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O que é necessário para aplicação de multa por infração em condomínios?

Agenda 18/08/2020 às 16:40

Estuda-se o contexto da aplicação de multas em condomínios, a necessidade de observância do regramento interno pelo síndico, a garantia do contraditório e da ampla defesa, a comprovação da infração e o valor que deve ser aplicado.

As multas decorrem da violação das normas condominiais, cujo propósito é disciplinar a relação entre os moradores, tendo como fundamento o exercício salutar e harmônico dos direitos de propriedade de cada um.

A propriedade e seu direito de uso

O condômino é proprietário de sua unidade privativa e de uma fração ideal das áreas comuns, da qual é coproprietário, juntamente com os demais condôminos. Aliás, condomínio vem do latim “condominum”, ou domínio comum, quando mais de um titular exerce direitos de propriedade sobre o mesmo bem.

Conforme determina o Art.1.335 do Código Civil, é direito do condômino:  usar, fruir e livremente dispor de suas unidade. Porém, tal direito de uso não é absoluto, pois deve dialogar com outras normas legais e condominiais. 

Na lista de deveres do proprietário o Art.1.336 do Código Civil assim dispõe: São deveres do condômino: IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes. Deste modo, o proprietário, ao fazer uso de seu imóvel ou das partes comuns, não pode causar dano ou incômodo aos demais condôminos.

Normas condominiais 

O condomínio possui diversas normas para regular sua administração, o rateio de suas despesas, o convívio harmônico entre os moradores, a utilização das áreas comuns e estabelece as sanções pelo descumprimento. Suas principais regras estão na convenção do condomínio e no regulamento interno.

A convenção de condomínio, em síntese, é o ato normativo que trata das relações condominiais, estabelecendo normas de convivência e sanções aos condôminos. Seu objetivo é disciplinar os direitos e deveres do condomínio e formas de gestão, como assembleias e administração.

O regulamento interno estabelece regras para o local, como restrição para utilizar determinadas áreas. É o instrumento normativo que rege as normas de conduta de moradores e visitantes, determinando as infrações e as penas aplicáveis, possuindo natureza mais específica, detalhando a convenção de condomínio.

Descumprimento do regramento interno do condomínio

Verificamos que o condômino deve dispor da sua unidade e das áreas comuns, sem infringir as normas do Regulamento Interno, da Convenção e da legislação vigente. Contudo, a existência de regras de convívio pressupõe sanções aplicáveis em caso de descumprimento.

O representante da sociedade condominial é o síndico, eleito em uma assembleia geral ordinária, com poderes para administrar o condomínio. Caberá ao síndico o papel de defender a convenção e o regulamento interno, conhecendo suas normas e aplicando-as durante sua gestão.

O Art.1.348 do Código Civil atribui ao síndico a imposição e cobrança das multas devidas, havendo, contudo, em algumas convenções, a previsão de aplicação pelo conselho ou a necessidade de retificação pela assembleia geral. É importante ressaltar, porém, que as multas devem estar previstas, seja na convenção do condomínio, no regimento interno ou por decisão do colegiado condominial.

Advertência ou multa?

Trata-se de um tema espinhoso, mas é necessário que o síndico não ignore a prática de determinados atos dissonantes ao espírito de sociabilidade e harmonização do condomínio. A ação diante da infração é a única forma de coibir abusos e manter a ordem e a paz entre os moradores. Entre os problemas mais comuns estão: estacionamento de veículos em local não permitido, barulhos, reformas, festas, vazamentos, animais, danos ao patrimônio do condomínio, uso de áreas comuns, horários para a realização de mudança, dentre outros atritos do cotidiano.

Antes de advertir ou multar, é importante avaliar a natureza da infração praticada, recomendando-se, sempre que as circunstâncias permitirem, que o síndico procure estabelecer uma conversa amigável sobre o fato ocorrido, alertando o condômino sobre a natureza da infração, informando que em caso de reincidência ele será multado.

Deste modo, o síndico pode optar por advertir ou multar, após examinar o caso concreto com base no regramento interno do condomínio. No entanto, de acordo com a natureza do fato, a multa pode se fazer necessária, independente de uma advertência inicial.

Qualquer que seja a atitude a ser tomada, é importante ressaltar que não é o síndico que adverte ou multa, mas sim as próprias regras do condomínio que assim o fazem, cabendo a ele apenas a aplicação, dentro do que as normas determinam, sob pena de ele também estar infringindo essas mesmas normas. Segundo Ivan Horcaio (2018, p.667), “o síndico não é executivo, é apenas o executante do que determina a lei, a convenção, o regulamento interno e a assembleia”.

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Para as situações mais recorrentes, como barulho, uso inadequado da garagem, ou passeio de animais em locais proibidos, é razoável começar com uma advertência e, então, se a situação tornar a se repetir, seguir com as multas. Normalmente são casos de natureza continuada, não se configurando como práticas isoladas.

Nos casos cuja natureza do fato tenha um cunho eventual, não recorrente, não há espaço para advertência, como na mudança sendo efetuada em data ou horário não permitidos pelo regramento interno. Nessa situação, uma advertência seria inócua, pois o fato já ocorreu e o condômino infrator não irá realizar outra mudança tão cedo. Portanto uma advertência seria excessivamente branda diante da infração praticada, o que poderia estimular outros condôminos a praticarem a mesma transgressão.

Nos casos em que o condômino causar prejuízos ao patrimônio do condomínio, como dano ao portão de garagem ou quebra de vidros de áreas comuns, o ressarcimento deve ser feito, independente de advertência prévia, partindo direto para a multa.

Comprovação da infração

Além da necessidade da norma que embase a aplicação da penalidade, o síndico precisará de provas materiais da ocorrência. Serão necessárias fotos, imagens do circuito interno de monitoramento, testemunhas ou áudios. Enfim, todo o fato deve ser registrado no livro de ocorrências do condomínio.

O síndico deverá agir motivado por uma reclamação devidamente registrada, para que haja um embasamento maior para sua ação.

Segundo Rodrigo Karpat (2012), advogado especialista em condomínios:

O que causa muita dúvida ainda é como provar a ocorrência da multa. O ideal é que sempre exista na portaria um livro de ocorrências a fim de documento o ocorrido. Sendo iminente o problema sugere-se que a presença de duas testemunhas, que podem ser moradores, funcionários ou membros do corpo diretivo. Uma segunda opção é documentar a reclamação por e-mail ao síndico ou a administradora. No caso da ocorrência ter sido constatada pelo síndico ou funcionários do condomínio, o ideal é que também seja relatada no livro.

Garantia do direito de defesa do condômino que cometeu a infração

Em qualquer caso, é imprescindível observarmos os princípios constitucionais, que devem ser necessariamente obedecidos, conforme o disposto na Constituição Federal, artigo 5º, inciso LV:

Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Assim, a imposição de multa deve ser necessariamente precedida de prévia notificação ao condômino ou possuidor, para que exerça seu direito de defesa. Importante observar se o regramento interno do condomínio estabelece algum trâmite específico e prazo para apresentação da defesa; e que a jurisprudência vem entendendo que é nula de pleno direito a cláusula da convenção do ou do regramento interno do condomínio que exclua o direito de defesa do condômino (STJ, REsp 1.365.279/SP; in: TARTUCE, 2016).

Se o infrator não apresentar defesa ou se a defesa apresentada não for acolhida, a multa será devida. Novamente, devemos analisar o regramento interno do condomínio, para verificar se existe a possibilidade de recurso para o conselho fiscal ou para a assembleia de condomínio.

Karpat (ib.) também ressalta a questão:

Em qualquer caso, deve ser concedido ao condômino o direito de defesa com prazo razoável. O procedimento de conceder o direito de defesa ao condômino infrator e a ratificação das multas em assembleia, mesmo em convenções que não estipulam este procedimento, tem sido fator determinante para que no caso do condômino não pagar a multa a mesma possa ser cobrada judicialmente.

Com efeito, qualquer que seja a modalidade de imposição de multa ou penalidade, os Tribunais têm entendido que seja conferido o direito de defesa ao condômino, conforme decisão abaixo:

0279300-73.2010.8.19.0001 – APELAÇÃO. Des(a). NAGIB SLAIBI FILHO - Julgamento: 09/11/2011 - SEXTA CÂMARA CÍVEL.  Direito Civil. Condomínio edilício. Cobrança de multa imposta pelo síndico. Alegação de violação à Convenção do Condomínio. Ausência de provas de que a penalidade tenha sido submetida à deliberação da assembléia geral de condôminos e de que foi assegurado à condômina o exercício do contraditório e da ampla defesa. Descabimento. Ilegalidade do ato, devendo o valor da multa ser restituído à condômina. Manutenção da sentença. (...) Íntegra do Acórdão - Data de Julgamento: 09/11/2011 (*)

Que valor aplicar?

O regulamento interno ou a convenção do condomínio deverão determinar o valor das multas, que normalmente tem como referência a cota condominial ordinária. Importante que o regramento do condomínio estabeleça alguns parâmetros, para que o síndico não use de arbitrariedade ao aplicar as sanções.

É razoável que esse valor possa variar de acordo com a gravidade da ocorrência e a quantidade de infrações cometidas. Considerando um aspecto pedagógico, é recomendável que a primeira multa tenha um valor mais baixo, que poderá aumentar em conformidade com a reincidência.

Vale lembrar que a multa deve ser aplicada apenas sobre o valor da taxa mensal, sem incluir aí rateios extras ou despesas extraordinárias. Convenções de condomínio antigas que estabeleçam outros critérios de cálculo, como a URV, devem ser atualizadas em assembleia própria.

Importante não confundir a multa por infração de normas com aquela referente ao atraso no pagamento da cota condominial mensal, prevista no Código Civil e na convenção, não havendo necessidade de qualquer procedimento para sua configuração, ou seja, uma vez que o condômino não tenha realizado o pagamento dentro do vencimento, já é devida a multa pelo atraso.

Porém, há um limite para o valor da multa de condomínio segundo o Código Civil. O Artigo 1.336 determina que esse valor não pode ser superior a cinco vezes o valor da taxa condominial.

A única situação em que a lei permite cobrar um valor de multa de condomínio mais alto é a de condômino antissocial. Nesses casos, a multa prevista pode chegar a quantia de até dez vezes o valor da taxa mensal. Essa questão é esclarecida pelo Artigo 1.337 e seu parágrafo único.

Sobre o autor
Francisco Machado Egito

Advogado com pós-graduação em Direito Imobiliário e pós-graduação em Direito Notarial e Registral. Graduado em Gestão de Negócios Imobiliários. Administrador de condomínios e imóveis. Graduado em administração e contabilidade. Sólida experiência em negócios imobiliários. Professor universitário nas disciplinas de Direito Condominial, tributação em negócios imobiliários e Aspectos contábeis, tributários e previdenciários em condomínios. Coordenador da pós graduação em Direito e Gestão condominial e da pós graduação em Direito Condominial. Mestrando em administração pela UFF. Presidente da comissão de Direito Condominial da ABA-RJ. Coordenador da Comissão de Contabilidade Condominial do CRC-RJ. Membro das comissões de Direito Imobiliário da OAB Niterói e OAB RJ.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

EGITO, Francisco Machado. O que é necessário para aplicação de multa por infração em condomínios?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6257, 18 ago. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/78472. Acesso em: 22 dez. 2024.

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