9. CONCLUSÃO
É inegável o fato do Direito ser determinado pela sociedade que o mesmo baliza, e natural também que o controle exercido por esta mesma sociedade sobre ele não se componha de parcelas equânimes, mas sim que seja administrado, em maior escala, pelas parcelas sociais dominantes. Interessante perceber-se, ao final de toda a recomposição do caminho evolutivo percorrido pelo direito e pela jurisdição penal, que tal máxima se reproduz no âmbito macro de uma sociedade internacional, composta não por indivíduos, mas por Estados e Organizações Internacionais.
O liame que se pretendia demonstrar ao longo deste trabalho ficou claramente evidenciado nas mais diversas ocasiões, evolutivas ou regressivas, enfrentadas pela jurisdição e pelo direito penal internacional, neste estudo abordadas. Foi sempre a vontade política o fator determinante para o ritmo e direção da marcha encampada pelo ramo jurídico em tela.
Pode-se concluir que o modo como a jurisdição penal internacional vem sendo implementada decorre fartamente de uma falha do sistema de proteção internacional (precipuamente o das Nações Unidas) em manter a paz e a segurança mundiais. Não obstante, a solução encontrada para tal falha (a jurisdição penal internacional posterior à perpetração dos atos criminosos) vem provando sua viabilidade, ao passo que efetivamente proporciona uma resposta legal eficaz aos desmandos de monta internacional. Para Cassese,
Quando a situação de emergência já não mais existe, considera-se que a reação apropriada a esses crimes não seria conceder anistia, esquecê-los ou instalar comissões de reconciliação constituídas para fomentar o processo de reconciliação nacional (e para evitar a sobrecarga do judiciário local sob construção ou reforma). De fato, sente-se que levar a julgamento aqueles responsáveis por sérios crimes a poderá ajudar no processo de construção da paz no pós-conflito, além de servir para barrar o futuro cometimento de mais ofensas em larga escala (CASSESE, 2005, p.343-344, tradução nossa).
Destarte, faz-se necessário purgar a má influência trazida pela, algumas vezes, distorcida vontade política ao desenvolvimento da justiça penal internacional. Tal intento só será alcançado quando da oferta a tal jurisdição de mecanismos que a possibilitem transcender às forças e vontades políticas que a originaram e, então, gerir-se autonomamente, aplicando a lei, quer seja no âmbito nacional ou internacional, e assim punindo os ultrajes cometidos contra os povos do mundo.
REFERÊNCIAS
BROWNLIE, Ian. Principles of Public International Law. 5. ed. Oxford: Oxford University Press, 2003.
CASSESE, Antonio. International Criminal Law. Oxford: Oxford University Press, 2003.
CASSESE, Antonio; DELMAS-MARTY, Mirelle. Crimes internacionais e jurisdições internacionais. Tradução de Silvio Antunha. Barueri, SP: Manole, 2004.
FERRO, Ana Luiza Almeida. O Tribunal de Nuremberg. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002.
GONÇALVES, Joanisval Brito. Tribunal de Nuremberg 1945-1946: a gênese de uma nova ordem no direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.
INTERNATIONAL LAW COMMISSION. Principles of International Law Recognized in the Charter of the Nürnberg Tribunal and in the Judgment of the Tribunal. Disponível em: <https://legal.un.org/ilc/texts/instruments/english/draft_articles/7_1_1950.pdf>. Acesso em: 16 nov. 2005.
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MIRCEVA, Stojanka. Why the International Criminal Court is Different. Global Policy Forum. Disponível em: <https://archive.globalpolicy.org/intljustice/icc/2004/0126different.htm>. Acesso em: 16 nov. 2005.
THE INTERNATIONAL CRIMINAL TRIBUNAL FOR THE FORMER YUGOSLAVIA. The ICTY at a Glance: general information. Disponível em: <https://www.icty.org/>. Acesso em: 16 nov. 2005.
Notas
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Exemplos de tais agressões foram a violação à neutralidade belga, o afundamento de navios neutros ou mercantes por submarinos alemães e as pilhagens nos territórios ocupados.
Atual Corte Internacional de Justiça.
Mais tarde estabeleceu-se também o Tribunal de Tóquio, com as mesmas atribuições do de Nuremberg, regimento similar e com o escopo de processar os criminosos de guerra do Oriente.
CURSO DE INVERNO EM DIREITO INTERNACIONAL. 1, 2005, Belo Horizonte – MG.
Materializa-se tal controle através das Operações de Paz das Nações Unidas, ou Peacekeeping Operations.
Milosevic utilizou-se de tal argumento para argüir contra a legalidade do TPII que o processava.
EUA, Reino Unido e França são membros tanto do UNSC (membros permanentes com poder de veto) quanto da OTAN.