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ADC nº 12 no STF.

O conceito de ato normativo primário no voto do relator, Ministro Carlos Ayres Britto

Agenda 21/02/2006 às 00:00

1. DESENVOLVIMENTO DAS IDÉIAS.

            Por nove votos a um, no dia 16/02/2006, o Plenário do Supremo Tribunal Federal deferiu liminar na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 12, confirmando a validade da Resolução nº 07/2005 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

            A resolução proíbe a prática do nepotismo no Poder Judiciário. O ministro-relator da ação, Carlos Ayres Britto, concedeu a cautelar para suspender todos as decisões proferidas contra a Resolução 07/2005 e foi acompanhado pela maioria do Plenário.

            Na ocasião, ao proferir o seu voto, o ministro-relator lançou luzes sobre vários temas jurídicos. Destacamos, nesta oportunidade, o conceito de ato normativo primário, que faz parte do núcleo essencial do voto por ele proferido, e que toca de perto a questão das espécies normativas e seu fundamento de validade.

            Para o ministro Ayres Britto, o Estado-legislador é detentor de duas caracterizadas vontades-normativas: uma primária, e outra, derivada. A primária é assim designada por buscar o seu fundamento de validade diretamente no Texto Constitucional, sem interposta espécie legislativa outra, logo, podendo inovar no ordenamento jurídico como força primária que é. Já a vontade secundária é assim chamada pelo fato de buscar o seu fundamento de validade em norma intercalar infraconstitucional, ou seja, em outra espécie legislativa já editada, por isso chamada de instrumento secundário que não pode inovar no ordenamento jurídico pátrio.

            Segundo os ensinamentos do min. Ayres Britto, são exemplos de atos normativos primários, estruturados a partir da linguagem do Texto Constitucional: resoluções do Senado Federal (art. 52, VII, VIII e IX e art. 155, § 2º, V, alíneas a e b, todos da Constituição Federal); medidas provisórias (art. 62 da Constituição Federal); decreto - regulamento autônomo – (art. 84, VI, a da Constituição Federal); resolução do Conselho Nacional de Justiça (art. 103-B, II da Constituição Federal); regimento internos dos tribunais (art. 96, I, alínea a da Constituição Federal). Neste ponto, o min. Ayres Britto destacou uma peculiaridade: é que estes regimentos internos possuem natureza dúbia, porquanto podem ter natureza de atos primários, quando dispõem sobre competência e funcionamento dos órgãos jurisdicionais e administrativos de cada qual deles (tribunais); e de atos secundários, quando dispuserem sobre o dever de observância das normas de processo e das garantias processuais das partes.

            Em sendo assim, os órgãos constitucionais que foram aquinhoados com a possibilidade de editar estes instrumentos jurídicos são detentores da chamada competência para expedir atos normativos primários, atos que podem inovar no ordenamento jurídico independentemente da existência de interposto texto legal, uma vez que o fundamento de validade para edição de tais atos primários advém da própria Carta Republicana.

            Dentro destas premissas, acolhidas pelo plenário do Supremo Tribunal Federal, plenamente constitucional é o conteúdo da Resolução nº 7/2005 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), já que trata de ato normativo primário em consonância com seu fundamento de validade, qual seja, mais especificamente, a cabeça do art. 37 da Constituição Federal, que trata dentre outros princípios, da impessoalidade, eficiência e moralidade administrativa.

            Veja, caro leitor ou leitora, que a lei é o protótipo (expressão cunhada pelo min. Ayres Britto) do ato normativo primário, até mesmo pela dicção do artigo 5º, II, da Constituição Federal, porém, há temperamentos. Não só a lei veicula atos normativos primários, consoante vimos de ver, existem outros instrumentos jurídicos espraiados pelo Texto Constitucional, que também são introdutores de diplomas normativos primários no ordenamento pátrio.

            Insista-se neste ponto: o conceito de legalidade é densificado, ou amplificado, de maneira que não só a lei introduz normas gerais, abstratas e impessoais no ordenamento jurídico, podendo também aquelas exceções já citadas no voto do min. Ayres Brito introduzirem normas jurídicas gerais, abstratas e impessoais, ou noutro dizer, atos normativos primários.

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2. CONCLUSÃO.

            - Texto e norma não se confundem. Cabe ao intérprete constitucional construir o significado da norma jurídica a partir da estrutura de linguagem posta no Texto Constitucional.

            - Não só ao Congresso Nacional é conferido o direito de introduzir normas gerais e abstratas no ordenamento jurídico pátrio, ainda que esta seja a regra.

            - O Poder Público, em suas três esferas (Legislativo, Executivo e Judiciário), está subordinado não somente à legalidade formal, mas, sobretudo, a um conceito mais amplo: o conceito de juridicidade, que abrange uma sistematização dos princípios jurídicos e dos demais atos normativos primários, cuja fonte é a Constituição.

            - A Resolução nº 7/2005, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por ser um ato normativo primário, isto é, instrumento jurídico que retira o seu fundamento de validade do próprio Texto Constitucional, pode dispor sobre a vedação do nepotismo no Judiciário independente de lei, já que a resolução tem a mesma natureza jurídica de uma lei, qual seja, ambos são atos normativos primários.

            - A Resolução nº 7/2005 alberga em si o dever-ser de uma busca contínua e incessante em prol da densificação dos princípios jurídicos postos no art. 37, cabeça, da Constituição Federal, a saber: moralidade, impessoalidade e eficiência.

Sobre o autor
Roberto Wagner Lima Nogueira

mestre em Direito Tributário, professor do Departamento de Direito Público das Universidades Católica de Petrópolis (UCP) , procurador do Município de Areal (RJ), membro do Conselho Científico da Associação Paulista de Direito Tributário (APET) é autor dos livros "Fundamentos do Dever Tributário", Belo Horizonte, Del Rey, 2003, e "Direito Financeiro e Justiça Tributária", Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2004; co-autor dos livros "ISS - LC 116/2003" (coord. Marcelo Magalhães Peixoto e Ives Gandra da Silva Martins), Curitiba, Juruá, 2004; e "Planejamento Tributário" (coord. Marcelo Magalhães Peixoto), São Paulo, Quartier Latim, 2004.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NOGUEIRA, Roberto Wagner Lima. ADC nº 12 no STF.: O conceito de ato normativo primário no voto do relator, Ministro Carlos Ayres Britto. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 963, 21 fev. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8001. Acesso em: 22 nov. 2024.

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