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A ilegalidade do inquérito das Fake News (INQ 4781)

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Agenda 04/12/2020 às 15:09

JULGAMENTO DA ADPF 572

O partido Rede Sustentabilidade ajuizou a ADPF (arguição de descumprimento de preceito fundamental) de nº 572, na qual questiona a validade do inquérito.

A Rede Sustentabilidade alega que não há indicação de ato praticado nas dependências do STF ou quem serão os investigados e se estão sujeitos à jurisdição do STF. Argui ainda que, salvo exceções, não compete ao Poder Judiciário conduzir investigações criminais. Sustenta a necessidade de representação do ofendido para a investigação dos crimes contra a honra e a falta de justa causa para a instauração de inquéritos por fatos indefinidos. Assevera, ainda, que o inquérito não ficou sujeito à livre distribuição, como determina o RISTF. Em 29/05/2020, o partido Rede Sustentabilidade pediu a extinção da ação, sem resolução do mérito.

O supremo, por sua vez, decidiu que o inquérito deve continuar, com 10 votos a 1, somente Ministro Marco Aurélio Melo divergiu. Adiante, trecho do voto do ministro Dias Toffoli:

“A instauração deste inquérito se impôs e se impõem não porque o queremos, não porque o gostemos, porque não podemos banalizar ataques e ameaças ao STF, guardião da CF, trata-se de prerrogativa de reação institucional, necessário em razão da escalada das agressões cometidas contra o Tribunal, contra membros do tribunal e contra familiares do tribunal, das quais a Corte não pode renunciar, em especial quando se verifica a inércia das instituições”

O ministro alegou que o Tribunal e seus ministros vem, há algum tempo, sofrendo ataques ou tem a sua integridade e honorabilidade ameaçadas por milícias digitais que buscam atingir o STF e o estado democrático de direito, o ministro fundamentou o seu voto como sendo uma prerrogativa de reação institucional e afirmou que tomou a iniciativa depois de constatar a inércia daqueles que deveriam evitar os ataques.

Ademais, todos os Ministros, com exceção do ministro Marco Aurélio Melo, acompanharam o voto do relator (Edsom Fachim). Na sua fundamentação o Ministro Marco Aurélio Melo arguiu:

“Estamos diante de um inquérito natimorto e este a de ser verificado depois de instaurado, um inquérito do fim do mundo, sem limites, eu faço acolhendo um pedido formulado na ADPF, para fulminar o inquérito, porque o vício inicial contamina a tramitação, não há como salva-lo, em que pese a ótica revelada posteriormente pela Procuradoria Geral da República, e devo ressaltar que inicialmente esse inquérito foi coberto pelo sigilo, receio muito as coisas misteriosas, devo ressaltar que somente se deu margem ao acesso por possíveis investigados envolvidos passados 30 dias, o mesmo ocorreu quanto a audição da PGR. Não pode a vítima instaurar inquérito. Uma vez sendo formalizado requerimento de instauração de inquérito, cumpre observar o sistema democrático da distribuição, sob pena de começarmos a ter um juízo de exceção em contrariedade ao que previsto no principal rol das garantias constitucionais da carta de 1988. Neste ponto, o sistema acusatório é oposto ao sistema inquisitorial. É como voto”

O ministro valeu –se da expressão “natimorto” que juridicamente significa que o ato foi iniciado eivado, maculado, contaminado com um vício capaz de torna-lo nulo, portanto o ministro invoca a falta de legitimidade do STF em instaurar o inquérito sob a ótica da CF e do CPP.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

È Característica do Estado moderno a proteção dos administrados, contrapondo o estado absolutista existente outrora, para tal, são necessários mecanismos de proteção eficazes contra o Estado, um deles é a possibilidade de anulação de processos e procedimentos judiciários quando tal feito nasce de maneira ilegal ou equivocada, e esse deve ser o destino do inquérito 4781 instaurado de ofício pelo STF, em consonância com código de processo pena em seu art 564, ipsis litteris:

Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: I - Por incompetência, suspeição ou suborno do juiz; II - Por ilegitimidade de parte. (Grifei)

De forma resumida a instauração do inquérito 4781mantida pelo Supremo Tribunal Federal é flagrantemente inconstitucional pois violam o art. 129. da magna carta de 1988 em seus incisos I e VIII:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;

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III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;

IV - promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição;

V - defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas;

VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva;

VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior;

VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais. (Grifei)

Pode-se concluir, portanto, que o inquérito 4781 é indefensavelmente nulo, embora o presente trabalho não tenha o objetivo de esgotar a discussão nem tampouco advogar em prol de possíveis delinquentes que possam atingir os membros do pelo Excelso Pretório, certo é que há de se ter um limite entre a interpretação analógica da lei e invasão de competências alheias, evitando assim de se nascer um judiciário absolutista, o qual se conflita com os preceitos básicos do estado democrático de direito, principalmente em tempos em que a desinformação deixou de ser o grande vilão da sabedoria, dando lugar a um vilão ainda mais ávido que é o excesso dela, pois muitas informações ao ignorante é como o excesso de palavras ao índio nativo, sabe dizê-las mas não sabe conjugar ou flexionar os verbos. Em tempos que temos acesso a quase toda literatura do mundo, mas nem por isso temos melhores escritores.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ULIANO, André Borges . Entenda por que o inquérito instaurado por Dias Toffoli é ilegal. Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/instituto-politeia/inquerito-toffoli-ilegal/. Acesso em: 01/07/2020.

NETOO, Paulo Roberto . E.tenda o inquérito das fake News contra o STF. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,entenda-o-inquerito-das-fake-news-contra-o-supremo,70002795934. Acesso em: 01/07/2020.

POR 10 VOTOS A 1, STF DECIDE QUE INQUÉRITO DAS FAKE NEWS DEVE CONTINUAR. G1/POLITICA. Disponível em:https://g1.globo.com/politica/ao-vivo/stf-julgamento-inquerito-das-fake- news.ghtml. Acesso em 01/07/2020.

CAPEZ, Fernando, Curso de Direito Penal. 23ª edição. São Paulo. Saraiva.2016.

CAPEZ, Fernando, Curso de Direito Penal. 15ª edição. São Paulo. Saraiva.2011.

CEBRIAN ARAÚJO REIS, Alexandre, apud. Direito Processual Penal Esquematizado. 5ª edição. Saraiva. 2015.

(CRISTINA WANDERLEY FERNANDES, Âmbito Jurídico, 2004). O princípio do Juiz Natural e os Tribunais de Exceção https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-constitucional/o-principio-do-juiz-natural-e-os-tribunais-de-excecao/

Cf. íntegra do pronunciamento no Canal da TV Justiça https://www.youtube.com/watch?v=fSRtZLbmNFc, 1:07min a 4:21min


Abstract: The purpose of this article is to demonstrate, in a legally technical manner, about the invalidity of the 4781 inquiry that became popularly known as the fake news inquiry, which was instituted by the Brazilian Supreme Court, with a view to investigating possible libelous and defamatory acts against its members. and their respective honors. The word “inquiry” originates from the Latin, In + quaerito and which gives rise to the word “inquire”, that is, the search for answers with the objective of mitigating obscurations, however there are criticisms about the very object of the investigation if it is somewhat how obscure, given the impossibility of reaching all users of the most used means of communication to spread the infamous fake News, as well as the choice of the case reporter, bringing to the fore blatant violation of the accusatory system, which gave rise to ADPF filed by the Political Party Rede sustainability. The research methodology used in this work was bibliographic research, books and articles, physical or available on the world wide web. The results and conclusions reached demonstrate the nullity of the 4781 investigation, which was instituted to the detriment of the principles of the natural judge of the specialty and of the accusatory penal system.

Key words : Fake News. Police investigation. Federal Court of Justice.

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