Resumo: O Direito Ambiental ocupa um espaço de maior destaque nas discussões sociais, principalmente devido à grande crise ambiental, tendo se verificado uma maior e mais evidente consciência política coletiva, ganhando espaço no discurso público nacional e internacional. Nesse sentido, o Estado possui um papel de destaque na sua função Constitucional (art. 225, §1°) de fazer valer seu poder de polícia, tornando assim o meio ambiente ecologicamente equilibrado. Assim, esse artigo tem como objetivo a análise da possibilidade de responsabilização civil do Estado em seus atos omissivos, com foco no caso Samarco. Utilizando-se da pesquisa qualitativa e de instrumentais técnicos sendo recursos bibliográficos e documentais, o artigo conclui que deverá o Estado ser responsabilizado por danos ao meio ambiente no caso Samarco, ao passo que possui o dever legal de manter o ambiente ecologicamente equilibrado.
Palavras-chave: Responsabilidade Civil do Estado. Constituição Federal. Desastres ambientais. Direito ao meio ambiente.
- INTRODUÇÃO
Atualmente o Direito Ambiental ocupa um espaço de maior destaque nas discussões sociais, principalmente devido à grande crise ambiental, tendo se verificado uma maior e mais evidente consciência política coletiva, ganhando espaço no discurso público nacional e internacional.
Nesse sentido, o Estado possui um papel de destaque na sua função Constitucional (art. 225, §1°) de fazer valer seu poder de polícia, tornando assim o meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Ocorre que, no dia 05 de novembro de 2015, houve o rompimento da barragem de Fundão, da mineradora Samarco S/A, no município de Mariana/MG, com consequente lançamento de 45 milhões de metros cúbicos de rejeito no meio ambiente. A extensão territorial atingida foi assustadoramente grande, ultrapassando a barragem de Santarém, percorrendo 55 km no rio Gualaxo do Norte até o rio do Carmo, e outros 22 km até o rio Doce. A onda de rejeitos que assolou o subdistrito de Bento Rodrigues, era composta especialmente de óxido de ferro e sílica, deixando um rastro de destruição até o litoral do Espírito Santo, percorrendo 663,2 km de cursos de água.
A tragédia ocorrida em Mariana/MG é considerando historicamente um dos maiores acidentes em volume de material despejado por barragens de rejeitos de mineração (AZEVEDO, 2015).
O Laudo Técnico Preliminar elaborado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e concluído em 26 de novembro de 2015, apurou diversos impactos ambientais, com inúmeros danos identificados inúmeros danos socioambientais, quais sejam: isolamento de áreas habitadas; fragmentação de habitats; destruição de vegetação nativa; mortandade de animais domésticos, silvestres e de produção; alteração na qualidade e quantidade de água; e sensação de desamparo e perigo da população (IBAMA, 2015).
Desde então, diversas medidas judiciais e extrajudiciais estão sendo tomadas pelo poder público, visando responsabilizar a Samarco, que é uma empresa controlada por duas sociedades empresárias, a Vale SA e BHP Billiton Brasil LTDA, bem como com o objetivo de reparar os prejuízos causados pelo rompimento da barragem como, por exemplo, a assinatura de Termo de Compromisso Preliminar entra a companhia, o Ministério Público de Minas Gerais e o Ministério Público Federal, com a prestação de caução para a tutela ambiental emergencial e da instauração de inquéritos civis e criminais e por último, do ajuizamento de ações civis públicas (BELCHIOR; PRIMO, 2016).
A abordagem adotada foi a qualitativa, que possui um caráter subjetivo, atuando na caracterização e determinação do objeto em estudo. Além disso, foi utilizado o método dedutivo, que parte de uma teoria base para uma abordagem específica. Em relação aos procedimentos técnicos, foram utilizadas a legislação, doutrina e pesquisa bibliográfica. O presente artigo abordará de forma breve a possibilidade de responsabilização do Estado diante das suas condutas omissivas, com foco no caso Samarco.
- RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL
A responsabilidade civil é dividida em duas grandes espécies, a subjetiva, que tem como principal pressuposto a culpa, e a objetiva que é a adotada amplamente para o instituto do dano ambiental, que ocorre independentemente da comprovação de culpa do agente.
Neste sentido, é imperioso destacar a importância do instituto da responsabilidade civil em caso de dano ao meio ambiente, ao passo que irá tutelar um direito coletivo e essencial à qualidade de vida de todos. Importante dizer que o caráter da responsabilização pelo dano ambiental é peculiar, conforme preleciona Steigleder (p. 177, 2004) “Cuida-se, então, de perceber que a responsabilidade civil pelo dano ambiental possui uma função social que ultrapassa as finalidades punitiva, preventiva e reparatória, normalmente atribuídas ao instituto.”
Assim, a responsabilidade civil ambiental tem como previsão legal os artigos 14, § 1°, da Lei n° 6.938/1981, bem como o art. 225 da Constituição Federal Brasileira. Conforme explica Carvalho (2008, p. 74):
Existem, ainda, previsões normativas específicas sobre a responsabilidade civil em atividades determinadas, tais como mineração, Código Florestal, energia nuclear, agrotóxicos. A responsabilização do poluidor, independentemente de comprovação de sua culpa, impõe a aplicação objetiva da responsabilidade civil em casos de danos ambientais como manifestação imediata dos princípios do poluídos-pagador (“quem contamina paga”) e da prevenção.
Muito bem pontuado por Vianna, ressalta que (2004, p .92) “Nosso sistema adotou, expressamente, a responsabilidade civil objetiva, conforme dicção do art. 14, § 1°, da Lei 6.938, de 31.08.1981”.
No mesmo sentido, preleciona Fiorillo (2014, p. 88):
O direito ambiental, atento a essas modificações e considerando a importância dos bens tutelados, adota a responsabilidade civil objetiva. Vale frisar que, anteriormente à Constituição Federal de 1988, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 6938/81) já previa a responsabilidade objetiva do poluidor em seu art. 14, § 1°. Com a promulgação da Lei Maior tal norma infraconstitucional foi recepcionada, tendo como fundamento de validade o art. 225, § 3°, porquanto este não estabeleceu qualquer critério ou elemento vinculado à culpa como o determinante para o dever de reparar o dano causado ao meio ambiente. Consagrou-se, portanto, a responsabilidade objetiva em relação aos danos ambientais.
É notório que a Constituição Federal apenas recepcionou o já estabelecido pela legislação infraconstitucional, o fato de que a responsabilização pelo dano ao meio ambiente será verificada independente de culpa.
Em que pese o entendimento de que a responsabilidade civil pelo dano ambiental seja objetiva, alguns pressupostos deverão ser observados, como por exemplo, a comprovação da conduta, por ação ou omissão, o dano e o nexo de causalidade.
2 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATOS OMISSIVOS
É importante analisar a responsabilidade civil do Estado por atos omissivos, que conforme Celso Antônio Bandeira de Mello (p. 1029):
Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência e imperícia (culpa), ou, então deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade objetiva.
É dessa forma que se mostra indispensável que a atuação do Estado tenha implicado em ilicitude, por não ter impedido o dano ou não ter agido de forma eficaz neste sentido, em razão de comportamento inferior ao esperado ao seu padrão legal (Mello, 2013).
Inicialmente, não há como definir um padrão legal para responsabilização do ente público em casos de omissão, o que dependerá de alguns fatores determinantes que devem ser apurados, conforme Celso Antônio Bandeira Mello (2013 p. 1030) “[...] em função do meio social, do estádio de desenvolvimento tecnológico, cultural, econômico e da conjuntura da época, isto é, das possibilidades reais médias [...]”, considerando o contexto em que se produz o fato danoso.
É nesse sentido que é coerente que o Estado responda objetivamente pelos danos que efetivamente causou. E em casos de omissão, que responda quando estiver juridicamente obrigado a impedi-lo.
Como elucida Celso Antônio Bandeira de Mello (2013, p. 1032):
A responsabilidade estatal repontará apenas, consoante reiteradamente vimos afirmando, se o Estado não agiu para impedir o dano, embora estivesse juridicamente obrigado a obstá-lo, ou se, tendo agido, atuou insuficientemente, portanto, abaixo dos padrões a que estava, de direito, compelido.
Por fim, importa mencionar que um dos acontecimentos que poderão gerar responsabilidade do Estado por omissão é o fato da natureza que de acordo com as palavras de Mello (2013, p. 1033) “[...] cuja a lesividade o Poder Público não obstou, embora devesse fazê-lo [...]”
Portanto, depreende-se que é plenamente possível que o Estado responda por seus atos omissivos, desde que obrigado juridicamente a impedir a ocorrência do dano ambiental.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme exposto, a responsabilidade civil do Estado é, em regra, objetiva, e merece atenção especial em casos que o Estado é omisso no seu dever Constitucional de assegurar efetivamente o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. É necessário tecer algumas considerações, pois, conforme verificado, o direito ambiental é um ramo jurídico que deve ser analisado de forma específica, considerando suas peculiaridades e dificuldade na sua restauração em casos de danos.
No caso ocorrido no município de Mariana/MG, no ano de 2015, observou-se uma grande quantidade de emissão de poluentes, principalmente na água, com a consequente destruição da fauna e da flora, o que impactou a vida na região local e no estado do Espírito Santo. Nesse sentido, verifica-se a evidente falha do poder público no seu dever de fiscalização, para a ocorrência do dano catastrófico, ao passo que emitiu autorizações de funcionamento em ambiente de alto risco de poluição, permanecendo inerte.
É nesse cenário que a Responsabilidade Ambiental do Estado deverá efetivar os direitos constitucionalmente previstos e buscar a toda coletividade o reparo nos danos causados em casos de omissão. Dessa forma, considerando que o Estado não promove as fiscalizações necessárias o que resultou em relevante dano ambiental ocorrido em Mariana/MG, tem-se que deverá o Estado ser responsabilizado civilmente pelos danos causados, ao passo que contribuiu significativamente para a ocorrência do dano na sua omissão no seu dever legal constitucional e infraconstitucional.
REFERÊNCIAS
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