CONCLUSÃO
A formação da identidade nacional no Brasil é baseada na hibridez dos povos ocorrida no período colonial, onde indígenas, europeus e africanos contribuíram para os costumes brasileiros através da cultura de cada um, não fazendo sentido, portanto, haver preconceitos com a questão religiosa em um país plural como o Brasil.
Levando em contraste aspectos históricos com a sociedade atual, os adeptos ao cristianismo mostram-se dispostos a continuar perseguindo e executando todos aqueles que não se encontram inseridos em um contexto aceitável pela vertente religiosa, ocasionando uma segregação social– mas claro que até como uma forma de se evitar a hipocrisia no presente artigo: em toda regra, há exceções.
Mesmo que haja tipificação de tal conduta preconceituosa e garantias constitucionais como a de liberdade de crença e culto ou até mesmo a laicidade e não intervenção estatal, há uma constante luta para exterminar tal intolerância construída ao longo da história.
Um Estado laico tem o dever de separar Estado e religião e de proteger a liberdade religiosa como consequência, já que o país é rico em diversidade, garantindo o direito de pessoas de qualquer crença serem aceitos na sociedade sem chance de qualquer preconceito – que como já demonstrado o Brasil apenas diz fazer, mas não cumpre.
Portanto, medidas que visem a harmonia e a não discriminação entre cidadãos com religiões diferentes deveriam ser garantidas para evitar infortúnios e abalos sociais, como a constante difamação que crenças minoritárias sofrem – tanto dos cidadãos, quanto do governo, o qual se colocou no poder graças à falácias e preconceitos que os adeptos à tal tipo de discriminação se identificam, ficando demonstrado que a liberdade religiosa também encara desafios.
Em razão disso que uma maior atenção com os crimes de intolerância religiosa deve ser cobrada, sendo que na maioria das vezes acaba-se por configurar crime de injúria ao invés de tipificar a conduta como deveria acontecer, causado perdas na sociedade e tornando-se necessário conter a situação.
Sendo assim, mesmo que pessoas não sejam mais assassinadas ou catequizadas à força, aqueles que não seguem a vertente cristã não deixaram de ser perseguidos, e de certa forma, continuam a serem queimados – só que desta vez socialmente, onde quando a intolerância é feita contra uma crença cristã, a comoção proporcionada é de nível nacional, enquanto as demais religiões são tratadas com inferioridade e indiferença.
O que resta a ser esclarecido é que nenhuma religião é absoluta, todas têm suas falhas e dúvidas e por isso que nenhuma deve ser superior à outra – ou à falta de religião. Não há um deus soberano, e mesmo se houvesse, este não é apresentado misericordioso pelos seus seguidores como a fé o ressalta, já que aqueles que não o reconhecem são imediatamente empurrados para o “inferno”. Portanto de duas uma: ou todas as religiões estão erradas; ou todas estão certas – sem meio termo.
Por isso que a liberdade religiosa se mostra extremamente importante, já que cada indivíduo é livre para escolher qual crença irá seguir baseado no seu bem-estar e conforto quanto à filosofia de vida de cada um, e não na do seu próximo, devendo esta ser assegurada e protegida pelo Estado de maneira a garantir que todas as pessoas sejam respeitadas, vindo a cumprir o seu papel quanto à imparcialidade em assuntos religiosos, construindo uma sociedade humanitária e justa.
E o Estado deveria garantir qualquer prejuízo contra qualquer religião, já que várias religiões de matrizes africanas sofrem danos contra seus locais de culto, como a imposição de multa para qualquer ato de intolerância ou até mesmo o ressarcimento dos danos causados através dos ataques recorrentes à locais de culto ou até símbolos religiosos.
A alienação e o fanatismo de muitos evoluem para intolerância e preconceito, ocasionando uma lavagem cerebral e padronização de um senso comum ultrapassado que contribui para alimentar uma massa de manobra que desrespeita a ética universal que tem o intuito de manter a harmonia e a paz na sociedade. Essa ideologia de que há apenas um “Deus” soberano e que é o único apto a ser adorado, desprezando qualquer outro tipo de crença ou religião é hostil.
A hierarquização de que apenas os valores “brancos europeus” tem relação com o que é válido – que é a crença tida como única e universal há muito tempo, empurrando o cristianismo goela abaixo como pílulas em um centro de reabilitação – contribui com a estigmatização de práticas religiosas que não tenham ligação com essa vertente e gerando um ódio inconveniente que diverge com os “princípios cristãos” que não deveriam ter tal sentimento como foco devida à ampla publicidade de amor que tal religião diz praticar – mas que tem por trás questões políticas que demonizam minorias pela necessidade de se sentirem superiores.
Por isso que torna-se necessário curar essa obsessão da sociedade promovendo uma transformação de mentalidade da população através de campanhas, projetos escolares, mecanismos de coibição do preconceito – como algum meio que impeça comentários de má índole em publicações ou postagens na internet – para ampliar a discussão sobre a tolerância às diferenças e à pluralidade cultural e religiosa existente no país, preservando a paz entre culturas para que haja uma cordialidade nas relações sociais – as quais contribuem para criar impressões da realidade –, como forma de conscientizar a população sobre o assunto e mostrando que é possível conviver respeitando as diversidades.
REFERÊNCIAS
ALVES, Chico. “Picham ‘Jesus é o dono do lugar’ e siglas de facções”. 2019. Projeto Colabora. Disponível em: <https://projetocolabora.com.br/ods16/picham-jesus-e-o-dono-do-lugar-e-siglas-de-faccoes/>. Acesso em: 25 de julho de 2019.
AZEVEDO, Marcelo André de; SALIM, Alexandre. Direito Penal: Parte Especial – Dos crimes contra a pessoa aos crimes contra a família. Coleção Sinopses para Concursos. Salvador, Editora Juspodvm, 2016, 5ª ed.
ASSEMBLEIA GERAL DA ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos. 217 (III) A. Paris, 1948. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2018/10/DUDH.pdf>. Acessado em 6 de setembro de 2019.
Balanço anual: Disque 100 registra mais de 500 casos de discriminação religiosa. 2019. Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Disponível em: <https://www.mdh.gov.br/todas-as-noticias/2019/junho/balanco-anual-disque-100-registra-mais-de-500-casos-de-discriminacao-religiosa>. Acesso em: 14 de julho de 2019.
BRASIL. Constituição Federal. Brasília: 1988. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 06 de julho de 2019.
BRASIL. Lei 7.716/89. Brasília: 1989. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7716.htm>. Acesso em: 14 de julho de 2019.
BRASIL. Lei 9.459/97. Brasília: 1997. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9459.htm>. Acesso em: 14 de julho de 2019.
BRASIL. Lei 11.645/07. Brasília: 2008. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm>. Acesso em: 14 de julho de 2019.
COSTA, Gicélia Santos. Teologias em Conflitos: A Reação Católica à Propaganda Religiosa Protestante na cidade de Laranjeiras (1885/1889). 2018. Disponível em: <https://revistas.pucsp.br/ultimoandar/article/view/37254>. Acesso em: 08 de julho de 2019.
D’ANGELO, Helô. As origens da violência contra religiões afro-brasileiras. 2017. Revista Cult. Disponível em: <https://revistacult.uol.com.br/home/violencia-religiosa-candomble-umbanda/>. Acesso em: 16 de julho de 2019.
Elementos Históricos da Intolerância Religiosa no Brasil. 2015. Disponível em: <https://teologoleomariano.blogspot.com/2015/12/elementos-historicos-da-intolerancia.html>. Acesso em 13 de julho de 2019.
PRIORE, Mary del. Histórias da gente brasileira: volume 1: colônia. 2016. São Paulo. Editora Leya.
PY, Fábio. Cristologia cristofascista de Bolsonaro. 2019. Disponível em: <https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Sociedade-e-Cultura/Cristologia-cristofascista-de-Bolsonaro/52/44285>. Acesso em: 06 de julho de 2019.
RUSSEL, Jeffrey B.; ALEXANDER, Brooks. História da Bruxaria. 2019. Traduzido por: Álvaro Cabral, William Lagos. 2. Ed. São Paulo. Editora Aleph.
SILVA, Vitória Régia da. Oito casos de intolerância religiosa são denunciados por dia em São Paulo. 2019. Gênero e Número. Disponível em: <https://www.generonumero.media/oito-casos-de-intolerancia-religiosa-sao-denunciados-por-dia-em-sao-paulo/>. Acesso em: 12 de julho de 2019.
____, Vagner Gonçalves. Entre a Gira da Fé e Jesus de Nazaré: Relações socioestruturais entre neopentecostalismo e religiões afro-brasileiras. 2007. Intolerância Religiosa: Impactos do neopentecostalismo no campo religioso afro-brasileiro. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo.
SOARES, Ingrid. Disque 100 registra mais de 500 casos de intolerância religiosa. 2019. Correio Braziliense. Disponível em: <https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2019/06/13/interna-brasil,762632/disque-100-registra-mais-de-500-casos-de-intolerancia-religiosa.shtml>. Acesso em: 14 de julho de 2019.