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O Direito Constitucional em crise

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Agenda 03/06/2020 às 11:52

6. FORÇAS ARMADAS NÃO SÃO PODER MODERADOR

O documento divulgado, no dia 2 de junho do corrente ano, pela OAB destaca que “compreender que as Forças Armadas, inseridas inequivocamente na estrutura do Poder Executivo sob o comando do Presidente da República, poderiam intervir nos Poderes Legislativo e Judiciário para a preservação das competências constitucionais estaria em evidente incompatibilidade com o art. 2o, da Constituição Federal, que dispõe sobre a separação dos poderes. Afinal, com isso, estabelecer-se-ia uma hierarquia implícita entre o Poder Executivo e os demais Poderes quando da existência de conflitos referentes a suas esferas de atribuições”.

A Constituição de 1988 não admite um poder moderador.

“Concluímos pela inexistência do Poder Moderador atribuído às Forças Armadas, bem assim pela inconstitucionalidade da utilização do aparato militar para intervir no exercício independente dos Poderes da República”, afirma o parecer, assinado pelo presidente nacional da OAB, Felipe Santa Cruz. O documento também é subscrito pelo presidente da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da entidade, Marcus Vinicius Furtado Coêlho e por Gustavo Binenbojm, membro da comissão.

Para a OAB, a Constituição não confere às Forças Armadas a “atribuição de intervir nos conflitos entre os Poderes em suposta defesa dos valores constitucionais, mas demanda sua mais absoluta deferência perante toda a Constituição”.

“Não cabe às Forças Armadas agir de ofício, sem serem convocadas para esse fim. Também não comporta ao Chefe do Poder Executivo a primazia ou a exclusiva competência para realizar tal convocação. De modo expresso, a Constituição estabelece que a atuação das Forças Armadas na garantia da ordem interna está condicionada à iniciativa de qualquer dos poderes constituídos. A provocação dos poderes se faz necessária, e os chefes dos três poderes possuem igual envergadura constitucional para tanto”, destaca o parecer.

Ainda se destaca daquele parecer:

“Ao contrário, como muito bem exposto por Seabra Fagundes, com apoio no pensamento de Rui Barbosa, as Forças Armadas estão integradas e vinculadas ao comando do seu chefe supremo, o Presidente da República, que, por sua vez, tem o dever de respeito às leis e à própria Constituição.3Essa cadeia de comando não abre nenhum espaço para se alçar as Forças Armadas de cumpridoras da lei à condição de intérpretes e fiadoras da própria legalidade.”

A Constituição imperial dizia no artigo 98: “O Poder Moderador [...] é delegado privativamente ao Imperador [...] para que vele sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos mais poderes políticos”. Temos uma República julgada incapaz de se autogovernar, sujeita à tutela de um novo Poder Moderador.

Assim, o Poder Moderador e o Poder Executivo eram exercidos pelo Imperador (artigos 101 e 102), cumulação essa que foi muito discutida, como disse Zacarias de Góis e Vasconcelos (Da natureza e limites do poder moderador).

Naquilo que é considerada a melhor obra na matéria, Zacarias de Góis e Vasconcelos afirmavam que a plenitude do governo representativo somente estaria assegurada pela responsabilidade ministerial nos atos do Poder Moderador.

Isso terminou em 1889 com a proclamação da República. Nessa linha a Constituição de 1891 proclamou o sistema dos freios e contrapesos.

A Constituição de 1891 proibia às Forças Armadas de desrespeitar as instituições fulcradas na Constituição.

Tem-se no modelo ditatorial de 1967, com as mudanças outorgadas em 1969, que as Forças Armadas tinham o papel político e policial.

Art. 92: repete 1946, trocando “poderes constitucionais” por “poderes constituídos”.

Sob a égide da Constituição de 1946, revogada em 1967, dizia Miguel Seabra Fagundes:

“As Fôrças Armadas constituem, em todos os Estados, o elemento fundamental da organização coercitiva a serviço do direito. Nelas, na eficiência da sua estrutura e na respeitabilidade que as envolva, repousa a paz social pela afirmação da ordem na órbita interna e do prestígio estatal na sociedade das nações. São, portanto, os garantes materiais da subsistência do Estado e da perfeita realização dos seus fins. Em função da consciência que tenham da sua missão está a tranqülidade interna pela estabilidade das instituições. É em função do seu poderio que se afirmam, nos momentos críticos da vida internacional, o prestígio do Estado e a sua própria soberania.”

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Em 1988, com a Constituição democrática tivermos: papel político e policial.

Art. 142: “[como em 1946] organizadas [...] sob a autoridade suprema do PR, e destinam-se à defesa da pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”

Assim devem as Forças Armadas respeitar o sistema dos freios e contrapesos.

Sendo o chefe das forças armadas o chefe da Nação, órgão do Poder Executivo, as Forças Armadas não podem ser longa manus desse poder, mas dos poderes da República.

Montesquieu acreditava que para afastar governos absolutistas e evitar a produção de normas tirânicas, seria fundamental estabelecer a autonomia e os limites de cada poder. Com isto, cria-se a ideia de que só o poder controla o poder, por isso, o Sistema de freios e contrapesos, onde cada poder é autônomo e deve exercer determinada função, porém, este poder deve ser controlado pelos outros poderes. Verifica-se, ainda, que mediante esse Sistema, um Poder do Estado está apto a conter os abusos do outro de forma que se equilibrem. O contrapeso está no fato que todos os poderes possuem funções distintas, são harmônicos e independentes.

Um dos objetivos de Montesquieu era evitar que os governos absolutistas retornassem ao poder. Para isso, em sua obra “O Espírito das leis”, descreve sobre a necessidade de se estabelecer a autonomia e os limites entre os poderes. No seu pensamento, cada Poder teria uma função específica como prioridade, ainda que pudesse exercer, também, funções dos outros poderes dentro de sua própria administração.

O Sistema de Freios e Contrapesos consiste no controle do poder pelo próprio poder, sendo que cada Poder teria autonomia para exercer sua função, mas seria controlado pelos outros poderes. Isso serviria para evitar que houvesse abusos no exercício do poder por qualquer dos Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Desta forma, embora cada poder seja independente e autônomo, deve trabalhar em harmonia com os demais Poderes.

O Sistema de Freios e Contrapesos consiste no controle do poder pelo próprio poder, sendo que cada Poder teria autonomia para exercer sua função, mas seria controlado pelos outros poderes. Isso serviria para evitar que houvesse abusos no exercício do poder por qualquer dos Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Desta forma, embora cada poder seja independente e autônomo, deve trabalhar em harmonia com os demais Poderes.

Esse sistema dos freios e contrapesos é essencial para a manutenção da ordem constitucional e as Forças Armadas devem ser a eles obedientes.

O que foi exposto acima com relação a GLO e os estados de defesa e de sítio deixam claro, como exposto pela OAB, que “não cabe às Forças Armadas agir de ofício, sem serem convocadas para esse fim. Também não comporta ao Chefe do Poder Executivo a primazia ou a exclusiva competência para realizar tal convocação. De modo expresso, a Constituição estabelece que a atuação das Forças Armadas na garantia da ordem interna está condicionada à iniciativa de qualquer dos poderes constituídos. A provocação dos poderes se faz necessária, e os chefes dos três poderes possuem igual envergadura constitucional para tanto”.

Sendo assim não há porque se falar em possibilidade constitucional de intervenção militar.

Sendo assim qualquer conduta do presidente da República fora desses limites e balizamentos dará pretexto a crime de responsabilidade, o que poderá leva-lo a seu impedimento.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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