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Auto de infração da fiscalização do trabalho:

novo título executivo extrajudicial trabalhista

Agenda 30/06/2006 às 00:00

1)Introdução

            Por longo tempo, cristalizou-se o entendimento de que não era possível a execução de títulos executivos extrajudiciais perante a Justiça do Trabalho.

            Essa conclusão decorria do disposto na redação original do caput do art. 114 da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), que estabelecia competir à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os litígios originados do cumprimento de suas próprias sentenças.

            Este preceptivo também aludia à possibilidade de a Justiça Especializada Trabalhista apreciar outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, desde que previstas em lei.

            Como inexistia lei que conferisse competência a este ramo do Poder Judiciário para processar execução direta de títulos executivos extrajudiciais, restou sedimentada a compreensão da necessariedade do processo de conhecimento prévio com mira a, somente mediante o proferimento de sentença lato sensu (sentença ou termo de conciliação judicial), conferir força executiva àqueles títulos.

            A nova redação do art. 876 da CLT – dada pela Lei n.º 9958/2000 – mudou este panorama, ao consignar expressamente que passariam a ser executados pela Justiça do Trabalho (dispensada, portanto, a etapa do processo de conhecimento) o termo de compromisso de ajustamento de conduta firmado perante o Ministério Público do Trabalho e o termo de conciliação celebrado perante a comissão de conciliação prévia.

            Com a conhecida Reforma do Poder Judiciário, parece-me – é este o objetivo deste sucinto estudo – que mais um título executivo extrajudicial trabalhista passou a existir: o Auto de Infração lavrado pela fiscalização do trabalho para aplicar multa em face do descumprimento da legislação trabalhista.


2) Nova competência da Justiça do Trabalho

            Reza a partitura do novel inciso VII do art. 114 da Constituição Federal:

            "Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

            ...................

            VII - as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;"

            Qual é acepção do vocábulo ações inscrito neste preceito constitucional? Limita-se às ações de conhecimento? Para abarcar as ações executórias diretas seria preciso inserir também a palavra execuções?

            A doutrina especializada pouco enfrenta o assunto. Os pioneiros que se dispuseram a tanto procederam a uma interpretação restritiva do preceptivo em pauta, arredando a possibilidade de este ter contemplado a promoção de ação executória autônoma para a cobrança judicial de multas aplicadas pela fiscalização do trabalho.

            O argumento central residiu exatamente na ausência da palavra execuções no dispositivo ora enfocado, efetuando-se um contraponto à redação do inciso VIII do art. 114 da CRFB, o qual prevê explicitamente a competência da Justiça do Trabalho para executar contribuições previdenciárias.

            Com todo o respeito, essa argumentação não é consistente. Fundamentemos.

            Nosso Texto Maior, ao disciplinar a competência da Justiça Federal (art. 109), não enuncia expressamente o processamento de títulos executivos extrajudiciais. Esta parcela de poder-dever estatal encarta-se no inciso I do aludido art. 109, o qual, bastante genericamente, apregoa competir aos juízes federais processar e julgar as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes, excetuadas as causas relativas a falência, acidente do trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.

            Note-se que as partituras dos caputs dos arts. 109 e 114 da CRFB são quase idênticos. Enquanto no art. 109 se assinala que "Aos juízes federais compete processar e julgar", no art. 114 consta que "Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar".

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            Demais disso, comparando-se o inciso I do art. 109 com o inciso VII do art. 114 da CRFB, verifica-se uma única diferença quanto ao instrumento processual que provocará a função jurisdicional desses ramos do Poder Judiciário nacional. Enquanto no primeiro se alude a causas, no segundo há referência a ações. Essa distinção, entretanto, é inócua, pois causas e ações são tidas por sinônimos.

            Assim, a prevalecer a tese defendida pela doutrina trabalhista, a Justiça Federal apenas seria competente para processar execuções diretas de cobranças de multas infligidas pelas fiscalizações federais se o vocábulo execuções estivesse averbado no inciso I do art. 109 da CRFB.

            Como esta competência sempre se inseriu no âmbito da Justiça Federal, evidencia-se a inconsistência da interpretação restritiva do inciso VII do art. 114 da CRFB.


3)Fundamento legal para a qualificação do Auto de Infração da fiscalização do trabalho como título executivo extrajudicial trabalhista

            A competência explícita para a Justiça Federal processar execuções diretas de cobrança de multas aplicadas pela fiscalização do trabalho estava radicada tão-somente no art. 642 da CLT. Transcrevamos este dispositivo, na parte que interessa aos propósitos desta breve dissertação:

            "Art

. 642 - A cobrança judicial das multas impostas pelas autoridades administrativas do trabalho obedecerá ao disposto na legislação aplicável à cobrança da dívida ativa da União..."

            De seu turno, a cobrança da dívida ativa da União se perfaz pelas balizas da Lei n.º 6830/1980 (Lei da Execução Fiscal). O esquadrinhamento deste diploma legal leva à iniludível conclusão de que a cobrança em tela se concretiza por execução direta, sendo supérfluo prévio processo de conhecimento.

            Tendo a competência para apreciar este tipo de demanda sido realocada para o Judiciário Trabalhista, não há razão plausível para se deixar de aplicar o art. 642 da CLT, o qual complementa o art. 876 celetizado.


4)Conclusão

            Conseguintemente, a partir do início de vigência da Emenda Constitucional n.º 45/2004, além do termo de compromisso de ajustamento de conduta firmado perante o Ministério Público do Trabalho e do termo de conciliação celebrado perante a comissão de conciliação prévia, o Auto de Infração emitido pela fiscalização do trabalho para aplicar multa por descumprimento da legislação trabalhista também se configura como título executivo extrajudicial trabalhista.

Sobre o autor
Ricardo Araujo Cozer

procurador do Trabalho, com lotação na Procuradoria Regional do Trabalho da 7ª Região, Ofício de Sobral (CE), bacharel em Direito pela UFPE

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COZER, Ricardo Araujo. Auto de infração da fiscalização do trabalho:: novo título executivo extrajudicial trabalhista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1094, 30 jun. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8581. Acesso em: 22 dez. 2024.

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