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Fundamentos institucionais do Estado

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Agenda 03/06/2006 às 00:00

O que dá Forma ao Estado, em Poucas Palavras?

De modo direto e objetivo, como definir o Estado a partir de poucas características, mas tão citadas, e que são o povo, o território e a soberania?

Pode-se dizer que é até uma questão de lógica que se defina o Estado a partir das relações estabelecidas entre Povo, Território e Soberania. Pois é preciso que haja um mínimo de organização social e política para que as instituições tenham um sentido claro e vivido, e é óbvio, então, que é por obra desse mesmo povo ou de seus líderes que existem tais instituições. Também é de se esperar que esse povo ocupe ou habite um determinado território.

Na verdade, são estabelecidas relações sociais e políticas, no tempo e no espaço, a partir das quais o povo passa a construir suas vidas, casas, cidades e propriedades, onde possa trabalhar, construir sua cultura, desfrutar das amizades (da interação social), produzir seus valores e se reproduzir socialmente.

Porém, nada disso existiria (ou a vida social e política seria muito precária) se esse povo que constituiu as bases do Estado, no seu território, não lhe tivesse total controle ou poder de decisão. Por isso, o povo necessita de hegemonia e de soberania sobre esse mesmo Poder Político que é o Estado.

O Estado decorre da soberania, da vontade expressa e consubstanciada pelo povo no seu próprio território e nas demais instituições sociais e políticas que se construíram ao redor dos aparelhos jurídicos e formais do Estado. Portanto, o Estado existe quando o povo se percebe soberano ou se faz dono de seu território – e tanto faz que seja por Direito ou pela conquista.

O que ainda nos leva a frisar que só faz sentido falar do Estado se estiver relacionado à demarcação histórica e geográfica em que se encontra. Isto é, não há Estado fora da história, e por mais que especifiquemos alguns elementos teóricos e abstratos a fim de caracterizar seu perfil, a experiência política vivida no Estado pode ser resumida a uma relação espaço-tempo.

Pela lógica, se o Estado é um objetivo, uma finalidade histórica constituída pelo povo, então, deverá ser uma busca, uma intenção clara de alguém ou de alguns, dos líderes ou da maioria - mas sempre real -, em determinado momento e em algum lugar mais ou menos demarcado. Só há Estado concreto, palpável, quando em funcionamento e em ação, pois, não há Estado abstrato, fora do globo terrestre e desconhecendo-se sua geopolítica.

Em suma, Estado = finalidade política + condições históricas objetivas.

Porém, para melhor funcionar, o Estado desenvolveu funções especializadas, dividiu tarefas políticas e administrativas - como são indicadas no último tópico.


Funções Clássicas (elementares) do Estado

Função legislativa (Poder Legislativo): manifesta-se por meio da edição de leis (gerais e obrigatórias) dirigidas a todos indistintamente. Função executiva (Poder Executivo): mais diretamente ligada à responsabilidade dos governantes, refere-se ao gerenciamento da coisa pública, inclui as atribuições políticas e engloba a capacidade legislativa do Poder Executivo (função atípica). Função jurisdicional (Poder Judiciário): cujo "campo de ação" se fixa mais detidamente na solução de conflitos surgidos na sociedade e que devem ser regulados pelas normas gerais já editadas, isto é, trata-se da aplicação da lei (do Direito 21) ao caso concreto. Das funções, vamos aos porquês do Estado.


Relevância e Utilidade do Estado

Para que serve o Estado, afinal? Veremos ao longo dos estudos propostos que a resposta não é simples – do tipo: o Estado é bom ou mal? Até porque o Estado é bom e mal -, mas composta e complexa. No entanto, inicialmente, basta-nos pensar que hoje precisamos discutir mais a utilização do que a utilidade do Estado.

Discutir os fundamentos do Estado e do Direito equivale a pensar/refletir – criticamente – não só a validade, a importância, a necessidade do Estado e do Direito atualmente, até porque isso seria óbvio demais. Dada a complexidade social de hoje e que só pode ser mediada pelo Estado como instituição chave, e tendo o Direito como instrumento, é preciso pensar além dos porquês do Estado, é preciso indagar acerca do uso da máquina, do como se faz o Direito e as demais instituições. Portanto, menos óbvio é discutir a utilização – não só a utilidade – do Estado, as formas e os meios empregados na sua regulação, regularização institucional.

Também é sabido que, camuflado nessa normatização social e institucional (do próprio Estado), há um crescente processo de dominação, às vezes legítima, às vezes mantendo-se com o mero uso de formas violentas ou opressoras por parte do próprio Estado. Seria preferível que tudo se desse de modo equilibrado, com a atuação e não apenas figuração do Estado como meio democrático, racional, popular de exercício do controle social. Mas, a objetividade política, o realismo político, e a realidade do Estado e do Direito são bastante diversas das intenções e das esperanças depositadas em suas instituições, por mais republicanas que estas sejam ou tenham sido em sua origem moderna.

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Por isso, não é difícil perceber que embutido nesse processo de normalização social e ideológica há um outro movimento meramente político – de antagonismos e de contradições de interesses - e neste caso é preciso cautela, pois ainda que menos evidente, continua muito clara e atuante a luta de classes sociais e/ou de grupos políticos.

As relações conflituosas são típicas da sociedade capitalista e, portanto, deve ser menos conclusiva a idéia de que se busca equilíbrio social no Direito e no Estado. Pois, é legítimo indagar: até que ponto o Direito e o Estado não são dois subprodutos dessa mesma violência, inconstância e nebulosidade social e que é parte estrutural, fundante das sociedades capitalistas?

Com o pensamento voltado para o Brasil, do passado e do presente, então, essas questões e polêmicas ganham ainda mais notoriedade, quase obviedade e é certo que não podem passar despercebidas a quem quer que analise tanto o Direito quanto o Estado de forma mais crítica e atuante. No Brasil, ainda temos que travar uma luta incessante com o passado que negava veementemente o Direito e, no presente, com um Direito que parece não ser de fato. É estranho, mas nem sempre Estado e Direito são de fato – aliás, um Direito que não é de fato, soa mais como privilégio: o que é de poucos ou o que serve a poucos. No entanto, veremos que este também é o contexto institucional em que se encontravam os Estados Antigos, além de muitos dos chamados Estados modernos ou contemporâneos.

No passado remoto vigorava a Teocracia, hoje nos vemos cercados pela sombra forte e crescente do protofascismo.

Enfim, de posse desses dados básicos, agora é possível analisar as formas de Estado propriamente ditas. O próximo capítulo tratará do Estado Antigo.


5. Bibliografia

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____. Igualdade e liberdade. 4ª Ed. Rio de Janeiro : Ediouro, 2000.

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BOBBIO, Norberto. Teoria Geral da Política: a filosofia política e as lições dos clássicos. (organizado por Michelangelo Bovero). Rio de Janeiro : Campus, 2000.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4ª Edição. Lisboa-Portugal : Almedina, s/d.

CLASTRES, Pierre. A sociedade contra o Estado: pesquisas de antropologia política. 5ª ed. Editora Francisco Alves, 1990.

DALLARI, Dalmo de Abreu. O futuro do Estado. São Paulo : Saraiva, 2001.

DURKHEIM, Émile. Sociologia. 4ª ed. Coleção Grandes Cientistas Sociais. São Paulo : Ática, 1988.

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LÉVI-STRAUSS, C. O Pensamento Selvagem. Campinas, SP : Papirus, 1989.

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MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Tomo I. 3ª ed. Coimbra-Portugal : Coimbra Editora, 2000.

NEGRI, Antonio. O poder constituinte: ensaio sobre as alternativas da modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

RIBEIRO, P. J. @ STROZENBERG, P. Balcão de direitos: resoluções de conflitos em favelas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Mauad, 2001.

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WEBER, Max. O Estado Racional. IN : Textos selecionados (Os Pensadores). 3ª ed. São Paulo : Abril Cultural, 1985, p. 157-176.


NOTAS

1 Sem contar a dificuldade de se crer que "o Estado busca o bem social".

2 "A soberania no plano interno (soberania interna) traduzir-se-ia no monopólio de edição do direito positivo pelo Estado e no monopólio da coação física legítima para impor a efetividade das suas regulações e dos seus comandos" (Canotilho, s/d, p. 90).

3 É óbvio que se trata aqui de uma afirmação simplista e somente inicial das forças que se aglutinam em torno dos aparelhos do Estado.

4 As relações de parentesco, por exemplo, fixam regras de convívio extremamente rígidas.

5 Este é o item mais complexo, pois vai da busca do bem comum à dominação de classe.

6 Porém deve-se ter claro que o reconhecimento internacional ou não de um Estado não implica em sua independência real. Um país pode ser declarado independente pela ONU e estar sob ocupação de outro (Tibet) e um outro país pode receber fortes restrições diplomáticas (também da ONU) e não sofrer quebra na sua soberania, como foi o caso da África do Sul – ainda na vigência do regime segregacionista do Apartheid.

7 Veja-se, neste sentido, por exemplo, todos os períodos em que se manifestaram os "déspotas esclarecidos" ou os líderes populistas.

8 O controle, neste caso, pode-se dar pelo convencimento político-ideológico, pelo simples uso da força física e da coerção ou pela imposição e aceitação (legítimas) de regras amplamente difundidas e aceitas.

9 Também diríamos de um ordenamento jurídico e que ainda resultasse de uma determinada cultura jurídica.

10 Creio que aqui devêssemos chamar de mundo ocidental e não exatamente civilizado, pois, toda cultura pode constituir uma civilização à parte. Bobbio se refere ao Estado europeu.

11 O Imposto de Renda Retido na Fonte, por exemplo, é um sinal explícito da ação regular e implacável desse Estado Arrecadador que temos no Brasil.

12 Cada vez mais a política e o Estado são regulados (busca-se uma limitação) por diplomas legais, além de serem submetidos a uma crescente inquirição jurídica: a este processo de crescente julgamento do Estado e dos seus agentes chama-se de judicialização da política.

13 Quer dizer que o encaminhamento dos pedidos e processos segue uma diretriz, um caminho regular.

14 Teoricamente, não deveria importar, ao serviço público, se fulano ou beltrano é magro, negro e pobre ou se, ao contrário, é rico, branco e obeso.

15 Quanto ao ensejo político, não deve trazer grandes diferenças no encaminhamento do serviço público, o fato deste sujeito ou daquele fazer parte da base aliada do governo ou, ao contrário, ser sua oposição.

16 Ao contrário do que se pensa, o Estado não fecha em finais de semana ou feriados, a exemplo da vigência das regras que desconhece suspensão de eficácia por esses motivos e da prestação regular dos chamados serviços essenciais.

17 Uma ação objetiva do Estado é aquela de efeito prático, rápido ou imediato, de baixo custo e de boa qualidade para a assistência dos cidadãos.

18 Aplicar a razão, o bom senso, a lógica, o equilíbrio aos negócios públicos da mesma forma como tentamos fazer com nossas contas e negócios particulares.

19 Fala-se, por exemplo, em autonomia ou não do Banco Central.

20 No século XVI, Maquiavel escreve o clássico livro O Príncipe, em que emprega pela primeira vez a expressão status com o sentido atual de Estado.

21 Lembremo-nos: Direito é diferente de lei – em certos momentos, as leis injustas afrontam o Direito.

Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINEZ, Vinício Carrilho. Fundamentos institucionais do Estado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1067, 3 jun. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8453. Acesso em: 5 nov. 2024.

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