prestações é diferente para cada uma das partes.

            Sendo o contrato de adesão um contrato bilateral, conforme mencionado no parágrafo anterior, o definiremos como uma relação contratual em que cada uma das partes tem prestações reciprocamente obrigatórias. Estas são muito importantes tendo em vista que a prestação de uma das partes é a razão da prestação da outra. Caso uma delas descumpra o que foi anteriormente acordado passaria a existir um desequilíbrio contratual.


2. Análise de Casos Concretos

            Segundo o artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor, contrato de adesão é: "aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo".

            O contrato de adesão caracteriza-se por permitir que seu conteúdo seja pré-constituído por uma das partes, eliminada a livre discussão que precede normalmente à formação dos contratos, segundo afirma Orlando Gomes [03].

            O contrato de adesão se realiza quando o interessado (o contratante, a empresa que vende títulos de capitalização, por exemplo) já determina de antemão as condições gerais negociais com a finalidade de uniformizar as futuras relações contratuais. A partir de então, o contratante começa a divulgar o seu serviço por meio de propagandas em jornais, revistas, colocando, por exemplo, fotos de veículos insinuando se tratar de um financiamento. O próximo passo a ser tomado ocorre quando o cliente vem ao encontro do futuro contratante e assina o contrato predisposto.

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            O contrato de adesão é um contrato atípico pois foge às regras gerais, que regem os contratos. Neste contrato, o princípio da responsabilidade determina que o contratante deve preocupar-se mais do que só com a real compreensão do contratado das condições gerais do contrato, a sua responsabilidade (do contratante) abrange as situações previstas nos artigos 49 e §§ 3º e 4º do artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor. A empresa vendedora de títulos de capitalização deverá verificar se: as cláusulas foram redigidas de modo a facilitar a compreensão do seu sentido e alcance pelo contratado, o contrato deverá ser redigido em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis e, finalmente, as cláusulas que implicarem algum tipo de limitação de Direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque.

            Em casos como esse já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo:

            CONTRATO DE ADESÃO. Cláusulas que limitaram o direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, inteligência do artigo 54 §4º do CDC. Interpretação mais favorável ao consumidor conforme artigo 47 do CDC (TJ de São Paulo – Embargos de Declaração nº 2.367-4 16/04/96. 3ª Câmara de Direito Privado. Rel. Mattos Faria).

            Ao comprar um título de capitalização, em geral, o consumidor não examina o serviço minuciosamente a fim de descobrir os possíveis defeitos ocultos, até porque ele parte do princípio da boa-fé presumindo que o fornecedor daquele serviço também estará agindo com correção e honestidade. O consumidor não tem como examinar profundamente o produto prometido porque, conforme propaganda exposta anteriormente pelo fornecedor, ele só terá a posse quando for devidamente sorteado. O que se discute aqui é que não poderia haver qualquer tipo de promessa por parte do fornecedor ao consumidor de que este será sorteado e receberá o produto prometido, pois aquele não tem como prever o resultado do sorteio. Caso contrário haveria má-fé na conduta do mesmo. A única coisa realmente garantida é que o consumidor, ao pagar as parcelas regularmente, participará dos 4 sorteios mensais com apurações baseadas nos resultados das extrações realizadas aos sábados pela Loteria Federal, recebendo ao fim do contrato o seu capital anteriormente investido devidamente atualizado monetariamente.

            No momento em que o contrato é firmado presume-se este de acordo com o princípio da boa-fé e presume-se ainda que as partes contratantes estão envoltas pela confiança e lealdade, mesmo que defendam interesses opostos. Isso significa presumir que as partes agirão licitamente com a finalidade de satisfazer suas vontades pactuadas originariamente. O consumidor presume que, na compra de um título de capitalização, está a empresa fornecedora agindo de boa-fé, mas verifica-se que os principais problemas dos consumidores com relação ao contrato objeto deste estudo são: o reajuste percentual das mensalidades – índice de correção IGP-M (juros acumulados em 12 meses); ao desistir no meio do contrato, o investidor recebe somente parte (ver tabela [04]) do que aplicou desde o início do pagamento das parcelas; o prazo para sorteio do bem (algumas vezes são prometidos veículos automotores ou imóveis), na maioria dos casos os consumidores nada recebem; propaganda enganosa: são prometidos ao consumidor brindes caso ele seja sorteado e; o fornecedor do serviço no ato da celebração do contrato, em regra, promete que o bem será sorteado logo nos 6 primeiros meses, promessa esta que está fora do seu alcance.

            O título de capitalização constitui-se em um serviço e o artigo 20 do Código de Defesa do Consumidor trata da proteção do consumidor no caso de existência de vício no serviço. Caso isso ocorra, poderá o consumidor alternativamente e à sua escolha exigir: a nova execução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível; a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos e; o abatimento proporcional do preço.

            O consumidor, caso não seja sorteado, não recebendo assim o bem prometido, receberá ao final do contrato o pagamento de todas as parcelas seu capital devidamente atualizado. O período do contrato será definido pelo consumidor que escolherá em quantas parcelas (12, 24 ou 36 parcelas, por exemplo) será feito o pagamento do título de capitalização.

            O problema ocorre quando muitos consumidores, desavisados ou desatentos, não conseguem mais suportar o pagamento das parcelas e decidem rescindir o contrato antes do final previsto contratualmente. Conforme visto na tabela acima, o valor do resgate é proporcional ao tempo em que o dinheiro ficou aplicado.

            Nos casos em que o fornecedor não explicita devidamente ao consumidor a questão do resgate, agindo assim de má-fé, caberá o artigo 6º inciso V do Código de Defesa do Consumidor elenca como um direito básico do consumidor o direito à revisão do contrato em razão de fatos supervenientes (por exemplo: em razão dos juros o pagamento das parcelas se torna abusivo e o consumidor não tem mais como pagá-la, ou então, este perde seu emprego) que o torne excessivamente oneroso. Conclui-se, então, que o consumidor, sentindo-se enganado quanto ao contrato firmado, não tendo recebido o bem anteriormente prometido pelo fornecedor e, vendo as parcelas aumentarem mensalmente de modo abusivo, tem todo o direito de requerer a revisão contratual provando a existência do mesmo por meio dos títulos de capitalização, contrato e cartas recebidas do fornecedor em domicílio acerca do assunto.

            Questiona-se se a proposta vincula o a empresa capitalizadora do título de capitalização. A proposta também pode ser chamada de oferta ou policitação e consiste em uma declaração de vontade de uma parte para outra onde a primeira declara sua intenção de se vincular à segunda. Ela obriga o contratante, exceto se o contrário resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso, conforme determina o artigo 427 do Código Civil. Ela também tem força vinculante e, caso o proponente resolva retirar sua oferta injustificadamente, responderá este por perdas e danos.

            Só existem quatro situações em que a proposta não será obrigatoriamente vinculante, segundo o artigo 428 do Código Civil, são elas: se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita; se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar resposta ao conhecimento do proponente; se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado e se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente.

            Há casos em que a oferta ao público corresponde à proposta, isto ocorrerá quando a oferta encerrar os requisitos essenciais do contrato, conforme determina o artigo 429 do Código Civil. Vale ressaltar que a oferta poderá ser revogada pela mesma via de sua divulgação na condição de que seja ressalvada esta possibilidade na oferta realizada. Como veremos adiante, a oferta no caso da propaganda de venda do título de capitalização é feita ao público, o aceitante é uma pessoa certa, definida. Entende Maria Helena Diniz [05] ser a oferta ao público uma proposta e não somente um simples convite.

            Fiúza [06] elenca algumas situações em que a parte prejudicada contratualmente poderá se utilizar da teoria da imprevisão a fim de requerer a revisão contratual. Usaremos com exemplo o contrato de título de capitalização. Segundo o ilustre doutrinador, são elas: para que se enquadre na situação de revisão contratual, o contrato deverá ser de execução futura, como no caso em estudo de venda de título de capitalização em que o consumidor receberá futuramente o prêmio por meio de um sorteio; no momento da execução do contrato as condições socioeconômicas das partes não são mais as mesmas do momento da sua celebração; a alteração das condições socioeconômicas das partes tem que decorrer de fato imprevisto, ou seja, tem que decorrer de um fato novo e imprevisto do qual as partes não tinham conhecimento prévio algum; uma das partes deve ter saído prejudicada economicamente em virtude da onerosidade excessiva decorrente do fato imprevisível e; o contrato deve ser pré-estimado, as partes devem conhecer originalmente as suas prestações.

            No que se refere à responsabilidade do fabricante, o artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor, abaixo transcrito, trata da mesma e afirma que esta independe de culpa e o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor reforça a questão da má informação fornecida ao consumidor. Entende Venosa [07] que os danos sofridos pelos consumidores como conseqüência da irregular atividade do fornecedor devem ser indenizados.

            art. 12 - O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente de existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas (grifo nosso) sobre sua utilização e riscos.

            Só existem três situações nas quais o fornecedor não será responsabilizado. Ele deverá provar não ter colocado o produto no mercado ou provar que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito não existe ou ser a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. No caso dos títulos de capitalização, somente o fato de o fornecedor produzir as propagandas prometendo como prêmio um carro ou uma casa já é suficiente para excluir o primeiro item mencionado, pois o produto foi devidamente colocado no mercado. No caso o fornecedor alegar o terceiro item ele deverá provar que a culpa excessiva do consumidor ou de terceiro se deve à ausência do nexo causal.

            Ressaltando ainda que, na venda do título de capitalização, verifica-se claramente a presença desses três elementos essenciais: existem o consumidor e o fornecedor (empresa capitalizadora), existe o serviço a ser oferecido que é o título de capitalização e o consumidor é o real destinatário final do serviço.

            Já em relação à questão da propaganda veiculada pelo fornecedor, o Código de Defesa do Consumidor é bem explícito ao afirmar em seu artigo 30 que toda informação ou publicidade veiculada por qualquer forma com relação aos serviços apresentados obriga o fornecedor que a publicou caso o contrato venha a ser celebrado. Logo, as empresas vendedoras de títulos de capitalização com promessas de bens vinculados a sorteios são obrigadas a fornecer o bem até a data do término do pagamento das parcelas, conforme informado pelas propagandas exibidas.

            O perigo maior está no caso em estudo, onde o cliente acredita que pagando as primeiras mensalidades já receberá o bem prometido (exemplo: uma casa, um carro) por meio de um sorteio. Aqui existe um contra-senso que passa desapercebido pelo consumidor. Na realidade o que ocorre é que, no momento da compra do título, o consumidor é informado de que será sorteado logo nos primeiros meses e que, ao receber o bem contratado também receberá outros brindes, como por exemplo, um CD player e um seguro no caso do bem ser um veículo automotor. Sendo a maneira de receber o prêmio um sorteio, como pode o fornecedor dar a garantia de que o consumidor será um dos primeiros sorteados? É evidente que há possibilidade disto ocorrer, mas trata-se de uma possibilidade e não de uma garantia. Neste caso, observa-se a malícia do vendedor que, propositadamente, confunde o comprador do título, quando tem a obrigação de tudo esclarecer. Há de convir que, no Brasil, com o analfabetismo e ignorância que infelizmente predominam trata-se de conduta facilmente realizada pelo fornecedor.

            Em virtude destas práticas ilegais, em 28 de agosto de 2003 o Ministério Público de Minas Gerais juntamente com o PROCON deste Estado e a Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor e, a outra parte, a Valor Capitalização S.A. assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta. Este termo tem como objetivo evitar que as ações publicitárias enganosas do fornecedor lesivas ao consumidor continuem a acontecer.

            Ficou determinado que a empresa fornecedora acima especificada deverá tomar as seguintes providências: esclarecer para os consumidores que o título de capitalização consiste em uma aplicação e que, ao término do contrato o consumidor, retirando a garantia aplicada poderá, com este dinheiro, adquirir o bem desejado. O título de capitalização não consiste, portanto, em forma de financiamento de bens, sejam eles móveis ou imóveis. Tendo em vista que o artigo 6º inciso III do Código de Defesa do Consumidor é claro ao determinar que a informação sobre o serviço oferecido tem que ser clara e adequada; esclarecer ao consumidor que ele poderá ou não receber o prêmio e que isso dependerá do sorteio baseado nos números da Loteria Federal. O consumidor só o receberá se for sorteado; esclarecer quando o consumidor estará apto a receber os brindes prometidos e; fica vedado o uso de publicidade que ludibrie o consumidor.

            Ficou ainda estabelecido o prazo de 30 dias para o cumprimento do termo e, caso isso não ocorra, as corretoras credenciadas serão descredenciadas e, o pagamento de R 13.000,00 para o FEDPC (Fundo Estadual de Proteção ao Consumidor) à título de reparação de danos a interesses difusos atingidos pela publicidade enganosa.

            Ressaltando ainda que um cliente que firma um contrato acerca de um título de capitalização também está protegido pelo art. 46 do Código de Defesa do Consumidor que deixa bem claro ao dizer que um contrato como esse que regula uma relação de consumo, não pode obrigar o consumidor se não lhe for fornecido todo o conhecimento prévio do seu conteúdo, ou se o contrato for redigido de maneira a dificultar a sua compreensão. O que acontece na prática é o que verificou-se em um artigo publicado em revista de circulação popular, instrumento de comunicação em massa, em que os clientes, ao perceberem que não receberão o carro prometido inicialmente, desejam cancelar o contrato. Ao realizarem este cancelamento, o consumidor sai prejudicado pois geralmente recebe somente 50% do valor pago até então. A posição do PROCON de São Paulo é a de que nessas situações todo o valor pago pelo consumidor lhe deve ser devolvido, sendo ainda estas quantias atualizadas. O PROCON de São Paulo orienta os consumidores a registrarem sua reclamação nesta instituição.

            Ainda neste sentido, decidiu o PROCON de Minas Gerais, em um Termo de Conduta em defesa do consumidor, suspender a venda de Títulos de Capitalização "Super Fácil Carro" da Sul América Capitalização S.A.. A decisão administrativa de natureza cautelar antecedente a processo administrativo de 29 de maio de 2003 analisou a questão da propaganda enganosa da empresa capitalizadora mencionada.

            A fornecedora do título de capitalização em programas de televisão como o "Falando Francamente" apresentado por Sônia Abraão e o "Melhor da Tarde" apresentado por Leonor faziam propagandas do "Super Fácil Carro" anunciando que comprando o título de capitalização esta seria a melhor maneira de se comprar um carro.

            Na propaganda a fornecedora utilizava-se do argumento de que a auto-estima do consumidor seria elevada tendo em vista que este passaria a ser proprietário de veículo novo ou semi-novo. Um desrespeito relevante em face do artigo 4º do Código de Defesa do Consumidor que defende o respeito à dignidade, saúde, segurança, melhoria da qualidade de vida e harmonia nas relações de consumo.

            Na publicidade veiculada a venda do veículo é anunciada como certa e imediata, coisa que não poderia ser prometida pela empresa capitalizadora porque esta não tem como garantir que o consumidor ganhará o prêmio pois isto depende de sorteio e, ao ser sorteado o que o consumidor receberá será o prêmio pecuniário que poderá ou não ser suficiente para a compra do carro.

            Decidiu então o PROCON de Minas Gerais pela suspensão do fornecimento do título de capitalização da Sul América "Super Fácil Carro" enquanto ainda veicular a propaganda enganosa, devendo ainda a empresa pagar a multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) caso continue desobedecendo o Código de Defesa do Consumidor e as emissoras de televisão que veicularam a propaganda seriam notificadas desta decisão.

            Conforme decidido pelo PROCON de São Paulo, a empresa que vende seus títulos de capitalização prometendo ao cliente que depois de algum tempo este receberá o bem (carro, casa, etc.) não poderá, em caso de desistência do consumidor, devolver somente parte do que já foi pago. Tratando-se o contrato em estudo de um contrato de adesão, entende a Justiça que:

            CONSÓRCIO. Obrigatoriedade de devolução dos valores pagos ao desistente. Devidamente corrigidos. Excluídos apenas o valor do seguro e taxa de administração. Tratando-se de contrato de adesão é abusiva a cláusula que permite a devolução não atualizada. (grifo nosso) Incidência do CDC que determina a correção e limita a cláusula penal em 10% sobre o valor. (TARGS. Nº 1918853 – Data 27/03/1991 – Rel. Paulo Heerdt).

            Questiona-se ainda a existência física ou não do contrato objeto deste estudo. Há situações em que as empresas vendedoras de títulos de capitalização não firmam contrato algum com os consumidores e a única documentação que prova a existência da relação de consumo, ou seja, que existe um contrato não formal, são os boletos bancários, a propaganda emitida pelo fornecedor informando as condições do negócio jurídico e as cartas informativas que o consumidor recebe em casa. O artigo 332 do Código de Processo Civil afirma que se se tratar de negócio jurídico não formal, qualquer meio de prova será permitido pela ordem jurídica, desde que não seja por ela proibido ou restringido. Portanto, o consumidor, portando o título em si, ou um contrato de venda do mesmo poderá utilizar um ou outro como meio de prova na sua defesa processual.

            Analisando a questão da responsabilidade dos publicitários, verifica-se que ao realizar uma campanha publicitária solicitada por um fornecedor qualquer, o publicitário toma conhecimento do que realmente é o produto ou serviço a ser comercializado, assim como também fica ciente da imagem que o fornecedor deseja passar ao público. O Código de Defesa do Consumidor trata dos abusos da publicidade nos artigos 66 a 69 e elenca como delito em espécie no seu artigo 67: fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva. A pena para estes profissionais é de detenção de 3 meses a 1 ano e multa. Norma esta considerada razoável, pois nada mais sensato do que punir os maus profissionais que saibam ou que devam saber que a propaganda por ele produzida e veiculada não condiz com a realidade do produto ou serviço oferecido. A conduta correta a ser tomada por estes profissionais seria a de não aceitar produzir a propaganda nos moldes exigidos pelo fornecedor, mas na medida da realidade do produto.

            O Código de Auto-Regulamentação Publicitária do Conar estabelece condutas que devem ser evitadas e condutas que devem ser obedecidas, a exemplo de seu artigo 19 que afirma que a atividade publicitária deve respeitar a dignidade da pessoa humana, o interesse social, as instituições e símbolos nacionais, as autoridades constituídas e o núcleo familiar. Neste mesmo Código, estabelece o artigo 27 que o anúncio deve conter uma apresentação verdadeira do produto oferecido e especifica mais no §1º ao determinar que todas as descrições do produto ou serviço de fatos ou dados objetivos devem ser comprobatórias, sendo de responsabilidade dos anunciantes e agências fornecer as comprovações quando solicitadas.

            Claro que não é sempre que o consumidor tem razão e a sua proteção não é indiscriminada, pois entendem os Tribunais que este não pode utilizar-se da Teoria da Imprevisão para esquivar-se de suas dívidas caso não exista um fato excepcional e extraordinário que justifique o não cumprimento da obrigação. Vide jurisprudência abaixo:

            CONTRATO DE FINANCIAMENTO – Sistema financeiro de Habitação – Rescisão pretendida sob invocação da Teoria da Imprevisão – Inadmissibilidade – Quadro econômico e financeiro do País que não se mostra como fenômeno novo e imprevisível – Problemas profissionais do mutuário impeditivos da satisfação obrigacional pactuada – Impossibildade de caracterização como desequilíbrio contratual provocado por fato excepcional e extraordinário." (RT 619/87)

Sobre as autoras
Melina Barros Telles Jaguaribe

advogada em São Carlos (SP), especialista em Direito Processual Civil

Flávia de Almeida Montingelli Zanferdini

juíza de Direito, mestre e doutora em Direito Processual Civil pela PUC/SP, professora de Direito Processual Civil pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP) - cursos de graduação e especialização

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JAGUARIBE, Melina Barros Telles; ZANFERDINI, Flávia Almeida Montingelli. Uma análise sobre a promessa de prêmio com prazo determinado em título de capitalização e o Código de Defesa do Consumidor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 893, 13 dez. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7684. Acesso em: 18 nov. 2024.

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